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“Taxa do Lixo” em Campo Grande/MS

verdades e mentiras

Agenda 15/01/2018 às 12:01

Entre a instituição da cognominada "Taxa de Lixo", no município de Campo Grande/MS, muito tem se falado sobre sua possibilidade jurídica e a forma que foi instituída, este artigo procura apresentar apenas mais um posicionamento possível.

“Taxa do Lixo” em Campo Grande/MS – verdades e mentiras

Recentemente presenciamos em Campo Grande, Mato Grosso DO SUL (DO SUL) uma sequência de fatos desde a sua criação por meio da Lei Complementar Municipal nº 308/2017 de 28/11/2017, pois bem, vamos às considerações, a primeira questão que vem à baila é a de a possibilidade jurídica da cobrança desta “taxa”.

Taxas são espécies do gênero Tributo, previstas na Constituição Federal, cujas normas gerais são disciplinadas pelo Código Tributário Nacional. Esta espécie de tributo pode ser cobrada pela prestação de serviços públicos divisíveis e mensuráveis individualmente, ainda que estejam somente potencialmente colocados à disposição dos contribuintes, o que de plano nos permite dizer que é possível cobrança da taxa em questão de proprietários de terrenos sem edificação, desde que o serviço de coleta esteja a estes disponível, independentemente de sua utilização efetiva.

Outra possibilidade de cobrança de taxas é a cobrança pelo exercício do poder de polícia, como por exemplo a emissão de alvarás de funcionamento, não sendo esta, por óbvio a modalidade com a qual estamos lidando.

Há um entendimento dominante que o valor da taxa, deve ser suficiente para a prestação do serviço público, se na prática, o valor corresponder a um valor maior que o necessário, isso configurará o enriquecimento ilícito do ente tributante, difícil é provar tal alegação, pois no caso de Campo Grande, sequer foi disponibilizada a planilha de custos para a prestação dos serviços prevista no contrato atual firmado com a empresa vencedora da licitação.

Com relação à taxa do lixo o Supremo Tribunal Federal -  STF -  já julgou pela sua constitucionalidade, tendo inclusive editado a Súmula Vinculante nº 19, cujo teor é o seguinte:

A taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis não viola o artigo 145, II, da Constituição Federal.

Uma vez aferida a constitucionalidade de sua instituição e cobrança, ainda há outro ponto a ser considerado para aferirmos sua possibilidade, ou seja, como dissemos, a taxa deve, na determinação de sua base de cálculo e alíquotas, confirmar a materialidade de sua regra-matriz de incidência, num claro dizer, deve mensurar com a máxima exatidão possível o quanto cada contribuinte deve pagar para ter o lixo produzido por ele, recolhido e tratado pelo município.

Pois bem, o Mesmo STF, também julgou ser constitucional a adoção de um ou mais elementos da base de cálculo de impostos para o cálculo das taxas, e editou a Súmula Vinculante nº 29, que assim dispõe:

“É constitucional a adoção, no cálculo do valor de taxa, de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não haja integral identidade entre uma base e outra” .

E em julgamentos posteriores, ainda admitiu ser constitucional a cobrança da taxa de coleta de lixo domiciliar com base na área do imóvel, vejamos:

"(...) a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consolidou-se no sentido da constitucionalidade da cobrança de taxa de coleta de lixo domiciliar, com base de cálculo atrelada à área do imóvel."

(RE 971511 AgR, Relator Ministro Edson Fachin, Primeira Turma, julgamento em 14.10.2016, DJe de 4.11.2016)

Como vimos, o STF analisou e julgou a constitucionalidade da cobrança da taxa de lixo, e ainda mais, admitiu que sua base de cálculo possa ser a área do imóvel, por entender que o fato presuntivo da quantidade de lixo produzido esteja atrelado à área do imóvel.

No caso do Município de Campo, além das áreas edificadas e dos terrenos dos imóveis, o município ainda inovou, adotando “novos critérios” de aferição da capacidade contributiva dos contribuintes da referida taxa, num claro dizer, a teor do artigo 7º da Lei Complementar Municipal nº 308/2017, além das áreas do imóvel, devem ser observados os seguintes fatores: “perfil sócio-econômico imobiliário do local do imóvel” no inciso I; o “uso predominante do imóvel” (residencial, comercial, industrial, etc., no inciso II e alíneas.

Aqui parece-nos que reside o grande equívoco da taxa criada, justificando tal assertiva, partimos da premissa que a aplicação do princípio da capacidade contributiva às taxas deve necessariamente ser restrita, pois tal presunção de capacidade contributiva já está, segundo o entendimento do STF, atrelada à área do imóvel.

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Ao inserir o novo elemento identificador, o “perfil sócio-econômico imobiliário do local do imóvel”, o município não obterá nenhum elemento razoável que explique que a quantidade da produção de resíduos sólidos estaria atrelada a esse fator, aliás, muito pelo contrário, em poucas regiões, muitas delas consideradas de alto perfil sócio-econômico imobiliário, é que é realizada a coleta seletiva de lixo, cujo reaproveitamento de material reciclável poderia até reduzir os custos do município.

Melhor sorte não terá o critério do “uso predominante do imóvel”, pois excetuando-se as óbvias situações em que ele se aplica, como na atividade industrial, que, em regra, é grande produtora de resíduos, porém tem seu regramento próprio, é praticamente impossível afirmar que um estabelecimento comercial produza mais ou menos lixo que um imóvel residencial, pois tal afirmação depende necessariamente da atividade comercial, por exemplo, um restaurante ou uma loja de vestuário.

Embora a redação do §1º do art. 145 da CRFB/88 trate da aplicação da capacidade contributiva aos impostos, entendemos que esta não se limita a somente esta espécie de tributo, mas a todas aquelas que compõem o quadro de tributos constitucionalmente previstos, porém, tem que ser aplicada com a devida razoabilidade.

Neste contexto, parece-nos que se o município quiser, de fato, promover uma cobrança qualitativa mediante a instituição de “taxa de lixo”, deveria fazê-lo pela via isentiva, como fez com os templos (artigo 10, da Lei Complementar Municipal nº 308/2017), mantendo um único valor a ser cobrado por metro quadrado, critério este, ‘o único’ já analisado e julgado pelo STF, embora questionável, como apto a aferir a capacidade contributiva dos contribuintes desta taxa.

Campo Grande/MS, 15 de janeiro de 2017.

Plinio Aranha

Advogado especialista em Direito Tributário

Sobre o autor
Plinio Antonio Aranha Junior

Advogado com especialização em Direito Tributário pelo IBET, atuante, preponderantemente, nas áreas cível, tributária e em questões regulatórias, também sou graduado em Administração de Empresas e em Engenharia Elétrica.

Informações sobre o texto

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