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Súmula 219 do TST: desvalorização do advogado e a restrição ao acesso a justiça do hipossuficiente

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Agenda 01/01/2018 às 13:00

Aspectos relevantes da aplicação da Súmula 219 do TST, e seus questionáveis reflexos para o advogado trabalhista e para o trabalhador, que sofreu restrição em seu acesso à justiça de forma igualitária.

RESUMO: O presente artigo se propõe a analisar os prejuízos causados pela aplicação da Súmula 219 do TST, ao trabalhador, restringindo seu acesso à justiça de forma igualitária e corroborando com a desvalorização do advogado trabalhista, criando requisitos para o recebimento de verbas honorárias sucumbenciais, vinculando o trabalhador ao seu respectivo sindicato de classe, impedindo que o hipossuficiente possa escolher quem melhor patrocine sua reclamatória, pois caso abra mão da assistência sindical, perderá ainda mais dos seus proventos, já suprimidos pelo empregador,. Busca o pesquisador demonstrar que a Súmula em questão serve apenas para monopolizar os sindicatos e retirar a essencialidade constitucional do advogado, bem como suprimir as verbas reconhecidamente alimentares, dificultando ao advogado sua subsistência e de sua família, por outro lado, fechando as portas do judiciário trabalhista para o hipossuficiente, que não poderá sem prejuízos de seu sustento, escolher seu advogado.   

Palavras-Chave: Honorários sucumbenciais. Súmula 219 TST. Implicações. Advogado. Hipossuficiente.   


INTRODUÇÃO       

Nas diversas áreas do direitos a “contraprestação econômica paga em favor do profissional liberal, pelos serviços técnicos por ele prestados” é chamada de honorários advocatícios (OLIVEIRA, 2007, p. 2).

O artigo 22 da Lei 8.906 (Brasil, 1994) assegura, aos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil, o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento e aos de sucumbência pela prestação de serviço profissional.

Os honorários advocatícios são contratuais quando há um acordo entre o advogado e o cliente, por arbitramento quando são fixados por um juiz e, os sucumbências consistem simplesmente na obrigação sentencial do pagamento dos honorários pela parte vencida na demanda.

Todavia, na seara trabalhista, para a percepção dos honorários de sucumbência por parte do advogado deve-se analisar os requisitos trazidos pela súmula não vinculante de nº 219 do Superior Tribunal do Trabalho.

E, neste cenário, que fará uma analise das implicações, interpretações e prejuízos causados pela sumula 219 do TST, tanto para o advogado quanto para trabalhador, num contexto em que, de lado, a Constituição Federal de 1988, mais precisamente em seu artigo 133, que assegura ser o advogado indispensável à administração da justiça e do outro, a figura do jus postulandi que, de acordo com a súmula 425 do TST, permite ao trabalhador, com limites, postular sozinho, ou seja, sem assistência do defensor em demandas trabalhistas.  

Assim, analisar-se-á na pesquisa as implicações e os danos causados pela referida sumula não vinculante, ressaltando entendimentos contrários nos diversos tribunais e varas do trabalho, a fim de demonstrar que, embora  vigente, sua aplicabilidade gera divergências, embaraça a celeridade processual e compromete princípios como o devido acesso a justiça.


1. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

O capítulo abordará, de maneira bastante sucinta, os honorários advocatícios, bem como sua origem e consequente evolução histórica, desde o seu surgimento até os dias atuais, elencando sua diferenciação entre honorários contratuais e sucumbenciais.

1.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA

A profissão de advogado é bastante antiga, porém imprecisa. Não se sabe ao certo onde e quando nasceu o primeiro causídico da história, entretanto, diante de inúmeras fontes históricas sobre o assunto, resolveu optar o pesquisador por aquela que pareceu mais confiável no que concerne aos honorários, a fim de buscar clareza e objetividade ao assunto. 

Foi no governo de Justiniano, no século VI a.C, que se originou o instituto dos honorários. Entretanto, quem exercia o munus, ou seja, a função, exercia  de forma não profissional, e tão somente por suas excelentes oratórias, por receber eles as honras, como bem preceitua o nobre escritor Fernando Jacques Onófrio:

No organismo judiciário romano, a advocacia objetivava antes de tudo o gaudio espiritual, as honrarias e, até mesmo, o reconhecimento de dotes artísticos.Nessa época, a profissão era composta apenas por pessoas das altas classes sociais que poderiam prestar seus serviços em troca de prestígio e favores políticos, sem receber qualquer quantia em pecúnia, (ONÓFRIO, 2005, p. 43).

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Ademais, nesta mesma linha, tem a conceituação feita por Gisela Ramos;

O vocábulo "honorário" tem origem latina e seus primeiros registros remontam à Roma Antiga. Derivado do latim honorarius, cujo radical honor também dá origem à palavra honra, o termo tem sua acepção clássica traduzida como sendo toda a coisa ou valor dado em contraprestação e que é recebida em nome da honra, sem conotação pecuniária. Isso acontecia, nos primórdios, porque o recebimento de honorários como forma de pagamento não fazia parte dos objetivos do indivíduo que exercia a função de advocatus. Tais indivíduos agiam de maneira não profissional e exerciam o munus como forma de arte, apenas para receberem o reconhecimento público pelos seus dotes intelectuais e oratórios (RAMOS apud OLIVEIRA, 2003, p. 426).

Naquele tempo, os profissionais da advocacia recebiam seus honorários em forma de reconhecimento público, ou seja, não existia uma conotação pecuniária nos honorários, e sim uma troca de favores, buscando uma ascensão social, tendo em vista ser proibido por lei a cobrança ou o pagamento de honorários, devendo o causídico contentar-se apenas com os emolumentos, como nos ensina Orlando Venâncio;

No Direito Pátrio, à época das Ordenações, o advogado era oficial do foro, exercendo um ministério público; assim, não era remunerado pelos cofres públicos, tampouco poderia ajustar pagamento de seus serviços com os clientes. Devia contentar-se com os emolumentos taxados no regimento de custas. Assim, objetivando coibir a contratação de honorários entre advogados e clientes, normas rigorosas foram aprovadas, entre as quais destaca-se alvará de 1.8.1774, agravando as penas para os profissionais que violassem tal proibição ( SANTOS FILHO, 1998,p31,40)

Conforme demonstrado pelo Ilustre escritor, exercer o sacerdócio da advocacia naquele tempo era tarefa difícil, pois, o profissional da área jurídica não era remunerado, haja vista estarem sob o julgo da lei, que punia severamente quem ousasse descumpri-la.

Vale ressaltar que, naquela época, somente os cidadãos de alta classe social exerciam a profissão de advogado. Somente eles podiam prestar seus serviços jurídicos, o que era feito em troca de prestígio e reconhecimento público, pois, conforme dito anteriormente, a lei proibia o recebimento das verbas honorárias em pecúnia, ou seja, dinheiro.

No decorrer do tempo às coisas mudaram, e o reconhecimento profissional do advogado, bem como sua remuneração, começou a ser aceita. Porém, foi no Império de Claudio que passou a ser permitido ao advogado receber seus honorários em dinheiro, no valor máximo de dez mil sestércios, (ONOFRIO, 2005, p.30).

Quase um século após a criação do Instituto dos Advogados Brasileiros, se criou por força do art. 17 do Decreto n ° 19.408 de 18 de Novembro de 1930, a Ordem dos Advogados do Brasil, assinado pelo então chefe do Governo Provisório Getúlio Vargas e referendado pelo Ministro da Justiça Osvaldo Aranha. (OAB, 2016)

Com a criação da Ordem dos Advogados do Brasil, foi sancionada, em 04 de Julho de 1994, a Lei n° 8.906, Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (EOAB), cujo conteúdo tratava sobre a organização, inscrição, ética e prerrogativas do advogado, e, principalmente, no que tange aos recebimentos de honorários, conforme art. 23 da referida legislação federal;

Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.

Esta legislação trouxe significativa mudança em relação aos honorários advocatícios, pois delimitou de forma imperativa a titularidade e o direito legal ao recebimento de tais verbas, tendo acabado com uma inércia de décadas.

Neste mesmo diploma tem-se o preceito contido no art.22, que assegura ao advogado o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. (EOAB, 1994)

De Justiniano aos dias atuais, embora muita coisa tenha melhorado em relação aos honorários advocatícios, outras mudanças precisam ser feitas, visando a garantir o direito constitucional do advogado.

Ademais, nesta evolução temporal dos honorários advocatícios a Lei n° 13.105/2015, que substituiu a Lei n° 5.869/73, ambas referentes ao Código de Processo Civil, tratou de dar a titularidade dos honorários ao advogado, conforme demonstrado no preceito legal, em seu art. 85, in verbis:“ A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor”.

Essa importante e significativa mudança retirou dos honorários sua natureza ressarcitória, dando-lhe caráter remuneratório, confirmando o preceito contido no art. 22 da Lei n° 8.906/94, conforme bem demonstrou o Ilustre professor e Juiz Federal José Jácomo Gimenes, em seu artigo escrito para Revista consultor jurídico em 17 de outubro de 2016.

Logo no início reconhecem que os honorários de sucumbência tinham natureza ressarcitória no CPC de 1973, portanto, pertenciam à parte vencedora do processo, tendo por função ressarcir o valor gasto pela parte com seu advogado. Apontam que o Estatuto da Advocacia, em 1994, transferiu a titularidade da verba para o advogado, passando a verba a ter natureza remuneratória, confirmada no artigo 85 do novo CPC. (GIMENES, 2016) Grifo nosso.                                                                                      

Fato que era bem diferente no código de processo civil anterior, conforme demonstrado no Art. 20 da Lei n° 5.869/71;

Art. 20. A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Esta verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria.

A titularidade dos honorários era da parte vencedora, e não do advogado, muito embora já existisse lei federal explicitamente demonstrando a titularidade dos honorários. Entretanto, esta significativa mudança na lei direciona para futuras mudanças neste ponto em particular.

É cediço que toda mudança traz consigo uma subjetiva dificuldade de aceitação. Entretanto, algumas se fazem necessárias a fim de equilibrar a balança. Esta recente discussão acerca da titularidade tende a ser pacificada logo em breve, confirmando ao advogado este direito, conforme relata José Jácomo Gimenes;

A situação infraconstitucional está bem certa. Duas leis transferiram a verba para o advogado e parece forte a tendência que esta situação se confirme na jurisprudência, mesmo pendendo no Supremo a ADI 5055-DF, ajuizada contra a transferência dos honorários de sucumbência do vencedor do processo (artigo 20 do CPC anterior) para o advogado do vencedor (artigos 22 e 23 do EOAB). (GIMENES, 2016).

Diante de tantas e importantes mudanças no que tange aos honorários e a classe de advogados, acredita-se que dar a titularidade das verbas honorárias ao advogado foi a mais importante, pois, assegurou um direito constitucional que há muito vinha sendo suprimido. Desse modo, é de se esperar que, na Justiça do Trabalho, aconteça uma revolução na mentalidade dos julgadores.

É inaceitável retirar do advogado esta prerrogativa, e, por mais que a legislação tenha mudado e resguardado a titularidade das verbas honorárias, é necessária uma mudança na mentalidade da sociedade em geral, que, comumente, desvaloriza e menospreza o papel do causídico. A partir do momento em que a sociedade enxergar a essencialidade do advogado dentro da ordem jurídica e democrática, estará iniciando-se um novo tempo para a classe.

1.2 CONCEITO

Os honorários são a contraprestação remuneratória recebida pelo advogado como forma de pagamento pela prestação de serviços jurídicos, podendo ser divididos em duas espécies.

1.3 TIPOS DE HONORARIOS

Este capítulo abordará as modalidades de honorários, bem como suas definições.    

1.3.1 Honorários Contratuais

Na advocacia, comumente são feitos contratos de prestação de serviços, entre o advogado e seu cliente, como forma de assegurar para ambas as partes uma segurança jurídica, tanto para o profissional forense quanto para seu cliente, fazendo nascer o direito.

Os valores, formas de pagamento, percentual e atribuições, são partes integrantes dos contratos feitos entre o advogado e seu cliente. Esta espécie de acordo é que chamamos de honorários contratuais, quando duas pessoas acordam sobre uma prestação de serviço jurídico, seja de orientação, consultoria, e até mesmo para patrocínio de litígio.

A definição de contrato nada mais é que o acordo em que duas ou mais pessoas assumem entre si, com a finalidade de modificar, resguardar, extinguir ou até mesmo transferir direitos, visando sempre à boa fé.

Na renomada conceituação feita pelo Ilustre doutrinador Carlos Roberto Gonçalves, contratos é; 

[...] uma espécie de negócio jurídico que depende, para a sua formação, da participação de pelo menos duas partes. É, portanto, negócio jurídico bilateral ou plurilateral. Com efeito, distinguem-se, na teoria dos negócios jurídicos, os unilaterais, que se aperfeiçoam pela manifestação de vontade de apenas uma das partes, e os bilaterais, que resultam de uma composição de interesses. (GONÇALVES, 2012, p, 25)

Quanto ao fundamento ético do contrato Caio Mario enfatiza que,

[...] é a vontade humana, desde que atue na conformidade da ordem jurídica. Seu habitat é a ordem legal. Seu efeito, a criação de direitos e de obrigações. O contrato é, pois, um acordo de vontades, na conformidade da lei, e com a finalidade de adquirir, resguardar, transferir, conservar, modificar ou extinguir direitos. (Gonçalves 2012, apud Caio Mario, p 25)

A Ordem dos Advogados do Brasil, mais precisamente através do seu Código de Ética e Disciplina, estabelece, em seu Art. 35, a majoração, correção, dentre outras mudanças, que seja por escrito, conforme exposto;

Art. 35. Os honorários advocatícios e sua eventual correção, bem como sua majoração decorrente do aumento dos atos judiciais que advierem como necessários, devem ser previstos em contrato escrito, qualquer que seja o objeto e o meio da prestação do serviço profissional, contendo todas as especificações e forma de pagamento, inclusive no caso de acordo.(OAB,1994)

Tal dispositivo mandamental direciona no sentido de ter advogado e cliente, garantia e segurança quanto à prestação e valores acordados. Portanto, honorários contratuais são aqueles realizados através de um contrato bilateral entre o advogado e o cliente, que contém as clausulas estabelecendo limites e valores, bem como, definindo a atuação a ser desenvolvida.

1.3.2 Honorários Sucumbencias

Ao contrário dos honorários contratuais, que derivam puramente do acordo de vontades, os sucumbenciais derivam da mera sucumbência, ou seja, quando a parte adversa, no litígio, perde a ação, tornando-se sucumbente.

Na definição do dicionário Michaelis, sucumbência quer dizer o ato de sucumbir, o ônus que recai sobre a parte vencida em uma ação de pagar os honorários advocatícios e despesas processuais. (MICHAELIS, 2016).

Dispõe o art. 85 da Lei n°13.105/2015 que a sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. Em outras palavras, determinando que o perdedor, sucumbente, pague ao vencedor na pessoa do advogado, de grosso modo, demonstrando-se o que é sucumbência.

Portando, honorários de sucumbências, são aqueles determinados por sentença condenatória, onde o magistrado delimitará o percentual, podendo ser de 10% até 20%, e serão destinados tão somente ao advogado, conforme assegurado pelo Código de Processo Civil, art. 85 e seus parágrafos.

Portanto, entende-se por necessária a manutenção e aplicação das vigentes e inovadoras legislações, a fim de assegurar ao advogado o direito de cobrar e receber, em todas as esferas judiciárias, seus honorários, por questão de justiça, até porque o advogado tem o papel essencial na sociedade, sendo este direito premissa constitucional, porém, vem sendo interpretado de maneira prejudicial ao advogado.

As verbas honorárias são para o advogado única fonte de sobrevivência, devendo ser respeitada, haja vista, a constante desvalorização e desrespeito ao profissional de direito, que diuturnamente busca, através da jurisdição, sua sobrevivência, deparando-se com magistrados e legisladores frios e sem o menor apreço ao trabalho desempenhado pelo advogado, por vezes, negando-lhe o direito ou, até mesmo, deferindo a verba, em quantias irrisórias, e meramente ilustrativas.

Sobre os autores
Márcio Bezerra

Advogado criminalista, pós graduando em Direito processual penal, militante nas áreas de direito do trabalho e direito penal, membro da comissão de Direitos Humanos da OAB/ES 17 subseção da Serra/ES

Gildazio Klippel

Advogado, Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais Constitucionais.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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