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A insegurança jurídica engendrada pela oscilação de interpretações característica do pós-positivismo

Agenda 16/05/2018 às 08:21

Os óbices criados por interpretações dissonantes à luz do pós-positivismo.

Em consulta ao site oficial do TJDFT, datada de abril de 2018, foi possível constatar, em quatro áreas diferentes, 14 assuntos que possuem divergência jurisprudencial. Com uma consulta algo mais minuciosa, é possível encontrar situações análogas em outros tribunais espalhados pelo Brasil. E então, o que pode explicar essa divergência jurisprudencial, as interpretações que oscilam constantemente; uma decisão que, proferida num caso, não vale para outro, cujas elementares são exatamente as mesmas, se, via de regra, as leis que dão espaço às oscilações em questão trabalham harmonicamente?

 

            O presente texto traz à luz uma observação despojada de caráteres políticos ou ideológicos, servindo apenas para provocar questionamentos acerca do que anda acontecendo com o Poder Judiciário nestes últimos tempos.

Recentemente tomou imensuráveis proporções midiáticas um caso que tratou da prisão após a condenação em 2ª instância. A grande dúvida que ficou foi sobre a constitucionalidade deste entendimento, qual o STF se fez valer para justificar o referido jus puniendi. Data maxima venia, contrariando (indubitavelmente) o texto constitucional e o artigo 283 do Código de Processo Penal, o entendimento do STF manteve-se em desfavor não só de milhares de réus que poderiam voltar à liberdade, como também do princípio da Segurança Jurídica, que encontra-se cada vez mais perdido no Poder Judiciário, tendo em vista que os intérpretes julgadores mudam de decisão tanto quanto mudam de sapatos, diga-se a grosso modo, com o devido respeito.

Em vista de tudo isso, deve-se pensar: qual o respaldo que os intérpretes (supra) têm para, todos os dias, decidirem em contrário de seus próprios entendimentos, de seus colegas, e de maneira divergente, em casos iguais? A resposta para isso está no instituto dos princípios. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, uma das mais completas e democráticas que já houve na história do país, chegou repleta de princípios e garantias fundamentais, além disso, está como um basilar para o que se chama de Neo-Constitucionalismo ou, em outras palavras, a era pós-positivista.

De que se trata este pós-positivismo, afinal? É uma nova escola jurídica, que tem sua estrutura primordialmente formada por uma junção de normas+princípios. De início, aparenta ser confuso, mas é mister esclarecer que, nesta escola, princípios têm o mesmo valor que normas válidas e positivas; e as normas, continuam com o valor e peso de que sempre dispuseram. É claro que, apesar de crítica, o presente texto não defende as antigas escolas positivistas que já existiram, apenas expõe os óbices (contando com a insegurança jurídica como o principal deles) à que dá espaço.

                     

  Para falar no iníquo problema da insegurança jurídica, é indispensável expressar qual relação tem a Moral com isso tudo. A moral se distingue do Direito no exato ponto em que inicia-se a coercibilidade. Isto é óbvio. É possível também destacar o papel da moral quanto à criação de normas: quando uma norma jurídica é criada, reflete uma série de valores: cultural, social, do momento, etc... Assim, estes valores (sob o prisma do dever-ser) estão sempre próximos à ética e à moral, logo, a norma reflete o momento em que foi editada, além dos valores de quem a construiu e da sociedade que a exigiu.  É de fácil assimilação, também, que a moral é autônoma, enquanto o direito é heterônomo. Esta diferença é evidente quanto ao que tange o cumprimento de normas pelos destinatários destas. Outrossim, outras inumeráveis ligações entre Direito e Moral podem ser erigidas.

O que tem se mostrado difuso nesses últimos tempos, com as devidas venias, é: a que ponto a moral individual pode ser exercida, usando uma roupagem a que chamam de princípio(s) – e arbitrariamente, se considerar-se a posição de quem assim o faz – sobre quem depende desta capacidade julgador-interpretadora? Fazendo a devida abstenção de entrar no mérito da deontologia da magistratura, muito se tem visto de projeções de valores morais e até certo exagero “hermenêutico” de quem majoritariamente deveria prezar pela imparcialidade. Os resultados na aplicação do Direito, atualmente, são frutos da interveniência dos valores de quem está na qualidade julgadora, no conjunto decisório, que reflete a decisão objetiva. Em outras palavras, as interpretações das leis, em tese, são as mesmas, o que se transforma, aqui, são os valores morais e éticos da pessoa que as está aplicando. Portanto, pode-se dar como causa inicial e fator principal da insegurança jurídica atualmente vivida o decisionismo judicial que abriga vieses solipsistas, o que não é de Direito, que têm respaldo nos princípios de “livre-interpretação” e que faz os magistrados darem sua forma pessoal a toda causa de que participam.

 Como registrado anteriormente, o presente texto não pretende esquadrinhar as Escolas Positivistas que outrora existiram, tampouco pretende defender alguma destas; aliás, parece importante esclarecer que o positivismo exegético e o normativismo puro de Kelsen (duas das principais escolas positivistas que existiram) seriam extremistas e incompatíveis com as necessidades contemporâneas, haja vista que não parece possível, diante da atual conjuntura histórica do Brasil, viver num sistema de leis que preza pela separação de direito e moral e desconsideração dos métodos empíricos e fáticos, sem anuência.

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            É certo que o Direito não é uma ciência exata. É necessário que o intérprete coloque um quantum do seu olhar julgador, também para que não se torne uma máquina que encaixa casos concretos em leis sem nenhuma ponderação; conquanto não faça abuso de suas competências, alcançando um grau de subjetividade a que se não deseja. É perturbadoramente claro: usando uma “máscara” de argumentos e interpretações, o magistrado – não importando seu grau de jurisdição – vai além do que se pede. Apenas recorre à princípios que na hora julga convenientes, usa boas referências (mesmo que isto, por vezes, crie uma incongruência), e pronto! Sua decisão se torna legítima e fundamentada!

.           Estas relativizações da “justiça” tornam o Direito incoerente, afastando os valores éticos e morais do bem comum, que são, basicamente, a construção profissional do Direito, que em si já é uma realidade que referencia valores, visto da perspectiva cultural. Destarte, no seu âmago, possui a missão da busca progressiva pela segurança jurídica, que é composta também pelo objetivo do bem social e da justiça. Dessa forma, se o uso da interpretação e da hermenêutica ocorre de maneira descontrolada, a própria norma toma um sentido confuso, e assim o intérprete deixa de levar em conta o que esta representa, passando a decidir conforme sua consciência e suas vontades. Não há que se enxergar normas jurídicas onde não existem. Sobre o caso supracitado e outros tantos com os quais tem-se deparado, resgatando um antigo aforismo: “ubi lex voluit dixit, ubi noluit tacuit”. (Quando a lei quis, determinou; sobre o que não quis, guardou silêncio). Qualquer controvérsia sobre o fato é explicitamente ideológica. 

 

 

BIBLIOGRAFIA:

JUNIOR, Tercio Sampaio Ferraz. Introdução ao Estudo do Direito: Técnica, Decisão, Dominação. 4ª edição. São Paulo: Atlas S.A., 2003.

COELHO, Fábio Ulhoa. Para entender Kelsen. 5ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009.

GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. 13ª edição. São Paulo: Rideel, 2010.

REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 1979.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa Do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

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