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A ineficácia das reformas processuais diante do uso patológico do Poder Judiciário pelos chamados “litigantes habituais”

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Agenda 23/08/2017 às 09:22

A abordagem do chamado “litigante habitual” será relevante para se demonstrar que a conduta recalcitrante de alguns poucos agentes sociais monopoliza e inviabiliza a atuação do Poder Judiciário, tornando inócuas as inovações da legislação processual.

Sumário: 1 Introdução; 2 A Constituição da República de 1988 e o Estado Democrático de Direito: a explosão da litigiosidade de massa; 3 As ondas de reformas processuais após a Constituição de 1988 e os Pactos Republicanos: solução para a morosidade da prestação jurisdicional?; 3.1 O I Pacto Republicano: a implementação da reforma do Poder Judiciário; 3.2 O II Pacto Republicano: aprovação de novas propostas legislativas; 3.3 A aprovação do Código de Processo Civil de 2015; 4 A litigiosidade crescente e o agravamento da crise do Poder Judiciário: os dados do Relatório Justiça em Números do Conselho Nacional de Justiça; 5 A morosidade dos tribunais – ineficácia prática da criação de novas técnicas de julgamento para agilização dos processos; 6 Os Litigantes Habituais: o uso patológico do Poder Judiciário no Brasil; 7 Conclusão; 8 Referências

Palavras-chave: Poder Judiciário – crise – litigante habitual – reforma processual - ineficácia


1. Introdução

O presente artigo visa abordar a crise do Poder Judiciário, desenvolvendo uma análise crítica e necessária dos problemas enfrentados pelo Sistema de Justiça no Brasil.

 Fala-se em “crise da Justiça” causada pela sobrecarga de processos nos tribunais, pela lentidão processual e pela ausência de uniformidade da jurisprudência. 

É por isso que o direito processual civil está inserido em um contexto de ampla reforma legislativa, com destaque para a vigência do CPC 2015, com a criação de novas técnicas processuais na tentativa de aprimoramento e aceleração dos mecanismos de solução dos conflitos. 

A cultura jurídica brasileira seria adepta, nas palavras de Rodolfo Mancuso, da nomocracia, em razão do imediatismo da solução legislativa e o fato de que a edição e divulgação de uma nova legislação a respeito de assunto problemático podem passar à sociedade a impressão de que as medidas já foram tomadas, diminuindo a insatisfação geral.

Intenta-se alertar, no entanto, que as reformas processuais já implementadas ao longo dos anos não estão alcançando o seu desiderato haja vista o aumento crescente da litigiosidade e a persistente lentidão dos julgamentos.

A ineficácia das inovações legislativas se mostra evidente pelas estatísticas do relatório “Justiça em números” do CNJ, as quais serão abordadas ao longo da pesquisa, e pelo fato das reformas não remediarem as causas da litigiosidade excessiva, mas apenas as consequências do excesso de processos, o que é absolutamente insuficiente. 

Nesse contexto, a abordagem do chamado “litigante habitual” será relevante para se demonstrar que a conduta recalcitrante de alguns poucos agentes sociais monopoliza e inviabiliza a atuação do Poder Judiciário, tornando inócuas as inovações da legislação processual diante da ausência de previsão de reprimenda mais rígidas e da ausência de mudança real da postura desses agentes. 


2. A Constituição da República de 1988 e o Estado Democrático de Direito: a explosão da litigiosidade de massa

No Brasil, o Constitucionalismo contemporâneo e o paradigma do Estado Democrático de Direito emergiram com o advento da Constituição da República de 1988, com ampla reestruturação do Estado, especialmente do Poder Judiciário, acompanhada da garantia de novos direitos. A sociedade globalizada impulsionou a necessidade da tutela de interesses metaindividuais, classificados como direitos difusos fundamentais de terceira dimensão. 

O fundamento desse novo paradigma do Estado não é apenas a defesa dos direitos de primeira dimensão (direitos civis e políticos) e de segunda dimensão (direitos sociais, econômicos e culturais), mas também a efetiva proteção e implementação dos direitos fundamentais de terceira dimensão (direitos difusos). 

Já se alardeia, inclusive, a garantia dos direitos de quarta e quinta dimensões. Paulo Bonavides, por exemplo, defende a existência dos direitos de quarta dimensão decorrentes da globalização política, relacionados à democracia, à informação e ao pluralismo, in verbis:

A globalização política neoliberal caminha silenciosa, sem nenhuma referência de valores. (...) Há, contudo, outra globalização política, que ora se desenvolve, sobre a qual não tem jurisdição a ideologia neoliberal. Radica-se na teoria dos direitos fundamentais. A única verdadeiramente que interessa aos povos da periferia. Globalizar direitos fundamentais equivale a universalizá-los no campo institucional. (...) A globalização política na esfera da normatividade jurídica introduz os direitos de quarta geração, que, aliás, correspondem à derradeira fase de institucionalização do Estado social. É direito de quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência. (...) os direitos da primeira geração, direitos individuais, os da segunda, direitos sociais, e os da terceira, direitos ao desenvolvimento, ao meio ambiente, à paz e à fraternidade, permanecem eficazes, são infraestruturais, formam a pirâmide cujo ápice é o direito à democracia. 

Como o sistema de direitos visa a incorporar os anseios e necessidades humanas que se apresentam com o tempo, José Adércio Leite Sampaio ressalta que já há quem fale de uma quinta geração dos direitos humanos com múltiplas interpretações, como, por exemplo, direito ao patrimônio genético e à proteção contra o abuso de técnicas de clonagem.

O acesso efetivo à Justiça ganha, portanto, novo impulso com o advento dos direitos de terceira e quarta gerações, relacionados ao meio ambiente, ao desenvolvimento sustentável, à proteção do consumidor, e demais direitos difusos e coletivos. Por conseguinte, as declarações jurídicas consagraram a prerrogativa inarredável de que todo cidadão faz jus a receber dos tribunais solução efetiva e em tempo razoável para os atos que violem seus direitos. 

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Por outro lado, a ineficiência do Estado quanto à efetivação dos direitos básicos à educação, saúde, moradia e ao trabalho assegurados pela Constituição da República de 1988 tem acarretado grande insatisfação social. Ou seja, existe uma discrepância alarmante entre as promessas constitucionais e a realidade vivenciada, demonstrando a conduta recalcitrante dos entes públicos e grandes empresas – instituições financeiras, concessionárias de serviços públicos em geral – em transformar e melhorar a qualidade e eficiência dos serviços. 

Nesse contexto, o Poder Judiciário passou a representar uma peça fundamental no processo de densificação social das normas, visando à concretização de direitos carentes de políticas públicas. 

Dierle Nunes alerta que “o Judiciário trabalha com as consequências do não cumprimento dos direitos, mas dificilmente com as causas, para as quais, em grande medida, haveria a necessidade de políticas públicas mais idôneas promovidas pelo Executivo”. 

Assim, o Poder Judiciário apático e inerte de outrora cede seu lugar a um Poder prospectivo e atuante, em decorrência da denominada “judicialização” das políticas públicas para a efetivação dos direitos. 

O ministro do STF, Luis Roberto Barroso, assim leciona sobre o fenômeno da “judicialização”: 

Judicialização significa que questões relevantes do ponto de vista político, social ou moral estão sendo decididas, em caráter final, pelo Poder Judiciário. Trata-se, como intuitivo, de uma transferência de poder para as instituições judiciais, em detrimento das instâncias políticas tradicionais, que são o Legislativo e o Executivo. Essa expansão da jurisdição e do discurso jurídico constitui uma mudança drástica no modo de se pensar e de se praticar o direito no mundo romano-germânico. Fruto da conjugação de circunstâncias diversas, o fenômeno é mundial, alcançando até mesmo países que tradicionalmente seguiram o modelo inglês (...) Exemplos numerosos e inequívocos de judicialização ilustram a fluidez da fronteira entre política e justiça no mundo contemporâneo, documentando que nem sempre é nítida a linha que divide a criação e a interpretação do direito. 

Através do fenômeno da judicialização da política e das relações sociais, o Poder Judiciário está ampliando sua esfera de atuação por via de um poder de revisão dos atos originados dos Poderes Executivo e Legislativo, deslocando os discursos do âmbito da esfera de representação política para a atuação decisória dos tribunais, o que, sem sombra de dúvida, causou um redimensionamento do papel do Judiciário para o qual ele não estava preparado.

Isso provocou a explosão da litigiosidade de massa ou de demandas repetitivas, que associada a questões funcionais e estruturais, trouxe graves implicações à celeridade processual.

Enquanto em 1990 o Judiciário havia recebido cerca de 04 milhões de processos em constante elevação, na década de 2000, o volume ultrapassou 20 milhões de ações e, em 2014, alcançou o patamar de cem milhões de demandas, conforme Relatório Justiça em números do Conselho Nacional de Justiça.

Boaventura de Sousa Santos já advertia há mais de uma década que tudo isso resultaria em uma explosão de litigiosidade à qual a administração da justiça dificilmente poderia responder, acarretando sérios problemas de eficiência e morosidade ao Poder Judiciário.


3. As ondas de reformas processuais após a Constituição de 1988 e os Pactos Republicanos: solução para a morosidade da prestação jurisdicional?

A ineficiência e a morosidade do Poder Judiciário passaram a integrar nas últimas décadas a pauta do Congresso Nacional, do Executivo, através do Ministério da Justiça, e do próprio Poder Judiciário que tenta implantar novas políticas de gestão e tramitação processual para aceleração da prestação jurisdicional.

Disseminou-se no Brasil a ideia de que os “defeitos” da legislação processual seriam os principais responsáveis pela morosidade judicial, o que gerou uma onda de reformas legislativas que, a toda evidência, não surtiram o efeito desejado ao longo dos anos. 

Com efeito, a “Crise do Poder Judiciário” não pode ser entendida de forma simplista como se fosse apenas uma questão de direito processual, quando, na verdade, ela envolve uma crise de todo o Sistema de Justiça e, principalmente, do próprio Estado que não consegue, já há muito tempo, proporcionar a satisfação do cidadão com o acesso aos serviços públicos essenciais de qualidade. 

Rodolfo Mancuso aponta ainda como concausas da crise do Poder Judiciário, entre outras, a judicialização das políticas públicas em razão da ineficiência das instâncias administrativas, o que dá margem à discricionariedade judicial e ao alargamento do campo de atuação do Poder Judiciário, o gigantismo desordenado do próprio Poder Judiciário no Brasil que fomentaria a litigiosidade e a cultura demandista brasileira, a deficiente divulgação e utilização de outros meios de resolução de conflitos, as duas classes de litigantes (os habituais ou frequentes e os eventuais ou esporádicos) e a desigual distribuição dos ônus e encargos processuais entre eles. 

O gigantismo da estrutura do Poder Judiciário no Brasil se dá muitas vezes pela ausência de planejamento estratégico efetivo na distribuição dos órgãos jurisdicionais. Não raras vezes, a criação e instalação de órgãos de primeira instância do Poder Judiciário são motivadas por interesses e interferências muito mais políticas do que técnicas para melhor equilíbrio e organização da Justiça. De igual modo, a não criação de órgãos necessários também ocorre por motivações divorciadas da análise técnica e estratégica necessária para a melhor distribuição do Sistema de Justiça. É o que se dá, por exemplo, com o não desmembramento do Tribunal Regional Federal da 1ª. Região, que ainda abrange 13 Estados da federação mais o Distrito Federal, acarretando grave desequilíbrio do acesso ao segundo grau da Justiça Federal no Brasil. A ausência de planejamento gera, enfim, custos desnecessários e ineficiência da atividade jurisdicional no Brasil. 

O professor Barbosa Moreira também critica o “mito” de que a sobrecarga de processos e a lentidão do Poder Judiciário seriam causadas pela legislação processual. Para ele, a demora processual resulta da conjugação de múltiplos fatores, entre os quais também concorre a lei, que, todavia, com todas as imperfeições que possa ter, não ocupa o lugar de maior relevância. 

Morais e Spengler apontam, na sua visão, quatro vertentes da crise do Sistema de Justiça, quais sejam: a crise estrutural, a crise objetiva ou pragmática, a crise subjetiva ou tecnológica e a crise paradigmática. 

A crise estrutural é aquela que decorre da deficiência de gestão, da ausência de infraestrutura adequada, número insuficientes de juízes e servidores. A crise objetiva ou pragmática, segundo os referidos juristas, refere-se aos aspectos pragmáticos da atividade jurídica, englobando questões relacionadas à linguagem técnico-formal utilizada nos ritos e trabalhos forenses, a burocratização e lentidão dos procedimentos, o excesso de recursos e o acúmulo das demandas sem solução em tempo razoável. A crise subjetiva ou tecnológica é a que se vincula à incapacidade tecnológica dos operadores jurídicos tradicionais lidarem com novas realidades fáticas que exigem não apenas a construção de novos instrumentos legais, mas também a (re)formulação das mentalidades em relação à nova realidade social que se apresenta. A crise paradigmática é aquela que trata sobre os métodos e conteúdos utilizados pelo direito para a busca de um tratamento pacífico para os conflitos a partir da atuação prática da norma aplicável ao caso sub judice. Já a crise funcional surge, enfim, a partir da inadequação das leis publicadas, a intrincada processualística e a deficiência do sistema de provocação do Poder Judiciário. 

Evidentemente que não se pretende aprofundar o estudo sobre as referidas vertentes, pois não se trata do objeto principal deste artigo, mas apenas demonstrar que a complexidade dos problemas do Sistema de Justiça do Brasil vai muito além da necessidade de reforma da legislação processual. 

A crise é, portanto, sistêmica, envolvendo questões afetas à gestão do próprio Poder Judiciário, questões relacionadas à formação nos cursos de graduação em Direito, à formação e recrutamento dos magistrados, à ausência de incentivo e integração dos métodos alternativos de solução de conflitos, questões relacionadas ao desprestígio do processo coletivo, ao despreparo e à ineficiência dos entes públicos, podendo-se destacar, ainda, a postura dos litigantes habituais (repeat players). 

Em que pesem o alerta e as críticas acima apontadas, é fácil perceber que a preocupação voltada apenas com as reformas da legislação processual foi e continua sendo a tônica encontrada pelos poderes constituídos da República para solucionar a crise. 

O enorme arcabouço legislativo impulsionado pelos Pactos da Republica está longe de representar a solução adequada para a crise do Poder Judiciário, mormente no que se refere à atuação dos litigantes habituais.

3.1 O I Pacto Republicano: a implementação da reforma do Poder Judiciário

A crise aprofundou o debate sobre a necessidade de reforma do próprio Poder Judiciário, culminando com a promulgação da Emenda Constitucional (EC) n. 45, de 2004.

Com o propósito de implementar a reforma constitucional preconizada pela referida emenda, foi subscrito pelos chefes dos três Poderes da República, em dezembro de 2004, um Pacto de Estado em favor de um Judiciário mais rápido e republicano, consubstanciado em vários compromissos fundamentais, entre os quais, destacam-se a reforma do sistema recursal e dos procedimentos para desburocratizar o processo, a implementação da informatização, além de se estabelecer uma política de coerência entre a atuação administrativa e as orientações jurisprudenciais já pacificadas para diminuir a litigiosidade. 

Essa postura de coerência preconizada pelas autoridades não se constata no dia a dia da prática forense, especialmente pela conduta recalcitrante dos litigantes habituais que insistem com suas teses e defesas até as últimas consequências, abarrotando os tribunais, principalmente os superiores, o que retarda a solução das controvérsias de grande magnitude e impacto em diversos processos em tramitação. 

Como resultado do I Pacto Republicano, iniciado em 2004, vários projetos de lei de reforma do Código de Processo Civil foram aprovados. 

Não obstante as reformas aprovadas, o Conselho Nacional de Justiça divulgou, no Encontro Nacional do Judiciário, pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas, no período de 09 a 11 de fevereiro de 2009, na qual 1.200 (um mil e duzentos) entrevistados consideraram a Justiça cara, lenta e manipulável pela imprensa, empresários e políticos. A lentidão da Justiça foi a característica mais citada pelos entrevistados: 88%. Em seguida, os altos custos para seguir com uma ação judicial (78%), a falta de imparcialidade (69%) e a influência sofrida pelos juízes na hora de decidir (63%).

A criação da técnica de julgamento dos recursos repetitivos e da súmula vinculante não trouxe celeridade processual, mas apenas aumentou o risco de padronização decisória no Sistema de Justiça no Brasil como forma de estabilização da jurisprudência. 

3.2 O II Pacto Republicano: aprovação de novas propostas legislativas

Envolto por um contexto social ainda de muito descrédito em relação à celeridade e eficiência do Poder Judiciário, firmou-se, em abril de 2009, o II Pacto Republicano de Estado por um Sistema de Justiça mais acessível, ágil e efetivo. 

Para a consecução dos objetivos estabelecidos no referido Pacto, foram assumidos novos compromissos públicos na linha do primeiro pacto firmado. Entre outros pontos, firmou-se o compromisso de fortalecer as Defensorias Públicas, a mediação e a conciliação, estimulando a resolução de conflitos por meios autocompositivos, além de incentivar a ampliação da edição de súmulas administrativas e a constituição de Câmaras de Conciliação no intuito de diminuir a litigiosidade, sobretudo envolvendo os entes públicos considerados os maiores litigantes do Sistema de Justiça. 

E, como resultado dos esforços conjuntos empreendidos no âmbito dos referidos Pactos Republicanos, várias propostas foram implementadas ao longo dos últimos anos, especialmente a aprovação de leis que acarretaram a introdução no sistema processual de novos instrumentos como o julgamento imediato das ações repetitivas, técnica de julgamento dos recursos extraordinários (repercussão geral) e especiais (recursos repetitivos), as súmulas impeditivas de recurso e das súmulas vinculantes. A execução dos títulos extrajudiciais foi simplificada com a criação e a modificação das formas de expropriação de bens (adjudicação, alienação particular, parcelamento imobiliário), e foram introduzidos atos executivos no processo de conhecimento com a criação da fase de cumprimento de sentença (execução sincrética). 

Destacam-se também a Lei 12.016/09, que regulamentou o mandado de segurança, e a Lei 12.011/09, que estruturou a Justiça Federal com a criação de 230 varas federais. Foi publicada a Lei 12.012/09, que criminalizou a entrada de aparelhos celulares e similares nas penitenciárias do país; a Lei 11.969, que facilita o acesso de advogados aos autos de processos, em cartório; e a Lei 11.965, que prevê a participação de defensores públicos em atos extrajudiciais, como assinatura de partilhas e inventários, separação e divórcio consensual. A Lei 11.925 possibilitou, por sua vez, a declaração de autenticidade dos documentos pelos advogados. 

Foi sancionada, ainda, a Lei 12.019, de 21 de agosto de 2009, que regulamenta a convocação de magistrados para instrução de processos de competência originária do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF). Também no âmbito do II Pacto, foi publicada a Lei nº 12.322/2010, para alterar o agravo de instrumento. A Lei 12.153, de 22 de dezembro de 2009, institui os Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, com competência para processar, conciliar e julgar causas cíveis, de pequeno valor, de interesse dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, ampliando o acesso à Justiça.

Importante ressaltar, finalmente, que a Defensoria Pública foi fortalecida com a aprovação da Emenda Constitucional 74, que lhe conferiu autonomia administrativa e financeira no âmbito da União, e pela Emenda Constitucional 80, de 04 de junho de 2014, que fixou prazo de 08 anos para que os entes públicos dotassem todas as comarcas de defensores públicos.  

3.3 A aprovação do Código de Processo Civil de 2015

Em complemento a todo o ciclo de modificações legislativas do Sistema de Justiça ao longo dos últimos vinte anos, foi sancionada a Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015, com sua entrada em vigor a partir de março de 2016, que institui o novo Código de Processo Civil. 

A novel legislação processual sistematizou as reformas pontuais já implantadas na legislação em vigor, no intuito de conferir maior funcionalidade, e também buscou inovar o direito processual com novas técnicas processuais de julgamento dos conflitos, como o incidente de resolução de demandas repetitivas, o incidente de assunção de competência, além da instituição de um sistema de precedentes vinculantes. 

A criação do novo Código de Processo Civil respalda-se em razões jurídicas e sociais que legitimam o surgimento do novo diploma, mas ele não pode ser colocado como se fosse um remédio adequado e suficiente para debelar a crise da morosidade da prestação jurisdicional, criando a falsa expectativa de que a situação será resolvida. 

O número expressivo de leis aprovadas e os projetos ainda em andamento demonstram que, no Brasil, impera o falso entendimento de que basta a criação de novas leis para que todos os problemas da morosidade processual sejam resolvidos e isso não é verdade. 

Desde a vigência do CPC 2015, há mais de um ano, não se verifica uma modificação concreta da postura dos litigantes e tampouco maior agilidade dos julgamentos pelo Poder Judiciário. 

Sobre o autor
Daniel Carneiro Machado

Juiz Federal da 21ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais. Doutor em Direito Processual pela UFMG (2016) e Mestre em Direito Processual pela PUC Minas (2004). Professor titular do curso de graduação em direito do Centro Universitário Newton Paiva, em Belo Horizonte, além de professor de cursos de pós-graduação e preparação para concursos públicos na área jurídica. Ex-Advogado da União e ex-Procurador da Fazenda Nacional em Minas Gerais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACHADO, Daniel Carneiro. A ineficácia das reformas processuais diante do uso patológico do Poder Judiciário pelos chamados “litigantes habituais”. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5166, 23 ago. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/59960. Acesso em: 5 nov. 2024.

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