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Solução pacífica de controvérsias internacionais

Agenda 09/02/2018 às 16:32

Dirimir os litígios e solucionar conflitos de forma pacífica deve ser uma prática inerente às relações internacionais que se estabelecem entre os seus sujeitos.

Dirimir os litígios e solucionar conflitos de forma pacífica deve ser uma prática inerente às relações internacionais que se estabelecem entre os seus sujeitos. O artigo 33 da Carta da Organização das Nações Unidas é taxativo nesse sentido.

As partes em uma controvérsia, que possa vir a constituir uma ameaça à paz e à segurança internacionais, procurarão, antes de tudo, chegar a uma solução por negociação, inquérito, mediação, conciliação, arbitragem, solução judicial, recurso a entidades ou acordos regionais, ou a qualquer outro meio pacífico à sua escolha.

Os instrumentos de solução pacífica de controvérsias citados no documento abrangem tanto os não-jurisdicionais quanto os jurisdicionais. Ambos ganharam importância significativa com o complexo de relações que se estabelecem no contexto mundial, onde as controvérsias podem ser resolvidas, primeiro, com a criação e ampliação dos órgãos jurisdicionais; depois, com o aumento da densidade jurídica do processo e das decisões internacionais. Varella acredita que, apesar da autonomia entre os diferentes instrumentos de solução de controvérsias, existe uma forte influência entre eles, o que contribui para uma unidade do direito internacional.

Não havendo hierarquia entre os mecanismos possíveis, ensina Paulo Henrique Gonçalves Portela, os sujeitos acabam podendo escolher livremente dentre as alternativas existentes, podendo indicá-los em tratados ou até defini-los após o surgimento de um conflito. Quer dizer, os Estados em litígio vão escolher a forma da solução pacífica de controvérsias, que pode ser prévia ou mesmo quando surge o litígio.

Define-se "controvérsia" dentro desta matéria como sendo o conflito de interesses de duas ou várias partes. Os meios pacíficos de soluções de controvérsias podem ser agrupados de várias formas, como por exemplo, os meios facultativos (os bons ofícios, as mediação, o inquérito e a conciliação) ou obrigatórios (arbitragem e soluções judiciárias por meio de tribunais internacionais).

Observando os fatos ocorridos em todo século passado (século XX), nota-se que este papel foi mal desempenhado, já que o século XX conheceu duas guerras mundiais e várias centenas de conflitos localizados. Mas em nenhuma sociedade a paz é fundada unicamente no Direito; ela é fruto de uma justiça aceita por todos os seus membros, de valores comuns, de uma solidariedade efetiva, do sentido de interesse comum. Fundamentalmente, tanto nas ordens nacionais como na ordem internacional, a paz não é a simples ausência de guerra: baseia-se na justiça, conscientemente procurada pelos indivíduos e realizada objetivamente pelo Direito e pelas instituições.

Acima de tudo, o Direito e todas as regras modernas de Relações Internacionais são direcionadas à busca da manutenção da paz, diferentemente de qualquer outro momento na história, onde, mesmo se as nações não estivessem interessadas pela guerra, ao mesmo tempo não buscavam arduamente a sua supressão. Ainda assim, é importante atentar que com todos os instrumentos de solução pacíficas de controvérsias, mesmo a ONU que é o órgão supremo de composição existente, não tem poder de coagir duas nações em conflito a sentarem-se e resolverem seus problemas em uma mesa de negociações. Faz-se necessário que as partes tenham a boa vontade de dialogar e estabelecer um entendimento.

O campo das soluções pacíficas de controvérsias internacionais sempre ocupou lugar de destaque no Direito Internacional Público, com um duplo papel: solucionar questões controvertidas entre Estados e servir de prevenção a que estes recorram a medidas extremas.

Um fato a levar-se em conta é que ao longo da História, as soluções eram elaboradas pelos usos e costumes internacionais. O século XX acabou por dar tripla contribuição: propiciou constantes recursos aos meios de soluções pacíficos; tornou possível a constituição de tribunais internacionais permanentes e; desenvolveu a diplomacia multilateral. Esse século também foi dominado pela presença das Organizações internacionais.

Com exceção dos procedimentos perante tribunais internacionais, que são formais e regulamentados, as outras formas de soluções de litígios entre Estados são regidas pelos usos e costumes.

O procedimento mais tradicional é a negociação, realizada por funcionários dos Estados especializados m tais tarefas, os diplomatas. Podem assumir as formas de negociações bilaterais ou multilaterais. Caracterizam-se pela informalidade seguindo os usos e costumes internacionais.

Os inquéritos têm a finalidade de esclarecer os fatos. Implicam o dever de os Estados suportarem a presença de pessoas ou comissões internacionais em seus territórios. Os poderes dos inspetores são minuciosamente tratados em normas especiais.

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Os bons ofícios são procedimentos antigos em que um Estado ou um alto funcionário de organização intergovernamental oferecem seus serviços, sua intervenção ou sua intermediação, em assuntos litigiosos entre Estados. Muito parecido com a mediação, na qual um Estado litigante solicita a intervenção de um terceiro. “os bons ofícios visam a propor uma base de negociações, enquanto a mediação visa antes a propor uma base de acordo”.

Na conciliação os litigantes elegem uma comissão de pessoas não necessariamente neutras, a qual apresentam suas conclusões sobre a questão. Difere da investigação porque permite a possibilidade de que se emitam opiniões valorativas e sugestões aos Estados litigantes.

A arbitragem é um dos mais institutos de soluções de litígios entre unidade políticas autônomas. Um famoso caso é o protagonizado por Estados Unidos e Inglaterra, no qual esse exigia indenização por esta ter tolerado que o navio Alabama e outros fossem aprovisionados de armas em portos ingleses, durante a Guerra de Secessão, em claro auxílio aos rebeldes sulistas. A Inglaterra teve de pagar os danos por violar uma norma de direito internacional. A arbitragem no início do século XX era o grande meio de prevenir as batalhas sangrentas. Com a Conferência de Paz de Haia de 1907, houve a primeira tentativa histórica de tornar a arbitragem um instituto regulado pelas normas de direito internacional.

Foi instituída a Corte Permanente de Arbitragem, CPA, com sede em Haia, sob a égide do Governo dos Países Baixos.

A arbitragem poderia ser definida como o procedimento de solução de conflitos, composto de várias pessoas, em geral escolhidos por sua especialidade na matéria envolvida e portadoras de grande neutralidade e imparcialidade. É importante enfatizar que com o nascimento das integrações econômicas regionais, “as arbitragens entre Estados ganham vida, em particular nos modelos menos supranacionais que as áreas de mercado comum”.

Quanto às soluções de litígios por tribunais internacionais. Sua grande diferença perante as outras formas de solução de conflitos entre Estados reside na “institucionalização de um organismo com funções claras e determinadas, fixadas em documentos internacionais solenes, que prefiguram as hipóteses em que podem ser acionadas”. Sua presença de um corpo de juízes nomeados pelos Estados, para mandatos definidos num estatuto de base, por meio de procedimentos de representatividade universal.

Em 1920, por mandamento do artigo 14 do Pacto da Liga das Nações, instituía-se com sede em Haia, uma Corte Permanente de Justiça Internacional, integrada por 15 juízes, eleitos pelo Conselho e Assembleia dessa organização acima citada.

O Tribunal Internacional do Direito do Mar, instituído pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, adotada em Montego Bay (1982). Já que “um Estado, ao assinar ou ratificar a Convenção, pode escolher livremente, por meio de declaração escrita, para composição dos litígios objeto do tratado, ou a jurisdição da Corte Internacional de Justiça, ou do Tribunal Internacional do Direito do Mar, ou de um tribunal arbitral”.

Quanto ao Tribunal Penal Internacional, firmado pelo tratado de Roma, por 120 países, inclusive o Brasil, a 17/7/1998.

O século XX principiou com instauração de uma organização cimeira nas relações internacionais, a Liga das Nações. Após a Segunda Guerra Mundial, surgiram novos atores, com dupla função: a) intervir como pessoas de Direito Internacional no jogo de forças entre os principais atores, que continuam sendo os Estados; b) de servir de foros em que se exercem as tradicionais formas de soluções pacíficas de controvérsias.Diplomacia é a forma de solução de disputa internacional que visa acordar as partes conflituosas através de negociação, conferência internacional, bons ofícios, mediação ou inquérito. Alguns autores como Adherbal Meira Mattos e Hildebrando Accioly acrescentam o sistema consultivo aos meios diplomáticos. Alguns autores como He Moon Jo e J. F. Rezek acrescentam a conciliação como meio diplomático, ao contrário de Hildebrando Accioly e Adherbal Meira Mattos que colocam a conciliação como meio jurídico. Enquanto a diplomacia é formalmente aplicada somente para as disputas entre os Estados, ela pode ser útil também para as disputas entre as instituições e indivíduos.

Negociação significa chegar a um acordo através do diálogo ou discussão, podendo ser por negociação direta ou por confer6encia internacional. Negociação direta: A grande maioria dos conflitos entre os Estados é resolvida mediante negociação, não sendo esta uma característica exclusiva do Direito Internacional, já que a maior parte das disputas surgidas em qualquer sistema jurídico é também por esse meio solucionada. Logo o meio usual, geralmente o de melhores resultados para a solução de divergências entre Estados, é o da negociação direta entre as partes. Essas negociações variam segundo a gravidade do problema, e nos de somenos importância basta na maioria dos casos um entendimento verbal entre a missão diplomática e o Ministério das Relações Exteriores local. Nos casos mais graves, a solução poderá ser alcançada mediante entendimentos entre altos funcionários dos dois governos, os quais podem ser os próprios Ministros das Relações Exteriores. Na maioria dos casos, a solução da controvérsia constará de uma troca de notas. Como resultado das negociações, poderá ocorrer a renúncia de um dos governos ao direito que pretendia; ou o reconhecimento por ele das pretensões do outro. Num caso, temos a desistência; no outro, a aquiescência. Pode ainda ocorrer a transação, quando ocorrem concessões recíprocas.

As organizações internacionais podem exercer suas funções para solucionar os conflitos internacionais. Os meios de solução por que elas optam podem se pacíficos ou coercitivos, visando eliminar a ameaça à paz ou para recuperar esta. Os meios pacíficos que as Organizações Internacionais empregam podem ser via solução política ou via solução judiciária. Por isso, a solução política, pelas Organizações Internacionais, é um meio de solução pacífica dos conflitos internacionais. Esses três meios de solução de disputas internacionais exercidos pelas Organizações Internacionais estão interligados, apesar de ser explicados separadamente para melhor compreensão.

No sistema da ONU, tanto o Conselho de Segurança quanto a Assembleia Geral podem intervir nos conflitos entre Estados, objetivando uma solução pacífica. As controvérsias tratadas na ONU têm de ser sérias e de caráter internacional. O que se entende por controvérsia séria é aquela que possa vir a constituir uma ameaça à paz internacional. E essa controvérsia deve ser uma controvérsia internacional, porque a ONU não pode intervir nos assuntos de jurisdição nacional (assuntos domésticos). Antes de recorrerem ao Conselho de Segurança da ONU as partes devem buscar pela solução pacífica.

O Conselho de Segurança tem um poder superior a todos, com relação à manutenção da paz internacional, segundo a Carta da ONU. O Conselho de Segurança pode intervir nos conflitos internacionais: pela decisão do próprio Conselho de Segurança; por solicitação de um membro da ONU, seja ou não parte da disputa; por solicitação de um Estado que não seja membro da ONU, na condição de ser parte no conflito e aceitar previamente, com relação à disputa, as obrigações de resolução pacífica estabelecidas na Carta da ONU; por solicitação da Assembleia Geral da ONU; e por solicitação do Secretário Geral da ONU.

A Assembleia Geral tem tratado da solução de conflitos internacionais, criando comissões de bons ofícios e indicando mediadores em vários casos. Entretanto, há casos em que ela só tem o poder de fazer recomendações e, ademais, ela não pode fazer nenhuma recomendação a respeito de controvérsia ou situação que está sendo tratada pelo Conselho de Segurança, a menos que este a solicite.

Organizações de alcance regional e vocação política, como a Organização dos Estados Americanos (OEA), dispõem de mecanismos essencialmente análogos aos das Nações Unidas para a solução pacífica de litígios entre seus integrantes. A OEA, por exemplo, tem conselho permanente, dotado de representação de todos os países membros, e pronto a equacionar politicamente os conflitos de âmbito regional antes que as partes busquem socorro no foro maior, o das Nações Unidas.

Se entre homens é comum a existência de divergências, conflitos entre os Estados não poderia ser diferente. Ao contrário da sociedade civil, na comunidade internacional não existe um órgão supremo a que todos obedeçam, com jurisdição obrigatória, mas há grandes avanços nesse sentido, como a ação, principalmente, da Corte Internacional de Justiça (CIJ) e da Organização das Nações Unidas (ONU), embora seus esforços sejam atrapalhados por alguns de seus próprios membros.

A solução que oferece o ordenamento jurídico internacional é a busca da reparação dos prejuízos e injustiças, na busca de restaurar a harmonia entre qualquer beligerante, sempre apostando nas consequências benéficas que a resolução de um conflito traz à comunidade internacional.

O objetivo a ser alcançado atualmente é a criação de cortes especializadas em várias áreas sociais internacionais, como direito do mar, direito aéreo, direito econômico, propriedade intelectual, uma necessidade latente na atual situação internacional.


Referências:

MATTOS, Adherbal Meira. Direito Internacional Público. Rio de Janeiro: Renovar, 1996.

NASCIMENTO E SILVA, Geraldo Eulálio e ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 1998.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. 3ª Ed. Salvador: Jus Podivm, 2011.

REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público – curso elementar. 15ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

ROQUE, Sebastião José. Direito Internacional Público. São Paulo: Hemus, 1997.

SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de Direito Internacional Público. v.1. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2004.

VARELLA, Marcelo D. Direito Internacional Público. 4ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

Sobre o autor
Benigno Núñez Novo

Pós-doutor em direitos humanos, sociais e difusos pela Universidad de Salamanca, Espanha, doutor em direito internacional pela Universidad Autónoma de Asunción, com o título de doutorado reconhecido pela Universidade de Marília (SP), mestre em ciências da educação pela Universidad Autónoma de Asunción, especialista em educação: área de concentração: ensino pela Faculdade Piauiense, especialista em direitos humanos pelo EDUCAMUNDO, especialista em tutoria em educação à distância pelo EDUCAMUNDO, especialista em auditoria governamental pelo EDUCAMUNDO, especialista em controle da administração pública pelo EDUCAMUNDO, especialista em gestão e auditoria em saúde pelo Instituto de Pesquisa e Determinação Social da Saúde e bacharel em direito pela Universidade Estadual da Paraíba. Assessor de gabinete de conselheiro no Tribunal de Contas do Estado do Piauí.

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