Estudar a evolução histórica do constitucionalismo, certamente, facilita a compreensão da evolução dos direitos fundamentais, tornando possível, inclusive, dividi-los em diferentes gerações, a depender do contexto em que surgiram, e do “valor” ao qual estão ligados.
Sobretudo por questões didáticas, o constitucionalismo é, comumente, subdivido em três diferentes fases, quais sejam: constitucionalismo antigo, constitucionalismo moderno, clássico ou social e constitucionalismo contemporâneo.
No que tange ao constitucionalismo antigo, que cuida das experiências constitucionais do Estado hebreu, Grécia, Roma e, até mesmo, da Inglaterra[1], ainda que possua significativa relevância, especificamente para o presente artigo, que tem enfoque nas gerações dos direitos fundamentais, acaba permanecendo em segundo plano.
A ideia de gerações dos direitos fundamentais, indubitavelmente, faz mais sentido quando se analisa o constitucionalismo a partir do século XVIII, momento marcado pelas Revoluções americana e francesa, que levaram, respectivamente, à Constituição norte-americana de 1787 e à Constituição francesa de 1791.
Referidos textos constitucionais, que marcam o início do constitucionalismo clássico e são influenciados por pensadores como Rousseau, Locke, Montesquieu e Thomas Jefferson, tinham como valor central a liberdade, o que é perfeitamente compreensível, diante do contexto em que surgiram.
De um modo geral, só o que buscavam os revolucionários era pôr fim às arbitrariedades do regime absolutista, isto é, limitar o Estado e garantir com que os direitos fossem, efetivamente, respeitados pelo próprio Estado. Pode-se afirmar, em síntese, que as Constituições clássica ou liberais, buscavam, acima de tudo, substituir os Estados absolutistas, por Estados de direito.
É justamente nesse ponto que, segundo Karel Vasak – primeiro jurista a utilizar o termo “gerações”[2] –, surgem os direitos fundamentais de primeira geração, que podem ser subdivididos em direitos civis (direitos de defesa ou negativos) – garantir a igualdade formal – e em direitos políticos (direitos de participação) – permitir o indivíduo a participar da vida política do Estado (votar e ser votado)[3].
Após o fim da Primeira Guerra Mundial (1918), o que se constatou, contudo, é que aqueles direitos fundamentais de primeira geração, já não eram mais suficientes. O liberalismo já não conseguia dar resposta aos problemas enfrentados no pós-guerra, marcado, sobretudo, por crises econômicas. Verificou-se, a bem da verdade, que o liberalismo só é viável, quando as pessoas estão, de fato, em um certo nível de igualdade.
É nesse momento que surge um novo modelo de Constituição, marcando o início do constitucionalismo social e inaugurando a ideia de Estado social ou Estado do bem-estar social, que abandona a postura abstencionista do Estado liberal, transformando-se em um verdadeiro “prestador de serviços”.
Destacam-se, aqui, a Constituição mexicana de 1917, bem como a Constituição de Weimar (1919)[4], que consagraram direitos sociais, econômicos e culturais[5] (direitos prestacionais ou positivos), com a missão de estabelecer uma igualdade material, proporcionar um equilíbrio, uma superação da dicotomia entre igualdade política e desigualdade social. São, justamente, esses direitos – típicos das Constituições sociais –, que compõem a segunda geração dos direitos fundamentais.
Àquela altura, já se verificava, portanto, textos constitucionais com direitos fundamentais de primeira e de segunda geração. Todavia, após a Segunda Grande Guerra (1945), constatou-se que faltava mais, e é, nesse contexto, que se inaugura, por fim, o constitucionalismo contemporâneo – identificado, por alguns doutrinadores, como neoconstitucionalismo – e que surgem os direitos fundamentais de terceira geração.
Pode-se afirmar que a experiência nazista – somada a toda a selvageria da Segunda Guerra Mundial[6] –, trouxe os “direitos transindividuais, isto é, direitos que vão além dos interesses do indivíduo; pois são concernentes à proteção do gênero humano, com altíssimo teor de humanismo e universalidade”[7]. A dignidade da pessoa humana passa a ser o núcleo axiológico dos textos constitucionais. Conforme ensina o Ministro Luís Roberto Barroso, estão na terceira geração os direitos coletivos e difusos[8].
Certo é que o constitucionalismo contemporâneo, que tem como “marco inicial” o fim da Segunda Guerra Mundial, perdura até os dias de hoje. Não se pode olvidar, contudo, que, para muitos doutrinadores, a exemplo do professor Pedro Lenza, os direitos fundamentais já chegam, até mesmo, a uma quinta geração[9], o que foge da ideia do jurista Karel Vasak, que estabeleceu apenas três gerações, associando o surgimento dos direitos fundamentais, nas Constituições, ao lema da Revolução francesa (“liberdade, igualdade e fraternidade”)[10].
Notas
[1] NOVELINO, Marcelo. Manual direito constitucional – Volume único. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. ISBN. 978-85-309-5495-6.
[2] DIÓGENES JÚNIOR, José Eliaci Nogueira. Gerações ou dimensões dos direitos fundamentais? Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11750>. Acesso em: nov. 2016.
[3] BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 212 e 213.
[4] LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 1.143.
[5] BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 213.
[6] NOVELINO, Marcelo. Manual direito constitucional – Volume único. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. ISBN. 978-85-309-5495-6.
[7] LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 1.144.
[8] BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 213.
[9] LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 1.142 a 1.145.
[10] DIÓGENES JÚNIOR, José Eliaci Nogueira. Gerações ou dimensões dos direitos fundamentais? Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11750>. Acesso em: nov. 2016.