1 Introdução
A Medida nº 739/2016, substituída pela MP nº 767/2017, convertida na Lei nº 13.457/2017, altera a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, no que concerne à revisão administrativa de benefícios por incapacidade laboral concedidos na via administrativa ou judicial. Neste breve artigo, pretendo discutir as possibilidades e as consequências jurídicas da cessação administrativa dos benefícios de Auxílio Doença e Aposentadoria por invalidez concedidos na via judicial.
Para este desiderato, analisarei a atual jurisprudência sobre o cancelamento administrativo de benefícios por incapacidade concedidos judicialmente e os reflexos da nova disciplina legal, visando a sedimentar a construção teórico-prática de novos paradigmas que, ao mesmo tempo, contemplem tanto a necessidade de se evitar a perenização de benefícios indevidos como a cessação daqueles em que não houve a recuperação da capacidade laboral diagnosticada por avaliação médica isenta.
Como pano de fundo, ao lado do problema social que se avizinha, tem-se o risco grave de hiperjudiciarização dos conflitos inerentes às cessações, comprometendo a capacidade de julgamento da Justiça Previdenciária. Alvitra-se, para uma tentativa de racionalização, algumas possibilidades de medidas a serem adotadas pelos segurados afetados e soluções judiciais concernentes aos seguintes temas centrais: direito intertemporal, alta programada, cessação por simples decurso de prazo (120 dias), duração do benefício com quesito obrigatório das perícias, hipóteses de fixação do prazo de duração do benefício, cessação administrativa e garantias do segurado (contraditório, ampla defesa e fundamentação do ato administrativo), bem como possibilidades de atuação judicial para a composição conflito entre as avaliações médicas.
2 O estado da arte da jurisprudência sobre a cessação administrativa de benefícios concedidos judicialmente
A Medida nº 739/2016, substituída pela MP nº 767/2017, convertida na Lei nº 13.457/2017, ao alterar a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, tem como objetivo reduzir os gastos da Previdência Social com o custeio indevido de milhares de benefícios pagos a indivíduos que, nada obstante tendo recuperado sua capacidade laborativa, persistem recebendo benefício previdenciário por incapacidade, à míngua de revisão administrativa.
O mesmo caráter rebus sic stantibus ("estando assim as coisas") que permite ao segurado voltar em juízo para obter o benefício negado em uma primeira ação, também autoriza o seguro social a revisar eventual benefício, mesmo que concedido na via judicial, quando o segurado recuperar a sua capacidade laboral.
A primeira questão amiúde controvertida diz respeito à possibilidade ou não de cancelamento na via administrativa do benefício concedido judicialmente. O tema está polarizado, exigindo o STJ, ao contrário dos TRFs, a ação revisional, em razão do princípio do paralelismo das formas (AgRg. no REsp. 1221394/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, 5ª Turma, julgado em 15.10.2013, DJe 24.10.2013).
O entendimento mais consentâneo com a natureza dos benefícios previdenciários de auxílio doença e aposentadoria por invalidez, é no sentido da prescindibilidade de ação judicial para o cancelamento de benefício concedido na via judicial, bastando o processo administrativo em que seja realizada a perícia para averiguação da persistência ou não do estado de incapacidade laboral.
Na relação jurídica continuativa, típica dos benefícios por incapacidade, sobrevindo modificação no estado de fato ou de direito, não ofende a coisa julgada a revisão de benefício concedido judicialmente, desde que obedecido o devido processo legal. Não é razoável que o Estado tenha que pagar por anos um benefício cujos pressupostos fáticos esmaeceram, até que uma decisão judicial trânsita em julgado assim reconheça (TRF4, Apelação Cível em MS nº 5009618-41.2015.4.04.7102/RS, 5ª Turma, unânime, Rel. Des. Fed. Paulo A. B. Vaz, j. 05/07/2016).
A jurisprudência do TRF4 tem dispensado ação judicial por parte do INSS para o cancelamento de benefício concedido judicialmente, mas exige o trânsito em julgado da decisão concessória (TRF4, APLREEX nº 5003587--87.2015.4004.7100, 5ª Turma, Rel. Luiz A. Bonat, juntado aos autos em 09/03/2016).
Essa jurisprudência, condicionando a revisão ao trânsito em julgado, foi construída defensivamente em cima de uma patologia do sistema judicial que é a demora na tramitação dos processos. Como o processo leva em média 3 (três) anos para chegar ao termo final, autorizar-se a revisão a cada seis meses geraria muita instabilidade e sucessivos pedidos de cancelamento e restabelecimento de benefícios, que somente poderiam ser decididos por nova perícia judicial. Principalmente nos casos de antecipação da tutela, em que a perícia judicial é realizada, em média, apenas 6 (seis) meses depois da concessão do benefício. Antes mesmo da perícia, ter-se-ia a possibilidade de cancelamento administrativo do benefício.
Eis o dilema: condicionar ao trânsito em julgado e correr o risco de pagar o benefício indevido por longo tempo ou não condicionar e correr o risco da insegurança enquanto a decisão não transita em julgado? Convém lembrar que na Justiça Estadual Delegada é comum processos de concessão de benefício por incapacidade ou vulnerabilidade demorarem 6 ou até 7 anos para que aconteça o trânsito em julgado da respectiva sentença.
3 A nova disciplina legal da cessação administrativa de benefícios concedidos na via judicial: revisão administrativa e alta programada
Fixado o estado da arte no campo jurisprudencial, passo ao exame do novo regime jurídico instituído pelas MPs nº 739/2016, 767/2017 e Lei n° 13.457/2017.
O art. 1º confere nova redação ao § 4º do art. 43 da Lei nº 8.213/91: “O segurado aposentado por invalidez poderá ser convocado a qualquer momento para avaliação das condições que ensejaram o afastamento ou a aposentadoria, concedida judicial ou administrativamente, observado o disposto no art. 101”.
O art. 101 da Lei nº 8.213/91 disciplinava a obrigação de se submeter o segurado à reavaliação, mas silenciava sobre os benefícios concedidos na via judicial, sendo o assunto, como referido no item anterior, amplamente controvertido jurisprudencialmente.
O § 8º do art. 60 recebeu a seguinte redação: “Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício”.
Esta nova redação desafia a jurisprudência já pacificada sobre a chamada “alta programada” que, depois de rechaçada a primeira tentativa feita por decreto, ganha espaço no texto da Lei de Benefícios. Os tribunais entendiam que a suspensão do benefício de auxílio-doença somente era possível após a realização de perícia médica administrativa atestando a cessação da incapacidade da parte autora para o trabalho.
A gramática do novo texto traz uma recomendação de fixação do termo da incapacidade e cessação do benefício dirigida ao perito administrativo e judicial nos laudos periciais, à autoridade administrativa concessora e ao juiz no processo judicial.
A não fixação do prazo pode gerar insegurança para ambas as partes, mas, via de regra, decorre ela da incerteza intrínseca à natureza da incapacidade. As patologias incapacitantes, quanto à sua evolução no tempo, podem estabilizar-se, perder intensidade e regredir ou agravar-se, como sói acontecer nos países pobres, em que os serviços de saúde pública não funcionam a contento.
Na práxis, conquanto deva ser incentivada, a tarefa de definir a priori o momento da recuperação da capacidade laboral do segurado é inglória e, em certos casos, até mesmo impossível, como vem reconhecendo a jurisprudência. “A alta programada não passa de um exercício de futurologia, haja vista cada segurado possuir um tempo específico de recuperação” (TRF1, 1ª Turma, AMS 13546 MT 0013546-46.2008.4.01.3600, Des. Federal Amilcar Machado, DJDF 19/05/2010).
Seria simplista a afirmação de que a Administração não poderia interferir no alcance da decisão judicial. A revisão é corolário da natureza continuativa da relação jurídica entre segurado e Previdência Social, encontrando fundamento legal no § 10 do art. 60 (auxílio doença) e no § 4º do art. 43 (aposentadoria por invalidez), ambos da Lei de Benefícios. Faz-se remissão ao que ficou assentado no item anterior quanto à exigência de ação própria e condicionamento ao trânsito em julgado da decisão concessória do benefício.
Outra questão é se o novo texto legal poderia ter corrigido a jurisprudência dominante. A ratio decidendi que levou a jurisprudência a rechaçar a “alta programada” foi de ordem formal e também material. Sustentou-se ora que a cessação do pagamento do benefício previdenciário de auxílio-doença através do simples procedimento de "alta programada" viola o art. 62 da Lei 8.213/91 (TRF1, 2ª Turma, AC 200638000022384/MG, j. 09/10/2013), ora que fere o direito subjetivo do segurado, baseado na Lei de Benefícios, de ver sua capacidade laboral reconhecida por perícia médica (TRF4, AC n. 2006.70.00.010597-5, Turma Suplementar, j. 28.02.2007, DJ 19/04/2007), ora que não se pode presumir a recuperação de capacidade laborativa, pura e simplesmente, em razão do decurso de determinado prazo (TRF4, AC n. 2006.70.00.017889-9, 6ª Turma, j. 02/05/2007, DJ 18.05.2007).
O certo é que a recuperação da capacidade laboral presumida ou por decurso de tempo foi ressuscitada a partir da MP n° 739/16, depois de ter sido desacolhida na jurisprudência dos tribunais.
Embora seja admissível e mesmo necessário, no Estado Democrático de Direito, o instituto do “controle recíproco” entre os três poderes (freios e contrapesos), também chamado “correção legislativa da jurisprudência”, existem limites que a novel disciplina olvidou. O radical repúdio à interpretação judicial, pela edição de texto legal intencionalmente contrastante com a jurisprudência, poderia ter se dado se houvesse no novo texto, a correção do vício que levou a jurisprudência a reconhecer a norma írrita à ordem jurídica como um todo.
Suprir a ausência de previsão legal não seria suficiente, pois o problema é também de ordem lógica, sistêmica e, sobretudo, de ferimento dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, devido processo legal, contraditório e fundamentação razoável. De qualquer sorte, fatidicamente, as MPs 739/767 e a Lei 13.457/17 mantiveram, com sutil modificação quanto à reabilitação para a “mesma atividade”, a redação do antigo art. 62 da Lei de Benefícios de onde se extrai a exigência de constatação factual da recuperação da capacidade laboral.
4 A fixação judicial da data de duração do benefício: possibilidade e hipóteses
A mais revolucionária e polêmica mudança operada está na nova redação dada ao § 9º do art. 60: “Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8º deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação junto ao INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62”.
A primeira observação, que já encontra respaldo jurisprudencial, é no sentido de que a novel sistemática somente se aplica aos benefícios concedidos depois da MP 739, de 07.07.2016 (TRF4, Remessa Necessária Cível nº 5018505-50-2016.2.04.7208/SC, Turma Regional Suplementar, Rel. Desembargador Federal Celso Kipper, j. 03.08.2017).
Mesmo que ressalvada a hipótese de impossibilidade de fixação do termo final da incapacidade e do benefício, a consequência da não fixação, segundo o texto, será a consideração de um prazo estimado pelo legislador de cento e vinte dias, contados da data de concessão ou de reativação. É dizer, se o juiz não fixar o prazo para a alta, este prazo será presumido: cento e vinte dias. O segurado pode elidir a presunção requerendo a prorrogação na via administrativa. Será então submetido à perícia e, se constada a persistência da incapacidade, o benefício será prorrogado.
É necessário distinguir entre a cessação por simples decurso de prazo e fixação do prazo de duração do benefício mediante avaliação médica e elementos concretos.
No que concerne à fixação do prazo de duração do benefício, conquanto não esteja o juiz obrigado, porque isso vai depender da situação concreta e, acima de tudo, do resultado da avaliação médica, não representa que o juiz não possa fazê-lo se a perícia judicial assim o definir, mesmo que não fique vinculado ao laudo se tiver outros elementos suficientes para superá-lo, como reconhece a jurisprudência.
Na hipótese em que o laudo fixa a data de duração do benefício, esta previsão será um dado técnico, em princípio, relevante e acreditado, como todo o mais que consta da perícia judicial realizada por um profissional equidistante e tecnicamente capacitado. Não há motivos apriorísticos para refutar a conclusão técnica contida na perícia.
À parte interessada cumpre impugnar o laudo, exercendo o contraditório, se entender que a conclusão do perito está equivocada. Se o juiz supera a impugnação e fixa na decisão a data da recuperação da capacidade, seguindo o laudo pericial, abre-se a oportunidade para o recurso, ficando também respeitado o devido processo legal.
A partir da previsão da nova redação do § 8º do art. 60 da LB passa a ser importante que os peritos judiciais informem ao juiz a data estimada em que o periciando virá a recuperar sua capacidade laborativa. O prazo de duração do benefício torna-se um quesito necessário nos laudos periciais produzidos no processo judicial, assumindo relevância porque a informação será indispensável para que o magistrado, se assim entender, possa fixar o prazo estimado de cessação do benefício. Sendo omisso o laudo, deverá o juiz intimá-lo para complementar a perícia ou, excepcionalmente, ater-se aos documentos médicos juntados pela parte para estimar, conforme a precisa dicção do parágrafo 8º, sempre que possível, um prazo de duração do benefício.
Com isso, não se está afirmando que a sentença concessória de benefício por incapacidade deva ser automaticamente reformada quando não fixa o prazo de duração do benefício. Absolutamente. Tem-se aqui diferentes situações: 1. questão de direito intertemporal. Somente as sentenças proferidas depois do advento da MP 739, de 07.07.2016 é que precisam conter o prazo de duração do benefício; 2. ausência ou não de elementos concretos nos autos (estimativa do perito ou outra avaliação médica) que autorizem a fixação do referido prazo. Estando fundamentado e razoável o argumento recursal do INSS, conforme a natureza da patologia, poderá o relator do processo, ou a turma, determinar a baixa em diligência dos autos para que o perito complemente a perícia informando o prazo de duração do benefício.
5 Duração do benefício definida exclusivamente por decurso de prazo (120 dias): possibilidades de provocação e resposta judicial
A cessação do benefício diante do simples decurso de prazo é inaceitável por falta de adequada racionalidade. Tem-se flagrante violação de princípios constitucionais, principalmente o contraditório, a ampla defesa e o dever de fundamentação e motivação do ato administrativo.
Sim. Há um ranço de inconstitucionalidade na leitura da nova redação do § 9º do art. 60 da LB, antes referido, quando fixa o prazo máximo (cento e vinte dias) para a cessação do benefício de modo a operar efeitos independente de avaliação médica, invertendo o ônus de provar a incapacidade, que passa a ser do segurado, a despeito de contar com um laudo pericial judicial de incapacidade a seu favor. Uma interpretação do novel texto legal conforme a Constituição e mesmo outros dispositivos da Lei de Benefícios, de maneira a tangenciar a cláusula de reserva de plenário (Súmula vinculante nº 10 do STF), coloca a exigência da perícia administrativa como antecedente necessário à cessação do benefício.
A inteligência e a leitura que podem salvar da inconstitucionalidade e da ilegalidade o citado § 9º do art. 60 da LB supõem que a iniciativa da realização de nova perícia, no prazo de cento de vinte dias contados da concessão ou reativação do benefício, seja do INSS. Sem a nova perícia, não poderá haver a cessação. Consoante já reconheceu a jurisprudência do TRF4, “à Autarquia Previdenciária não é lícito cancelar de imediato o benefício por incapacidade antes de periciar o segurado e concluir por sua recuperação” (TRF4, Remessa Necessária Cível nº 5018505-50-2016.2.04.7208/SC, Turma Regional Suplementar, Rel. Desembargador Federal Celso Kipper, j. 03.08.2017).
De qualquer sorte, este entendimento apenas inverte a ordem das coisas. Mesmo que realizada a perícia, e tendo sido indeferido o pedido de prorrogação, tal circunstância (a prévia perícia) não impedirá a extremada judiciarização. Certamente, as perícias administrativas, feitas mediante o regime de mutirão e mediante o Bônus Especial de Desempenho Institucional por Perícia Médica em Benefícios por Incapacidade, previsto na novel disciplina legal, tendem a ser superficiais e arbitrárias, até mais do que até hoje têm sido. Basta consultar as estatísticas de cancelamentos já operados. Caberá à Justiça Previdenciária dizer se a cessação foi adequada ou não.
Veja-se ainda, para arrematar, que a leitura do § 9º do art. 60, dispensando a prévia perícia, está em antinomia com o § 10 do art. 60: "O segurado em gozo de auxílio-doença, concedido judicial ou administrativamente, poderá ser convocado a qualquer momento para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção, observado o disposto no art. 101 desta Lei". Com efeito, a exigência de avaliação, no caso de incapacidade para o trabalho, tem como pressuposto o exame médico pericial.
Consoante dispõe o § 11 do art. 60, “O segurado que não concordar com o resultado da avaliação da qual dispõe o § 10 deste artigo poderá apresentar, no prazo máximo de trinta dias, recurso da decisão da administração perante o Conselho de Recursos do Seguro Social, cuja análise médica pericial, se necessária, será feita pelo assistente técnico médico da junta de recursos do seguro social, perito diverso daquele que indeferiu o benefício”. O recurso em questão não tem efeito suspensivo e a avaliação pericial será realizada pelo assistente técnico do INSS. Assim, não se pode exigir do segurado que se considera ainda incapaz que aguarde o desfecho do recurso para só então postular na via judicial o restabelecimento do benefício.
Na prática, o cenário que se projeta é o seguinte:
Hipótese 1. benefício cessado sem realização de avaliação pericial no prazo de 120 dias. Possibilidade de impugnação do ato administrativo nos autos do processo em que foi concedido o benefício por vício formal: violação aos princípios do contraditório, ampla defesa e fundamentação obrigatória. Hipótese de restabelecimento sem realização de avaliação médica.
Caso a cessação ocorra sem a realização da perícia, conquanto o ato administrativo padeça de vício formal, é aconselhável que o segurado, antes de noticiar o fato ao juízo, para restar bem caracterizada a pretensão resistida, requeira a prorrogação do benefício na forma da parte final do § 9º do art. 60. Com isso, o juízo poderá cotejar os laudos e até, em casos flagrantes, dispensar o novo exame pericial.
De qualquer sorte, para atenuar a sobrecarga de trabalho na jurisdição previdenciária, será possível dispensar o novo exame pericial nos casos em que se revele evidente a incapacidade, pela natureza da patologia, ou a superficialidade do laudo do assistente técnico do INSS. Ainda poderá o magistrado dispensar uma nova perícia quando o segurado apresentar laudo médico particular que ateste a persistência da incapacidade (art. 464, § 1º, II, do NCPC). É possível também ao juiz determinar a realização de prova técnica simplificada (art. 464, §§ 3º e 4º, do NCPC), apenas para solucionar a dúvida acerca da incapacidade.
Hipótese 2. benefício cessado mediante perícia administrativa, prévia ou posterior ao pedido do segurado. O vício da ausência de perícia fica superado. Caberá à Justiça Previdenciária dizer se a cessação foi adequada ou não, mas isso poderá levar a uma indefinição permanente: perícia judicial reconhece a incapacidade e perícia administrativa não reconhece. Por isso, talvez seja importante, sempre que possível, como única forma de prevenir esta circularidade, a definição da data da recuperação da capacidade.
Assim, estando pendente o processo em que foi concedido o benefício que veio a ser cessado em decorrência de perícia administrativa (hipótese 2), deve o segurado adotar as seguintes providências: 1. buscar uma avaliação de seu médico particular; 2. confirmada a incapacidade, por simples petição nos autos do processo, solicitar ao juízo do processo que consulte o perito judicial sobre a incapacidade, esclarecendo acerca da persistência ou não do estado de incapacidade laboral, diante da recente conclusão da perícia administrativa, fixando a data da recuperação da capacidade ou a impossibilidade de fazê-lo.
Confirmada a incapacidade em laudo firmado pelo expert do juízo, o benefício será restabelecido até a data fixada ou a realização de nova perícia. Caso contrário, deverá ser mantida a cessação administrativa.
6 conclusões articuladas
1. A cessação de benefício por incapacidade concedido judicialmente, na forma preconizada pelas MPs nº 739/2016, 767/2017 e Lei n° 13.457/2017, com base no decurso do prazo de 120 (cento e vinte) dias (novo § 9º do art. 60 da LB), somente pode ser aplicada aos benefícios concedidos depois da edição da MP 739, de 07.07.2016.
2. O INSS não pode cessar o benefício concedido na via judicial sem a prévia avaliação médico-pericial, sob pena violar os princípios do contraditório, da ampla defesa e da obrigatoriedade da motivação e fundamentação do ato administrativo.
3. O segurado, nesta hipótese, pode (1) requerer a prorrogação do benefício na forma prevista na parte final do § 9º do art. 60; (2) postular diretamente nos autos do processo concessório a invalidação do ato administrativo viciado pela falta de avaliação médica ou (3) solicitar ao mesmo juízo que defina a data real e exata da cessação do benefício mediante parecer médico fundamentado.
4. É possível, e mesmo recomendável, como mecanismo de prevenção de benefícios indevidos, que o juiz defina, nos casos em que for possível, a data provável da cessação da incapacidade, preferentemente, a partir de resposta necessária a quesito pericial (novo § 8º do art. 60 da LB).
5. O juiz não está obrigado a fixar a data da duração do benefício se ausente nos autos avaliação médica fundamentada estimando a data da recuperação da capacidade laboral do segurado, estabelecido o contraditório sobre a conclusão.