Da necessidade de uma linguagem clara e precisa nas referências de uma pesquisa científico-jurídica.
A linguagem é como um meio de comunicação por meio do qual um ser linguístico se comunica com outro. Evidentemente, para que essa comunicação seja feita com sucesso, cada indivíduo da conversa deve conhecer uma determinada língua composta por regras sintáticas e semânticas[12] que é construída através da convivência com os parâmetros da comunicação.[13] Através dessa linguagem, um indivíduo fala, o outro entende, e responde se achar conveniente. Cada parte desse processo linguístico é relevante para que a comunicação seja bem sucedida.
Nesse sentido, a pesquisa jurídica é também uma comunicação. Principalmente se levarmos em conta o diálogo científico-jurídico que ocorre quando novos trabalhos são produzidos com base em pesquisas anteriores. Sendo uma comunicação, ela só será bem sucedida se o processo descrito no parágrafo anterior for feito apropriadamente. Isso ocorre quando um primeiro indivíduo pesquisador divulga um trabalho, um segundo indivíduo, se interessado for pelo tema, consegue captar as informações contidas nesse trabalho, e, por fim, se o trabalho despertar especial interesse, a ponto de ser útil para uma pesquisa futura do leitor, será concretizado um diálogo científico entre ambos os trabalhos. Vale lembrar que o leitor pode se limitar ao segundo passo, sem avançar para o terceiro. Se esse for o seu desejo, evidentemente ele terá que conseguir ler o trabalho científico em questão e entendê-lo.
Esse entendimento, contudo, não se concretiza se o texto é demasiado fechado, a ponto de limitar completamente a compreensão do leitor. Talvez seja inadequado exigir que um pesquisador escreva de forma tão simples que um público completamente leigo entenda seu texto, mas, ainda assim, seria muito pouco razoável que ele escrevesse de forma obscura e com uma linguagem que inviabiliza completamente a comunicação científica.
Essa mesma lógica se aplica também às referências em um trabalho científico. Se elas não forem claras, a sua compreensão fica comprometida, e, com isso, a bibliografia fica inacessível ao leitor. A importância da bibliografia já foi ressaltada anteriormente. Ainda assim, vale lembrar por quais motivos. Sem ela, o leitor não pode ir às fontes utilizadas pelo escritor, além de não poder checar a veracidade das afirmações feitas em seu trabalho.
Além disso, o desconhecimento da bibliografia impede o já mencionado "further reading" do pesquisador que se interessa por determinada parte do texto que tem uma ou mais citações. Se essa citação interessante não pode ser lida com clareza porque o título, o autor, ou qualquer outra informação relevante não está claramente disposta, a bibliografia fica completamente inacessível. O mesmo vale para o corpo do texto, quando ele não é claro; este, porém, não é o assunto do presente texto, que busca ressaltar a relevância das citações, por elas serem fundamentais para a pesquisa jurídica.
Dessa forma, essa linguagem clara e precisa de uma referência é possível por meio da padronização da forma como citações são feitas, como foi exposto na primeira parte do presente texto. Em outras palavras, a linguagem de uma referência é clara e precisa quando se tem um padrão a ser seguido por todos os pesquisadores, já que, se esse parâmetro for seguido, haverá uma forma constante de se citar um trabalho; sendo que essa forma, sendo amplamente aceita e divulgada, se torna facilmente compreensível pelos leitores de pesquisas jurídico-científicas. Isso porque eles, ao verem uma citação, reconhecerão rapidamente seu formato, podendo, então, tirar dela as informações das quais precisam para encontrar o objeto citado.
Nesse sentido, percebe-se uma fusão entre o que foi dito nessa primeira parte com o que foi dito na segunda. A linguagem clara e inteligível, descrita na segunda parte, se concretiza através da formalização das referências, descrita na primeira parte. Em outras palavras, a linguagem de uma referência é clara, precisa, simples e inteligível quando essa referência é escrita sempre da mesma forma. Isso porque, se isso for feito, o método de citação será amplamente conhecido, e não haverá grandes dificuldades em se compreender uma citação.
Um exemplo disso é a forma de referência utilizada no mundo inteiro para se citar um livro. Ela é a que está sendo utilizada nas citações desse trabalho. Essa forma é a seguinte: Autor; Título; Edição; Editora, ano de publicação, página de onde foi tirada a citação. Esse tipo de citação não omite nenhuma informação, em princípio. Isso porque, partindo do pressuposto de que a função da referência é possibilitar que a fonte usada seja encontrada, esse tipo de referência cumpre seu dever.
É claro que outros infinitos meios de citação também cumprem essa função. Ainda assim, a linguagem é uma convenção, e, no caso de uma referência, a convenção só é clara quando a forma utilizada para fazê-la pode ser facilmente compreendida.[14] Por isso não é conveniente utilizar um método desconhecido como um que troca o nome do livro com o nome da editora; ou o título do livro com o seu autor.
Essas alterações desavisadas, ainda que incluam as informações necessárias sobre o livro citado, podem causar confusão e impedem que a referência seja clara e facilmente inteligível. Por essa razão, esse tipo de citação dificulta a vida do leitor se ele quiser encontrar determinada fonte, além de não cumprir uma de suas funções que é a de ser simples e eficiente[15].
Em vista dessa necessidade de uma formalização das referências para que elas sejam claras, simples e precisas, se torna necessário um critério fixo que determine quais citações podem e quais não podem ser usadas.
Como é dado um enfoque, pelo presente texto, à pesquisa científico-jurídica realizada no Brasil, é natural que se busque um critério padrão para as referências feitas nos trabalhos daqui. Em outras palavras, é natural que se busque um padrão que possa ser usado em todo o país. Como foi dito na introdução, esse critério já existe, e é a Associação Brasileira de Normas Técnicas. Os motivos por ser assim são os que seguem.
Da importância da Associação Brasileiras de Normas Técnicas como padronizadora das formas de se fazer uma referência no Brasil.
Nesse ponto do texto, alguns fatos já foram evidenciados. Entre eles, o de que a linguagem de um trabalho científico deve ser clara, uma vez que ela tem, acima de tudo, o objetivo de passar uma informação. Como já foi repetido, essa lógica se estende à parte técnica do trabalho. Por isso, nas duas partes anteriores do texto, buscou-se evidenciar a necessidade de um método formal, claro e simples que torne as referências de um trabalho jurídico-científico facilmente compreensíveis.
A conclusão à qual se chegou foi a de que deve haver um padrão universal para a maneira de se fazer uma referência; sendo que esse padrão, por ser universal, deve ser usado por todos os pesquisadores. Isso facilitaria o entendimento do que está citado, tornando possível, então, o "further-reading", o diálogo jurídico entre pesquisadores, entre outras partes importantes da pesquisa jurídica.
Percebe-se, com isso, que a necessidade agora é estabelecer um padrão universal a ser usado por todos os pesquisadores. Feito isso, o presente texto estará completo, já que estará proposta uma solução para os problemas de imprecisão linguística descritos anteriormente.
Essa solução já foi adiantada mais de uma vez no decorrer do texto. Ela é a ABNT. Isso porque, por ser uma associação nacional de alta visibilidade, ela é capaz de estabelecer um padrão de como se realizar referências em todo o Brasil. Isso não seria possível se o órgão escolhido para decidir os padrões de citação no país fosse inexpressivo ou desconhecido. Mesmo porque suas recomendações técnicas referentes às pesquisas científicas não atingiriam aqueles que o desconhecem.
Nesse sentido, a visibilidade considerável da ABNT é um dos fatores que torna essa associação a solução ideal. Como o que se busca é um padrão fixo para toda a comunidade jurídico-científica do Brasil, tal visibilidade é importante para que as regras de referências sejam conhecidas nos quatro cantos do país. Até porque, se elas não forem tão conhecidas, elas não serão padrão, uma vez que não serão amplamente usadas.
Deve-se ressaltar, nesse momento, que o texto, levando em conta o que foi escrito anteriormente, parte do pressuposto de que, quanto mais pesquisadores utilizarem o mesmo critério de citação, melhor será para a pesquisa científica, tendo em vista, é claro, as facilidades decorrentes de uma uniformização das referências feitas no mundo da pesquisa científica. Por essa razão, uma grande visibilidade do órgão responsável por estabelecer os padrões técnicos da pesquisa científica é imprescindível; e a ABNT tem essa visibilidade.
Além dessa qualidade imprescindível da ABNT de ser amplamente conhecida, outro motivo para que suas regras virem padrão para a pesquisa jurídico-científica é a de que os métodos de citação sugeridos por ela já são amplamente usados pela academia brasileira. Vale citar os exemplos dos notórios professores e juristas brasileiros Marcelo Neves, Lenio Streck e Elival da Silva Ramos, que, em seus principais livros, fazem uso do método de citação de livros recomendado pela ABNT.[16]
Percebe-se, então, que já há uma certa ligação entre a ABNT e a comunidade científico-jurídica brasileira. Essa ligação é importantíssima porque, ao mesmo tempo que o critério padrão para se fazer referências deve ser conhecido por todos, ele, ao ser escolhido, não pode ser completamente inovador ou amplamente desconhecido no mundo da pesquisa científica. Se for, ele não será naturalmente aceito por todos, já que é mais simples continuar utilizando uma forma de citação já conhecida do que se adaptar à uma forma diferente e nova; e uma mudança não natural dos padrões de citação comprometeria completamente a universalidade do novo padrão de referência.
Nesse contexto, é necessário que os critérios escolhidos como padrões sejam os que já são usados pela comunidade científica; ou então com poucas alterações comparados com aqueles que são. Do contrário, dificilmente eles serão bem recebidos, sendo que, se eles não forem, depara-se com o problema da não universalidade de um critério de citação. Isso porque, se ele não é conhecido por todos, ele não é universal, tendo em vista que, se ele não for conhecido por todos, ele não será amplamente usado pelo público acadêmico.
É claro que não é impossível padronizar um método de citação completamente desconhecido. No entanto, para ele se tornar na prática o padrão, ele deveria ser divulgado para que os pesquisadores tivessem de fato contato com ele. Essa divulgação envolveria propaganda, gastos, tempo, etc., sendo, portanto, muito menos simples do que a padronização de um critério já conhecido.
Voltando à ABNT, ela não corre o risco de ter seus critérios rejeitados pela academia, tendo em vista o que foi exposto acima e o que será em seguida. Em primeiro lugar, suas regras já são usadas nas principais pesquisas jurídicas do Brasil, o que faz concluir que suas regras serão, quando utilizadas como padrão, aceitas naturalmente pela comunidade científica. Em segundo lugar, a ABNT não sofre com o problema de ser desconhecida pelo público jurídico. Na verdade, a prova de que ela é consideravelmente conhecida é o fato de ela ser uma associação nacional, cujas regras são amplamente usadas em trabalhos científicos para a citação de livros, artigos, periódicos, etc. Exemplo disso é a plataforma CONPEDI, que, em seus editais de artigos jurídicos, exige, antes de aceitar julgar um artigo científico enviado a ela, que ele utilize as formas de citação recomendadas pela ABNT.[17]
Fica evidenciada, com isso, a já estabelecida ligação entre a ABNT e o mundo da pesquisa jurídica. Essa ligação é importante para que a ABNT se torne o padrão universal nas pesquisas jurídicas nacionais, já que ela ganha cada vez mais espaço entre os pesquisadores através da sua divulgação feita pela academia.
O fato de a plataforma CONPEDI exigir que os métodos da ABNT sejam os utilizados em seus artigos, é importante para que essa divulgação continue a todo vapor. Isso porque, em razão dessa exigência, faculdades de Direito em todo o Brasil interessadas em desenvolver pesquisas deverão ensinar seus alunos a usarem o método de citação da ABNT. A partir disso, o padrão ABNT se torna cada vez mais dominante, uniformizando, com isso, as pesquisas realizadas no Brasil.
Percebe-se, portanto, que a escolha da ABNT como a solução que formalizará e uniformizará a parte técnica da pesquisa jurídica é bastante razoável. Principalmente pelo fato de ela preencher os pré-requisitos exigidos para que ela ocupe tal posição. Isso porque essa associação é conhecida, divulgada, respeitada, e, o mais importante, suas regras são amplamente utilizadas.
Uma possível objeção à escolha da ABNT para ser o órgão encarregado de definir como será feita a parte técnica da pesquisa científica é a de que os métodos de citação escolhidos por ela não são os mais convenientes, e que eles deveriam ser substituídos por outros. A primeira parte dessa objeção, embora possa estar certa, é irrelevante, já que o pressuposto do qual se parte no presente texto é o de que, ainda que o método padronizado não seja o melhor método de citação possível, ele é o que deve ser usado, porque a padronização geral desse método é mais importante do que a satisfação da vontade de alguns.
Possibilitar o "further-reading", o diálogo científico, facilitar o entendimento das bibliografias das pesquisas jurídicas, é mais importante do que satisfazer o gosto de alguns que preferem outros meio de citação aos da ABNT. Isso porque, se cada pesquisador utilizasse os meios de citação que preferisse em suas pesquisas sem ser repreendido por isso, todo o processo da pesquisa científica estaria prejudicado. A dificuldade do leitor de uma pesquisa para encontrar uma citação aumentaria consideravelmente, como já foi exposto anteriormente, impedindo a concretização de todos os avanços propostos pelo presente texto.
Por essa razão, é necessário que a comunidade jurídica faça sempre uso de normas técnicas padronizadas e pré-definidas. No caso da comunidade jurídica brasileira, esse padrão deve ser encontrado entre as normas da ABNT. O preço a ser pago se isso não for feito é muito caro; sendo que, ao mesmo tempo, as vantagens oferecidas se isso for realizado são grandes.
Outra qualidade de imensurável importância da ABNT é o fato de sua visibilidade não se limitar ao âmbito nacional, mas atingir também o internacional. Na verdade, algumas de suas regras foram influenciadas pelos métodos de citação de alguns outros países americanos. Talvez por isso a ABNT tenha participado mais tarde da formação da Comissão Panamericana de Normas Técnicas (COPANT) e da Associação Mercosul de Normalização (AMN).[18]
Essas duas participações da associação brasileira em órgãos internacionais demonstram a sua preocupação em recomendar regras técnicas à academia brasileira que sejam utilizadas também no exterior. As razões para ela fazer isso são provavelmente as mesmas das usadas pelo presente texto para defender a padronização das normas técnicas no Brasil, só que em um âmbito internacional. São elas a dinamização da pesquisa científica e a uniformização das referências da pesquisa por todo o mundo, causando, assim, uma espécie de globalização da parte técnica da pesquisa científica.
Até mesmo porque, embora a ABNT consiga tornar um único método de citação o método padrão no Brasil, ela não consegue fazer isso em todo o mundo. Isso torna necessária uma observação do que é usado fora do Brasil para que os meios de se fazer referências aqui não sejam completamente diferentes dos do resto do mundo a ponto de essa diferença inviabilizar a comunicação de um pesquisador brasileiro com um estrangeiro.
Uma associação de normas técnicas diferente da ABNT dificilmente teria uma mesma visibilidade nacional e internacional. É necessário somente um acesso ao site da ABNT para que se perceba a amplitude de sua atuação nos diversos âmbitos da pesquisa jurídica. Por essa razão ela é a solução indicada pelo presente texto, ou seja, porque ela é capaz de solucionar, por meio de sua visibilidade e de suas regras adequadas, os problemas identificados e expostos nos capítulos anteriores.
Além disso, como já foi dito anteriormente no texto com essas mesmas palavras, a ABNT é a solução para os problemas suscitados acima porque ela é capaz de padronizar todas as tecnicidades dos trabalhos científicos produzidos no Brasil, otimizando o diálogo e o desenvolvimento das pesquisas jurídicas. Ela é capaz de uniformizar a maneira de se realizar a parte técnica de uma pesquisa jurídica em todo o país, impedindo uma utilização de critérios diferentes por pessoas diferentes.
Com ela, há uma formalização da parte técnica do trabalho científico, sendo que essa formalização simplifica o entendimento das referências e evita os problemas descritos acima decorrentes da má comunicação entre pesquisadores. Em suma, a ABNT é capaz de solucionar e evitar os principais problemas técnicos de uma pesquisa jurídico, devendo por essa razão ser a encarregada de fazer isso.