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Resenha de cartas urbanas

Agenda 11/09/2017 às 22:20

Trata-se de uma websérie documental sobre “direito à cidade”, realizada com os moradores das comunidades da cidade Fortaleza que trocam cartas entre si, com o fito de levantar problemas consistentes naquela cidade uma moradia digna, saúde, educação etc.

Trata-se de uma websérie documental sobre “direito à cidade” feita pela produtora Nigéria em que foram gravados alguns moradores das comunidades da cidade Fortaleza trocando cartas entre si, com o fito de levantar problemas consistentes na região como a luta pelo direito de uma moradia digna, bem como o acesso ao transporte público, coleta de lixo, saúde, acesso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado entre outros.

Também foram abordados outros contratempos em decorrência de empreendimentos que estão em desacordo com os planos diretores do local e um exemplo a ser dado, se dá através do Episódio 01 – “Comunidade em Ruínas”, que ocorre na Trilha do Senhor, uma comunidade que foi removida por conta da implantação do Projeto Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), uma obra capitaneada pelo Governo do Ceará sob o contexto da Copa do Mundo, que consiste num sistema de transporte que está entre o metrô e o ônibus convencional que ligaria o transatlântico ao centro da cidade.

O Projeto prevê a remoção de mais de 2 mil famílias e por conta desta obra cuja a exigência se dá em desapropriações para favorecer o tráfego, acaba por afetar as pessoas que ali vivem, pois no momento, a obra se encontra paralisada desde 2014 com menos de 50% de execução.

As desapropriações ocorreram devido a ocupação pelos moradores nas áreas de rede ferroviária sendo o Poder Público negligente com relação a isso e em detrimento do investimento que o VLT traria para a cidade, sendo assim, o governo quis lucrar em cima dessas áreas ocupadas que ali estão.

Ao que parece ser o Estado quer ficar com as terras dos moradores para construir sem se preocupar com o futuro dessas pessoas, pois, utilizou-se da desapropriação como um instrumento para auferir renda para os cofres públicos.

Mediante os estudos levantados pelo Laboratório de Estudos da Habitação da Universidade Federal do Ceará (LEHAB/UFC), a obra não era uma prioridade para a Prefeitura de Fortaleza e nem para o Estado, mesmo adquirindo futuros recursos advindos da Copa do Mundo.

Algumas dessas famílias adquiriram suas propriedades através do usucapião mesmo sem o registro, e através de concessão de uso especial para fins de moradia de bem público.

Outra questão que preocupa o LEHAB, como foi dito no Episódio, é que

“dar continuidade ao Projeto é saber que haverá mais violações e ao contrário disso, não dar continuidade ao Projeto é saber que foi jogado dinheiro público fora também”.

A respeito do Episódio 02 – “Fronteira Esquecida”, que se passa no Grande Bom Jardim, composto por 5 comunidades com mais de 200 mil habitantes, destaca-se também a falta de planejamento da cidade para suportar as comunidades e receber empreendimentos de grande importância para a economia do município.

Neste contexto, são alguns dos problemas vividos diariamente na comunidade devido à inexistência de estradas ou ruas para a passagem de transporte público e de coleta de lixo e com isso também, não entra as ambulâncias para atendimentos de emergências.

Conforme foi mostrado no Episódio, 83,3% das Políticas Públicas não estão institucionalizadas e com isso abre um precedente para que os gestores façam aquilo que melhor provém, isto é, propõe uma forma de discricionariedade fora dos padrões propostos no ordenamento jurídico brasileiro.

Foram criados os instrumentos como a Zona Especial de Interesse Social (ZEIS), destinadas à moradia digna para a população da baixa renda por intermédio de melhorias urbanísticas, recuperação ambiental e regularização fundiária, que tem a participação da população com o objetivo de organizar a comunidade e fazer acontecer a regularização do Plano Diretor, junto a Comissão Permanente de Avaliação.

Criado em 2009 o Plano Diretor que dirige o crescimento da cidade, tem por princípios fundamentais da Política Urbana, as funções socioambientais da cidade, a função social da propriedade, a gestão democrática da cidade e a equidade, entretanto, ainda não foi regulamentado.

O Plano Diretor também possui funções priorizando o direito à cidade, entendido como o direito à terra urbana, à moradia digna, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte, aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.

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Ao que tudo indica, nenhuma dessas funções vem sendo cumpridas até o presente momento, pois, existem fatores como as técnicas jurídicas que são acompanhadas de política, o que dificulta em muito o progresso da cidade em relação aos direitos fundamentais. Existem interesses que não estão voltados para o bem-estar social onde a discricionariedade do Estado, tendo em vista uma cultura de partidarismo onde cada quer deixar sua marca política, vem ignorando os problemas vividos na cidade.

Vale ressaltar que antes de começar qualquer obra particular ou qualquer projeto habitacional para atender as comunidades carentes do Bom Jardim, deve-se investir em projetos de urbanização com o fito de regulamentar a comunidade assegurando a todos uma moradia digna, atendendo-os em sua essencialidade como a educação, saúde e segurança.

Outra comunidade em destaque é a Raízes da Praia, consolidada há 7 anos como mostra no Episódio 04 – “Vazio Ocupado”, onde existem ali cerca de 80 famílias, considerando que 40% da população vivem em assentamentos através da ocupação, sendo que a metade do terreno foi concedida para esta comunidade. A área se encontrava abandona por mais de 10 anos e um dos obstáculos está relacionado ao não cumprimento da função social da propriedade e com isso gera direitos violados na questão do acesso à moradia.

Instrumentos como a ZEIS1 e o usucapião se fazem presentes na questão, porém, o grande contratempo que se encontra é que as pessoas não tem acesso as terras e os preços dos alugueis na cidade são muito caros, portanto, as pessoas não tem onde morar ocasionando-se em uma ocupação desordenada, que foram as formas naturais encontradas por elas para resolver este conflito.

Mas, existe também uma questão que chama atenção que são os prédios públicos abandonados, que no ponto de vista da função social da propriedade há uma característica de violação à própria Constituição quanto no sentido de direitos humanos e aí se estabelece mais uma vez os interesses do Poder Público, considerando ele mesmo teria que arcar com os próprios recursos para atender essas pessoas.

Outro assunto importante do ponto de vista ambiental, são as licenças ambientais na região litorânea, onde fica localizada a comunidade Raízes da Praia e o que se pergunta sobre isto é se realmente as licenças ambientais foram ou não devidamente liberadas, ou se foi mais uma questão política envolvendo os interesses particulares e por ora, interesse dos gestores.

Para tanto, é essencial a existência de políticas públicas com objetivos de dar condições para que as comunidades possam ser regulamentadas e em consequência disso, as obras futuras também possam ser concretizadas com sucesso sem violações de direitos e principalmente de deveres envolvendo o público e o particular.

Por último, o Episodio 05 - “Operação Urbana”, mostra a situação vivida pelos moradores da comunidade de Pau Fininho, onde a preservação da Lagoa do Papicu deveria ser uma das prioridades a ser respeitada em decorrência da instalação de um shopping e de algumas torres residenciais que por sua vez, ocasionou-se em uma remoção das famílias e para atendê-las, deveria acontecer um investimento de um conjunto habitacional que contaria com 75 unidades.

Um dos instrumentos agregado no local é a Operação Urbana Consorciada onde a prefeitura cedeu o terreno para a construção de um shopping e uma delegacia, entretanto, a bem da verdade o que ocorreu mesmo foi o descaso do Poder Público devido a falta de fiscalização em parceria com a omissão pactuado pelo setor privado, pois não houve o cumprimento das medidas previstas para a execução da obra.

Sob o aspecto econômico existente em decorrência desse empreendimento são os lucros que foram auferidos em favor do setor privado que atingiu uma média de 4000%, de outro lado, o cofre público ficou com somente 4%, ou seja, quase que nada para resolver os problemas que a cidade possui. Diante disso, uma questão alarmante é saber até que ponto uma obra dessa traz benefícios para cidade e sem adentrar no mérito desta preocupação, nos faz imaginar que alguém saiu lucrando com tudo isso e podemos deduzir que a população carente não foi contemplada com isso.

Ademais, não restam dúvidas de que existe ali um projeto para construir o tal empreendimento e não um projeto para as melhorias da cidade, isto é, uma promessa foi lançada, os interesses foram aguçados e mais uma vez a população se encontra vulnerável dada à importância política.

Com isso, se torna uma questão extremamente relevante uma vez que ali existem pessoas vulneráveis por desconhecerem seus direitos e em virtude das obras paralisadas ocorre um descaso do Poder Público para com a própria comunidade, bem como para a cidade e também acaba afetando o país, pois oneram os cofres públicos onde a população acaba por ter que pagar esta conta.

Desse modo, diante das violações de direitos e descumprimentos de medidas estabelecidas entre o Poder Público e o particular, ou seja, os empreendimentos ali construídos, em nenhum momento não se pensaram se tais empreendimentos seriam viáveis ou relevantes para o município em relação à comunidade.

Para tanto, o direito de moradia digna deve estar relacionado com os interesses de todos e em consonância com o que prevê o Estatuto da cidade, pois o que mais interessava ali não foi em nenhum momento discutido, e se foi, simplesmente não foi regulamentado, isto é, Administração Pública viola as leis em prol dos seus próprios interesses sem se preocupar com o que foi definido para o bem da coletividade.

O que se percebe diante dos problemas elencados neste trabalho elaborado pelo LEHAB são as obras inacabadas e a falta de regulamentações em todos os sentidos, que acarretou prejuízos tanto para o erário quanto para as pessoas que vivem nas comunidades ao redor dessas obras, mesmo com a existência de instrumentos como o Estatuto da Cidade, Lei n.º 10.257/01 que prevê já em seu artigo 1º, p. único na qual 

“estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental”.

Por fim, tratar desses assuntos públicos requer o conhecimento de todos os envolvidos e isso depende também da participação popular uma vez que se trata de direitos incluindo a moradia e a responsabilidade efetiva das autoridades, sendo esta a gestora que possui funções tais como o estabelecimento de normas de ordem pública e interesse social incluindo o planejamento da cidade.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei n. 10.257 de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 11 de julho de 2001. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm> Acesso em: 24 jun. 2017.

BRASIL. Observatório das Metrópoles. Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia. Disponível em: <http://observatoriodasmetropoles.net/index.php?option=com_k2&view=item&id=1529%3Acartas-urbanas-uma-webs%C3%A9rie-sobre-direito-%C3%A0-cidade&Itemid=164&lang=en#> Acesso em: 24 jun. 2017.

FORTALEZA. Direito à Cidade. Zonas Especial de Interesse Social. Disponível em:< https://legislacaoufc20141.wordpress.com/2015/06/18/zeis/> Acesso em: 24 jun. 2017.

FORTALEZA. Lei Complementar nº 062, de 02 de fevereiro de 2009. Institui o Plano Diretor Participativo do Município de Fortaleza e dá outras providências. Disponível em: <http://legislacao.fortaleza.ce.gov.br/index.php/Plano_Diretor> Acesso em: 24 jun. 2017.

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