5. CONCLUSÃO
Conforme depreendido do estudo, não há, na Constituição brasileira, qualquer cláusula que indique a supremacia do direito internacional face ao direito interno. Existe, sim, dispositivos que regem as relações internacionais e também a aplicação dos Tratados pelos tribunais internos, uma vez incorporados estes ao direito interno. Exceto o art. 5, parágrafo 2 da CF, relativa aos tratados internacionais de proteção aos direitos humanos, nada mais há no tocante à temática.
Não obstante, a Convenção de Viena traz dispositivos, de caráter consuetudinário, que propugnam pela não invocação de disposições de direito interno para fins de justificar o inadimplemento de um tratado, sendo certo que existe o instituto da denúncia para o caso de o Estado desejar se retirar do Tratado vigente.
Sem embargo do recente posicionamento do Supremo Tribunal Federal, não há que se falar em conflito de normas enquanto o Tratado estiver vigente em órbita interna, após o procedimento da incorporação normativa. Enquanto não for denunciado, o Tratado deverá prevalecer por ser um compromisso assumido perante a comunidade internacional.
Mesmo assim, se a corte brasileira determinar pela inobservância do conteúdo de Tratado internacional, há a possibilidade de corrigir o imbroglio e reaver o direito via decisões arbitrais ou de cortes internacionais, as quais, segundo interpretação do art. 102, I, alínea "h", da CF, não demandam homologação por parte do STF para a execução das ordens manifestadas.
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Notas
1 Para maiores detalhes sobre as teses explanadas, vide a dissertação de mestrado de Estevão Ferreira Couto. COUTO, Estevão Ferreira. A Relação entre o Interno e o Internacional: concepções cambiantes de soberania, doutrina e jurisprudência dos tribunais superiores no Brasil. Dissertação de mestrado. Ciências políticas e Relações Internacionais - UNB, 2001.
2 Triepel, H. Les Rapports entre le Droit Interne et le Droit International, in Recueil de Cours de L’Academy de Droit International, tomo I, 1925.
3 Para Estevão Ferreira Couto, não existem dualismos ou monismos com gradações, ao contrário do que sugerem a nova doutrina. COUTO, op cit.
4 Por ser a principal fonte de DI, trataremos neste trabalho especificamente a respeito dos conflitos entre Tratado e direito interno.
5 ACCIOLY, H. Manual de Direito Internacional Público, São Paulo: Saraiva, 1998, p. 62.
6 KELSEN, Hans. Les Rapports entre le Droit Interne et le Droit International Public, in Recueil de Cours, 1926; Teoria Pura do Direito, 6 ed., Coimbra, Armênio Amado Ed., 1984; Teoria Geral do Direito e do Estado, São Paulo, Martins Fontes, 1990.
7 Art. 55 da Constituição Francesa de 1958: "Os tratados ou acordos devidamente ratificados e aprovados terão, desde a data de sua publicação, autoridade superior à das leis [...]".
8 Art. 6, II da Constituição dos EUA – " Esta Constituição, as leis dos Estados Unidos ditadas em virtude dela e todos os tratados celebrados ou que se celebrarem sob a autoridade dos Estados Unidos constituirão a lei suprema do País, e os juízes em cada Estado serão sujeitos a ela, ficando sem efeito qualquer disposição em contrário na Constituição e nas leis de qualquer dos Estados". Contudo, o Tratado tem o mesmo status em relação à lei federal (votada pelo Congresso e sancionada pelo Presidente). Assim, em caso de conflito entre tratado internacional e lei do Congresso, prevalece o texto mais recente. Por isso, alguns autores identificam o sistema americano como similar ao adotado pelo STF brasileiro, ou seja, o "sistema paritário", conforme será estudado, infra.
9 Neste sentido, vide a tese de Mirtô Fraga, no sentido de que o poder constituinte é limitado e não arbitrário a ponto de desrespeitar os compromissos internacionais. FRAGA, Mirtô. Conflito entre Tratados e Lei Interna, ed. Forense.
10 RESEK, J. Francisco. Direito Internacional Público, São Paulo: Saraiva, 2002, p. 96.
11 Segundo alguns autores, este sistema paritário poderia ser denominado de monismo moderado, havendo a equiparação hierárquica do tratado à lei ordinária com as seguintes conseqüências: a) subordinação do tratado à Constituição; b) quanto à lei ordinária, aplicação dos critérios temporal e da especialidade para a solução de antinomias. Neste sentido, vide BINENBOJM, Gustavo. Monismo e Dualismo no Brasil: uma dicotomia afinal irrelevante, Revista Forense, v. 350. Vide DOLINGER, Jacob. Direito Internacional Privado, Rio de Janeiro; Renovar, 2003. Vide também quadro sinóptico em ARAÚJO, Nadia. Direito Internacional Privado, Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 145-146.
12 No mesmo sentido, o art. 105, inciso III, alínea "a" da CF.
13 A íntegra do acórdão está em RTJ 83/809.
14 Vide RE 80.004, in RTJ 83/809. Para maiores detalhes sobre o tema, vide Jacob Dolinger, op. cit.
15 Vale ressaltar que o critério cronológico não se aplica aos Tratados fiscais e de extradição, que por sua natureza contratual demandam denúncia formal para deixarem de ser cumpridos. Neste mesmo sentido, Jacob Dolinger, op. cit. Vide também o artigo 98 do CTN, que configura a exceção supra mencionada. Neste sentido, vide RE 114.784, RTJ 126/804; RE 113.156, RTJ 124/347.
16 Vale ressaltar a discussão existente na doutrina a respeito da terminologia "devedor infiel", de forma a incluir ou não o devedor fiduciante. O entendimento majoritário é no sentido de que o legislador, ao equiparar o devedor fiduciante ao depositário infiel, no Decreto 911/69, teve como objetivo encontrar uma forma rápida de evitar o elevado número de inadimplência que o credor vinha sofrendo. Segundo o acórdão que indeferiu o pedido de Habeas Corpus n. 72.131-SP, em 1995, o atual entendimento do STF é no sentido de que o devedor fiduciante é depositário infiel, já que a CF 88 recepcionou o Decreto supra mencionado. Com este entendimento, como bem asseverou Nelson Nery Jr., "a prisão civil passou de exceção à regra". Vide NERY JR, N. Código de Processo Civil Comentado, RT, 1997, p. 1274.
17 DINIZ, Maria Helena. Conflito de Normas, São Paulo: Saraiva, 1998, p. 39.
18 PINHEIRO, Carla. Direito Internacional e Direitos Fundamentais, Atlas, 2001.
19 Neste sentido, vide RTJ 70/333; RTJ 100/1030; RT 554/434.
20 Esta Convenção entrou em vigor internacional em 7 de junho de 1959.
21 MAZZUOLI, Valério. As Sentenças Proferidas por Tribunais Internacionais Devem ser Homologadas pelo Supremo Tribunal Federal? Disponível em: <http://www.santajus.unisanta.br/doutrina.asp?ID=39&varOrder=titulo,%20autor&viewArticle=616>. Acesso em: 8 de junho de 2004.
22 MAGALHÃES, J. C. O Supremo Tribunal Federal e o Direito Internacional: uma análise crítica, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000, p. 102. No mesmo sentido, MAZZUOLI, Valério. Prisão Civil por Divida e o Pacto de San Jose da Costa Rica, Rio de Janeiro: Forense, 2002.