A mídia tem divulgado que alguns juízes do trabalho estão aplicando a Lei nº 13.467/2017 — a “Lei da reforma Trabalhista”— a processos iniciados antes da sua publicação, e, com isso, certos encargos processuais como honorários periciais e de advogados, que antes não podiam ser exigidos dos empregados, agora estão sendo cobrados, e em valores muito acima do poder aquisitivo do trabalhador e dos limites em que normalmente eram fixados na constância da lei antiga.
Isso é possível?
Pode um processo ser julgado com base em uma lei publicada depois do seu ajuizamento?
A resposta é sim e não.
Uma lei começa a vigorar no país quarenta e cinco dias depois de publicada. Essa é a regra geral. Por expressa disposição nela contida, a lei nº 13.467/17 entrou em vigor cento e vinte dias depois de publicada. Como foi publicada em 14/7/2017, uma sexta-feira, entrou em vigor em 11/11/2017, um sábado.
Alguns doutrinadores dizem que “leis processuais” se aplicam aos processos em curso e têm “efeito retroativo”. Isso é um erro. Toda lei validamente publicada aplica-se aos processos em curso. Nisso, a Lei nº 13.467/2017 não tem nenhuma novidade. Isso não quer dizer que tenha efeito retroativo. “Lei processual” é toda lei que regula o processo. A Lei nº 13.467/2017 é lei material, regula o direito material do trabalho. Não é “lei processual” em sentido estrito. Logo, não pode retroagir. Somente as leis processuais podem ter efeito retroativo, mas mesmo aqui há limites.Uma lei processual pode retroagir se disser expressamente que o faz, mas deve respeitar o ato jurídico perfeito, os direitos adquiridos e a coisa julgada.
Saber se a Lei nº 13.467/2017 pode ou não ser aplicada a processos iniciados antes dela é uma questão de direito intertemporal. Os conflitos entre leis no espaço são fáceis de resolver. Toda lei, como ato de Estado, aplica-se aos limites territoriais (espaço) desse Estado. Para a solução dos conflitos de leis no tempo, a doutrina adota três sistemas:
1o – Sistema da Unidade Processual
2o – Sistema das Fases Processuais
3o – Sistema do Isolamento dos Atos Processuais
Para o sistema da unidade processual, o processo é um todo, encadeado para um único fim que é a sentença sobre o mérito. A lei nova apanharia o processo e, como ele é um todo, todos os atos anteriores à edição dessa lei perderiam a validade. Vale o que a lei nova disser. Para o sistema das fases processuais, o processo é a soma de quatro fases autônomas: postulatória; probatória; decisória e recursal. Cada uma dessas fases constitui-se de um conjunto inseparável de atos que, ao fim, formarão o processo como instrumento da jurisdição. Por último, para o sistema do isolamento dos atos processuais, o processo é um todo que busca um fim, mas cada conjunto de atos das fases postulatória, probatória, decisória e recursal pode ser considerado isoladamente e a lei nova somente apanha as situações processuais que se formarem depois dela, respeitando-se os atos já praticados.
O direito brasileiro adota o sistema de isolamento dos atos processuais, isto é, embora o processo seja um todo, os atos que o compõem são isolados e a lei nova apanha esse processo em andamento e passa a regulá-lo a partir dali, mas os atos praticados na constância da lei antiga conservam a sua eficácia. A Lei nº 13.467/2017, portanto, somente se aplica aos processos trabalhistas ajuizados depois de sua publicação. Em todos os processos ajuizados antes de 11/11/2017, quando a Lei nº 13.467/2017 entrou em vigor, aplica-se a legislação anterior. Como os atos processuais são isolados, o juiz somente poderá aplicar a Lei nº 13.467/2017 para aqueles atos praticados pelas partes após a sua entrada em vigor, ainda que o processo tenha sido ajuizado antes. Assim, se depois da publicação da sentença, já na constância da Lei nº 13.467/17, as partes praticarem algum ato processual que justifique punição nela prevista, o juiz poderá aplicá-la exclusivamente em relação a esses atos. Quanto aos outros atos, praticados na constância da lei antiga, apenas a lei antiga poderá ser aplicada.