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O consumidor e o prazo de reflexão

Apontamentos sobre o direito do consumidor de devolver o produto comprado na internet, sem maiores explicações, bastando se manifestar dentro do prazo indicado por lei.

Comumente ouve-se a despretensiosa frase que diz: “o cliente tem sempre razão!” Apesar de aparentemente vulgar, este é o mandamento imperante na relação de consumo. Isso porque somos nós, consumidores, o alvo principal das estratégias das campanhas de publicidade. É para nós que a televisão e os meios de comunicação social lançam os grandes produtos e os imprescindíveis serviços. Os comerciantes, além de atrair os consumidores, tentam também conquistar sua confiança. Para tanto, vários são os meios empregados, como o prazo dilatado, a entrega em domicílio, o uso de cartões personalizados, os descontos fenomenais, promoções relâmpago e uma intensa publicidade, muitas vezes, enganosa!

Com a globalização da economia e o crescimento do mercado virtual, está sempre mais difícil competir num mercado tão heterogêneo. O consumidor fica cada vez mais exigente e ocorre uma via-crúcis atrás daquilo que tenha bom preço e ótima qualidade. Em um mundo tão globalizado, nada é tão importante quanto a qualidade de vida, e esta se amolda naquilo que é bom, barato e eficiente.

Na relação de consumo, o consumidor tem a seu lado todas as normas de direito público e do Código de Defesa do Consumidor e, por isso mesmo, essas normas não podem ser interpretadas desfavoravelmente ao mesmo. Assim, tudo aquilo que fica acertado entre as partes é passível de ser exigido pelo consumidor na defesa de seus interesses.

Reza o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 49, que "o consumidor pode desistir do contrato, no prazo de sete dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio". Seu parágrafo único estabelece que "se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados". Esse prazo de sete dias foi denominado pela lei como prazo de reflexão ou de arrependimento.

Para exemplificar a dimensão de nossos direitos e as astutas técnicas de marketing, tomemos como exemplos as vendas por telefone ou veiculadas pela mídia. Normalmente, após citar as qualidades do produto e o seu valor, o anúncio é acompanhado de uma mensagem de que, no caso de insatisfação com o produto, fica garantida a devolução de toda a quantia expedida. É o famoso jargão: “Satisfação garantida ou seu dinheiro de volta!”. A mensagem é veiculada como se a garantia de devolução do dinheiro fosse uma grande dádiva ofertada a nós pelos fornecedores. O que devemos ter em mente é que tal “dádiva” é um direito nosso, reconhecido no art. 49 do Código de Defesa do Consumidor. Todo produto vendido por telefone, internet ou a domicílio, caso não atenda aos anseios do comprador, pode ser devolvido independentemente de justificativa, garantindo-se a completa devolução do dinheiro.

Interessante verificar quem deve arcar com a despesa de entrega e devolução do produto. Ora, se o fornecedor escolheu efetuar suas vendas fora do seu estabelecimento, os prejuízos por ventura ocorridos são inerentes à modalidade de venda tão agressiva. E é agressiva porque o consumidor é atingido dentro de sua própria residência, sem ao menos conhecer o produto, efetuando a compra apenas nas informações prestadas pelo fornecedor. Isso ocorre por não ter como o consumidor averiguar as qualidades oferecidas nos anúncios publicados. Nessa modalidade de contrato, o consumidor está em grande desvantagem em relação ao vendedor. Como a liberdade conferida pelo legislador é limitada nos contratos privados que regem a relação de consumo, o código não poderia abandonar o consumidor numa circunstância como esta. Ao preconizar o direito de arrependimento, o parágrafo único do art. 49 do Código de Defesa do Consumidor especifica que o consumidor terá de volta, imediatamente e monetariamente atualizados, todos os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, entendendo-se incluídos nestes valores todas as despesas com o serviço postal para a devolução do produto, quantia esta que não pode ser repassada ao consumidor.

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Três projetos de lei (281, 282 e 283) em andamento no Senado Federal visam adaptar a Lei 8.078/90 ao comércio eletrônico. Alguns juristas alegam que nem toda compra pela internet está sujeita ao direito de arrependimento, porém é forçoso convir que a compra realizada fora do estabelecimento comercial, por várias vezes priva o consumidor da melhor análise sobre os bens a serem adquiridos, correndo o risco de comprar gato por lebre, em total desconformidade com a oferta publicitária.

Deve ser observado que o prazo de reflexão não tem como escopo prejudicar os fornecedores, mas, sim, conferir tratamento igualitário Às partes da relação de consumo. O objetivo maior é preservar os princípios basilares das relações de consumo, de forma preponderante o princípio da boa-fé objetiva. Ademais, o princípio retromencionado possibilitará combater as eventuais distorções e abusos praticados pelo consumidor de má-fé.

O código veio revolucionar as relações entre vendedor e consumidor, este último a parte mais frágil dessa relação. O legislador baseou-se no princípio do risco do empreendimento, pelo que, a partir do momento que o fornecedor atua no ramo de venda a distância, este está ciente de que o consumidor poderá devolver o produto de forma injustificada, bastando se manifestar dentro do prazo hábil, que é de 7 (sete) dias. Ora, obrigar o consumidor a pagar por qualquer taxa ou encargo seria uma forma de mitigar esse direito de arrependimento.

Por fim, a venda à distância proporciona vantagens ao fornecedor, eis  que não precisa manter um corpo de funcionários para vender seus produtos. Baseado nisso tudo, o Código Consumerista proporcionou ao consumidor um prazo de reflexão, onde o mesmo terá a possibilidade de ter o produto em suas mãos e ver se aquilo é realmente o que ele desejava comprar, sendo facultada a devolução do mesmo e a restituição do capital gasto, monetariamente corrigido se houver índices oficiais.

Sobre os autores
Rogerlaine Lúcia Santos de Oliveira

Pós graduanda em Direito de Família

Luiz Francisco de Oliveira

Mestre em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos pela Universidade Federal do Tocantins. Atualmente é Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Tocantins. Promotor Eleitoral da 25ª Zona Eleitoral (TRE/TO). Professor Universitário da Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS). Possui graduação em Direito pelo Centro Universitário de Sete Lagoas (1997). É pós graduado em Direito em Administração Pública. Pós graduado em Direito Processual Civil. Pós graduado em Direito de Família. Exerceu o cargo de Advogado da União (AGU) na Procuradoria da União em Minas Gerais. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Público. Ex-Membro Titular do Grupo Especial de Controle Externo da Atividade Policial e Estabelecimentos Prisionais do Estado do Tocantins.

Informações sobre o texto

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