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O uso da tecnologia da informação no novo Código de Processo Civil

Discussões e panorama atual acerca das novas tecnologias frente aos processos civis.

SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 Algumas Deficiências do Antigo Código; 2.1 Pontos que precisam de ajuste; 2.2 As razões pelas quais precisam ser ajustados; 3 Propostas de Modernização no Novo Código; 3.1 Introdução; 3.2 Características Gerais; 4 Modernização X Custos; 4.1Introdução; 4.2 Efeitos; 4.3Uso do papel nos processos; 5 Considerações Finais

RESUMO:A elaboração de um novo código de processo civil se faz necessário não apenas para o acompanhamento das mudanças sociais que ocorreram durante os quarenta e um anos de vigência do antigo, mas, também, para desfrutar da evolução dos meios pelos quais se conduzem esse instrumento de acesso à justiça. Entretanto, o projeto do novo código deixa descoberto algumas questões que poderiam ser mais bem trabalhadas e aproveitadas pela tecnologia, e que poderiam ajuda-lo a cumprir com seu principal objetivo de existência que é promover acesso à justiça e dar celeridade àqueles que já a acessaram. Este trabalho propõe uma apresentação de algumas destas questões, que a nosso entendimento foram pouco aproveitadas, como é o caso do paradigma do papel, ou seja, a existência, importância e o uso do papel numa sociedade que, gradativamente, vem deixando seu uso, seja por uma consciência ecológica, seja pelo aproveitamento do espaço, segurança e agilidade que os meios tecnológicos proporcionam atualmente.


1 INTRODUÇÃO

A discussão sobre o Novo Código de Processo Civil vai para além das normas que regem os atos das partes na busca pela jurisdição e o acesso à justiça e, embora o projeto de lei aponte para o futuro, percebe-se a resistência de alguns problemas do antigo código.

Não é possível pensar a sociedade sem o uso da tecnologia, seja para as relações sociais, seja para as profissionais. Os segmentos da sociedade que cedo lidaram com esse avanço tecnológico desempenharam mais eficientemente o seu papel e avançaram em resultado e agilidade no desenvolvimento das suas funções.

Falar de Novo Código de Processo Civil e ignorar o avanço tecnológico que pode ajudar a justiça a desempenhar melhor a sua função e responder eficientemente aos princípios que norteiam o processo como Princípio da Celeridade Processual, Princípio da Duração Razoável do Processo, Princípio do Devido Processo Legal, Ciência dos Atos Processuais entre outros, é desfazer o discurso da necessidade de reforma do antigo código.

O Projeto do Novo Código de Processo Civil retrocede quando não enfrenta o paradigma do papel de forma adequada, deixando a cargo da evolução paulatina nos diversos segmentos da justiça a decisão sobre modernizar ou não seus tribunais. Não decidir explicitamente pelo uso da tecnologia é permitir que fique a critério dos operadores usá-la, e como a tecnologia evolui mais rapidamente que o ser humano, alguns operadores ainda resistem a ela e consequentemente atrasam a evolução do processo civil.

Entretanto, optar pelo uso integral da tecnologia sem permitir que os interessados se adaptem a ela, também se configuraria em um retrocesso e não contribuiria para a principal função do processo civil que é instrumentalizar o acesso à justiça. Mas, não discutir essa transformação nos tempos de mudança que assinala o novo código é pior que optar por qualquer das alternativas anteriores. Cabe-nos visualizar onde, no processo civil, esse embate acontece e suas consequências na prática.


2 ALGUMAS DEFICIÊNCIAS DO ANTIGO CÓDIGO

2.1 Pontos que precisam de ajuste

Ao se discutir a criação de um novo código, inevitavelmente denota-se a insatisfação, mesmo que pontual, do antigo; dentre elas podemos perceber que a preocupação dos legisladores perpassa pelo tempo que se leva para conceder ao jurisdicionado a tutela do estado na resolução do seu conflito e a efetiva resposta a essa solicitação, e os instrumentos que possibilitem decisões mais adequadas por parte dos julgadores, reduzindo algumas complexidades desnecessárias.

Dentre essas preocupações podemos citar a razoável duração do processo, que é uma preocupação do legislador, reafirmada desde a emenda constitucional nº 45/2004, que alterou o inciso LXXVIII do artigo 5º da CR/88, que afirma que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantem a celeridade de sua tramitação”. Outra inquietação do legislador demonstrada na alteração acima citada é para com os meios de acesso à justiça, justificada pela tecnologia empregada em todos os setores da sociedade e que facilitam a vida desta, e que devem também contribuir para a jurisdição. 

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2.2 As razões pelas quais precisam ser ajustados

É evidente, então, que os legisladores buscam a celeridade processual que, como princípio basilar dessa matéria, não vem tendo uma resposta satisfatória. Como diz Antônio do Passo Cabral (?. p. 101):

"A rapidez da mudança no direito material e o dinamismo da vida contemporânea não tardaram a apresentar um novo problema ao Estado: a sociedade passou a exigir urgência na resposta estatal, o que evidentemente viria a transbordar no processo, pois muitos dos seus mecanismos para a solução de controvérsias ainda possuem formato milenar, em descompasso com as necessidades de provimentos céleres e respostas imediatas."

Conforme o mesmo autor a demora da solução do litígio impões a todos os litigantes um prejuízo, onde as partes perdem simultaneamente em razão do prolongamento injustificado da lide. “trata-se de um dano que não decorre da derrota em relação à pretensão deduzida, mas um “dano marginal”, na feliz expressão que foi popularizada na doutrina italiana por Enrico Finzi” (ano? p. 102). Prossegue o autor revelando que este dano seria resultado de deficiências na tramitação dos processos.

Podemos perceber que, entre outras coisas, o legislador quer efetivar princípios que proporcionam ao jurisdicionado rapidez na solução dos conflitos, não apenas pelos dispositivos modificados, mas pelos meios a que esses dispositivos transitarão, além de conceder maior segurança nesse trânsito.


3 PROPOSTAS DE MODERNIZAÇÃO NO NOVO CÓDIGO

3.1 Introdução

As propostas de modernização do novo código são reflexo de ondas de modernidade que estão acontecendo ao longo do tempo. Primeiro com a Lei 9.800, de 1999, que autorizou a transmissão de peças processuais por fax ou similar.  Em seguida a Emenda Constitucional 45, de 2004, que promoveu alteração em vinte e cinco artigos da Constituição e acrescentou quatro novos, abrindo, dessa forma, espaço para a modernização do Judiciário. Depois vieram outras alterações legais:

A Lei 11.280/2006, parágrafo único do artigo 154 do Código de Processo Civil, autorizou os Tribunais a "disciplinar a prática e a comunicação oficial dos seus atos processuais por meios eletrônicos,..."; a Lei 11.341, de 2006, parágrafo único do artigo 541 do CPC, passou a aceitar a mídia eletrônica ou a internet como repositório de jurisprudência para comprovar divergência em recursos extraordinários e especiais; a Lei 11.382, de 2006, artigo 655-A do CPC, autorizou o juiz a requisitar "à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre existência de ativos em nome do executado...".

Depois veio a Lei 11.419, 2006, modificando o CPC, para autorizar a tramitação do processo sem o uso do papel e promovendo verdadeira revolução no sistema judiciário brasileiro. Essa lei contribui para evitar as petições longas, acaba com os arquivos, facilita a consulta de informações e democratiza o acesso à Justiça. Preocupou-se até mesmo com eventuais dificuldades dos advogados e dos jurisdicionados, quando condicionou a adoção compulsória do sistema à disponibilização gratuita de "equipamentos de digitalização e de acesso à rede mundial de computadores à disposição dos interessados..."[1]

Entretanto, apesar de todo esse empenho por parte dos legisladores em editar dispositivos que empurram o judiciário para o futuro tecnológico, o uso desses recursos disponíveis não são usados na proporção que favoreça aos princípios da celeridade processual. Isto por pelo menos dois motivos, embora existam outros: o primeiro é em consequência da resistência dos operadores do direito em todas as suas camadas e o segundo são os custos, que trataremos nos tópicos seguintes. Em relação à resistência disse Fábio Ulhoa (2007. p.?):

Em 1929, a Câmara Criminal do Tribunal da Relação de Minas Gerais anulou uma sentença judicial porque não tinha sido escrita pelo juiz de próprio punho. A decisão havia sido datilografada! O tribunal considerou, naquela oportunidade, que o uso da máquina de escrever era incompatível com um dos valores basilares do processo penal, o do sigilo das decisões antes da publicação.

No fim da década de 1980, várias sentenças foram anuladas porque os juízes haviam usado o microcomputador. Os tribunais receavam que o novo equipamento, na medida em que permitia a reprodução de sentenças “em série”, pudesse prejudicar a devida atenção do magistrado para as particularidades de cada caso.

3.2 Características Gerais

Apesar da aparente resistência, o novo CPC não deixa de abordar este tema, pelo contrário, veremos a seguir algumas colocações que o legislador intenta fazer uso das tecnologias de comunicação, processamento e armazenamento e transmissão de dados e internet.

A proposta do art. 236, que trata das disposições gerais a respeito da prática dos atos processuais contém, no § 3º, disposição no sentido de que atos processuais poderão ser realizados por videoconferência "ou por outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real".[2]

Isto significa dizer que atos que antes levariam semanas ou meses para se cumprirem com esse sistema não passarão de dias, pois as idas e vindas das cartas precatórias que viabilizam a oitiva de testemunhas não serão mais necessárias, podendo o magistrado arguir e ouvir a testemunha mesmo residindo em comarca diferente.

 O projeto do novo CPC, no § 1º do art. 460 prevê esse dispositivo: "A oitiva de testemunha que residir em comarca, seção ou subseção judiciária diversa daquela onde tramita o processo poderá ser realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens tem tempo real, o que poderá ocorrer, inclusive, durante a audiência de instrução e julgamento".

O mesmo método poderá ser utilizado para a tomada de depoimento pessoal da parte, nos termos do que prevê o § 3º do art. 392 do projeto.[3]


4 MODERNIZAÇÃO X CUSTOS

4.1 Introdução

Apesar de algumas alterações no atual CPC já apontarem para o uso da tecnologia, por exemplo, a Lei 11.280/2006, parágrafo único do artigo 154 do Código de Processo Civil, que autorizou os Tribunais a "Os tribunais, no âmbito da respectiva jurisdição, poderão disciplinar a prática e a comunicação oficial dos atos processuais por meios eletrônicos, atendidos os requisitos de autenticidade, integridade, validade jurídica e interoperabilidade da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP - Brasil." e a Lei 11.341, de 2006, parágrafo único do artigo 541 do CPC, “Quando o recurso fundar-se em dissídio jurisprudencial, o recorrente fará a prova da divergência mediante certidão, cópia autenticada ou pela citação do repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que tiver sido publicada a decisão divergente, ou ainda pela reprodução de julgado disponível na Internet, com indicação da respectiva fonte, mencionando, em qualquer caso, as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados.”  Aceitando a mídia eletrônica ou a internet como repositório de jurisprudência para comprovar divergência em recursos extraordinários e especiais.

Porém, o uso não tem sido maior por falta de equipamentos e infraestrutura nos tribunais e a dificuldade de acesso dos jurisdicionados residentes no interior do país e a falta de recursos desses mesmos tribunais para equipá-los ou capacitar os servidores para operar os sistemas que dão suporte a essa facilidade. Existe ainda a escassez de uma rede eficiente e com capacidade de transmissão de dados que permita, além de efetivar a transmissão dos dados de uma comarca para outra, a segurança de sua disponibilidade a qualquer tempo de necessidade.

4.2 Efeitos

Embora com previsão no projeto do novo CPC, o uso dessas tecnologias não foi bem abordado, pois o legislador prevê seu uso, mas não enfrenta todos os problemas que poderão ocorrer. Seus benefícios são indiscutíveis, como a extinção do chamado tempo morto do processo, quando os autos ficam aguardando a prática de determinados atos físicos, como a autuação da petição inicial ou a juntada de documentos, tornando a prestação jurisdicional mais célere e eficiente, mas não contempla os custos ou recursos necessários para a implantação de um sistema de processamento de dados em cada comarca, deixando a cargo de cada uma se equipar, desconsiderando a realidade econômica variada nas diversas cidades da federação onde dispõe a prestação jurisdicional.

4.3 Uso do papel nos processos

Por fim, veio a Lei 11.419, 2006, modificando o CPC, para autorizar a tramitação do processo sem o uso do papel e promovendo verdadeira revolução no sistema judiciário brasileiro. Essa lei contribui para evitar as petições longas, acaba com os arquivos, facilita a consulta de informações e democratiza o acesso à Justiça. Entretanto, o projeto não aborda de frente o paradigma do papel, pois menciona o uso do processo eletrônico, mas não deixa de abordar situações em que o projeto permanece com a visão de autos em papel, a exemplo disso cita Roque et al. (2013, p. 80):

a) A previsão apenas de agravo de instrumento, ou seja, com a necessidade de extração de cópias e formação do instrumento a ser distribuído no tribunal (art.1030);

b) Competir ao escrivão a “guarda dos autos” que em regra devem “permanecer em cartório” (art. 152, IV e V) e ser dever dos patronos” restituir os autos” (art. 234);

c) Ser possível às partes requerer “recibo de petições, arrazoados, papéis e documentos que entregarem em cartório” (art. 201), bem como ser vedado lançar “cotas marginais ou interlineares, as quais o juiz mandará riscar” (art. 202);

d) Menção a “autos apartados” ou “em apenso” (arts. 69, II, 545, 638, 657, § 1º, 700, 717, 930, § 1º, entre outros); e

e) Ausência de previsão de sustentação oral por videoconferência (art. 950), ainda que haja menção, genérica, a ato processual por tal meio, como já exposto (art. 236, §3º).

Percebe-se que o novo CPC aponta para o futuro com um pé no passado, tímido e receoso de abandonar velhas práticas em nome da segurança jurídica, sem contemplar que o futuro tecnológico também fornece ferramentas mais que comprovadamente seguras. O uso do papel é um forte exemplo disso, pois enquanto se busca celeridade, eficiência, modernidade e abrangência da prestação jurisdicional, seu uso se confronta ao oposto de tudo isso.


4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percebe-se, com isso, que em vista da realidade econômica, social e cultural do país, o trâmite do processo predominantemente por meio eletrônico está longe de acontecer, pois o mesmo projeto que intenciona modernizar o processo e o acesso à justiça, não abre mão do uso de meios ultrapassados para se locomover. Os usuários deste código também resistem ao seu uso pelo meio tecnológico, não fazendo o investimento necessário para a modernização dessa ferramenta, isto aos que podem fazê-lo, pois a maior parte da jurisdição não poderá, a curto ou médio prazo, equipar suas comarcas com todo o aparato que necessitam para seu funcionamento, especialmente o fator humano.

Existem ainda os fatores externos, que se não impedem, atrapalham o aprimoramento do novo CPC com a tecnologia, como uma rede de transmissão segura, rápida e abrangente suficiente para contemplar todas as comarcas existentes.

Finalmente perceberemos que o novo CPC nasce ultrapassado com respeito ao uso do papel e outros mecanismos que insistem em permanecer, e também lúdico, pela falta de estrutura que suporte toda sua demanda por tecnologia.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Juarez de Oliveira. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. 168 p. (Série Legislação Brasileira)

BUENO, Cassio Scarpinella. Projetos do novo código de processo civil – comparados e anotados. São Paulo: Saraiva 2014.

COELHO, Fábio Ulhoa.  Resistência Crônica. Judiciário Brasileiro Ainda Reluta a Avanços Tecnológicos. Consultor Jurídico. Setembro de 2007. Disponível em:

http://www.conjur.com.br/2007-set-08/judiciario_ainda_reluta_avancos_tecnologicos

FREIRE, Alexandre et. all. (Org.).  Novas tendências do Processo Civil.  Estudos sobre o Projeto do Novo Código de Processo Civil. Salvador: JusPodivm, 2013.

FUX, Luís et all. (Coord.). O novo processo civil brasileiro. Direito em Expectativa (reflexões acerca do Projeto do novo Código de Processo Civil). Rio de Janeiro: Forense, 2011.

LEI No 5.869, DE 11 DE JANEIRO DE 1973. Código de Processo Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm

WAMBIER, Luiz Rodrigues A tecnologia, essa possível aliada da efetividade do Processo Civil. Disponível em: http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI186022,61044-A+tecnologia+essa+possivel+aliada+da+efetividade+do+Processo+Civil


Notas

[1] Novo Cpc Também Precisa Se Adaptar Às Tecnologias. Antonio Pessoa Cardoso. 2012.

[2] A tecnologia, essa possível aliada da efetividade do Processo Civil. Luiz Rodrigues Wambier. p.?.

[3] Idem.

Sobre os autores
Shieldes Melo Frazão

Acadêmico do 10º Período de Direito.

Informações sobre o texto

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