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A Teoria do Estado e a Repercussão Geral em Recurso Extraordinário

Agenda 05/03/2018 às 21:52

O Estado utiliza-se da repercussão geral para densificar a Rechtordnung, Normatividade Institucional e Legalidade (Staatsordnung), num processo objetivo de autorreferibilidade em dinâmica dialética de institucionalização de-si.

O Estado, para manter a coesão institucional sistêmica, constitui, constrói, integra e institui em-si, em seu próprio ‘Eu’ institucional, instrumentos do Logos Institucional para sustentar-se como Instituição das instituições (Carl Schmitt[1], Arthur Benz[2]).

A organização (estrutura, organicidade e funcionalidade), expressão (concepcional, relacional, decidente e operacional) e fatorização (matriz, motriz e histórica) ontológicas do Estado carecem de substratos juspolíticos para manutenção da substância e subsistência estatais, confirmando a decisão consciencial de-si, que o Estado estabelece para permanecer realizando-se, possibilitando-se e historicizando-se no Universo e diante dele.

Logos Institucional e consciência ordenante de institucionalidade formam o mínimo possível para a estruturação matricial-orgânica da unidade-totalidade institucional do Estado, ordenando-se no seu mundo histórico-cultural concreto.

Para que o Estado ordene o Nomos[3] e o Lebensraum institucional[4], a qualidade densificadora-complexiva há de ser harmônica com as lógicas do Direito, da Política, da Staatsordnung historicizante e História ordenante, formando um plexo ontológico dotado de universalização unitarizante funcional-operativa (Filosofias Política e Jurídica Ontológicas).

Agregue-se à genealogia realizante/possibilitante/historicizante estatal (ortogenia e protogenia) a diretividade-retora axiológica-deontológica (Naturrecht[5] e Rechtprinzipien), como formação da densidade evolutiva dos estamentos intelectíveis institucionais-culturais do Estado, afirmando-se a Metaética hegeliana[6], qualificadora do Estado (Filosofias Política Axiológica e Deontológica) e Democracia Institucional (Robert Dahl[7]).

A reflexão analítica-crítica da configuração juspolítica da qualificação ontológica de ‘repercussão geral’ transcende a Normatividade e Legalidade Institucionais, pois as hipóteses normativas são insuficientes em-si e por-si para serem ontológicas, elas são axio-deontológicas para identificação da transpersonalização da pretensão individual-subjetiva ou coletiva-objetiva, para o atingimento do gradiente de densificação intelectível da Rechtsordnung (a Ordem Jurídica como uma unidade-totalidade, um sistema orgânico-funcional), Normatividade e Legalidade Institucionais íntegras e referíveis ao próprio Estado e Democracia Institucional.

A repercussão geral é uma qualificadora de racionalização do Direito e da Política (Norma e Poder), no sentido de manter simétrica e sincrética (matéria e forma) a própria qualidade dinâmica-dialética da coesão institucional sistêmica, que a Rechtsordnung possibilita.

A Rechtsordnung concreta possui suas lógicas de institucionalizações existencial e transcendental, cujo fator motriz é a ação e reação em face do Universo, na qualidade de expressão relacional dualógica do Estado para com aquele: Para cada gradiente de existencialidade há um de transcendentalidade que o corresponde, formando uma relação dinâmica dialética implicativa-biunívoca, relacionante do real e ideal de integridade institucional de-si, que o Estado perfaz e perfectibiliza por-si, estabilizando-se como Instituição.

A repercussão geral forma-se como dado empírico racional da pragmática e da transpragmática, realizante do Estado, no sentido de elasticidade ontológica de-si, na temporalidade especificante da Rechtsordnung, abrindo-lhe a consciência ordenante de institucionalidade para a decisão normativa concreta, atualizante-mutagênica da extensão da Normatividade Institucional, distendendo-a para com o Universo, organizando e estabelecendo coerência lógica-sistêmica.

A repercussão geral espelha a instrumentação pontual do Bloco de Institucionalidade, no sentido de referibilidade estrutural-matriz para a organicidade-motriz, desenvolvendo-se no processo jurisdicional a autorreferibilidade do Estado, uma vez que o recorrente o faz como súdito do Estado, súdito de-si e na expressão de dever ético para com ele.

Súdito e Sociedade Política assim se posicionam como protagonistas omniconvivenciais com o Estado e mantêm a segmentação racional implicacional entre-si, entre os estamentos intelectíveis de configuração ontológica de cada um, mantendo-se independência específica em cada ente (Logos relativo, Sociedade Política e Estado – o ente institucional).

A participação protagonista do súdito é imediata para-si próprio, para seu próprio universo intelectível cultural, visando imediatamente sua Ordnung concreta e, após, o faz na qualidade ontológica de integrador pertencente à Sociedade Política, em grau de gregariedade, em grau distensional-disjuntivo de-si e de pertencimento a um todo unitário-totalitário de natureza política, decidindo mediatamente sua Fortuna[8].

Para Javier Roiz[9] , a Fortuna, sob análise do pensamento de Nicolau Maquiavel constitui:

“Sin duda Fortuna significa la consagración de la visión de la política como vigilância perpetua: y essas ruedas están siempre girando, dia y noche, porque el cielo ordena (y a ella no se le puede resistir) que Pereza y Necessidad las giren sin cesar... Por encima de las verjas de entrada que nunca están cerradas, se sientan la suerte y la Oportunidad, sin ojos y sin oidos.” (...) “Fortuna en realidade sanea el ambiente humano de omnipotencia. Para empezar limita todo en el tempo y nos lo hace ver así para que compreendamos que tenemos limites: “Nada en el mundo es eterno; Fortuna lo quiere así y se hace así espléndida, de tal manera que su poder pueda verse más claramente.” (Itálicos no original e nossos).

Prova-se que o súdito assim o faz para o Estado na relação permeável jurisdicional, cuja legitimidade lhe é natural e óbvia, uma vez que ele e Sociedade Política se deram um Estado (Carl Schimitt[10]) e Leis Constitucionais (Carl Schmitt[11]), consolidando o Estado existencial para constituição formal (Legitimidade Institucional na transcendência), formando-se uma dinâmica multinivelar ética, pois o súdito e Sociedade Política anuíram democraticamente (CPC-2.015) para se darem e se possibilitarem em receber uma ordenatividade jurídica, que amoldou e coordenou o exercício do direito de ação (Garantia Institucional do Logos relativo).

Quem decidirá a extensão e dosimetria ontológicas da qualidade de repercussão geral é o Estado, pois o objeto questionável é o Staatsrecht e a Rechtsordnung, qualificados como estamentos racionais institucionais dele próprio (Logos Institucional), da sua identidade como Instituição das instituições, conferindo-lhe a completude de Rechtsstaat perfectibilizante ontológico de-si (José Luis Monereo Perez[12]).

O Estado faz por-si o desenvolvimento da autorreferibilidade cognoscível e compreensível de-si, dimensionando o gradiente de captura da essência da realidade e idealidade para transformá-las em substrato de ordenatividade de-si, puntualizante na repercussão geral e extensão decidente pelo Tribunal Constitucional.

 Para análise do critério normativo de repercussão geral,[13] há de ser feita a distensão entre a subjetividade do caso concreto e a objetividade da Normatividade Institucional e, por inferência lógica, da Rechtsordnung.

Prova-se que não se discute facticidade, valoração de prova ou a extensão delas, mas exclusivamente a situação jurídica da Normatividade Institucional do Estado.

Prova-se que há gradiente de objetividade, que a decisão normativa concreta lesiona a Normatividade Institucional constitucional, a Legalidade e Legitimidade Institucionais, Rechtsordnung, Staatsordnung[14], Staatsrecht[15] e Rechtsstaat[16], considerados como uma unidade-totalidade institucional sistêmica, sendo admissível o recurso extraordinário que se limita especificamente à realidade jurídica do recorrente, contendo elementos concretos que existam da própria Rechtsordnung lesionados direta, imediata e ostensivamente.

Consideram-se argumentos suficientes em-si, toda a perspectiva jurídica que foi apresentada na transcendentalização racional, universal unitarizante, que o Tribunal Constitucional entender pertinente, sendo elementos pertinentes a um processo jurídico objetivo e na extensão de sua objetividade transpersonalizante, sem inovação na Normatividade Institucional, com efeitos de transcendentalização de recurso de natureza extraordinária de pertinente conhecimento de um Tribunal Constitucional e eventual concessão de efeito repercussão geral.

A transcendentalização constitucional há de ser explícita na realidade juspolítica, ocorrendo a possibilidade de utilização da hermenêutica constitucional para dimensionar a possibilidade da extensão da Normatividade Institucional constitucional, sem que ocorra a alteração normativa, analisem-se provas ou facticidades peculiares ou criem-se normas específicas via decisão normativa concreta (Carl Schmitt).

O que a repercussão geral faz, numa específica temporalidade institucional do Tribunal Constitucional, dimensionar aquilo que está na Lei Constitucional (Carl Schmitt – Constituição Republicana de 1.988), conferindo extensão na pragmática com atualização face à realidade do possível.

Conclui-se que há uma distensão normativa entre Sociedade Política (Espírito Objetivo) e o Estado (Espírito Absoluto – G.W.F. Hegel), na qual há estamentos racionais entre um e outro, sendo que no último se encontra a completude da Rechtsordnung, Staatsordnung, Staatsrecht, Rechtsstaat e Democracia Institucional, que é objeto de conhecimento do Tribunal Constitucional.

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A pretensão, em análise crítica pelo Tribunal Constitucional, circunscreve-se ao poder de autotutela do Estado para com a Normatividade Institucional constitucional e legal, especialmente em relação à questão constitucional, que é a própria Legalidade, tal como explicita o STF, no julgamento abaixo.

Tem-se uma análise da Legalidade Institucional (Institutionelle Legalität), em sede de Bloco de Institucionalidade e, simultaneamente, de Questão Constitucional, tal como se observa no julgamento do recurso extraordinário nº 638.115, com repercussão geral deferida, o Sr. Ministro-Relator Gilmar Mendes[17] expõe, em seu voto de admissibilidade do recurso naquela qualidade repercussiva, a acepção de Legalidade – Normatividade Institucional – Rechtsordnung.

Prova-se claramente a existência da denominada Questão Constitucional em face da Normatividade Institucional e, principalmente, a margem analítica possível pelo Tribunal Constitucional, que poderá distender à Legalidade Institucional e seu conteúdo, mas não inová-la (John Rawls[18]).

Tal margem analítica é dilatada em razão da necessidade que o Tribunal Constitucional pode realizar para manutenção de integridade, coerência e organicidade da Rechtsordnung, Legalidade Institucional e Normatividade Institucional constitucional, nos seus aspectos dinâmicos.

Prova-se que existe margem legítima de análise pelo Tribunal Constitucional e sinergia institucional para o início da análise de dimensionamento da normatividade constitucional, tal como exposto pelo Ministro Gilmar Mendes.

O estamento intelectível da Normatividade Institucional constitucional é finito em-si próprio, mas permeável à dinamicidade realizante do Estado, possibilitando-lhe a autoperfectibilização ontológica, autossuperando-se por-si.


Notas

[1] I Tre Tipi di Scienza Giuridica. Torino: G. Giappichelli, 2002, Organizador: Giuliana Stella, Coleção: Jus Publicum Europaeum, vol. 1, p. 09.

[2] Der Moderne Staat – Grund del politologischen Analyse. 2.Auflage. München: Oldenbourg, 2008, p. 105 e ss.

[3] Cf.: SCHMITT, Carl. El Nomos de la Tierra en el Derecho de Gentes del “Ius Publicum Europaeum”. Granada: Comares, 2002, Trad. Dora Schilling Thou, Colección: Crítica del Derecho, Sección: Arte del Derecho, vol. 41, ps. 35-36: “Nomos, en cambio, procede de nemein, una palabra que significa tanto “dividir” como también “apacentar”. El nomos es, por lo tanto, la forma inmediata en la que se hace visible, en cuanto al espacio, la ordenación política y social de un pueblo, la primera medición y partición de los campos de pastoreo, o sea, la toma de la terra y la ordenación concreta que es inherente a ella y se deriva de ella; en las palabras  de Kant: “la ley divisoria de lo mío y lo tuyo del suelo”, o en la formula inglesa que es una puntualización adecuada: el “radical title”. Nomos es la medida que distribuye y divide el suelo del mundo en uma ordenación determinada, y, en virtud de ello, representa la forma de la ordenación política, social y religiosa. Medida, ordenación y forma constituyen aquí una unidad espacial concreta. En la toma de la tierra, en la fundación de una ciudad o de una colonia se revela el nomos con el que una estirpe o un grupo o un pueblo se hace sedentario, es decir se establece históricamente y convierte a un trozo de tierra en el campo de fuerzas de una ordenación. Sólo en relación con un nomos de esta índole, y no com cualquier disposición o aun con una norma sofisticamente separada de la fisis concreta, que como “tesis” en contrapuesta a la fisis, (...)” E à p. 39: “(...) El nomos, en su sentido original, sin embargo, es precisamente la plena inmediatitud de una forza jurídica no atribuída por leyes; es un acontecimiento histórico constitutivo, un acto de la legitimidad que es el que da sentido a la legalidad de la mera ley.” (grifos nossos). Cf.: LÓPEZ, Montserrat Herrero. El nomos y lo político: La filosofía política de Carl Schmitt. 2ª ed. Barañáin: Navarra. Ed EUNSA, 2007, Colección Filosófica, NÚM. 120; MORENO, José Antonio Sanz. Ordenación jurídica y Estado postliberal: Hans Kelsen y Carl Schmitt. Granada: Espanha, 2002, Biblioteca Comares de Ciencia Jurídica, p. 350 e ss.

[4] Cf.: KAUFMANN, Arthur. Derecho, Moral y Historicidad. Barcelona: Marcial Pons, 2000, Trad. Emilio Eiranova Encinas, ps. 42-43 “Pero, para todas las cosas terrenales, la posibilidad de desmoronamiento de su esencia y su existencia, así como de lo resultante de ambas y la contingencia de su ser, no tienen el mismo sentido. Los entes sin espíritu, la pura materia, las plantas y los animales existen, al igual que lo han hecho siempre, en la perfección de su esencia, sin que por ello tengan que hacer algo ellas mismas, siempre y cuando puedan no necesitar de su esencia para realizarse, y de ahí que no puedan errar: una vez que existen, son todo aquello que pueden ser. Con los hombres y sus obras culturales sucede de otro modo; aquí la realización de la esencia no aparece como una necesidad poderosa y causada por la naturaleza, sino como un acto que emana de la liberdad del espíritu; se presenta para el Hombre como una obra perpetua e inacabada; además, por ser el Hombre libre, puede también equivocarse; él mismo asume el riesgo y la responsabilidad que entraña hacer el trabajo. De esta forma, la realización del Derecho constituye un deber permanente, puesto que en todo momento debe, tal y como dijo Eberhard Schmidt “aproximarse a la justicia y, a su manera, a la idea de justicia”. Nunca imperfecto, de un Derecho perfecto, verdadero y correcto; pero allí donde no nos hemos esforzado, el Derecho cae en la deficiencia denominada positivismo. Así, entendemos la temporalidad e historicidad de los hombres, y la del mismo Derecho, como un modelo estructural del ser. Las cosas carentes de inteligencia no saben nada del tiempo, por lo que son algo meramente fáctico; el Hombre, por su inteligencia, tiente una comprensión de sua situación temporal e histórica, y concibe su existencia como ser en un tiempo y ser a lo largo del tiempo. Como si fuese un espectador en el tiempo debe desprenderse del ayer y el hoy en aras del futuro; esto lo realiza constantemente, nunca termina este esfuerzo, siempre está en camino. Por último, cabe señalar cómo este caminar del ser en el tiempo sólo puede tener sentido si está orientado a una meta, cuanto esto sucede en un fondo supratemporal y absoluto. Lo inmanente sólo recibe algún sentido de lo transcendente, solamente se ilumina la temporalidad por la eternidad. El hombre es un caminante entre dos mundos, lo que quiere decir que el “ser ahí” es histórico.” (itálicos nossos); LÓPEZ, Montserrat Herrero. El nomos y lo político: La filosofia política de Carl Schmitt. 2ª edição. Navarra: EUNSA, 2007, Colección Filosófica, núm. 20, p. 51 e ss.

[5] Cf.: MESSNER, Johannes. Ética Social. São Paulo: Quadrante e Editora da Universidade de São Paulo, s/d, Tradução: Alípio Maia de Castro, p. 09.

[6] Cf.: BOBBIO, Norberto. Teoria Geral da Política – A Filosofia Política e as Lições dos Clássicos. 1ª edição. 12ª tiragem. Rio de Janeiro: Elsevier e Campus, 2000, p. 190 e ss.

[7] A Democracia e seus Críticos. São Paulo: WMF/Martins Fontes, 2012, Tradução: Patrícia de Freitas Ribeiro, Revisão de Tradução: Aníbal Mari.

[8] Cf.: BLANC, Mafalda de Faria in op. cit. p. 33: “Assim, compete ao nível hermenêutico cingir, numa primeira visão sinóptica, o como do aparecer do ser, ou seja, delimitar o âmbito e o caráter da sua verdade, ou ainda, numa perspectiva transcendental e crítica, que tem em conta as estruturas da articulação pensante e discursiva do ser, interpretar o seu horizonte de sentido.” (Negritos no original e itálicos nossos). Não se aplica à horizontalidade de Fortuna o historicismo radical em razão da existência da Liberdade racional-cultural e Vontade do Logos relativo, no sentido dele próprio ser o constituidor, construtor, integrador e instituinte de-si, da metodologia e do conteúdo de sua ortoessencialização subsistente de-si. E na análise de GABRIEL CHALITA in op. cit. p. 90: “A definição mais completa de fortuna encontra-se nessa citação de O Príncipe. Maquiavel desloca a fortuna do domínio de deuses ou de forças divinas, colocando-a como questão circunstancial, como “sorte”, como relação de forças. Não há destino ou algo que já esteja escrito para acontecer; isso limitaria o poder de atuação do homem e lhe tiraria o livre-arbítrio. As circunstâncias, a ocasião, a sorte: a fortuna confunde-se com essas questões. O que importa é estar preparado para aproveitar ao máximo a sua passagem, e, quando ela faltar, a virtù poder dar conta sozinha de sua função.” (Itálicos no original e nossos); CUNHA, Paulo Ferreira. Repensar a Política – Ciência & Ideologia. 2ª edição revista e atualizada, Coimbra: Almedina, 2007, p. 188: “A expressão virtù está espalhada repetidamente por todo O Príncipe, de Maquiavel. Por vezes logo associada a fortuna. A fortuna é determinação exógena, a virtù é a qualidade, a força, a capacidade própria para agir e mudar o mundo, dentro dos limites da fortuna. Bem se vê como esta virtù viril [...] nada tem a ver com as virtudes cristãs, e é ainda diversa das aretai clássicas, ou das virtudes estóicas e ciceronianas. A virtude é coragem, bravura, orgulho, vigor, força, impetuosidade. Só ela detém e de algum modo molda a fortuna. Mas Maquiavel é cauteloso. E em casos de sucesso, histórico ou futuro – como o que simultaneamente constata e pres[a]gia aos Médicis – não deixa de fazer confluir na ventura quer uma quer outra:” (Itálicos no original e nossos); ROIZ, Javier, Leo Strauss y la Omnipotencia en política, In: Teorías Políticas Contemporáneas, p. 53 e ss e 56.

[9] Leo Strauss y la omnipotencial política, In: Teoría Política Contemporáneas, p. 55.

[10] Cf.: Teoría de la Constitución. 1ª edição. 5ª reimpressão. Madrid: Alianza. 2006. Apresentação: Francisco Ayala, Epílogo: Manuel García-Pelayo. Tradução ao espanhol: Francisco Ayala, Coleção Alianza Universidad Textos, p. 35.

[11] Cf.: Idem, p. 37 e ss; MORENO, José Antonio Sanz. Ordenación jurídica y Estado postliberal: Hans Kelsen y Carl Schmitt. Granada: Comares, 2.002. Biblioteca Comares de Ciencia Jurídica, p. 224 e ss.

[12] Cf.: Edición y Estudio Preliminar: “Hermann Heller y la “constitución política” de la sociedade” In: HELLER, Hermann. Las Ideas Políticas Contemporáneas. Granada: Editorial Comares, 2004, Colección: Crítica del Derecho, Sección: Arte del Derecho, vol. 56, p. XXIV: “(...) En el Estado soberano moderno el Derecho asume formalmente la condición de fuente y garante de todo Derecho. Él afirma el principio da estatalidade del Derecho, aunque admita la existencia subordinada de otros centros sociales de poder jurídico diferentes (el Derecho es la ordenación social de um complejo normativo estabelecido y assegurado por la organización del Estado). En una sociedade desarrollada (sociedade jurídica), el Derecho y el Estado son elementos correlativos: Estado y Derecho son mutuamente condiciones necessárias de su propia existencia. Aunque destaca la normatividade del Derecho, no olvida que todo deber ser queda referido ao ser. Se trata, ambos, de términos que se encuentran referidos dialécticamente entre sí. El Estado democrático de Derecho supone una autolimitación de los fines y de las condiciones de ejercicio del poder del Estado, pero no una neutralización completa de su poder soberano, en cual o de excepción. En este sentido el Estado democrático puede comportarse como Estado autoritario.” (Itálicos nossos)

[13] “Art. 1.035.  O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral, nos termos deste artigo.

§ 1o Para efeito de repercussão geral, será considerada a existência ou não de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo.

§ 3o Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar acórdão que:

I - contrarie súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal;

II - tenha sido proferido em julgamento de casos repetitivos;

III - tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da Constituição Federal.”

[14] Cf.: JELLINEK, Georg. Teoría general del Estado. 1ª edição em espanhol. México: Fondo de Cultura Económica, 2000, Tradução e Prólogo: Fernando de los Ríos, Sección de Obras de Política y Derecho, p. 65.

[15] Cf.: STOLLEIS, Michael. Histoire du droit public en Allemagne – 1800-1914. Paris: Dalloz, 2014, Apresentação: Jean-Louis Mestre, Tradução: Marie-Ange Maillet e Mari Ange Roy, Coleção: Rivages du droit, p. 03 e ss; JELLINEK, Georg in op. cit. p. 44.

[16] Cf.: GOZZI, Gustavo. Estado de Direito e direitos subjetivos na história constitucional alemã. In: Estado de Direito: História, teoria, crítica. COSTA, Pietro e ZOLO, Danilo (orgs). São Paulo: Martins Fontes, 2006, Tradução: Carlo Alberto Dastoli, p. 308 e ss; BÖCKENFÖRDE, Ernst Wolfgang. Estudios sobre el Estado de Derecho y la democracia. Madrid: Trotta, 2000, Tradução e Prólogo: Rafael de Agapito Serrano, Colección: Estructuras y Procesos, Série: Derecho, p. 17 e ss; BARBERIS, Mauro, Idéologies de la constitution – Histoire du constitutionnalisme. In: Traité international de droit constitutionnel – Théorie de la Constitution. TROPER, Michel e CHAGNOLLAUD, Dominique (direction), Paris: Dalloz, 2012, Coleção: Traité Dalloz, Tomo I, ps. 132-135.

[17] “RECURSO EXTRAORDINÁRIO 638.115 CEARÁ VOTO: O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): Em primeiro lugar, atesto a presença dos requisitos de admissibilidade do recurso extraordinário e ressalto que a questão nele discutida teve repercussão geral reconhecida por esta Corte (decisão de 27.4.2011). O parecer da Procuradoria-Geral da República sugere que o presente recurso extraordinário não seria cabível contra a decisão do Superior Tribunal de Justiça que, mantendo o entendimento fixado pelo Tribunal Regional, não debateu questão constitucional nova. Dessa forma, não havendo prequestionamento, a oportunidade para invocar matéria constitucional estaria preclusa, pois não teria sido interposto o recurso extraordinário contra a decisão da Corte regional. Para tanto, cita a consolidada jurisprudência desta Corte sobre o tema (AI-AgR 145.589, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 24.6.1994). De fato, a jurisprudência desta Corte é no sentido de ser inadmissível o recurso extraordinário interposto contra decisão do STJ que, em recurso especial, fundamenta-se em matéria constitucional já apreciada e decidida na instância inferior e não impugnada diretamente no STF mediante recurso extraordinário. Assim, não interposto o recurso extraordinário contra a decisão de segunda instância dotada de duplo fundamento (legal e constitucional), fica preclusa a oportunidade processual de questionar a matéria constitucional. Novo recurso extraordinário somente é admissível para suscitar a questão constitucional surgida originariamente no julgamento do recurso especial pelo STJ (AI-AgR 155.502, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 27.5.1994; RE-AgR 365.989, rel. Min. Celso de Mello, DJ 10.02.2006). Ocorre, porém, que o caso apresentado nos presentes autos é deveras peculiar. O tema referente à incorporação de quintos, por suscitar a interpretação da legislação aplicável a essa matéria (leis 8.112/90, 8.911/94, 9.624/98 e MP 2.225-45/2001), costuma ser tratado como de índole estritamente infraconstitucional. Assim, ele tem sido enfrentado pelos tribunais e também pelo Superior Tribunal de Justiça. No entanto, essa forma de abordar a matéria representa apenas um dos enfoques possíveis quanto à questão da legalidade. Nada impede que a questão debatida em todas as instâncias inferiores, inclusive no âmbito do STJ, seja abordada desde outra perspectiva no Supremo Tribunal Federal, mesmo porque a causa de pedir do recurso extraordinário é aberta (RE 298.695, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 6-8-2003, Plenário, DJ de 24-10-2003). A mesma questão debatida, devidamente prequestionada, pode ser apreciada desde outro enfoque pelo Supremo Tribunal Federal, o qual poderá enfrentar o tema desde o enfoque constitucional, inegavelmente presente nesta matéria. Nessa hipótese, é cabível o recurso extraordinário, tendo em vista que, apreciada a questão novamente pelo STJ, apenas resta a via do recurso extraordinário para que o STF possa analisá-la sob outra perspectiva, a constitucional. E, no caso, a matéria, apreciada de forma adequada, é visivelmente constitucional. Destarte, não há, aqui, mera questão de ilegalidade, por ofensa ao direito ordinário, mas típica questão constitucional consistente na afronta ao postulado fundamental da legalidade. Embora a doutrina ainda não tenha contemplado a questão com a necessária atenção, é certo que, se de um lado, a transferência para o Superior Tribunal de Justiça da atribuição para conhecer das questões relativas à observância do direito federal acabou por reduzir a competência do Supremo Tribunal Federal às controvérsias de índole constitucional, não subsiste dúvida de que, por outro, essa alteração deu ensejo à Excelsa Corte de redimensionar o conceito de questão constitucional. O próprio significado do princípio da legalidade, positivado no art. 5.º, II, da Constituição, deve ser efetivamente explicitado, para que dele se extraiam relevantes consequências jurídicas já admitidas pela dogmática constitucional. O princípio da legalidade, entendido aqui tanto como princípio da supremacia ou da preeminência da lei (Vorrang des Gesetzes), quanto como princípio da reserva legal (Vorbehalt des Gesetzes), contém limites não só para o Legislativo, mas também para o Poder Executivo e para o Poder Judiciário. A idéia de supremacia da Constituição, por outro lado, impõe que os órgãos aplicadores do direito não façam tabula rasa das normas constitucionais, ainda quando estiverem ocupados com a aplicação do direito ordinário. Daí porque se cogita, muitas vezes, sobre a necessidade de utilização da interpretação sistemática sob a modalidade da interpretação conforme à Constituição. É de se perguntar se, nesses casos, tem-se simples questão legal, insuscetível de ser apreciada na via excepcional do recurso extraordinário, ou se o tema pode ter contornos constitucionais e merece, por isso, ser examinado pelo Supremo Tribunal Federal. Ainda, nessa linha de reflexão, deve-se questionar se a decisão judicial que se ressente de falta de fundamento legal poderia ser considerada contrária à Constituição, suscitando uma legítima questão constitucional. Na mesma linha de raciocínio seria, igualmente, lícito perguntar se a aplicação errônea ou equivocada do direito ordinário poderia dar ensejo a uma questão constitucional. Tal como outras ordens constitucionais, a Constituição brasileira consagra como princípio básico o postulado da legalidade segundo o qual “ninguém está obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (CF, art. 5.º, II). O princípio da legalidade contempla, entre nós, tanto a ideia de supremacia da lei (Vorrang des Gesetzes), quanto a de reserva legal (Vorbehalt des Gesetzes). O princípio da reserva legal explicita as matérias que devem ser disciplinadas diretamente pela lei. Este princípio, em sua dimensão negativa, afirma a inadmissibilidade de utilização de qualquer outra fonte de direito diferente da lei. Na dimensão positiva, admite que apenas a lei pode estabelecer eventuais limitações ou restrições (CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional. 5. ed., Coimbra, 1992, p. 799). Por seu turno, o princípio da supremacia ou da preeminência da lei submete a Administração e os tribunais ao regime da lei, impondo tanto a exigência de aplicação da lei (dimensão positiva) quanto a proibição de desrespeito ou de violação da lei (dimensão negativa) (CANOTILHO. Direito Constitucional, op. cit., p. 796-795). A propósito, são elucidativas as lições de Canotilho: “Em termos práticos, a articulação de suas dimensões aponta: (I) para a exigência da aplicação da lei pela administração e pelos tribunais (cf. CRP arts. 206, 266/2), pois o cumprimento concretizador das normas legais não fica à disposição do juiz (a não ser que as ‘julgue’ inconstitucionais) ou dos órgãos e agentes da administração (mesmo na hipótese de serem inconstitucionais); (II) a proibição de a administração e os tribunais actuarem ou decidirem contra lei, dado que esta constitui um limite (‘função limite’, ‘princípio da legalidade negativa’) que impede não só as violações ostensivas das normas legais, mas também os ‘desvios’ ou ‘fraudes’ à lei através da via interpretativa; (III) nulidade ou anulabilidade dos actos da administração e das medidas judiciais ilegais; (VI) inadmissibilidade da ‘rejeição’ por parte dos órgãos e agentes da administração (mas já não por parte dos juízes), de leis por motivo de inconstitucionalidade. Neste sentido pôde um autor afirmar recentemente que o princípio da legalidade era um ‘verdadeiro polícia na ordem jurídica’ (J. Chevallier).” Problema igualmente relevante coloca-se em relação às decisões de única ou de última instância que, por falta de fundamento legal, acabam por lesar relevantes princípios da ordem constitucional. Uma decisão judicial que, sem fundamento legal, afete situação individual revela-se igualmente contrária à ordem constitucional, pelo menos ao direito subsidiário da liberdade de ação (Auffanggrundrecht) (SCHLAICH, Klaus. Das Bundesverfassungsgericht, Munique, 1985, p. 108). Se se admite, como expressamente estabelecido na Constituição, que os direitos fundamentais vinculam todos os poderes e que a decisão judicial deve observar a Constituição e a lei, não é difícil compreender que a decisão judicial que se revele desprovida de base legal afronta algum direito individual específico, pelo menos o princípio da legalidade. A propósito, assinalou a Corte Constitucional alemã: “Na interpretação do direito ordinário, especialmente dos conceitos gerais indeterminados (Generalklausel) devem os tribunais levar em conta os parâmetros fixados na Lei Fundamental. Se o tribunal não observa esses parâmetros, então ele acaba por ferir a norma fundamental que deixou de observar; nesse caso, o julgado deve ser cassado no processo de recurso constitucional” (Verfassungsbeschwerde) (BverfGE 7, 198 (207); 12, 113 (124); 13, 318 (325) (BverfGE 18, 85 (92 s.); cf., também, ZUCK, Rüdiger. Das Recht der Verfassungsbeschwerde. 2ª ed., Munique, 1988, p. 220). Não há dúvida de que essa orientação prepara algumas dificuldades, podendo converter a Corte Constitucional em autêntico Tribunal de revisão. É que, se a lei deve ser aferida em face de toda a Constituição, as decisões hão de ter sua legitimidade verificada em face da Constituição e de toda a ordem jurídica. Se se admitisse que toda decisão contrária ao direito ordinário é uma decisão inconstitucional, ter-se-ia de acolher, igualmente, todo e qualquer recurso constitucional interposto contra decisão judicial ilegal (SCHLAICH. Das Bundesverfassungsgericht, op. cit., p. 109). Enquanto essa orientação prevalece em relação a leis inconstitucionais, não se adota o mesmo entendimento no que concerne às decisões judiciais. Por essas razões, procura o Tribunal formular um critério que limita a impugnação das decisões judiciais mediante recurso constitucional. Sua admissibilidade dependeria, fundamentalmente, da demonstração de que, na interpretação e aplicação do direito, o juiz desconsiderou por completo ou essencialmente a influência dos direitos fundamentais, que a decisão se revela grosseira e manifestamente arbitrária na interpretação e aplicação do direito ordinário ou, ainda, que se ultrapassaram os limites da construção jurisprudencial (Cf., sobre o assunto, SCHLAICH. Das Bundesverfassungsgericht, op. cit., p. 109). Não raras vezes, observa a Corte Constitucional que determinada decisão judicial afigura-se insustentável, porque assente numa interpretação objetivamente arbitrária da norma legal (Sie beruth vielmehr auf schlechthin unhaltbarer und damit objektivwillkürlicher Auslegung der angewenderen Norm) [BverfGE 64, 389 (394)]. Assim, uma decisão que, v.g., amplia o sentido de um texto normativo penal para abranger uma dada  conduta é considerada inconstitucional, por afronta ao princípio do nullum crimen nulla poena sine lege (LF, art. 103, II). Essa concepção da Corte Constitucional levou à formulação de uma teoria sobre os graus ou sobre a intensidade da restrição imposta aos direitos fundamentais (Stufentheorie), que admite uma aferição de constitucionalidade tanto mais intensa quanto maior for o grau de intervenção no âmbito de proteção dos direitos fundamentais (ZUCK, Rüdiger. Das Recht der Verfassungsbeschwerd. 2.ª ed., Munique, 1968, p. 221). Embora o modelo de controle de constitucionalidade exercido pelo Bundesverfassungsgericht revele especificidades decorrentes sobretudo do sistema concentrado, é certo que a ideia de que a não observância do direito ordinário pode configurar uma afronta ao próprio direito constitucional tem aplicação também entre nós. Essa conclusão revela-se tanto mais plausível se se considera que, tal como a Administração, o Poder Judiciário está vinculado à Constituição e às leis (CF, art. 5.º, §1º). Enfim, é possível aferir uma questão constitucional na violação da lei pela decisão ou ato dos poderes Executivo, Legislativo ou Judiciário. A decisão ou ato sem fundamento legal ou contrário ao direito ordinário viola, dessa forma, o princípio da legalidade. No caso, a decisão judicial que determina a incorporação dos quintos carece de fundamento legal e, portanto, viola o princípio da legalidade. (...)” (negritos e itálicos no original e nossos).

[18] Political Liberalism – Expanded ed. New York: Columbia University Press, 2005, Columbia Classics in Philosophy, p. 237.

Sobre o autor
Marcelo Elias Sanches

Especialista em Direito Tributário, Direito Processual Civil e Direito Público; Mestre em Direito Político e Econômico.Advogado da União Federal

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