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O princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade

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Agenda 14/02/2018 às 20:30

O tema em foco será analisado de maneira ampla e esclarecedora no que tange seus aspectos históricos, conceituais, bem como, sua fundamentação constitucional no âmbito do ordenamento jurídico brasileiro.

1. Conceito

Para o desenvolvimento do presente trabalho, torna obrigatório que se faça uma inquirição acerca de que venha ser o principio da presunção de inocência ou, qual é o seu significado e o seu real alcance no campo normativo?

Para responder tais indagações pode-se afirmar que o direito penal possui características que se fundamenta no tipo penal incriminador, pois tem a função de resguardar os bens jurídicos classificados como extremamente essenciais. De modo que pode ser caracterizado por uma provisão final, qual seja: a pena.

Neste sentido, o Juiz, ao se deparar com uma situação de um caso concreto à norma penal incriminadora, poderá aplicar e exercer o seu poder de punir e, ao mesmo tempo, declarar a culpabilidade do acusado. Daí é que nasce a presunção de inocência que se emerge para o campo do Direito Processual Penal com raízes profundamente de princípios, habilitado de poder e instrumento regulador que controla os limites do poder de agir do Estado na função de exercer o seu poder punitivo.

O significado de presunção origina-se do latim praesumptio, no qual, o verbo é praesumera, como bem observam os notáveis Cretella Junior e Ulhoa Cintra (1944, p. 896) ao afirmar que: “significa antecipar, tomar antes ou por primeiro, prever, imaginar previamente”. Portanto, esse termo de origem latina, significa antecipar algo que ainda não aconteceu.

Por outro lado, ainda sob a interpretação dos mesmos autores, inocência, que também provem do latim innocentia, e seu significado está ligado intimamente a práticas religiosas. No campo canônico, a inocência era referida àquele que nuca pecou, ou seja, que não infringia as regras divinas, mas com o passar do tempo foi adquirindo uma significação mais filosófica influenciada pelas as ideias iluministas que incorporou uma perspectiva mais racional, na qual uma pessoa não poderia ser apontada como culpada sem antes haver uma comprovação que a incriminasse.


2. Contextualização histórica

É bem possível identificar elementos da presunção de inocência desde antes do Império Romano, sem que haja, todavia, falar na possibilidade de um sistema fundado nesse referido princípio.

Existem registros pontuados ao final do século I a.C., e início da era cristã, de que foi atribuído ao Imperador Augusto o exercício do poder de decidir em casos que hajam uma condenação majoritária, ou seja, “em caso de maioria condenatória por apenas um voto, votar pela absolvição do réu. Caso houvesse empate no resultado da votação, ocorreria a absolvição.” (MORAES, 2010, p. 16).

Observa-se que, embora o mecanismo funcionasse com a presunção de culpa, nitidamente deparar-se-ia com a ideia do in dubio pro reo, o que levaria crer na possibilidade de um sistema ser fundado na presunção da culpa, porém, admitindo o princípio do favor rei. Conquanto seja necessário salientar que esses conceitos não possuem identidades recíprocas, uma vez que a presunção de inocência representa muito mais do que uma simples e mera aplicação do in dubio pro reo. Caso houvesse um posicionamento contrário, a presunção de inocência não estaria em consonância com a verdade, o que remeteria aos tempos do Direito Romano.

Noutros tempos, agora se referindo à Idade Média, a presunção de inocência passou despercebida, praticamente nenhum elemento de sua natureza fora notada. Isso pode ser entendido, num primeiro momento, a força da cultura bárbara como influência, pois eles adotaram meios de julgamentos, como os das ordálias, ou juízos de deus. Nessa concepção, presumia-se a culpa do acusado que ao mesmo tempo, poderia ser desfeita por ordália, que, conforme se acreditava, provocaria a proteção divina daquele que estaria sob o manto da razão. Também, existiam outros meios, como, os duelos judiciários e as provas de água quente e de ferro em brasa que, aquele que sobrevivesse a tais sacrifícios, seria considerado inocente, uma vez que deus sempre protegeria o acusado.

Já num segundo momento, as ordálias foram abandonadas em virtude da ascensão da Igreja Católica e o surgimento do período da Inquisição, que tinha como característica, o direito penal do inimigo, que combatia com bastante vigor o fenômeno da heresia. Vale ressaltar que nessa época, o julgador em caso de dúvidas, não decidia pela absolvição, e sim, pela redução da pena. Já em relação à prisão provisória, a mesma funcionava como pena antecipada, sem que houvesse qualquer caráter de natureza processual, como assevera os ensinamentos de Zanoide de Moraes ao dizer que

(...) as prisões da Inquisição viviam abarrotadas de presos, grande número dos quais ainda não tivera nenhuma acusação feita contra eles. Podiam ficar encarcerados durante anos, sem ao menos saber a transgressão de que se dizia que eram culpados. Enquanto isso, eles e suas famílias eram privados de toda a propriedade, pois a prisão invariavelmente era seguida do imediato confisco de todos os pertences do acusado – tido, desde a casa até os pratos e panelas. E enquanto o homem definhava na prisão, ainda sem nenhuma acusação feita, suas posses eram vendidas para pagar sua manutenção no cativeiro. (MORAES, 2001, p. 69).

Nesse viés, pode-se afirmar que durante o período da Inquisição católica é notória a ausência de qualquer indício de presunção de inocência. Zanóide de Moraes inclusive chega a ponderar que “talvez seja a Inquisição o mais perfeito antípoda do que se deva entender por um sistema fundado na presunção de inocência” (MORAES, 2001, p. 69).

Percebe-se que neste período a presunção era de culpa e não de inocência, pois caso as provas não demonstrasse elementos suficientes para libertar ou até mesmo para prender uma pessoa, o réu poderia ser condenado tão somente por suposição, Nas sábias palavras do jurista gaúcho Aury Lopes Júnior, “No Directorium Inquisitorum, EYMERICH orientava que o suspeito que tem uma testemunha contra ele é torturado. Um boato e um depoimento constituem juntos, uma semiprova e isso eram suficientes para uma condenação” (JÚNIOR, 2001, p. 187).

Ao final do século XVI e início do século XVII, o mundo pode vislumbrar uma nova era que se enunciava. Sob a influência do Movimento Iluminista surgia para o homem o sentimento de liberdade e um total desprendimento ao Estado que, até então, possuía um posicionamento controlador sobre os cidadãos. Esse governo absolutista ruia-se por completo com o advento da Revolução Francesa que veio portando a bandeira do Liberté, Égalité et Fraternité, consagrando assim, a Declaração dos Direitos do Homem de do Cidadão.

Já àquela época o grande filósofo italiano Césare Beccaria aludia que “um homem não pode ser considerado culpado antes da sentença do juiz, nem a sociedade pode tirar-lhe a pública proteção, a menos que ele tenha violado os pactos estabelecidos” (BECCARIA, 2006, p. 71).

Por conseguinte, a Declaração dos Direitos do Homem de 1789, consagrou de vez o princípio da presunção de inocência trazendo expressamente no seu art. 9°, na qual, estabeleceu que, “Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei”.

A euforia que contemplava os avanços idealizados pelos iluministas e pelos revolucionários liberais teve o seu curso ameaçado devido à ascensão de Napoleão Bonaparte ao poder, interrompendo sobre maneira a consolidação do princípio da presunção de inocência.

Outro fato que também trouxe uma avaria a este princípio foi a subida ao poder de governos totalitários por toda parte do mundo, porém, as impressões mais fortes se manifestou na Alemanha com o advento do Nazismo e na Itália com a representação fascista. Essa oposição aos ideais iluministas chegou a ser chamada de concepções estranhas e absurdas, pelos respectivos governos que, segundo eles, advém do empirismo francês.

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Aury Lopes Junior observa que

(...) partindo de uma premissa absurda, MANZINI chegou a estabelecer uma equiparação entre os indícios que justificam a imputação e a prova da culpabilidade. O raciocínio era o seguinte: como a maior parte dos imputados resultavam ser culpados ao final do processo, não há o que se justifique a proteção e a presunção de inocência. Com base na doutrina de Manzini, o próprio Código Rocco de 1930 não consagrou a presunção de inocência, pois era vista como excesso de individualismo e garantismo. (LOPES JR., 2012, p. 238).

Para sintetizar bem o que fora dito no parágrafo anterior, devemos nos ater ao Código de Processo Penal de 1913, seguido pelo Código de 1930, elaborado em pleno governo fascista de Benedito Mussolini que, sob o prisma de um tecnicismo neutro, ignorou sistematicamente o princípio de inocência.

Este retrocesso está muito bem explicado nas palavras do professor Zanóide de Moraes que justifica esse momento histórico dizendo que

(...) presunção de culpa (de periculosidade, de temibilidade, de heresia ou de insurgência política ou militar) advinda de uma postura embebida e fomentada por uma visão estatal autoritária (fascista e violenta) e pela qual todos, que não estivessem ao seu lado (seguidores, adeptos, correligionários, familiares, companheiros de fé ou de partido), são maus (doentes, criminosos, hereges, rebeldes ou um perigo social), pela própria e simples condição de não lhe serem afins. (MORAES, 2010, p. 136).

Logo, a postura rígida e autoritária imposta pelos governos fascista de Benito Mussolini e nazista de Adolf Hitler daquela época viria macular em toda sua totalidade os preceitos do princípio de inocência.

2.1. Presunção de inocência pós-segunda guerra mundial

O episódio da segunda guerra mundial compreendida entre 1939 a 1945 foi o marco mais importante no que tange a efetivação do princípio da presunção de inocência, pois os rigores e os abusos praticados pelo nazismo impressionaram e, de certa forma, chocou o mundo pela crueldade e barbaridade que o planeta assistia àquela época porque o idealismo alemão que confundia na mesma pessoa, acusador e julgador.

Diante desta situação, foi necessária uma ampla discursão para avaliar a extensão dos direitos que estavam sendo violado e, o resultado foi perceber a necessidade de criação de um órgão que disciplinasse e tutelasse direitos e garantias individuais ao homem em todo planeta.

Foi a partir dessas conveniências que no ano de 1948 a Organização das Nações Unidas (ONU) proclamou a Declaração Universal do Direito do Homem, sacramentando assim, no seu Artigo XI, 1, o princípio da presunção de inocência na qual estabeleceu que (SCHMIDT, 2005, p. 584): “toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumidamente inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público, na qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”.

Logo após a Convenção de 1948, semelhantes tratados e convenções internacionais surgiram com a impressão explícita da presunção de inocência nos seus textos afim de promover e assegurar a paz no mundo e a consolidação das instituições democráticas, como por exemplo, a Declaração Americana dos Direito e Deveres do Homem, (Bogotá, 1948, art. XXVI), a Convenção do Conselho da Europa, (Roma, 1950, art. 6° § 2°), com o intuito de resguardar os Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, bem como, a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (Nice, 2000, art. 48, §1°), a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povo/Carta de Banjul (Nairóbi, 1981, art. 7º, § 1º, b), Declaração Islâmica sobre Direitos Humanos (Cairo, 1990, art. 19, e), Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (art. 14, §2º) e Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969 (Pacto de São José da Costa Rica).

2.2. Presunção de inocência na Constituição Federal de 1988

No ordenamento jurídico brasileiro o princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade vem insculpido no Artigo 5°, inciso LVII da Constituição de 1988 com o seguinte enredo: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Em vista disso, logo após a promulgação da Carta Magna que entrara em vigor, o que se viu foram inúmeras divergências e fortes debates doutrinários acerca da referida previsão constitucional, ora mencionado. A discussão se baseia especificamente na interpretação do novo princípio recepcionado no texto da Constituição de 1988, que presumia inocente o acusado de cometer um delito infracional penal. De modo que uma corrente doutrinária entendia que o texto constitucional não teria recepcionado a presunção de inocência, e sim, a presunção de não-culpabilidade.

Sobre a questão posta em discussão o Desembargador, Professor e Doutrinador Paulo Rangel esclarece que não há de se falar em presunção e sim, em declaração, uma vez que, para ele, o texto constitucional não presume que ninguém seja inocente, contudo, declara que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, vejamos:

(...) primeiro não adotamos a terminologia presunção de inocência, pois, se o réu não pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, também não pode ser presumidamente inocente. A Constituição não presume a inocência, mas declara que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória (art. 5º, LVII). Em outras palavras, uma coisa é a certeza da culpa, outra, bem diferente, é a presunção da culpa. Ou, se preferirem, a certeza da inocência ou a presunção da inocência. (RANGEL, 2010, p.24).

O professor Amilton Bueno de Carvalho, por sua vez, ensina que o aludido princípio é um pressuposto, tendo em vista que, mesmo que o princípio da presunção não estivesse normatizado na Declaração dos Direitos do Homem, ou até mesmo na nossa atual Constituição, de todo modo, seria uma garantia fundamental, pois o autor entende que “o princípio da presunção de inocência não precisa estar positivado em lugar nenhum” (CARVALHO, 2001, p. 51).

Para o processualista Aury Lopes Júnior, o princípio se trata de um dever e, sendo assim, a presunção de inocência impõe uma clara visão de que o réu seja tratado como inocente ao lecionar que: “a presunção de inocência impõe um verdadeiro dever de tratamento (na medida em que exige que o réu seja tratado como inocente), que atua em duas dimensões: interna ao processo e exterior a ele” (LOPES JÚNIOR, 2008, p. 188).

Destarte, a voz do Professor Eugênio Pacelli de Oliveira, enfatiza que o estado ou situação jurídica é uma posição ao Estado a observância e obediência a duas regras específicas ao acusado ao notar, uma relacionada ao tratamento e outra de caráter probatório ao aduzir que

(...) tratamento, segundo o qual o réu, em nenhum momento do inter persecutório, pode sofrer restrições pessoais fundadas exclusivamente na possibilidade de condenação, e a outra, de fundo probatório, a estabelecer que todos os ônus da prova relativa à existência do fato e à sua autoria devem recair exclusivamente sobre a acusação. (OLIVEIRA, 2005, p. 31).

Desta maneira, o que se percebe na realidade é a concepção de uma presunção de culpa contrária ao acusado, pois terá desde o começo da persecução criminal a incumbência de contraprovar sua inocência.

Os debates que houveram antes da promulgação da Carta Magna e os que há atualmente, sob a égide da vigente Constituição são intimamente direcionados a mera interpretação do texto normativo frente ao conteúdo material, ou seja, a norma, o que muitos constituintes, isso não passa de uma sinonímia.

Sobre esse assunto, Zanoide de Moraes observa que

(...) essa impossível coexistência de conteúdos (constitucional brasileiro e ideológico fascista), aliada à análise genético-sistêmica agora empreendida, permitem concluir que, se na escolha formal o constituinte vacilou até tender à aceitação da técnica redacional da “não consideração prévia de culpabilidade”, em essência jamais se afastou da força juspolítica e ideológica da presunção de inocência, nos moldes aceitos e informados pela comunidade internacional no pós-guerra. (MORAES, 2010, p. 218).

Ainda no foco dos debates, surge o ponto de vista firme e incisivo do Professor Gustavo Badaró que afirma

(...) as expressões “inocente” e “não culpável” constituem somente variantes semânticas de um idêntico conteúdo. É inútil e contraproducente a tentativa de apartar ambas as ideias – se é que isto é possível -, devendo ser reconhecia a equivalência de tais fórmulas. Procurar distingui-las é uma tentativa inútil do ponto de vista processual. Buscar tal diferenciação apenas serve para demonstrar posturas reacionárias e um esforço vão de retorno a um processo penal voltado exclusivamente para a defesa social, que não pode ser admitido em um Estado Democrático de Direito. (BADARÓ, 2012, p. 24).

Diante dessas discussões doutrinária e jurisprudenciais em relação a previsão do princípio da presunção de inocência traz para o campo das divergências dúvidas acerca do momento em que o acusado poderia ser desconsiderado inocente no sentido de apurar o momento mais adequado para que o Estado deixa de observar, a garantia de presunção de inocência do acusado.

Há quem diga que o texto constitucional em vigor consagrou expressamente um modelo que se apresenta num contexto negativo, uma que não está explícito se o indivíduo será considerado até então, inocente. Porém, não será ele reputado culpado ate que seja estabelecida uma sentença condenatória irrecorrível.

Seria excelente que esta discussão chegasse ao entendimento pacífico no contexto do ordenamento jurídico brasileiro, porém, é necessário dizer que o princípio da presunção de inocência ganhou mais um ingrediente no tempero da discórdia em face ao novo entendimento do Superior Tribunal Federal (STF), tema que será abordado no capitulo III deste trabalho.


3. Considerações acerca da privação de liberdade

Prisão, em outras palavras, trata-se da privação de liberdade de locomoção e, tal ação pode ser determinada por um particular na forma de sequestro ou cárcere privado. A privação de liberdade de locomoção pode ser um ato de vontade própria da pessoa, ou seja, alguém que se preste a outra por algum tempo determinado, para exemplificar, nos valemos a um aluno em sala assistindo aula, nesse caso, o aluno está preso voluntariamente ao professor na intensão de adquirir conhecimentos.

A prisão também pode ser imposta coercitivamente pelo Estado entendido como poder público dotado de soberania. Sendo esta última modalidade, objeto de apreciação neste capítulo.

3.1. Conceito de prisão

Antes de adentrarmos neste tema, faz-se necessário trazer alguns conceitos doutrinários de alguns autores estudiosos em matéria processual penal.

O Artigo 283 do Código de Processo Penal estabelece o conceito de prisão de uma forma bem clara ao dizer que a prisão é a privação da liberdade por do flagrante delito, ou por ordem escrita e fundamentada pela autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença penal condenatória transitada em julgada, ou no curso da investigação, ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

O sábio professor Júlio Fabbrini Mirabete, sustenta que a prisão é “a privação de liberdade da liberdade de locomoção, ou seja, do direito de ir e vir, por motivo lícito ou por ordem legal”. (MIRABETE, 2001, p. 234).

Podemos também nos valer da explicação ampla e genérica de Nucci (2014), ao dizer que “prisão é a privação de liberdade, tolhendo-se o direito de ir e vir, por meio do recolhimento da pessoa humana ao cárcere”.

Já o professor Fernando Capez, por sua vez, assevera que

(...) a privação da liberdade de locomoção em virtude de flagrante delito ou determinada por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. (CAPEZ, 2012, p. 301).

Na visão de Nestor Távora, há de discernir a prisão-pena e a prisão processual, uma vez que

(...) a prisão é o cerceamento da liberdade de locomoção, é o encarceramento. Pode advir de decisão condenatória transitada em julgado, que é a chamada prisão pena, regulada pelo Código Penal, com o respectivo sistema de cumprimento, que é verdadeira prisão satisfativa, em resposta estatal ao delito ocorrido, tendo por título a decisão judicial definitiva. (TÁVORA, 2013, p. 547).

Sendo assim, diante dessas analises conceituais acima citadas pode perceber a existência de duas espécies de prisão, quais sejam: a prisão-pena, aquela que é aplicada após a condenação transitada em julgado e a prisão cautelar, aquela que é aplicada antes da sentença condenatória.

3.2. Origem da pena privativa de liberdade

Ao analisar o desenvolvimento histórico da prisão temos que nos remeter à Idade Antiga, pois trata de um período que foi marcado pelo surgimento e desenvolvimento das primeiras civilizações. Segundo, Felipe Machado Caldeira, “o nascimento da escrita, foi o ponto de partida de toda essa evolução que se deu por volta de 4.000 a 3.500 a. C., até a queda Império Romano aproximadamente em 476 d.C., e o início da Idade Média no século V”. (CALDEIRA, 2009, p. 272).

O contexto social daquela época era formado por famílias, clãs e tribos, porém, sem nenhuma organização social, de modo que, os “Clãs” ou “bando”, eram os responsáveis pela manutenção e regulamentação de todos os componentes do grupo e estabeleciam regras que visavam um convívio harmônico comum a todos. (TELES, 2006, p. 20).

Essas regras tinham como finalidade a proteção própria ou dos demais membros que faziam parte do grupo, constituindo-se no principio do parentesco (WOLKMER, 2010, p. 3), de modo que a pena era um mecanismo de defesa, ou seja, uma vingança individual.

Portanto, o surgimento das sanções como meio de manter a comunidade unida e protegida, decorreu do estabelecimento dessas regras de convivência, sendo assim, elas foram umas das primeiras demonstrações de um conjunto normativo de conduta, conforme explicações de Felipe Machado Caldeira, ao aduzir que

(...) o ser humano sempre viveu agrupado, em virtude de seu nítido impulso associativo e lastreou, no seu semelhante, suas necessidades, anseios, conquistas, enfim, sua satisfação. E desde os primórdios, o ser humano violou as regras de convivência, ferindo os semelhantes e a própria comunidade onde vivia, tornando inexorável a aplicação de um castigo (sanção). No início, a punição era uma reação coletiva contra as ações antissociais (CALDEIRA, 2009, p. 260).

Outra característica importante a ser aborda sob o advento da Idade Antiga, diz respeito a um fenômeno que ganhou força entre os as comunidades da época, trata-se da forte influência da religião, tendo em vista, a crença era de que a paz adivinha dos deuses, sobre esse aspecto, Felipe Machado Caldeira, ensina que

(...) a pena possuía uma dupla finalidade: (a) eliminar aquele que se tornara um inimigo da comunidade e dos seus deuses e forças mágicas, (b) evitar o contágio pela mácula de que se contaminara o agente e as reações vingadoras dos seres sobrenaturais. Neste sentido, a pena já começa a ganhar os contornos de retribuição, uma vez que, após a expulsão do indivíduo do corpo social, ele perdia a proteção do grupo ao qual pertencia, podendo ser agredido por qualquer pessoa. Aplicava-se a sanção como fruto da liberação do grupo social da ira dos deuses em face da infração cometida, quando a reprimenda consistia, como regra, na expulsão do agente da comunidade, expondo-o à própria sorte. Acreditava-se na forças sobrenaturais – que, por vezes, não passavam de fenômenos da natureza – razão pela qual, quando a punição era concretizada, imaginava o povo primitivo que poderia acalmar os deuses. Por outro lado, caso não houvesse sanção, acreditava-se que a ira dos deuses atingiria a todo o grupo (Caldeira, 2009, p. 260).

Dessa forma, é notória a prevalência de um estado de natureza emocional e sentimental, ou seja, demonstra uma concepção da sanção de modo totalmente contrário ao racionalismo, mesmo porque os povos daquela época levavam em conta, também, como aplicação de pena, os fenômenos da natureza, como, os trovões, raios, etc., visto como sinais dos deuses (CALDEIRA, 2009, p. 261).

3.3. A prisão na Idade Média

O marco na Idade Média se deu no século V, d.C., com a queda do Império Romano em detrimento à ascensão dos povos germânicos, quando então, foi invadida e conquistada. À vista disso, houve uma descentralização política, o que provocou um abandono das cidades e, por consequente, tornando a economia de subsistência agrária. O que de certa forma colaborou para constituição do feudalismo. Este sistema, contudo, era baseado na servidão, qual seja, o proprietário dava proteção e trabalho aos camponeses e estes, por sua vez, davam em troca parte de sua produção. Nas sábias palavras de Tatiana Chiaverini, “a economia feudal baseava-se principalmente na agricultura, sendo que as técnicas de trabalho agrícola eram rudimentares”. (CHIAVERINI, 2009, p. 16).

A autora segue dizendo que, conforme a fragmentação do poder, as punições deixaram de ser aplicadas por um único suserano, porque já não existia mais um poder matriz, desse modo, cada feudo tinha suas próprias normas, como veremos a seguir

(...) com a descentralização do poder político, o sistema de punição estatal se tornou impraticável, passando a existir a lei do feudo e a pena pecuniária. A ausência de um poder central forte permitia que qualquer conflito de interesse ameaçasse a paz social, a medida em que qualquer parentes e súditos eram automaticamente envolvidos nesses conflitos (CHIAVERINI, 2009, p. 19).

Neste diapasão é possível observar a falta de organização desses sistemas legais na medida em que surge uma ambiguidade nas resoluções dos conflitos, onde o indivíduo só respondia pelas acusações que atingisse o feudo a qual era subordinado.

3.4. A influência do direito canônico

É importante salientar que a Igreja Católica teve um papel preponderante nos costumes da sociedade daquela época e na idealização da pena privativa de liberdade. Esse posicionamento deu origem à denominação de Direito Canônico. Conforme essa visão, o objetivo era propagar uma humanização da punição. Desse modo, conforme (PRADO, 2010, p. 83), “a Igreja buscou substituir a pena de morte pela reclusão do infrator, por considerar a punição pública como a única correta”.

O Direito Canônico foi a base e a referência da pena de prisão, pois atualmente a aplicação da pena se assemelha aos moldes do direito brasileiro atual ao trazer a ideia de “recuperação” do ser humano através da privação de liberdade.

3.5. A pena privativa de liberdade no Idade Moderna

O período da Idade Moderna é entendido como um momento de transição que compreende o século XV ao XVIII. Diante dessa nova concepção surgiram grandes transformações no que tange as relações sociais, inclusive para o Direito Penal que seria fortemente influenciado pela Revolução Francesa e as ideias iluministas que surgia naquela época.

O cenário político começou a mudar radicalmente e a ideia de um governo absolutista trazia certo desconforto perante algumas figuras intelectuais que contestavam os privilégios que a nobreza e o clero desfrutavam do governo.

A insatisfação por parte dos intelectuais também se voltou contra o sistema da justiça penal daquela época, por não concordar com forma de tratamento que era imposta nas casas de trabalho e correção, uma vez que o tratamento deveria ser mais humano e racional no que tange a fixação da pena. Neste sentido, Cesar Roberto Bitencourt, assevera que

(...) as correntes iluministas e humanitárias, das quais Voltaire, Montesquieu, Rousseau seriam fiéis representantes, fazem severa crítica aos excessos imperantes na legislação penal, propondo que o fim do estabelecimento das penas não deve consistir em atormentar um ser sensível. A pena deve ser proporcional ao crime, devendo-se levar em consideração, quando imposta, as circunstâncias pessoais do delinquente, seu grau de malícia e, sobretudo, produzir a impressão de ser eficaz sobre o espírito dos homens, sendo, ao mesmo tempo, a menos cruel para o corpo do delinquente (BITENCOURT, 2011, p. 40).

Outro destaque importante que trouxe uma preocupação humanista no cumprimento da pena foi a obra escrita por Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria (1738 – 1794), intitulada como: Dos delitos e das penas, publicada no ano de 1764. Seus pensamentos filosóficos o fizeram a ser considerado o principal representante do Iluminismo Penal. Cesar Bitencourt sintetiza que

(...) sugeria mudanças que eram desejadas e apoiadas pela opinião pública. Surgiu exatamente no tempo em que deveria surgir. A Europa estava preparada para receber a mensagem do livro em 1764. Ele serviu para arrasar e destroçar muitos costumes e tradições da sociedade do século XVIII, especialmente por meio da ação dos protagonistas da nova ordem. É indubitável que Voltaire impulsionou muitas das ideias de Beccaria. Não é exagero afirmar que o livro deste é de vital importância na preparação e amadurecimento do caminho da reforma penal dos últimos séculos. Sua obra teve sentido político e jurídico, e seu campo de ação foi de grande amplitude, pois aspirava à reforma do direito penal naquele tempo reinante (BITENCOURT, 2011, p. 41).

As propostas até então, revolucionária pregadas no livro de Beccaria viria a mudar sistematicamente o pensamento do direito penal nos anos futuro devido sua forma analítica acerca do tratamento dispensado ao ser humano.

Como se vê, a natureza do liberalismo foi efetivamente “libertar” os homens dos arbítrios impostos pelos regimes absolutistas monárquicos que vigorava na quela época, especialmente no continente europeu. Através do liberalismo, o Estado passou a atuar não mais como interventor, mas sim, de forma somente excepcional.

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