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Direitos constitucionais de proteção aos animais e de liberdade religiosa: qual deve prevalecer quando se trata do abate de animais nos cultos de matriz africana?

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Agenda 20/05/2018 às 11:14

VI. Conclusão

Após um passeio pelo histórico do sacrifício de vidas movido pela fé; pelo inventário constitucional, legal e normativo; pelos posicionamentos doutrinários e jurisprudencias, é chegado o momento de aderir a uma das duas correntes aqui movimentadas, pois este é o destino natural de toda pesquisa. Nessa raia, como em todos os temas controversos de tensão de direitos, ambos os pólos têm argumentos robustos que merecem respeito e consideração, mas aqui se adere ao grupo que privilegia a liberdade religiosa em detrimento da proteção aos animais.

A uma, porque não são apenas os cultos de matriz africana que adotam o sacrifício ritualístico de animais, que alcançam outras comunidades religiosas, como a judaica e muçulmana, entre outras não alcançadas nessa pesquisa. Por isso, não se poderia limitar a liberdade ritualística apenas nos templos de Candomblé, Batuque, Omolokô, Umbanda e Santeria. A duas, porque proibir o abate de animais nas referidas crenças equivaleria a extingui-las, pois se poria abaixo um dos seus principais pilares, sem o qual se quedaria sem sustentação. Considerando que o Brasil é um Estado laico, abolir os sacrifícios nessas religiões é o mesmo que proibir a hóstia aos católicos, a bíblia aos evangélicos  e o passe aos Kardecistas.  A três, porque no direito comparado os países democráticos em geral não interferem em questões religiosas, em respeito ao princípio da neutralidade, que na Europa é muito praticado, tanto que é proibido fixação de crucifixos como ornamento em locais públicos, por exemplo, enquanto nos Estados Unidos desde 1992 a Suprema Corte já decidiu que o abate para rituais religiosos não é crime. A quatro, porque a sociedade brasileira é voraz consumidora de carne animal e nos destacamos como grandes exportadores de carne bovina e de frango. O impacto dessa moldura carnívora é um sem número de animais sacrificados para atender e deleitar nosso paladar e fortalecer nossos cofres, sem pudor nem crises de consciência. Por isso, enquanto não atingirmos um patamar de alimentação vegetariana, se é que queremos e devemos chegar a isso, não é razoável limitar a liberdade de crença alheia ao argumento de que se está desrespeitando o sagrado direito à vida dos animais.

O Brasil tem evoluído bastante no trato da natureza e vem lentamente se libertando do conceito ultrapassado e bolorento etiquetado no antropocentrismo ocidental, que tem o homem como o centro do mundo em relação à natureza, mas que sofreu uma ruptura nas mencionadas Constituições Federais do Equador em 2008 e da Bolívia em 2009. Nessas Cartas Constitucionais o ser humano foi posicionado de maneira integrada à natureza, fazendo parte dela e não acima dela, de uma forma tão contundente que os elementos da natureza passaram a ser sujeitos de direito. Nesse sentido, há uma decisão simbólica da Corte Constitucional Equatoriana que reconhece o direito de o rio fluir, reconhecendo-o como um sujeito de direito. Assim, qualquer cidadão equatoriano pode reivindicar direitos de qualquer ser vivo daquele país, sendo o que há de mais moderno em termos de direito ambiental. Mas isso é tema para um outro estudo, quem sabe comparando a questão do abate de animais em rituais religiosos no Brasil e nesses dois países andinos que deram passo tão relevante e exemplar no trato dos animais e da natureza, da qual fazemos parte e sem a qual não subsistimos. O que por ora interessa é que na tensão entre os direitos de liberdade religiosa e de proteção aos animais, no caso dos sacrifícios em cultos de matriz africana, deve prevalecer o o primeiro. 


Referências

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Sobre o autor
Luciano Rosa Vicente

Professor de Direito na Faculdade Anhanguera de Brasília - FAB; mestrando em Direito; especialista em Direito Público, Direito Penal, Direito Constitucional, Direito Administrativo e Direito Disciplinar; bacharel em Direito; e bacharel em Ciências Contábeis.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VICENTE, Luciano Rosa. Direitos constitucionais de proteção aos animais e de liberdade religiosa: qual deve prevalecer quando se trata do abate de animais nos cultos de matriz africana?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5436, 20 mai. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/66080. Acesso em: 22 nov. 2024.

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