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Análise da relação contratual dos motoristas da empresa Uber sob o prisma dos elementos que caracterizam a relação de emprego no direito do trabalho

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Agenda 07/03/2018 às 14:28

A tese adotada pela empresa Uber, quanto ao seu modelo de negócio e quanto à relação jurídica dos seus motoristas, não coincide com o que efetivamente ocorre no mundo dos fatos.

Resumo: Este trabalho abordou a relação jurídica existente entre os motoristas e a empresa Uber. A análise partiu do estudo dos elementos caracterizadores da relação de emprego constantes no art. 3º da CLT. Para tanto, foi necessário explicar o funcionamento da empresa Uber e as suas características, além de explicitar o modelo de negócio predominante na sua estrutura. Além disso, foi feita uma abordagem da realidade dos fatos em relação às atividades exercidas pelos motoristas, sob o prisma dos elementos que caracterizam o vínculo de emprego. O resultado demonstrou que a tese adotada pela empresa, quanto ao seu modelo de negócio e, também, quanto à relação jurídica dos seus motoristas, não coincide com o que efetivamente ocorre no mundo dos fatos. Verificou-se que a Uber é uma das maiores empresas de transporte individual de passageiros do mundo. E também, que a relação entre a empresa e os seus motoristas é a de vínculo de emprego.

Palavras-Chaves: Uber; economia compartilhada; disrupção; relação de emprego.


INTRODUÇÃO

Diante do cenário contemporâneo das relações de trabalho, é de suma importância atentar-se para as novas modalidades laborais que surgem do avanço tecnológico. As relações jurídicas advindas dessa inovação merecem atenção especial dos operadores do direito e, em particular, do Direito do Trabalho, que tem papel fundamental na solução de possíveis lides.

O ordenamento jurídico brasileiro nada mais é do que um conjunto de normas jurídicas, divididas por matérias, dentre as quais se encontra o ramo do Direito do Trabalho. Essa especialidade do Direito estuda, além de outros institutos jurídicos, as relações de trabalho e os seus efeitos perante a sociedade.

Em sua essência, o Direito do Trabalho apresentará de forma bastante abrangente questões relevantes e respostas acerca do tema proposto. Para isso, reuniu-se neste trabalho dados e informações com o propósito de responder ao seguinte questionamento: é possível compreender que tipo de relação jurídica há entre a empresa Uber e os seus motoristas, partindo-se do estudo dos elementos caracterizadores da relação de emprego do Direito do Trabalho?

Para responder a essa pergunta, discorreremos acerca da empresa Uber, do seu funcionamento, como ela opera de fato no mercado, de que forma ela se sustenta economicamente. Abordaremos o modelo de negócio adotado pela Uber, e, por fim, detalharemos as atividades exercidas pelos motoristas, com base nos elementos da relação empregatícia (pessoa física, pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação) e, consequentemente, a relação existente entre motoristas e Uber.

Apesar das várias controvérsias envolvendo novos mecanismos de utilização de mão de obra decorrentes da inovação tecnológica, é possível regulamentar as relações de trabalho desse novo modelo de exploração laboral, tendo em vista que as normas de Direito do Trabalho existentes respondem de forma satisfatória a essa nova forma de exploração da força de trabalho.


Uber

Segundo o que a própria empresa descreve, a sua criação se deu em 2009 em São Francisco, Califórnia, por Garret Camp e Travis Kalanick, após uma experiência que eles tiveram em uma viagem para a Europa. Eles estavam em Paris participando de um evento de tecnologia e empreendedorismo e passaram pela dificuldade de encontrar um táxi. Então, diante da necessidade, surgiu a ideia: por que não criar um serviço de motorista particular utilizando o celular?

Voltaram para os Estados Unidos e fundaram a empresa que se chamava UberCab: um aplicativo para smartphone em que era possível solicitar um carro informando a localização do passageiro através do GPS. Inicialmente a proposta era oferecer um serviço semelhante a um táxi de luxo com carros executivos (MELO, 2015). Em 2011, a empresa iniciou sua expansão no território norte-americano e em 2012, internacionalmente. 

A empresa chegou ao Brasil no primeiro semestre de 2014, antes da copa do mundo. Iniciou suas operações na cidade do Rio de Janeiro, e logo depois passou a atender às cidades de São Paulo, Belo Horizonte e Brasília. Hoje atua em mais de 43 cidades do Brasil e em mais de 530 cidades espalhadas pelo mundo (UBER, 2017).

A Uber auto define-se como uma plataforma tecnológica criada para smartphones que permite estabelecer uma conexão entre motoristas profissionais (dispostos a compartilhar o uso de veículos subutilizados) a usuários interessados em contratá-los, orientando-se pelos princípios da economia colaborativa:

Para utilização dos serviços da Uber, o usuário instala o aplicativo em seu smartphone e realiza um cadastro, fornecendo: nome, telefone celular, e-mail, idiomas e informações de um cartão de crédito. Ao abrir o aplicativo, o usuário pode visualizar um mapa do local onde pode ajustar sua localização. Por meio do GPS, o aplicativo Uber associa o passageiro solicitante a motoristas mais próximos e estima o tempo de espera. O preço estimado para a viagem pode ser visualizado antes de confirmar o pedido de transporte. Após confirmar a localização exata, o aplicativo contata o outro lado da plataforma, os motoristas. Uma vez aceita a viagem, o passageiro recebe as informações sobre o motorista e seu automóvel, podendo acompanhar o deslocamento do carro no mapa do aplicativo. Na chegada do carro, o usuário é avisado por mensagem de texto. (AZEVEDO, PONGELUPPE, MORGUILIS, & ITO, 2015, p. 3).

A empresa não possui frota de veículos e sustenta que não há motoristas contratados. Ela os define como empreendedores individuais que utilizam a plataforma em sistema de economia compartilhada. Para se tornar um “motorista parceiro”, o condutor deve atender várias exigências, como:

Os automóveis também são credenciados pela Uber, devendo atender a vários requisitos alusivos à segurança, luxo e conforto. Dentre os serviços oferecidos pelo aplicativo, os mais conhecidos são o UberBLACK e o UberX. Esses serviços se diferenciam pelo padrão dos veículos que são oferecidos.  A empresa define o UberBLACK como serviço luxuoso de alto nível (UBER, 2017). Os veículos exigidos nessa categoria devem ser do tipo sedam ou SUV, na cor preta, quatro portas, ar condicionado, cinco lugares e bancos de couro. O site do aplicativo disponibiliza uma relação das marcas, modelos e ano dos veículos que podem fazer parte dessa categoria. O UberX é composto por carros populares, que devem atender às seguintes exigências: o modelo do veículo deve ser do ano de 2008 ou superior, quatro portas, ar condicionado e cinco lugares.

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A fixação dos valores das corridas é totalmente controlada pela empresa. Os motoristas não dispõem de qualquer oportunidade de negociar os preços com os passageiros.

O valor das corridas é calculado através do próprio aplicativo, que gera uma estimativa de preço, antes mesmo de o cliente fazer a solicitação, com base em fatores como a distância a ser percorrida e o tempo de viagem, tendo em vista as informações repassadas previamente por cada cliente, atinentes a sua localização e destino (SARMENTO, 2015, p. 2).  Tem-se também o preço dinâmico, que pode se elevado ou reduzido pelo aplicativo, a qualquer momento. Para isso acontecer, basta que a demanda de passageiros esteja alta.  De acordo com a Uber, se a demanda de passageiros estiver alta, o preço dinâmico aumentará os valores de modo gradual. Para os passageiros, o preço dinâmico ajuda a garantir a disponibilidade rápida de um veículo. Para os motoristas, o preço dinâmico aumenta os valores das viagens para fornecer um ganho adicional. Este multiplicador de preço dinâmico se aplica à base, ao tempo e à distância do preço de viagem (PEREIRA, 2016).

Maria Cecília Máximo Teodoro faz duras críticas quanto ao modelo do preço dinâmico adotado pela Uber. Para ela, o preço dinâmico é:

uma ferramenta de controle da demanda, pelo qual a Uber manipula, livremente, sem nenhuma interferência estatal, a lei da oferta e da procura, exercendo um controle sem freios sobre o mercado de transporte de passageiros, podendo incorrer, inclusive, na prática de Dumping, [...]. Ademais, o preço dinâmico afronta os direitos dos consumidores, os passageiros, e, principalmente demonstra que a suposta autonomia dos motoristas da Uber não se concretiza na realidade operacional da empresa, sequer quanto ao que mais lhe importa – o retorno financeiro. (TEDODORO, D’AFONSECA & ANTONIETA, 2017).

Os pagamentos são realizados por meio do cartão de crédito, previamente cadastrado no aplicativo, ou por meio de dinheiro.

O motorista fica 80% (oitenta por cento) do valor cobrado por viagem e a empresa com 20% (vinte por cento), na categoria UberBLACK. Na UberX, o motorista fica com 75% (setenta e cinco por cento) e a empresa com 25% (vinte e cinco por cento).

Todos os custos da prestação do serviço ficam a cargo dos motoristas, como combustível, manutenção do veículo, seguros, impostos e taxas de licenciamentos, além das regalias servidas aos passageiros, como água e balas.

A permanência dos motoristas na plataforma depende das avaliações anônimas que estes recebem dos usuários após o término de cada viagem, por meio de um sistema de pontuação, que varia de zero a cinco estrelas. Caso o motorista tenha uma média de avaliação menor que 4,6 estrelas, pode ser descredenciado pela Uber. De acordo com a empresa, esse é um dos mecanismos utilizados para controlar a qualidade dos serviços.

Em sua página oficial, a Uber oferece aos seus motoristas o Guia do Parceiro 5 Estrelas, que contém diversas instruções. Dentre elas, estão:

A Uber qualifica seus parceiros como trabalhadores autônomos, livres para exercer suas atividades da forma que melhor lhe convir. Isso fica claro na propaganda do seu site “A Uber precisa de parceiros como você. Dirija com a Uber e ganhe dinheiro como autônomo. [...]. Seja seu próprio chefe e seja pago dirigindo em seu próprio horário.” (UBER, 2017).  De acordo com Paulo Furquim de Azevedo, Leandro Simões Pongeluppe, Maria Clara de A. Morgulis e Nobuiuki Costa Ito (2015), “Os motoristas parceiros são autônomos [...] – não estão sujeitos a ordens, possuem liberdade para definir quando e por quanto tempo trabalhar, e deles não se exige exclusividade.” 

Por outro lado, o Procurador do Trabalho Rodrigo de Lacerda Carelli afirma que os motoristas parceiros são, na verdade, empregados da Uber:

O Uber é, na prática, a forma mais completa do novo modelo de exploração de trabalhadores, no qual o controle se dá por programação, inputs e outputs. O Uber, empresa, controla o tipo de carro, a forma de conduzir, modo de se portar, uniforme e a tarifa a ser cobrada. Tem total controle dos trabalhadores por meio do sistema de “cenouras e porrete”, ou seja, por meio de prêmios e castigos. Controla o quantitativo de mão de obra disponível, por meio de premiações para o trabalho em momentos de pouca oferta. A faceta do porrete também se apresenta: os trabalhadores não podem negar corridas e são desligados do sistema se não obtiverem certa nota pelos clientes do Uber. (CARELLI, 2016).

A Uber constantemente muda a nomenclatura quando se refere aos seus motoristas, ora chamando-os de “parceiros”, ora de “clientes” e outras vezes de “contratantes”. Independentemente do nome adotado pela empresa, o fato é que a principal responsável pelo faturamento bilionário da Uber é a força de trabalho despendida por seus motoristas.

A empresa fatura sobre o percentual pago de cada corrida, ou seja, são os passageiros que pagam pelo serviço de transporte, são os usuários quem são realmente os clientes ou contratantes da Uber, não os seus motoristas, como ela afirma.

Apesar de a Uber não ser a única empresa que ofereça esse tipo de serviço no Brasil, conectar motoristas e passageiros por meio de um aplicativo, este trabalho limitar-se-á ao estudo dessa empresa, devido ao grande destaque que é dado a ela na mídia e ao seu porte, que em 2016 chegou a ser avaliada em mais de 60 bilhões de dólares (EXAME, 2016).


ECONOMIA COMPARTILHADA

Segundo Dias (2016), a Economia Compartilhada é um novo conceito de economia/consumo, que surgiu nos últimos anos, principalmente em países desenvolvidos, baseado no compartilhamento dos bens de consumo e na produção compartilhada. Como bem nos assegura Novais (2015), a Economia Compartilhada é a mudança nos hábitos dos consumidores, que dividem, compartilham o uso (ou a compra) de bens e serviços, criando uma nova categoria de consumo, o colaborativo.

Para Botsman e Rogers (2011, p. XIV), a Economia Compartilhada aproveita a ociosidade dos bens de consumo e redireciona-os para outro lugar, interconectando o possuidor do bem com potenciais consumidores. Para esses autores, esse tipo de economia permite que:

[...] as pessoas, além de perceberem os benefícios enormes do acesso a produtos e serviços em detrimento da propriedade, economizem dinheiro, espaço e tempo, façam novos amigos e se tornem cidadãos ativos novamente. Redes sociais, redes inteligentes e tecnologias em tempo real também estão conseguindo superar modos ultrapassados de hiperconsumo, criando sistemas inovadores baseado no uso compartilhado, como acontece com carros e bicicletas. (BOTSMAN e ROGERS, 2011, p. XIV).

Infere-se dessa citação que essa nova forma de mercado está ligada a uma nova matriz da relação de consumo na economia. Evidencia-se que esse novo mercado pode ser utilizado para compartilhar ou redistribuir produtos ou serviços de uma empresa ou de um indivíduo.

A economia compartilhada ou colaborativa funciona da seguinte forma: compartilham-se bens ociosos, partilhando o uso da propriedade com pessoas que não querem deter a coisa, querem apenas usufruir da sua utilidade por um determinado período de tempo. As pessoas querem pagar pelo benefício do produto ou serviço e o que eles podem oferecer para elas, sem ter que possuir o produto/serviço definitivamente.

Botsman e Rogers demonstram que a economia colaborativa está muito ligada à mudança de comportamento:

Consumo colaborativo não tem nada a ver com compartilhamento forçado e educado. Pelo contrário, ele coloca em vigor um sistema em que as pessoas dividem recursos sem perder liberdades pessoais apreciadas e sem sacrificar seu estilo de vida. (BOTSMAN e ROGERS, 2011, p. XIX).

A Economia Compartilhada possibilita a criação de redes locais ou mundiais de novos consumidores que compactuam os mesmos interesses. Pessoas preocupadas em dividir a propriedade dos seus bens, em um novo ciclo de consumo consciente. Esse tipo de relação, com pessoas desconhecidas, que é ao mesmo tempo comercial e pessoal, é a base da economia colaborativa.

Logo, é importante compreender que esse tipo de economia é fruto dos avanços e mudanças culturais que a sociedade contemporânea está vivendo. A humanidade está envelhecendo em um mundo cada vez mais colaborativo, e esse fenômeno de comportamento está se transformando em um novo modelo econômico, que em dado momento o indivíduo é o fornecedor e em outro já é o consumidor.

Assim, a Economia Compartilhada destaca-se no cenário atual como um novo marco da relação de consumo na economia mundial, em que o consumismo exacerbado difundido durante o Século XX e início do XXI cede lugar ao compartilhamento de bens e serviços. Esse novo modelo torna-se disruptivo em relação ao modelo tradicional de comercialização.

A palavra disrupção surge na economia para expressar as inovações que rompem com o processo tradicional de produção e reprodução de bens e serviços. A economia disruptiva altera o modelo econômico previamente existente, quebrando seu curso estático.

Esse modelo econômico ocorre quando uma descoberta ou uma nova estratégia de mercado abre novos cenários para o futuro desenvolvimento de um produto ou a melhoria de um produto já existente (MENDONÇA, 2009).

A economia disruptiva geralmente é propiciada pelos avanços tecnológicos, mas nem toda inovação tecnológica é disruptiva, assim como nem toda disrupção provem necessariamente da tecnologia.

Gustavo Gauthier (2016, p. 12), conforme citado por Maria Cecília Máximo Teodoro, Thaís Cláudia D’Afonseca e Maria Antonieta Fernandes (2017), aponta que as inovações disruptivas são concebidas a partir do atendimento de três condições: a) identificação de uma necessidade do consumidor que não estava sendo satisfeita até o momento por nenhum produto ou serviço ou a solução de um problema que até o momento não tinha saída; b) a concepção de um novo modelo sustentável que permita lucros e financiamentos; e c) a criação de uma solução ou de novos negócios que não existiam antes e que crie vantagem competitiva sustentável ao longo do tempo.

Resumidamente, pode-se afirmar que toda inovação disruptiva, por definição, abala as estruturas sociais e econômicas previamente existentes.

Assim, a empresa Uber, ao fomentar o rápido desenvolvimento do seu modelo de negócios por todas as cidades atendidas por seus serviços, começou a alterar o status quo do mercado de transporte individual de passageiros, impactando a modalidade preexistente desse tipo de transporte, que era feita exclusivamente por meio de táxis licenciados pelo poder público. Os taxistas, que detinham o monopólio da prestação desse serviço (transporte individual de passageiros), passaram a enfrentar a concorrência de um novo modelo de negócio, que tem regras bastante distintas do modelo adotado pelos taxistas.

Para Márcio Toledo Gonçalves, Juiz do Trabalho Titular da 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, as tecnologias com potencial disruptivo abrem um campo extraordinário de acumulação de capital ao provocarem o naufrágio dos concorrentes que, a partir do estabelecimento de um novo padrão tecnológico, provocam a obsolescência dos demais concorrentes.  Ele complementa, citando o economista austríaco Joseph Schumpeter, afirmando que o modelo disruptivo alinha-se ao conceito de destruição criativa.

O termo destruição criativa foi cunhado pelo escritor Joseph Schumpeter. Para esse autor, a destruição criativa era a essência do sistema econômico, ou como ele descreveu, fato essencial do capitalismo (BLANCO, 2015).

A destruição criativa explica os efeitos que as inovações produzem no mercado. Quando algo novo chega para substituir o que antes era dominante, começa todo um novo ciclo, que vai se renovar novamente no futuro, quando essa novidade se tornar obsoleta, e o seu monopólio for quebrado. Para Schumpeter, a economia capitalista anda em ciclos e quando uma crise aparece, são as inovações e as mudanças de paradigmas que conduzem a um novo ciclo de prosperidade:

[...] a expressão destruição criativa demonstra o constante processo de criação, que leva o empresário à ascensão em razão da descoberta de uma nova tecnologia ou da combinação inovadora dos meios de produção, em seguida os lucros com a inovação se estabilizam para sofrer uma queda, quando a tecnologia que já se tornou tradicional e foi copiada é destruída por uma nova invenção ou combinação. (TEODORO, D’AFONSECA & ANTONIETA, 2017).

Na destruição criativa, a inovação é continuada e faz parte do ciclo dinâmico da economia, que gera desenvolvimento quando realiza novas combinações dos meios de produção, atendendo as seguintes condições: que as combinações sejam conduzidas por empresas novas que, geralmente, não surgem das que já estão no mercado e que as novas combinações valem-se de meios de produção das combinações antigas e não de meios de produção que se encontravam ociosos na economia (OLIVEIRA, 2014, p. 108).

A empresa Uber é uma start up[1] que não surge das tradicionais empresas de transporte público ou privado, nem das cooperativas de táxi, mas se põe como a principal concorrente dessas.

A Uber faz do transporte individual de passageiro algo diferente ao revolucionar a forma de prestação desse tipo de serviço. Ela alia o tradicional transporte urbano às novas tecnologias, suprindo a demanda reprimida da população, que deseja se deslocar com agilidade, de maneira fácil, rápida, descomplicada, mais barato e mais seguro, sem utilizar o serviço de transporte público ou os serviços de táxi, apenas com alguns toques na tela do smartphone.

A professora Maria Cecília Máximo Teodoro afirma que a Uber é o mais puro e transparente exemplo da destruição criativa, concebida como mola mestra do sistema produtivo capitalista contemporâneo (TEODORO, D’AFONSECA & ANTONIETA, 2017).

A Uber se reveste do conceito de economia compartilhada para fugir da regulamentação estatal, das leis trabalhistas e dos riscos inerentes da atividade econômica. 

A economia compartilhada parte da ideia do consumo consciente e colaborativo, intermediado por um terceiro. Na maioria das vezes, a tecnologia vem para viabilizar o intercâmbio entre as pessoas, aquelas que detêm o bem ou o serviço e aquelas que querem usufruir diretamente desse bem ou serviço.  Esse tipo de economia também é conhecido como economia peer to peer (de pessoa para pessoa).

Para compreendermos melhor a diferença entre a economia peer to peer e a economia peer to business (de pessoa com o negócio) aplicada pela empresa Uber, cabe aqui transcrever os esclarecimentos apresentados pela Prof.ª Maria Cecília Máximo Teodoro:

[...] para que este tipo de negócio seja considerado compartilhado ou colaborativo, este intermediário não pode lucrar sobre o trabalho alheio, podendo sim lucrar com a venda do aplicativo, com a disponibilização do espaço na nuvem, com o número de acessos à sua plataforma, com a venda de espaço para publicidade [...]. A partir do momento em que intermediação existe pura e simplesmente para lucrar através do trabalho de quem presta o serviço, tal característica torna-se inconciliável com a ideia de compartilhamento ou de colaboração ou de negócio de pessoa para pessoa, tornando-se um modelo de peer to business – de pessoa com o negócio [...]. (TEODORO, D’AFONSECA & ANTONIETA, 2017).

A Uber foge do escopo do sistema de economia compartilhada. Ela se vale do seu aplicativo para conectar quem quer o serviço de transporte individual de passageiro a quem quer oferecê-lo. A Uber não faz o simples papel de intermediadora, a fim de propiciar o consumo consciente que é pregado pela economia colaborativa. Ela extrai o seu lucro explorando o serviço do seu prestador, cobrando a percentagem do motorista por cada viagem que ele realiza. Como exposto na citação, o modelo de negócio adotada pela empresa Uber é o peer to business, sistema esse que é inconciliável com a ideia colaborativa em que ela se auto declara fazer parte.

Pelo que foi exposto, pode-se inferir que o modelo de negócio adotado pela empresa Uber se aproxima mais do sistema disruptivo, da destruição criativa, do que da economia compartilhada. 

Sobre o autor
Kleber Soares de Araújo

Pós-graduado em Direito Constitucional do Trabalho pela Universidade de Brasília - UnB; Pós-graduado em Docência no Ensino Superior pela Universidade Cruzeiro do Sul; Bacharel em Direito pelo Centro Universitário IESB. Servidor Público Federal do Poder Judiciário da União.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Kleber Soares. Análise da relação contratual dos motoristas da empresa Uber sob o prisma dos elementos que caracterizam a relação de emprego no direito do trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5362, 7 mar. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64583. Acesso em: 24 nov. 2024.

Mais informações

Trabalho de conclusão de curso de pós-graduação, em forma de artigo científico, apresentado à Universidade de Brasília – UNB e ao Tribunal Superior do Trabalho – TST como requisito à obtenção do grau de especialista em Direito Constitucional do Trabalho, sob a orientação do Professor Doutor Wilson Theodoro Filho.

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