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Poder(?) de tributar: uma breve análise sobre justiça tributária e Estado Democrático de Direito

Agenda 24/01/2017 às 20:37

1) Justiça tributária: conceito, aplicações e evolução histórica frente a constitucionalização dos direitos

Como em todo conceito aberto da ciência jurídica, analisar o termo justiça tributária é tarefa que se faz de maneira não tão simples e direta. Usualmente, quando se ouve ou se fala do vocábulo justiça em seu mais estrito senso, logo vem na mentalidade de cada um os sentidos como os de isonomia, equidade, direitos igualitários, dignidade da pessoa humana, dentre outras expressões. Quanto ao tema Justiça Tributária este não podia se dar de modo diferente, vez que também guarda íntima correlação com os termos supracitados, tendo, ainda, como um plus de destaque, os ditames do princípio da capacidade contributiva e o princípio da vedação ao confisco, sempre tomando por base a Carta Maior do país, refletindo inevitavelmente no princípio da dignidade da pessoa humana. Para embasar tais palavras tem-se:

A noção do que venha a ser justiça tributária passa inelutavelmente pela discussão mais geral do que seja a justiça. Do ponto de vista conceitual, isso implica difícil e quiçá intransponível obstáculo epistemológico que impede que sejam estabelecidos os contornos desse objeto cognoscente, cuja essência é irrevelável ao conhecimento comum. (VASCONCELOS, 2012, p. 73)

Portanto, como descrito acima, a função de delinear e conceituar os termos justiça, bem como justiça tributária, são obstáculos epistemológicos de difícil transposição que não se esgotam em simples estudos ou conhecimentos sobre o assunto, ao contrário, está em constante mutação fazendo companhia a toda mudança de conhecimento que existe sobre o assunto. Asseverando:

De fato, a concepção de justiça é variável no tempo e no espaço, como sucede com o bem-estar social. Apesar de relativa, não há como se negar que essa concepção encerra um mínimo de significação. A grande e difícil questão é, pois, firmar um conceito mínimo do que venha a ser justiça. (VASCONCELOS, 2012, p. 73)

Ainda na tentativa de trazer um pouco da conceituação de justiça, de destaque são as palavras RAWLS (1997, p. 3) “A justiça é a primeira virtude das instituições sociais, como a verdade o é dos sistemas de pensamento”. Desse modo, tratar a justiça como preceito maior de uma sociedade enquanto instituição organizada é dizer que aquela encontra-se em posição sempre de mais destaque, posto que é a base de uma organização civilizada.

Portanto numa sociedade justa as liberdades de cidadania igual são consideradas  invioláveis; os direitos assegurados pela justiça não estão sujeitos a negociação política ou ao cálculo de interesses sociais. A única coisa que nos permite aceitar uma teoria errônea é a falta de uma teoria melhor; de forma análoga, uma injustiça é tolerável somente quando é necessária para evitar uma injustiça ainda maior. Sendo virtudes primeiras das atividades humanas, a verdade e a justiça são indisponíveis. (RAWLS, 1997, p. 4)

Induvidoso falar que, a recente constitucionalização dos direitos no Brasil tornou a questão da justiça ainda mais evidente, tranzendo a baila todas as questões sobre o poder de tributar do Estado e a forma como tal atividade é cumprida, para que não seja ferida a isonomia e a capacidade contributiva de todos aqueles que sofrem com a incidência das normas tributárias.

Assim sendo, a observância ao estrito cumprimento do princípio da legalidade, a neutralidade estatal, no que tange a não invasão à vida privada e financeira dos contribuintes pelo estado e a observação do princípio da capacidade contributiva, são de grande importância para que assim não seja ferido todos os preceitos constitucionais colocados atualmente em patamar de maior relevância para a aplicação das leis equitativamente, fazendo elo com o seguinte:

Não se pode olvidar que a noção da justiça como equidade está no cerne da concepção contemporânea de justiça tributária. Assim, de que modo deve o Estado impor a seus súditos o pagamento de tributos? Que tributos e hipóteses de incidência? Qual alíquota é justa para garantir um bom desempenho financeiro da máquina tributária, sem impor ao contribuinte ônus insuportável? Questões desta dimensão sinalizam para a presença da ideia de justiça na formulação de qualquer política tributária. (VASCONCELOS, 2012, p. 79)

Dessa maneira, para que se possa alcançar justiça em seus mais alargados termos, imperioso que se passe pela justiça também na tributação, evitando, assim, o aumento das diferenças sociais, os entraves no desenvolvimento econômico do país e tudo mais aquilo que de certa maneira impede a concretização dos ideais almejados pela Carta Magna de 1988. Para ratificar ainda mais tal entendimento, tem-se as seguintes palavras:

[…] a justiça na tributação é o caminho para que se chegue à justiça social, com a superação das abissais diferenças que entravam o desenvolvimento nacional. Dessa forma, é com a concretização da justiça tributária, princípio estruturante do sistema jurídico-tributário e de hermenêutica fundamental para a aplicação das normas jurídico-tributárias, que se enseja o alcance da justiça social. (VASCONCELOS, 2012, p. 80)

Indispensável tomar como base toda a evolução e historicidade que se deu no país em tempos mais antigos. Marcado pela desigualdade de maneira forte e pela má distribuição das rendas, necessário se faz correlacionar tais fatos com a ciência das finanças e também com o prórprio direito tributário, imbricando com o conceito maior de justiça dos tempos modernos e assim tratando o poder de tributar e a maneira do Estado se gerir financeiramente de forma mais justa. Dessa forma, passou-se a considerar mais o lado da capacidade contributiva, fazendo com que aqueles que mais possuem possam contribuir mais, de modo que os que menos possuem, contribuam menos.

Nessa evolução da ciência financeira e do direito tributário, foi possível perceber uma maior distribuição das riquezas e das rendas, de maneira tal que, os ramos do direito acima mencionados começaram a ser vistos não apenas meramente eficientes, para serem, a partir de então, vistos sob uma ótica mais justa, sem, no entando, refugar a eficiência. Então, observa-se que as leis e os sistemas não bastam almejarem a eficiencia a qualquer custo, tem que ser, no mesmo compasso, justos, para que assim se possa alcançar, primeira e basicamente a justiça social. Nas palavras de Irapuã Beltrão:

Não apenas os pensadores da atividade financeira destacam essa necessidade. Na nova virada testemunhada no último quartel do século passado, muito se recuperou dos instrumentos das finanças para implementação da justiça social, promovendo uma melhoria nas condições de gerais com redistribuição das riquezas da coletividade para além do sentido puramente de eficiência econômica. (BELTRÃO, 2014, p. 106)

Acompanhando tal evolução, se faz de bom alvitre esclarecer que a Carta de 1988 foi no mesmo sentido da evolução dos estudos das finanças e dos tributos justos, uma vez que se começou a perceber uma onda internacional com relação ao amadurecimento do sentido de justiça. É como se pode observar nos artigos 3º e 43 da Constituição da República Federativa do Brasil em que é posto todo um modelo responsável pela garantia do estado social e do bem estar social.

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No entanto, este bem estar social, não é alcançado de fácil maneira com uma política fiscal e tributária apenas eficiente e econômico, há que se tomar atenção quanto a justificação das normas de redistribuição, pois na doutrina econômica, o postulado da justiça tributária está ligada a justiça redistributiva, porém, este termo ainda há que ser mais profundamente analisado, uma vez que se pode alcançá-lo tanto no sentido da redistribuição das capacidades contributivas, como na realocação da aplicação das rendas, sendo estas ultimas aplicadas da melhor maneira possível para que se possa verificar um bom remanejamento das riquezas.

Destacando:

Em razão dos valores assegurados ou reconhecidos na Constituição, a atividade financeira pública não pode ser, de forma exclusiva, ponderada na visão econômica, especialmente em razão do princípio da diferença apresentado por Rawls, permitindo o atingimento da melhor adequação e resultados sociais - como, no exemplo citado pelo próprio autor estadunidense, quanto as despesas e financiamento da educação. (BELTRÃO, 2014, p. 107)

Assim, considerando os postulados da política fiscal, poderá se alcançar a destacada justiça tributária não só com a simples criação de tributos em si, fazendo do estado um exímio caçador de dinheiro para galgar eficiência econômica, mas, também, buscando formas extrafiscais para se chegar a uma política fiscal e tributária justas. Daí porque o legislador, e, consequentemente, o Estado, devem observância aos princípios constitucionais para se colocar em prática os escopos de justiça e bem estar social impregnados na Constituição uma vez que a justiça tributária, bem como a doutrina pátria liga-se com o sentido de redistribuição das riquezas.

Vejamos o seguinte ensinamento:

a justiça fiscal, especial dimensão da justiça política, é a nosso ver, a que oferece a melhor instrumental para a redistribuição de rendas, com a adjudicação de parcelas da riqueza nacional a indivíduos concretos. Abrange simultaneamente a justiça orçamentária, a tributária e a financeira (TORRES, 2005, p. 113-114).           

Ainda:

a máxima na justiça tributária está vinculado ao postulado de Direito na igualdade fiscal e inclui imposição uniforme segundo a capacidade contributiva econômica. Justiça fiscal em sentido estrito é a execução sistematicamente consequente da igualdade tributária e dos princípios, que concretizam o princípio da igualdade (TIPKE, 2008, p. 394)           

Efetivamente falando, a questão de um política tributária/fiscal justa é, principalmente fazer com que a tributação gere os melhores recursos do ponto de vista de uma realização racional e econômica, permitindo a disponibilidade destes para a diminuição das diferenças, tal qual conste dos princípios fundamentais da Carta Constitucional de 1988 e largamente reconhecido na interpretação da efetividade material do ordenamento fundamental, devendo estrita observância do legislador.

Continuando de maneira clara, destaca como se deve agir todo o ordenamento fiscal frente aos comandos constitucionais postos no art. 3º da Constituição da República:

mesmo o sistema econômico nacional foge àquela visão estática de acolher os valores constitucionais, projetando-se para o futuro com o acolhimento das demandas sociais”. (BELTRÃO, 2014, p. 109)

De tal modo, a política financeira e tributária do Estado vai mais além do que simplesmente produção de leis e mandamentos. Se não for observado os proclames constitucionais desde a criação até o alcance das exações tributárias dificilmente se poderá afirmar que foi atingido o objetivo do bem estar social através da redistribuição das rendas e das riquezas e assim alcançado a justiça tributária. Para tanto tem-se o seguinte:

Para que a justiça fiscal, por outro lado, seja realizada de modo efetivo, o conteúdo da economicidade deve lhe emprestar os predicados para que todas as tomadas de decisões tributárias – inclusive na fase legislativa – sejam dadas a partir da avaliação dos meios empregados diante das finalidades a serem atingidas (BELTRÃO, 2014, p. 110

Como se vem observando na sociedade atual, desde as manifestações de junho/julho de 2013, a pressão vinda daquele meio nada mais é que o entendimento que veio se formando em seu interior no sentido de cobrar efetivas e enérgicas ações para que sejam observados os interesses da maioria e não de apenas determinados setores pelo legislador brasileiro.

Portanto, da análise do termo justiça tributária, inevitavelmente se observa, também, a análise dos princípios fundamentais e constitucionais trazidos no bojo da vigente Constituição Federal, mais especificamente o princípio da capacidade contributiva, princípio da isonomia, da neutralização do Estado e dentre outros trazidos anteriormente, assim:

A justiça, tal como uma espécie de tentáculos, há de alcançar aqueles menos desprovidos de recursos, sejam materiais ou intelectuais, reconhecendo aquele estado de diferença amplamente suscitada pela moderna teoria do direito. A gestão tributária e a política fiscal decorrente deve se prestar a equacionar, isonomicamente, os agente sociais de acordo com a sua capacidade contributiva para que se dê, de forma plena, a justiça. (BELTRÃO, 2014, p. 110)

Fica claro o modo como a sociedade responde e anseia pela justiça no seu termo mais amplo, bem como também, a justiça tributária, indo para as ruas e exigindo dos representantes legais que atuem de modo para que efetive e coloquem em prática este tão importante tema que é a justiça.


2) Estado Democrático de Direito e Poder(?) de Tributar

Ser capaz para contribuir com o Estado através de seus tributos instituídos não significa trabalhar, auferir renda e acumular riqueza, para, por conseguinte, o mesmo ficar com a maior parte do inteiro. Tanto é que, se for feita uma rápida visitação histórica das mais importantes revoluções e transformações acontecidas nos tempos antigos no centro europeu como na França e Inglaterra por exemplo, se perceberá que, a injustiça quanto ao tanto que era dado ao Estado e quanto ao tanto que se tinha a título de retorno - praticamente nada naquela época havia de retorno para a sociedade - sempre esteve como plano de fundo, ou seja, a injustiça tributária, consequentemente a social, sempre serviu de força motriz para as principais transformações nas sociedades. Mudança significativa começou a se operar com a Carta Magna de 1.215 do Rei João Sem Terra.

Assim sendo, a medida da tributação é a capacidade contributiva, em uma ocasião em que todos têm o dever de contribuir, contudo, cada um dentro de suas capacidades para tal, sem fazer do poder de tributar do Estado, uma razão para a generalidade, vindo a gerar injustiça tributária no seio de um sociedade que deve ser igualmente justa.

A manifestação de riqueza nem sempre se correlaciona com a manifestação de capacidade contributiva. Algumas vezes, a manifestação de riqueza de certos contribuintes significam apenas valores suficientes para a sobrevivência do ser, desse modo, podendo vir a não serem tributados sem que haja ofensa ao princípio da isonomia.

Desta feita, justiça fiscal, por meio da observância da capacidade contributiva, seria a capacidade econômica somada a todos os valores de proteção do interesse público garantidos pela Constituição, seria a qualificação da capacidade econômica tendo como critério basilar todos os direitos e garantias fundamentais assegurados pela Carta Mãe de 1988 para que, desse modo, se faça possível viver em uma sociedade mais justa e igualitária.

Continuando na análise da justiça tributária inserida no ordenamento jurídico brasileiro e por conseguinte, fazendo uma correlação com o Estado Democrático de Direito, vê-se que, o sistema tributário organizado e posto como hoje está, foi possível graças a evolucão dos estudos no século XIX e, também, a evolução do direito financeiro, fatos estes ligados ao surgimento do Estado Democrático de Direito. Nesse passo, é onde surge todo o sistema de princípios que regem o direito tributário, passando este de estudo meramente econômico para estudo jurídico e consequentemente de justiça. Bem descrito nos estudos a seguir:

[...] a construção de um pensamento sistemático do direito tributário somente foi possível graças ao surgimento do Estado de Direito e às pesquisas jurídicos-administrativas havidas ao longo de todo o século XIX, ao que adicionamos a contribuição da Doutrina da Ciência das Finanças, naquilo que pode ser assimilado ao Sistema Tributário. Desse encontro exsurgem as bases do sistema de princípios, conceitos e de relações peculiares do direito tributário que conhecemos na atualidade. E foram necessários mais de cem anos de evolução e aperfeiçoamento para libertar os tributos da economia e a estes conferir um exaustivo rigor de juridicidade. (TÔRRES, 2011, p. 300)

Originariamente entendia-se o sistema tributário apenas sob os aspectos econômicos e empíricos, fato este que passou a ser mudado com o surgimento do Estado Democrático de Direito, onde se começou a analisar o sistema tributário sob o enfoque jurídico.

Um primeiro entendimento metódico sobre o sistema tributário nasceu com os estudos de Adolf Wagner onde o mesmo dizia que:

sistema tributário significa a indicação dos princípios econômicos e jurídicos a serem seguidos, os critérios de justiça tributária e o princípio da diferenciação do sistema tributário, que serviria de distincão dos tributos segundo os fatos representativos de capacidade contributiva. (1990, apud TÔRRES, 2011, p. 302)

A partir de então, tendo em vista todos os princípios existentes no ordemento jurídico o princípio da segurança jurídica foi considerado como um implícito do Estado de Direito, consagrado como expressão de certeza jurídica, podendo se afirmar que o Sistema Tributário deve ser concebido como um permanente esforço de concretização do conteúdo essencial do princípio da segurança jurídica, servindo este como mais uma maneira de se alcançar a justiça tributária.

Ao seguir na evolução dos tempos e dos estudos, já pelo meio do século XX, passou-se a perceber de forma mais contundente que o princípio da segurança jurídica e o sistema tributário organizado se encontrava diretamente ligado com o Estado Democrático de Direito, indo mais além, passando a entendê-los não somente ligados ao Estado Democrático em si, mas, também, ao princípio da garantia da legalidade tributária, de forma que as leis tributárias muito mais que trazerem em sua essência apenas os fatos e as obrigações jurídicas, devem assegurar uma tributação justa e condigna com a a realidade do Estado, especialmente devendo atenção maior aos ditames da isonomia e capacidade contributiva.

Em vista disso, percebe-se que as garantias e direitos fundamentais trazidos na Carta Maior de 1988, e o ordenamento dos sistemas tributários vieram para corrobar com o sentido de Constituição Material. A conformação das normas à simples legalidade começou a não bastar mais para fundamentar a tributação e o asseguramento da segurança jurídica. Considerando tal fato, as constituições e suas correspondentes normas garantistas passaram a ganhar mais destaque como forma de justificar todo o arcabouço tributário, ficando dessa maneira os legisladores vinculados e devendo obrigatória observância aos mandamentos constitucionais.

Assim sendo, é por meio da segurança jurídica garantidora dos princípios constitucionais que se tem comprometimento com a concretização da realização de um real Estado Democrático de Direito, tendo como fator basilar o sistema tributário ligado intimamente com os valores, garantias e direitos fundamentais defendidos na Constituição Federal, garantindo, assim, justiça funcional aos valores constitucionais tão importantes.

Um Estado Democrático de Direito e um sistema tributário justos, demonstram a capacidade que os estudos sobre o assunto tiveram de desligar a idéia de que o tributo se mostrava como desenho do Ius Imperi do Estado, em que se fundamentatava a tributação das pessoas unicamente no poder de tributar daquele sem, contudo, observar o poder-dever de concretizar os comandos garantistas trazidos em todo o bojo da Constituição, de proteção dos direitos e liberdades individuais dos contribuintes quanto a suas reais possibilidades frente as normas e obrigações tributárias.

No novo modelo de constitucionalismo dos tempos atuais, a realização e permanente otimização dos princípios constitucionais se mostra como uma das características principais, senão a principal.

Portanto, o exame e observância da segurança jurídica impõe o dever de definir seu conteúdo, alcance e efeitos do Sistema Tributário Constitucional, para que se seja possível uma definição básica de suas competências e objetivos

A partir da nascença e confirmação cada vez mais emergente do Estado Constitucional de Direito, começa a entrar em cena, fazendo como contra peso a tal soberania estatal, os limites e princípios do poder de tributar. Os primeiros, de modo objetivo, mostrando o alcance do poder estatal na sua atividade legistativa e executiva quanto aos tributos, sendo assim, tratados como real limite de obrigatória atencão e observância pelo Estado. Já os segundos, possuindo um papel mais demonstrativo de como deve ser exercido o poder de tributar, se caracterizando como um conjunto de regras a serem seguidas pelo Estado quando da criação e administração das obrigações tributárias. Assim, hoje, a tributação se liga com a relação constitucional tributária, devendo o poder de tributar ser compreendido como o somatório de todas as competências, na medida em que estas são a expressão do poder no qual a soberania se torna reflexo, segundo entendimento:

Na atualidade, como dito, a tributação projeta-se como forma de relação constitucional democrática. [...] será a partir da Constituição posta, exclusivamente, como plexo de poderes que investirão o Estado como sujeito da ordem interestatal, que se poderá falar, com legitimidade, de uma verdadeira soberania estatal como somatório de todas as competências, internamentel. (TÔRRES, p. 307 e 309).

O estudo é, de uma certa forma, espinhoso, pois trata-se de falar de um assunto  sensível no que tange a um Estado Democrático de Direito e suas garatias fundamentais de justiça, além de que, os tributos e suas obrigações, mexem com uma parte melindrosa dos indivíduos contribuintes, o bolso.

Quando se detêm para fazer uma análise mais crítica da situação atual do Brasil, logo se percebe que o problema não está na carga tributária por si só. Em sendo assim, países mais desenvolvidos da Europa teriam enfrentado maiores e mais graves dificuldades que o Brasil, uma vez que lá, como por exemplo, na Dinamarca, Suécia, França e Itália, possuem cargas tributária maiores do que a brasileira. Enquanto se tem uma carga tributária brasileira nos atuais 35%, a Dinamarca possui 45,2% e não por isso se percebe a tamanha dificuldade em se pagar impostos lá do que aqui, pelo motivo de que existe uma real e concreta redistribuição de tais valores pagos a título de impostos para toda a população, de modo que quem mais ostenta condições de pagar impostos, contribui com aqueles que menos têm, fazendo com que toda a sociedade seja beneficiada, do mais pobre ao mais rico, com saúde, eduação, segurança e outros benefícios mais garantido a todos e de ótima qualidade.

Causando uma incógnita ainda sem resolução, no sentido de que, será que o país se encontra realmente libertado daquele estado Soberano dos tempos antigos que instituía e cobrava impostos no seu ius imperium? Muito pouco se vê no que atine ao retorno dos valores dos tributos pagos no Brasil. Quem ganha ou possui mais paga menos, quem menos possui capacidade contributiva pena com os serviços públicos precários do país e assim vai criando um sentimento negativo com relação ao dever de pagar impostos, ficando este a mercê da sonegação pois não há um real e concreto retorno em bem-estar aos cidadãos. Portanto, o que mais se percebe no Brasil hoje é falta de planejamento tributário a médio e longo prazo, má gestão do dinheiro público, mínimo retorno do valor dos impostos para os serviços básicos, não taxação dos indivíduos de acordo com suas capacidades contributivas e um política tributária que almeja tão somente a entrada de dinheiro nos cofres públicos, fazendo dessa situação um círculo vicioso sem perspectiva de mudanças.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BELTRÃO, Irapuã. A política tributária para a realização do princípio da justiça. Revista SJRJ, Rio de Janeiro, v. 21, n. 39, p. 95-115, abr. 2014.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em: 16 jul. 2016.

O Globo, De 30 países, Brasil é o que oferece menor retorno dos impostos ao cidadão. Disponível em: <http://www.ibpt.com.br/noticia/2260/De-30-paises-Brasil-e-o-que-oferece-menor-retorno-dos-impostos-ao-cidadao> Acesso em: 31 jul. 2016.

RAWLS, John. Uma teoria da justiça. Trad. de Almiro Pisetta e Lenita M. R. Esteves. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

TIPKE, Klaus. Direito Tributário. 18ª ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2008. V. I.

TIPKE, Klaus: YAMASHITA, Douglas. Justiça fiscal e o princípio da capacidade contributiva. São Paulo: Malheiros, 2002.

TÔRRES, Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica: metódica da segurança jurídica do Sistema Constitucional Tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário: valores e princípios constitucionais. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.

_____. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 12ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.

VASCONCELOS, Inessa da Mota Linhares. Efetivação da justiça tributária: a constitucionalidade da dedução de despesas com medicamentos adquiridos pelo contribuinte da base de cálculo do IRPF. 2012. Tese (doutorado). Universidade de Fortaleza, Fortaleza, 2012.

VIEGAS, Viviane Nery. Justiça fiscal e igualdade tributária: a busca de um enfoque filosófico para a tensão entre poder de tributar e direito de tributar frente à modernidade tardia no Brasil. Revista Direitos Fundamentais & Democracia, Curitiba, vol. 7, n. 7, p. 66-89, jan./jun. 2010.

WAGNER, Adolf. La scienza, 1990. In: TÔRRES, Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica: metódica da segurança jurídica do Sistema Constitucional Tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 302.

Sobre o autor
Jaciel Paiva

Bacharel em Direito pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Pós graduando em Direito Tributário pela Universidade Cândido Mendes. Aprovado no XIX exame de ordem da OAB.

Informações sobre o texto

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