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A íntima convicção dos jurados no tribunal do júri

O princípio da íntima convicção pode ser conceituado como a oportunidade do julgador decidir segundo suas próprias convicções, decisão esta que não necessita de fundamentação ou até mesmo amparo legal.

INTRODUÇÃO

O tema será delimitado por uma breve definição da origem até o procedimento atual tribunal do júri, previsto no artigo 5°, XXXVIII da Constituição Federal de 1988.

Logo em seguida, serão trazidas as garantias processuais aplicáveis ao tribunal do júri e adentrando aos princípios que regem o mesmo.

Após, iremos falar da íntima convicção dos jurados, princípio este que vigora exclusivamente no júri, garantindo ao conselho de sentença julgar conforme sua intima convicção, sem necessariamente esta vinculado ao que foi exposto em plenário.

A princípio, iremos expor o papel da mídia sensacionalista na formação da íntima convicção dos jurados, deixando duvidas a respeito da real imparcialidade do conselho de sentença, até onde os meios de comunicação podem influencia tais decisões.

O trabalho será encerrado, com o resultado de uma pesquisa, aplicada a possíveis jurados, onde serão questionados a respeito da presente influência da mídia na íntima convicção dos jurados.


A ÍNTIMA CONVICÇÃO DOS JURADOS

O princípio da íntima convicção pode ser conceituado como a oportunidade do julgador decidir segundo suas próprias convicções, decisão esta que não necessita de fundamentação ou até mesmo amparo legal.

Desta maneira, a íntima convicção é uma exceção dentro do nosso ordenamento, podendo ser aplicável apenas nos casos que encaminhados ao julgamento perante o plenário do júri:

De acordo com esse sistema, o Juiz não estava obrigado a exteriorizar as razões que o levaram a proferir a sentença; atribuía às provas o valor que em quisesse e entendesse, podendo, até, valer-se do conhecimento extra-autos, mesmo sem nenhuma prova nos autos; decidia de acordo com a sua íntima convicção, sem se deixar dominar pelo que havia no processo. (TOURINHO FILHO, 2010, p.522).

Entretanto, interpreta-se que o sistema da íntima convicção é baseado no processo inquisitivo, estabelecido pelo absolutismo dos julgadores, visto ser a decisão do plenário soberana.

No período imperial, com as invasões bárbaras e forte influência do direito germânico, a atividade probatória no processo penal passou a incorporar elementos religiosos e irracionais, estranhos ao processo como as ordálias (urtuil) de Deus, entre elas os duelos judiciários, os juramentos, a prova do ferro em brasa etc.

Por meio das ordálias, acreditava-se na intervenção divina para se estabelecer a verdade nos julgamentos. Assim, por exemplo, se o acuado atravessasse uma fogueira pisando sobre as brasas e saísse ileso, era sinal inequívoco da sua inocência. As ordálias, bem como a tortura, duramente combatidas pela igreja católica, somente seriam abolidas com o Concílio de Latrão em 1215.

Nesse sistema das provas irracionais, o julgador formava intimamente a sua convicção acerca dos fatos e não tinha a necessidade de declinar os fundamentos de suas decisões. Nascia aí o sistema da convicção íntima do juiz, com todo seu caráter místico, autoritário e inteiramente livre de qualquer controle racional. É natural que esse sistema se prova se compatibilizasse por inteiro com o tipo de processo inquisitivo caracterizado pelo sigilo das apurações e pelo absolutismo do juiz. (MACHADO, 2009, p.353).

Malatesta (1996, p.51) defende que o convencimento deve ser racional, pois, as preocupações e prevenções subjetivas das pessoas podem pesar de forma fútil e ser consideradas suficientes para seu convencimento.

O convencimento deve ser racionado, não determinando de que natureza devem ser as razões que legitimam o convencimento. E muitas vezes, as preocupações e prevenções subjetivas da pessoa dão um tal peso a motivos fúteis, que os fazem considerar-se como razões suficientes. Ora, é importante para a noção do convencimento judicial acrescentar que as razões que o determinaram devem ser de natureza tal que criem a convicção em qualquer outra pessoa razoável, a quem sejam expostas.

O convencimento não deve ser, em outros termos, fundado em apreciação subjetivas; deve ser tal que os fato se provas submetidos a seu juízo, se o fossem, desinteressados ao de qualquer outro cidadão razoável, deveriam produzir, também neste, a mesma convicção que naquele. Este requisito, para mim importantíssimo, é que eu o chamo de sociabilidade do convencimento. (MALATESTA, 1996, p.51).

3.1. A formação de opinião pública por meio da mídia sensacionalista

A opinião pública, o que é emitido pela comunicação coletiva, capitado pela sociedade, no todo ou em parte, divulgado de forma escrita ou falada, mas que possui um amplo e vistoso campo de abrangência, pois consegue atingir uma coletividade indeterminada de pessoas, nos mais diversos países do mundo.

Segundo Tupã Gomes Corrêa (apud TEIXEIRA, 2011, p.35):

A opinião pública é parte do processo de comunicação, porquanto pode ser entendida como um dos efeitos ao nível da comunicação coletiva pressupondo para tanto a existência de um estímulo, mensagem ou conteúdo de significados, produzido ou emitido por alguém, e captado pelo todo ou parte da sociedade.

Sendo assim, os profissionais da área de comunicação “são determinantes para o processo de formação da opinião pública, pois grande parte do conhecimento advém dos noticiários, jornais, revistas”. (TEIXEIRA, 2011, p.35)

Em busca de estimular o consumo de jornais e alcançar grande número de audiência televisiva, a mídia sensacionalista usa da exposição exagerada de alguns acontecimentos, para assim, atrair a curiosidade dos telespectadores.

A grande arma da TV é o fato de mostrar o acontecimento, muitas vezes em tempo real, diferentemente de outros meios de massa como o jornal e o rádio. Isto faz com que a imagem tenha um forte poder emocional e apelativo, pois traz as pessoas para “dentro” da notícia. As lentes de aproximação ou zoom da câmara simulam aquilo que o observador humano faz ao processar a imagem dos olhos: presta atenção no detalhe, sem perda total da visão do conjunto. Esse é o diferencial: o impacto e as sensações que as imagens podem causar ao público. Assim, no telejornalismo, é comum a imagem tornar-se a própria notícia (TEIXEIRA, 2011, p.37).

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É notório o deslumbramento causado pela mídia, sobre os telespectadores, basta observar o grande número de audiência televisiva dos programas que relatam o cotidiano humano, como os reality shows, que visa altíssimos número de participação popular.

É indiscutível o fascínio que as mensagens televisivas exercem sobre as pessoas. Pode-se dizer que o espetáculo midiático tornou-se uma válvula de escape para o telespectador, que fornece, cada vez mais, audiência de programas que relatam o cotidiano humano, como os reality shows. Por exemplo, como explicar os mais de 2 bilhões e 500 milhões de votos nas 10 edições do Big Brother Brasil? Os números da participação popular são alarmantes e demonstram que o público não somente alimenta esse tipo de espetáculo, mas gosta da interação proporcionada pela mídia. (TEIXEIRA, 2011, p. 39).

Atualmente é visível a competitividade do mundo dos noticiários, devido a isto, é crucial atrair telespectadores através de reportagens chamativas, entretanto, muitas vezes sem buscar a fonte e verificar a veracidade.

No anseio de captar a atenção do grande público, os noticiários carregam as ferramentas da dramatização para as redações. Assim, é comum vermos a “reconstituição” de crimes, recheada de detalhes gráficos e informações precisas de técnicos e autoridades policiais. Tudo para tornar a notícia mais atrativa para as pessoas. (TEIXEIRA, 2011, p.40)

Por meio de tantos recursos utilizados para fazer da notícia algo grandioso, TEIXEIRA (2011, p.50) observa:

Portanto, partindo do pressuposto que o telejornalismo tem natureza espetacular, a transformação de notícias em espetáculos midiáticos é mais do que uma tendência: é a consolidação da existência da TV. Assim, é inegável que a exibição de shows em detrimento da informação asseguram a audiência, porém o jornalismo corre o risco de perder o interesse público, uma das razões de sua origem.

É valido salientar que o comportamento do receptor da notícia, diante da multidão, se perde em detrimento do homogêneo, de acordo com TEIXEIRA:

As qualidades do caráter individual do homem são apagadas dentro de uma multidão e o heterogêneo se perde em detrimento do homogêneo. Portanto, aquelas decisões que necessitam de elevada aptidão do indivíduo não devem ser tomadas pela multidão. (Le bon, apud TEIXEIRA, 2011, p.51)

Teixeira procura explicar que o que leva as pessoas a compor uma multidão é a sensação de invencibilidade, por estar em um grupo, deste modo, agindo por instinto e não de forma racional.

Um dos motivos que fazem a pessoa integrar uma multidão é o sentimento de invencibilidade que o grupo oferece. Assim, a ação se dá pelos instintos e não pela racionabilidade, características muito visíveis na multidão anônima (que não representa classe ou instituição). Nesse tipo de classificação, os sentimentos primitivos tornam-se latentes e incontroláveis, desaparecendo do indivíduo qualquer senso de responsabilidade. (TEIXEIRA, 2011, p.52).

Não obstante, Teixeira (2011) associa o comportamento dos jurados com o da multidão, certificando-se que as pessoas munidas de anonimato agregam um juízo de valores.

As pessoas responsáveis pelo julgamento podem condenar determinada atitude que individualmente não reprovariam. Dessa forma, o jurado, uma vez que dotado de anonimato, incorpora juízos de valores externos, um sentimento que não é seu, para fazer parte do grupo. (TEIXEIRA, 2011, p.54)

Diante do exposto, podemos concluir que a opinião publica está intimamente relacionada com o que lhe é passado através de quem a conduz, ou seja, a mídia (TEIXEIRA, 2011, p. 55).

3.2. O papel da mídia na formação da íntima convicção dos jurados

Nos tempos atuais os meios de comunição em massa, ganhou força e influencia através da propagação e popularização dos veículos midiáticos.

No entanto, é nítida a pressão que a mídia exerce em nosso judiciário, especificadamente no âmbito criminal, até mesmo por esse ser um tema de grande repercussão social, ou seja, proporcionando altos números de vendas e índice de audiência televisiva.

A notícia é transmitida, muitas vezes, com exagero, ultrapassando os limites da ética, basta averiguar o jornalismo investigativo, atuando de forma política ou até julgadora, criando vitimas e réus, ocasionando frequentemente o confronto das garantias constitucionais com a liberdade de imprensa.

O poder da imprensa é arbitrário e seus danos irreparáveis. O desmentido nunca tem a força do mentido. Na Justiça, há pelo menos um código para dizer o que é crime; na imprensa não há norma nem para estabelecer o que é notícia, quanto mais ética. Mas a diferença é que no julgamento da imprensa as pessoas são culpadas até a prova em contrário. Tem sido comum os meios de comunicação condenarem antecipadamente seres humanos, num verdadeiro linchamento, em total afronta aos princípios constitucionais da presunção de inocência, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, quando não lhes invadem, sem qualquer escrúpulo, a privacidade, ofendendo-lhes aos sagrados direitos à intimidade, à imagem e a honra, assegurados constitucionalmente. Aliás, essa prática odiosa tem ido muito além, pois é corriqueiro presenciarmos, ainda na fase da investigação criminal, quando sequer existe um processo penal instaurado, meros suspeitos a toda sorte de humilhação pelos órgãos de imprensa, notadamente nos programas sensacionalistas da televisão, violando escancaradamente, como registra Adauto Suannes, o constitucionalmente prometido respeitoà dignidade da pessoa humana. Não foram poucos os inocentes que se viram destruídos, vítimas desses atentados que provocam efeitos tão devastadores quanto irreversíveis sobrebens jurídicos pessoais atingidos. (ROCHA, 2013, p.2-3)

A maneira por muitas vezes distorcido que os veículos midiáticos usam para subversão das garantias fundamentais, tem como consequência formar opinião individual do telespectador, até mesmo por não terem acesso a veracidade das informações, acaba por levar como verídico o que lhe é passado.

Os maiores problemas de toda essa repercussão dos fatos gerados pela mídia se dá como relação à manipulação midiática que atinge os jurados que formarão o conselho de sentença de um julgamento de crime cometido contra a vida. A informação repassada à sociedade faz objeções da vida do acusado, incriminando-o e mostrando a sua vida, particular de uma maneira distorcida, formando então a opinião errônea a respeito da conduta deste. (KOEHLER, 2010, p.29)

Sendo assim, despir-se de preconceito e pré-julgamento tem sido um desafio, perante a publicidade desmedida da mídia sensacionalista, perante os crimes dolosos contra a vida. Pois, a maior parte dos membros da sociedade é desprovido de conhecimento técnico.

Tal influência é de fácil percepção dentro do tribunal do júri, pois, o conselho de sentença é formado por esses membros da sociedade, bem como toda essa informação vendida pela média pode sim interferir na convicção do jurado, induzindo-o ao pré- conceito generalizado pelos meios de comunicação.

Indubitável é que a pressão da mídia produz efeitos perante o juiz togado, o qual se sente pressionado pela ordem pública, por outro lado, de maior amplitude é este efeito sobre o júri popular que possui estreita relação com a opinião pública construída pela campanha midiática, é obvio, pois, que isto faz com que a independência do julgador se dissipe não podendo este realizar um julgamento livre por estardiante de uma verdadeira coação. “Levar um réu a julgamento no auge deu ma campanha de mídia é levá-lo a um linchamento, em que os ritos e fórmulas processuais são apenas a aparência da justiça, se encobrindo os mecanismos cruéis de uma execução sumária”.(TUCCI, 1999, p. 115).

Da mesma forma, Marcio Thomaz Bastos discorre:

Se a pressão e a influência da mídia tendem a produzir efeitos sobre os juízes togados, muito maiores são esses efeitos sobre o júri popular, mais sintonizado com a opinião pública, de que deve ser a expressão. [...]. Com os jurados é pior: envolvidos pela opinião pública, construída massivamente por campanhas da mídia orquestradas e frenéticas, é difícil exigir deles conduta que não seguir a corrente. (BASTOS, 1999, p. 117)

A mídia sensacionalista compromete direitos e garantias fundamentais, expondo as partes de crimes de grande repercussão e influenciando a sociedade nos casos em que esta por meio do tribunal do júri, julgam seus pares, muitas vezes sem o conhecimento técnico para distinguir o que foi transmitido pela mídia perante o que esta sendo exposto em plenário.

A influência externa capaz de impedir que o réu tenha um julgamento justo e na forma da lei, decorre da influência exercida pela opinião da mídia, capaz de exercer um forte apelo junto à opinião publica. Em verdade, a imprensa possui o poder de absorver ou condenar previamente um réu e, com isso, influir no convencimento dos jurados e na atuação da acusação e da defesa em plenário. É um poder de influir que não pode ser desprezado, visto que exercido de forma quase imperceptível, principalmente em se tratando de casos que alcançam grande repercussão pública. (KOEHLER, 2010, p.30)


CONCLUSÃO

Diante do exposto, fica a dúvida da possível imparcialidade dos jurados, tendo em vista que os telespectadores de hoje podem vir a ser os jurados de amanhã. Eles estão sendo bombardeados por manchetes e reportagens que criam uma condenação antecipada dos acusados, muitos ainda em estágio de inquérito policial. Assim, formam-se convicções antes mesmo de adentrar ao plenário, devido ao falso clamor de justiça imposto pela mídia sensacionalista, que apenas almeja lucros por meio de furos jornalísticos e índices de audiência.

O desenvolvimento do presente estudo possibilita uma análise da importância que os profissionais da área de comunicação exercem na formação da opinião pública, ou seja, na interferência direta na íntima convicção dos jurados.

Deste modo, pode-se perceber facilmente tal influência dentro do tribunal do júri, pois o conselho de sentença é formado por membros da sociedade que estão expostos diariamente a meios de comunicação, os quais muitas vezes ultrapassam os limites da ética. Tomemos como exemplo a pressão exercida pelo jornalismo investigativo no nosso ordenamento jurídico, criando vítimas e réus para seus telespectadores e, assim, podendo ocasionar pré-julgamentos e comprometer direitos e garantias fundamentais ao expor partes de crimes de grande repercussão.

Neste sentido, o objetivo deste estudo é abordar a possível imparcialidade do conselho de sentença do tribunal do júri, bem como a influência da mídia sensacionalista na formação de julgamentos antecipados. Desta maneira, pode interferir na formação da convicção íntima dos jurados. As entrevistas com alunos de diferentes semestres do curso de Direito evidenciaram que os meios de comunicação podem interferir na opinião pública e até mesmo influenciar nas decisões dos jurados que presidem o tribunal do júri.


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Sobre as autoras
Daniela Galvão Araújo

Possui graduação em Direito pelo Centro Universitário Euripedes de Marília (2002), Pós-graduação em Direito Processual: Civil, Penal e Trabalho e Mestrado em Teoria do Direito e do Estado pelo Centro Universitário Euripedes de Marília (2005). Atualmente é professora e coordenadora do curso de Direito da UNILAGO (União das Faculdades dos Grandes Lagos). Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Teoria do Direito, Teoria do Estado, Direito Civil, Direito Processual Civil, Direito Penal, Direito Constitucional.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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