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Direito à sustentabilidade das cidades, sob o enfoque do princípio da dignidade da pessoa humana

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Agenda 25/01/2018 às 09:50

O presente trabalho busca uma abordagem sobre o direito das cidades em relação à sustentabilidade como, também, sua proporcionalidade em relação ao principio da dignidade da pessoa humana.

Sumário: Introdução. 1. Breve histórico acerca das cidades e do fenômeno da urbanização. 2. Cidades sustentáveis: um dos grandes desafios do século XXI. 3. Sustentabilidade das cidades no contexto do princípio da dignidade da pessoa humana: direito à cidade constitucionalmente assegurada. 4. Metodologia. Conclusão. Referências.


Introdução

Sabe-se que tratar acerca das cidades leva a uma acepção que reside no sentido de ambiente, espaço e território, que é concebido juntamente com a consequente habitação de pessoas, indivíduos e grupos sociais, que se firmam em determinada área com a finalidade de estabelecer suas respectivas moradias, desenvolver relacionamentos, constituir família, conduzir a própria vida, dentre outros propósitos.

Assim sendo, compreende-se a cidade como ambiente possibilitado a todos, ao passo que também se configura como espaço de cada pessoa. Desta maneira, torna-se necessário que cada um possa respeitar e proteger o espaço onde vive, para que este possa ser saudável para todos e, simultaneamente, para o habitante em sua condição mais individual também.

Considerando, pois, a imprescindibilidade de se destacar os diplomas legais que aduzem o direito à sustentabilidade das cidades, ressalta-se como exemplo a Constituição Federal de 88 e a Lei nº 10.257/01, que se inclinam no sentido de reconhecer a necessidade da observância e efetivação da função social, uma vez que esta auxilia no cumprimento da dignidade da pessoa humana e possibilita à sociedade o direito de participar ativamente da gestão municipal e acompanhar de perto o planejamento urbano, de forma a observar se o mesmo está sendo desenvolvido para dialogar diretamente com o melhor interesse de todos, conforme preconiza o art. 182 da Constituição Federal e o art. 2º da respectiva lei supracitada.

Neste diapasão, o direito às cidades sustentáveis é analisado sob o fundamento que pretende garantir aos seus habitantes o direito a uma palpável qualidade de vida, a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. Em virtude disso, apresenta-se o caráter sustentável das cidades elevado à categoria de direito fundamental assegurado à pessoa humana e efetivamente preconizado pela Constituição de 1988.

Importante frisar que, através deste estudo, intenciona-se relacionar intimamente o direito às cidades sustentáveis e o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana insculpido na Carta Magna de 1988. Destarte, o indivíduo e o espaço no qual está introduzido tornam-se indissociáveis, pois a perspectiva sustentável carrega em seu cerne a tendência para buscar a concretização de melhores níveis de qualidade de vida e a satisfação pessoal de cada habitante que integra um determinado meio.

Logo, é comum manifestar-se por parte destas pessoas a necessidade de um ambiente adequado, que possua condições de abrigar e incorporar no espaço urbano a maior variedade de indivíduos, bem como a promoção de um espaço que se torne útil para responder com efeito às carências emanadas por todos. Em vista disso, urge a indispensabilidade de fazer com que o ambiente urbano se transforme em um espaço apto não somente ao crescimento econômico, mas, sobretudo, ao desenvolvimento econômico, que possui como escopo primário a distribuição equânime dos recursos municipais captados e possibilite o acesso a melhores condições de vida.

Isto posto, evidencia-se o cuidado em assegurar às cidades o direito de estarem imbuídas desse espírito sustentável, que, embora se configure como um dos desafios mais expressivos do século XXI, sobreleva a responsabilidade de pensar em um meio ambiente que esteja plenamente assegurado, protegido e planejado, com vistas ao alcance da urbanificação, caracterizada como meta do direito urbanístico.

Para tanto, inclui-se o tipo de pesquisa bibliográfica, que trabalha a partir de conteúdos disponibilizados em materiais como artigos, livros etc. Elege-se também a pesquisa exploratória, que pretende se apropriar de uma maior quantidade de informações sobre um dado assunto, para propiciar uma visão mais ampla a fim de aproximá-la de determinado fenômeno. Além destas, trabalha-se com a pesquisa qualitativa, tendo em vista o zelo pela qualidade dos dados que estão sendo discutidos no presente trabalho, bem como a pesquisa explicativa, que visa explicar a razão e o motivo de determinados acontecimentos, fatos, dentre outros.

Logo, objetiva-se analisar o direito às cidades a partir de sua vertente sustentável, ou seja, a partir do direito que propõe a sustentabilidade destas cidades, aliando-se ainda a este objetivo a imperiosidade de atrelar essa análise à dignidade da pessoa humana, consagrado como direito fundamental.

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1. Breve histórico acerca das cidades e do fenômeno da urbanização

Consoante o entendimento de José Afonso da Silva apud Daniela Di Sarno (2004), sabe-se que as primeiras cidades surgiram no vale entre os rios Tigres e Eufrates. Automaticamente, o processo de evolução das sociedades fez com que as cidades também acompanhassem esse crescimento e se organizassem de modo a atender as necessidades humanas.

No caso do Brasil, de acordo com DI SARNO (2004), a ocupação do território se deu através das capitanias, funcionando o sistema da seguinte forma: acontecia a entrega de faixas territoriais a pessoas com abundante poderio econômico ou a nobres, que se tornavam os senhores feudais destas terras, para que eles desempenhassem uma função comercial, que era a função recorrente da época. Neste cenário, pontua LEAL (2003, p. 15-16) que “A história de construção das cidades brasileiras aponta para uma trajetória marcada por ações isoladas em defesa dos interesses das elites dominantes, em destaque a elite agrária, já que o seu poderio está diretamente ligado ao fato de que as primeiras cidades, a exemplo de Salvador, Olinda e Rio de Janeiro, surgiram como núcleos coloniais, cujo escopo estava vinculado à defesa e exploração das terras do Brasil, então colônia de Portugal”.

Isto posto, aliado a este sistema de capitanias, a ocupação do território também ia ocorrendo por meio de vilas e cidades, criadas por atribuições oficiais. Em seguida, o modelo das capitanias foi eliminado e Tomé de Souza foi nomeado chefe do Governo-Geral, residindo nas proximidades de Vila Velha, que corresponde, atualmente, ao território da Bahia. Em virtude das atividades desempenhadas no contexto da indústria açucareira, Vila Velha se expandiu com facilidade, tornando-se, então, a cidade mais produtiva e fértil do Brasil, seguida de Pernambuco.

Paralelamente a essa situação, DI SARNO (2014) alega que Piratininga, que nos dias hodiernos equivale ao território de São Paulo, consista na única região que se preocupava com o interior do país. Através da descoberta do ouro na região de Minas Gerais, muitos se interessaram em procurar o local, o que deu início ao processo de urbanização e, consequentemente, provocou a atenção da coroa portuguesa em relação ao Brasil. Assevera ainda que “No século XVIII, metade da produção mundial de ouro foi extraída do Brasil. Isso levou a população dessas cidades a ter luxo e prosperidade, desfrutando de condições muito diversas das do resto do país”. (SARNO, 2004, p. 02).

Deste modo, sabendo que os principais interesses estavam concentrados no Sul, as regiões do Norte e do Nordeste viviam à margem do descaso, existindo apenas para se auto sustentarem. Em seguida, a derrocada da produção do ouro ensejou uma declive na economia do país, que, posteriormente, ergueu sua economia através da produção de café na região Sudeste. Logo, o país começava a vivenciar um crescimento maior, que atraia imigrantes da Europa e concedia espaço amplo à comercialização de escravos.

Os ricos, então, preferiam construir suas respectivas moradias em bairros que se distanciassem de casas populares, que, por sua vez, enfrentavam sérias dificuldades de higienização e saneamento. A eclosão da Revolução Industrial ensejou um grave avanço do crescimento populacional no ambiente urbano, assumindo as mesmas extensões ocorridas na Europa. No entanto, além de incitar a urbanização, este advento também trouxe um contexto desfavorável para as cidades brasileiras, principalmente no que tange às perspectivas políticas e sociais, uma vez que no Brasil já estava solidificada a problemática da desigualdade social e, quanto ao aspecto político, não haviam políticas urbanas denotando um posicionamento que delimitasse e determinasse de que forma o solo e os espaços urbanos poderiam ser utilizados.

Logo, a administração pública teve de intervir nestes ambientes com uma função higienista, pois os problemas se transformavam em agravantes que culminavam em problemas com a alimentação, água contaminada, inexistência de saneamento básico, dentre outros. Esse panorama ocasionou no Poder Público a necessidade de que fossem editadas leis que colaborassem na melhoria deste panorama. A respeito desta realidade, FIORILLO (2009, p. 348) aduz: “Marcado pela necessidade de acomodar quase 170 milhões de seres humanos e convivendo com realidades que apontam a existência de mais de um milhão de pessoas em algumas capitais do país, o Brasil convive com a formação de uma cidade irregular ao lado da regular, obrigado a considerar, nos dias de hoje, uma realidade no campo jurídico que nasce com o regramento constitucional (Constituição Federal de 1988), visando superar as discriminações sociais da cidade pós-liberal e dar a todos os brasileiros e estrangeiros que aqui residem os benefícios de um meio ambiente artificial cientificamente concebido”.

Desta maneira, se extrai o pensamento de que o processo de urbanização agiu como grande impulsionador do Direito Urbanístico, além de reiterar o compromisso que o Constituinte de 88 assumiu ao preconizar a garantia do direito a um meio ambiente saudável e equilibrado.


2. Cidades sustentáveis: um dos grandes desafios do século XXI

Haja vista o panorama do direito às cidades sustentáveis, torna-se imperioso apresentar o entendimento de LEITE e AWAD (2012), os quais aduzem que o desenvolvimento sustentável representa, atualmente, o maior desafio do século XXI. Neste sentido, denota-se a dificuldade que as cidades e seus respectivos planejamentos urbanos enfrentam quanto à implementação de uma mentalidade cultural que possa promover nas pessoas a conscientização de uma maior responsabilidade em relação à forma como preservam as cidades. Através disso, torna-se viável a verificação de uma possível materialização da real essência do espírito sustentável.

Neste sentido, elenca-se, então, o posicionamento defendido por SACHS (1981, p. 14), uma vez que, segundo o seu entendimento, a questão da sustentabilidade “Trata-se de gerir a natureza de forma a assegurar aos homens de nossa geração e à todas as gerações futuras a possibilidade de se desenvolver”. Desta maneira, observa-se que o desenvolvimento sustentável poderá ser alcançado, desde que a sociedade, de um modo geral, possa entender a importância de garantir um ambiente sadio, digno e ecologicamente equilibrado a todas as gerações, inclusive às próximas.

Logo, percebe-se que as cidades sustentáveis são dignas de um volumoso destaque em seu estudo, uma vez que enfatizam um modo de vida que propõe como objetivo principal a adesão de práticas e comportamentos que possam resultar na melhoria da qualidade de vida populacional através do alcance de um desenvolvimento econômico, que também possa estar aliado à finalidade da preservação ambiental. Destarte, as cidades sustentáveis representam cidades organizadas, que estão sendo pensadas a partir de um planejamento urbano realizado com responsabilidade e eficiência. 

Partindo desse pressuposto, nota-se que, atualmente, muitas cidades desejam ser reconhecidas como cidades que promovem e estimulam a sustentabilidade, mas o que ocorre é que elas não conseguem projetar esses parâmetros sustentáveis em seu modo de vida. Assim, ser considerada uma cidade sustentável se tornou o “sonho de consumo” da grande parte das cidades, porém, para algumas delas, a forma de pensar e de buscar essa sustentabilidade ainda se encontra bem distante de sua realidade própria.

Como expõe GADOTTI (2008), é salutar que o desenvolvimento sustentável seja compreendido a partir de uma visão holística, biocêntrica e multidisciplinar, capaz de ensejar um comprometimento a um novo modo de vida, que privilegie a qualidade das condições urbanas e convide os indivíduos à responsabilidade de se viver para proporcionar a sustentabilidade das presentes gerações, bem como assegurar o acesso aos mesmos direitos às futuras gerações.

Percebe-se, portanto, que a sustentabilidade, no ordenamento jurídico brasileiro, é considerada como um valor constitucional. Então, é constitucionalmente assegurado também

o direito às cidades sustentáveis, o qual figura como um direito elevado à categoria de direito fundamental, que preza pela dignidade da pessoa humana. Logo, prossegue GADOTTI (2012) no mesmo entendimento ao aduzir que “Sem uma preocupação social, o conceito de “desenvolvimento sustentável” esvazia-se de sentido”. Dito isso, é imprescindível que haja com maior preponderância uma preocupação socioambiental do que ambiental, uma vez que as necessidades dos seres humanos estão intimamente ligadas às necessidades planetárias. (GADOTTI, 2008, p. 50).

Por conseguinte, pode ser observado que o que rege uma cidade sustentável é a busca incessante pela otimização do ambiente urbano, de maneira que o estímulo à qualidade de vida dos habitantes seja a principal preocupação. Através disso, torna-se primordial agir na melhoria de algumas questões, como a poluição sonora e atmosférica, mobilidade urbana, áreas verdes urbanas, exclusão de resíduos sólidos, economia de água, entre outros aspectos, que juntos possuem o grande potencial de contribuir para a concepção de uma cidade sustentável.

Por sua vez, tais cidades possuem grandiosa conotação por aderirem e estimularem práticas que atrelam a qualidade de vida populacional ao desenvolvimento econômico e à preservação ambiental, o que enseja uma considerável redução dos impactos ambientais, uma vez que a partir de uma consciência mais humanizada em relação aos riscos sofridos pelo meio ambiente, é possível aproximar-se de um panorama que fomente a necessidade de ações sustentáveis em vários espaços urbanos.

Consoante FIORILLO (2014, p. 50), “Constata-se que os recursos ambientais não são inesgotáveis, tornando-se inadmissível que as atividades econômicas desenvolvam-se alheias a esse fato. Busca-se com isso a coexistência harmônica entre economia e meio ambiente”. Logo, salienta-se o interesse de que, em sede de cidades sustentáveis, os habitantes possam pensar o desenvolvimento dos ambientes urbanos de modo a procurar racionalizar os recursos humanos e agir mediante a consciência de que seus atos influenciam diretamente o meio onde vivem e as pessoas que nele vivem.

Para isso, torna-se indiscutível a primordialidade de um planejamento ambiental urbano que proponha o cuidado com a qualidade de vida da geração atual, mas que também se preocupe com as condições de vida das futuras gerações e se elas poderão gozar das mesmas prerrogativas e garantias, dotadas da capacidade de oportunizar uma sadia qualidade de vida.

Dito isso, urge a relevância de uma educação que possa pensar e visualizar a Terra como a única casa, que pertence a cada ser humano, e, por isso, cada um deste se torna responsável pela sustentação do planeta, uma vez que nele habitamos e precisamos assegurar os nossos direitos e exigir de cada habitante e cumprimento de seus deveres.

Sobre o autor
Alisson Hondinelle Oliveira Amorim

Estagiário do curso de direito, Sargento da Policia militar e pós graduado em História.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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