Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

APAC: a humanização do sistema carcerário

Exibindo página 2 de 2

3. OS BENEFÍCIOS DA HUMANIZAÇÃO DO SISTEMA CARCERÁRIO PELO MÉTODO APAC

Ante a falência do sistema prisional brasileiro, é notória a necessidade de métodos alternativos que sejam efetivamente ressocializadores, para que os presidiários tenham a oportunidade de saírem do cárcere com esperança de uma vida melhor, longe da criminalidade.

A principal proposta do método apaqueano é reduzir significativamente os índices de reincidência. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, 70% dos egressos do sistema prisional atual reincide no crime, enquanto que no método APAC, essa quantidade não ultrapassa 15%. O método APAC prima pela busca do homem que há por trás das vestes criminosas, principalmente por meio da assistência religiosa, desenvolvimento do senso de responsabilidade e oportunidade de profissionalização.

A humanização do sistema carcerário se dá principalmente através da ressignificação dos princípios tidos como essenciais ao convívio harmônico de todo ser humano, pois, para o indivíduo a margem da lei, tais princípios estão totalmente deturpados, o que reflete em seu comportamento.

Um dos benefícios do método apaqueano é atribuir ao criminoso a inteira responsabilidade de sua recuperação, e os resultados são surpreendentes. Ao comparar os índices de reincidência do sistema tradicional com os do método APAC, vislumbra-se a enorme diferença, pois a volta ao mundo do crime é extremamente baixa entre os egressos da APAC, não ultrapassando 15%, conforme dados supra. (Campos, 2011)

Os educandos, como são chamados no método APAC, estão cientes de que a pena possui caráter punitivo, e o tratamento alternativo se revela como uma oportunidade de retorno harmônico ao convívio social. (Zeferino, 2011)

O sistema APAC conta com várias particularidades, por exemplo: chamamento nominal, como forma de valorização do indivíduo; não utilização de armas; trabalho voluntário, para desenvolver espírito altruístico; ajuda mútua entre os reeducandos, para estimular a interação etc.(Teixeira, 2004)

Na APAC, o reeducando tem a oportunidade de frequentar cursos supletivos e profissionalizantes, e, além disso, conta com assistência jurídica, médica e psicológica. A participação da família contribui significativamente para o sucesso do processo de ressocialização.

Imperioso frisar que o sistema carcerário atual não cumpre, nem de longe, as funções de reeducação e ressocialização dos presos, pois se valem de métodos obsoletos e desumanizados, que simplesmente alimentam a revolta dos que se encontram no sistema, pois marginaliza pessoa que poderia ser recuperada por métodos alternativos e modernos.

Apesar do sucesso do método apaqueano, poucas são as localidades que contam com unidade da APAC . No Brasil, são 43 Apacs. Dessas, 36 estão em Minas Gerais. É preciso fomentar a implantação de unidades em número suficiente para atender a demanda, para que os condenados tenham esperança de um futuro melhor.

Assistência, responsabilidade e educação são as bases para a construção de uma sociedade mais justa, fraterna e solidária.

Desta forma, a utilização do método em análise, funciona como uma importante ferramenta para o franco declínio dos índices de reincidência delitiva, como veremos no capitulo seguinte.


4. A UTILIZAÇÃO DO MÉTODO APAC NA RECUPERAÇÃO DOS PRESOS

O modelo de ressocialização proposto pelo método APAC é, sem dúvidas, exemplo de evolução/revolução na forma de operacionalizar a recuperação do apenado. A punição deve ser aplicada, mas não se pode renegar a ressocialização, a humanização e o respeito a direitos fundamentais, que decorrem diretamente da dignidade da pessoa humana.

A sociedade, principalmente por influência de uma mídia sensacionalista, sem olhar social, acredita que a pena possui o papel único de punir, o que é um equívoco.

O método APAC é norteado por doze elementos, quais sejam: Participação da comunidade; Recuperando ajudando recuperando; O trabalho; A religião; Assistência jurídica; Assistência à saúde; Valorização humana; Família; Voluntariado; Mérito; Centro de Reintegração Social; Jornada de libertação com Cristo.

É fundamental incutir nos educandos princípios e valores indispensáveis para o retorno à sociedade. Desde a infância somos sempre educados com alguns princípios, porém, em algumas famílias, esse ensinamento se mostra deficitário. Nesse sentido, Oliveira aponta que:

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

quando pensarmos em algo voltado ao preso, devemos sempre tentar resgatar ao máximo a sua vida antes da prática delituosa, refletindo sobre o contexto social no qual esse indivíduo estava inserido, na sua base familiar, entendendo, ainda, quais os conceitos de valor, ética e moral ele conhece. Destaca-se que, em sua maioria, os presos têm esses conceitos arraigados em si; entretanto, estão distorcidos, pois, em grande parte, foram aprendidos no “mundo” do crime. (OLIVEIRA, 2000, p. 161)

No sistema carcerário tradicional, o trabalho é tido apenas como forma paliativa, pois não há um estudo prévio para distribuir tarefas segundo as habilidades de cada interno, o que resplandece a falta de individualização. Os condenados são arremessados em uma vala comum. 

Já na APAC, através do trabalho, o recuperando consegue perceber sua utilidade à sociedade, o que renova sua autoestima, e, gradualmente, arranca seu rótulo de detento ou ex-detento. Ainda são utilizados outros métodos na recuperação dos apenados, como a assistência espiritual, jurídica e à saúde, áreas muito importantes na reforma do indivíduo. (Nogueira, 2011)

A assistência à saúde, por exemplo, demonstra preocupação com a dignidade do indivíduo enquanto pessoa. É sabido que o cárcere favorece a proliferação de inúmeras doenças, que são devidamente tratadas para devolver ao indivíduo sua saúde de dignidade.

A seu turno, a assistência espiritual permite ao condenado reflita sobre sua vida e estabeleça conexão com Deus, para que o verdadeiro arrependimento se manifeste. Por meio da assistência jurídica, o interno da APAC acompanha e soluciona as suas demandas e pendências, o que tranquiliza a pessoa e conscientiza-o de que a justiça está cumprindo seu papel. (Teixeira, 2004)

Na APAC, os reeducandos promovem a organização e limpeza do ambiente, bem como preparam as refeições e promovem a segurança do local de recuperação. Observe:

No modelo apaqueano, a disciplina assim como o próprio método são inovadores, haja vista que a disciplina está aliada à humanização, sendo compartilhada com os recuperandos a responsabilidade de manter a ordem nas dependências de cada regime de cumprimento de pena da APAC. (OLIVEIRA, 2000, p. 158.)

Assim, a base para a recuperação dos condenados no método apaqueano é a valorização do “eu” existente em cada um, o que provoca aumento da autoestima e sentimento de utilidade social, que são imprescindíveis para o êxito ressocializadora. A partir de então, o reeducando passará a se sentir parte importante da sociedade, o que desestimula a volta para o mundo da criminalidade, o que traduz o sucesso do método APAC.

Portanto, o método APAC apresenta-se como órgão auxiliar dos Poderes Judiciário e Executivo, respectivamente, na execução penal e na administração de unidades de custódia destinadas a presos já condenados pela Justiça. Provendo desta forma, “a Justiça na execução da pena, recuperando o preso, protegendo a sociedade, socorrendo as vítimas e promovendo a justiça”. (Cristiane, 2011)


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 O presente trabalho discorreu sobre o Sistema prisional brasileiro, apontando os motivos para sua atual crise. Abordou ainda, os fundamentos e princípios do método APAC,  acerca da recuperação do apenado, através de um paralelo entre Sistema Penitenciário Convencional X  Método APAC.

Nota-se que o sistema prisional convencional não consegue desempenhar a contento o seu papel, pois o Estado não cumpre as disposições da Lei de Execução Penal (LEP), o que compromete, sobremaneira, as chances de recuperação do condenado.

Diante dos problemas do sistema prisional tradicional, surge a Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (APAC), com uma proposta diferenciada, que se vale de ferramentas humanizadoras e eficazes na recuperação e ressocialização do condenado. O método APAC, conforme visto, se funda em 12 diretrizes que são essenciais no processo de reeducação social.

Assim, a APAC segue atuante há mais de quarenta anos, e cumpre o seu papel na tutela dos direitos dos condenados, o que gera satisfatórios índices de recuperação, o que contribui para a redução da reincidência.

Portanto, conclui-se que o atual sistema penitenciário brasileiro apresenta graves deficiências, o que repercute negativamente na recuperação do condenado – superlotação, ausência de trabalho adequado e suficiência, não individualização da pena, insalubridade da unidade celular individual etc., ao passo que a APAC se apresenta como alternativa moderna e viável na recuperação dos condenados, com atuação conjunta com o Poder Judiciário no mister recuperatório.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. São Paulo:

BRASI, Lei nº 7210 de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Brasília: Congresso Nacional, 1984.

CAMPOS, Raquel de Fátima Silva. Apac: Alternativa na Execução Penal. Monografia apresentada à Faculdade Presidente Antônio Carlos,2011. Diponível em www.unipac.br/site/bb/tcc/tcc-84b6940eb39cc638606113097b06a440.pdf . Acesso dia 23/04/16 às 18:30.

GRECO, Rogério. Direitos Humanos, Sistema Prisional e Alternativa à Privação de Liberdade. São Paulo: Saraiva, 2011.

JUNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição FederalComentada e Legislação Constitucional. São Paulo, 2006.

KUHENE, Maurício. Lei de Execução Penal Anotada. 11. ed. rev. e atual. Curitiba: Jaruá , 2013.

ROLIM. Marcos. Prisão e ideologia limites e possibilidade para a reforma prisional no Brasil. Revista de Estudos Criminais nº12, Rio Grande do Sul, 2003.

MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal.2 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

Saraiva, 1988.

MINAS GERAIS, Tribunal de Justiça, Apac: Programa Novos Rumos. Disponível em: http://www.tjmg.jus.br/portal/acoes-e-programas/novos-rumos/apac/apac-apresentacao/. Acesso dia: 24/04/16 às 23:30.

MIRABETE, Júlio Fabrini. Execução Penal: comentários à Lei n° 7.210, de 11-7-84. 6.ed. São Paulo: Atlas, 1996.

NOGUEIRA, Cristiane Santos de Souza. Execução Penal – APAC. In: MINAS GERAIS, Tribunal de Justiça. A execução penal à luz do método APAC. Organizadora: Desembargadora Jane Ribeiro Silva. Belo Horizonte: Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 2011.

UNIMONTES. Resolução nº 182 – Cepex/2008 – aprova manual para elaboração e normatização de trabalhos acadêmicos para os cursos de graduação da Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes – Trabalho de Conclusão de Curso – TCC. Acesso em: 14 de março de 2016, às: 16h00min.

TEIXERA, Rodrigo Moraes. Sistema Penitenciário: Aspectos Positivos e Negativos. Monografia apresentada à Faculdade Integradas Antônio Eufrásio de Toledo, 2004. Disponível           em intertemas.unitoledo.br/revista/index.php/Juridica/article/viewFile/254/248. Acesso dia: 24/04/16 às 20:00.

ZEFERINO, Genilson Ribeiro. Execução Penal – APAC. In: MINAS GERAIS, Tribunal de Justiça. A execução penal à luz do método APAC. Organizadora: Desembargadora Jane Ribeiro Silva. Belo Horizonte: Tribunal de Justiça do Estado de


Notas

[5] Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.

[6]  Art. 4º O Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de execução da pena e da medida de segurança.

[7] Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade.

[8]Art. 11. A assistência será:

I – material;

II - à saúde;

III - jurídica;

IV - educacional;

V - social;

VI - religiosa.

[9]Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado.

§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:

        a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;

        b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;

        c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.

[10] FALCON, Romeu. Sistema Prisional: Reinserção Social?,p.109

Sobre os autores
Cynara Silde Mesquita Veloso

Doutora em Direito Processual pela PUC Minas, Mestre em Ciências Jurídico-políticas pela UFSC, Professora do Curso de Direito da UNIMONTES. Professora e Coordenadora do Curso de Direito das FIPMoc.

Willian Prates

Acadêmico do curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES

Isa Nunes e Evaristo

Acadêmica do curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES

América Gabriel O. Carvalho Lauro

Acadêmica do curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES

Eustáquio Tadeu Nogueira

Bacharelando em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!