Resumo: O presente artigo de tema “CRISE FISCAL, DÉFICIT PÚBLICO E EFICIÊNCIA ARRECADATÓRIA NO CONTEXTO BRASILEIRO” teve como pressuposto o estudo da grave crise fiscal do Estado brasileiro, proveniente de uma recessão econômica brasileira contaminada pela crise política nos diversos entes federativos – União, Estados e Municípios, onde pretendeu-se descrever os limites das sanções coercitivas e punitivas que extrapolam os mecanismos legais para cobrança e elevação da arrecadação tributária, comprometendo a eficiência e eficácia na ordem econômica nacional.
Palavras-chave: Arrecadação tributária; Capacidade contributiva; Limites jurídicos; Ordem econômica; Política fiscal.
1 Introdução
A presente Monografia teve como objeto o estudo da elevação da arrecadação tributária, descrevendo os limites das sanções coercitivas e punitivas que extrapolam os mecanismos legais para cobrança, resultando no comprometimento da eficiência e a eficácia na ordem econômica nacional.
O seu objetivo geral foi descrever as potestades sancionatórias do Estado para elevar a arrecadação tributária em virtude da crise fiscal, fruto da sonegação e evasão fiscal, bem como os limites constitucionais para consecução de tal finalidade.
No Capítulo 1, tratou-se da análise da crise fiscal e a carga tributária na década recente, a regressividade e progressividade na estrutura tributária do brasil, a política fiscal e carga tributária no país, a regressividade e progressividade na política fiscal brasileira, a eficiência arrecadatória, a sonegação, evasão e elisão fiscal. Para tanto, utilizou-se de autores das áreas de economia e direito tributário.
2 Crise Fiscal, Déficit Público e Eficiência Arrecadatória no Contexto Brasileiro
A Constituição de 1988 estabelece um conjunto de princípios tributários que constituem uma base importante para edificação de um sistema tributário baseado na justiça fiscal e social: a isonomia, a universalidade, a capacidade contributiva, a essencialidade, além da solidariedade, que está subjacente a todos os princípios tributários. A tributação deve ser, preferencialmente, direta, de caráter pessoal e progressiva. A Constituição Federal estabelece, ainda, que os contribuintes e os consumidores devem ser esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços.
O Constituição Federal de 1988, em seu art. 145 estabelece os princípios gerais da tributação, conforme pode ser observado abaixo.
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
I - impostos;
II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;
III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.
§ 1.º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
§ 2.º As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos[2].
Assim, a capacidade contributiva é um requisito essencial para o critério de justiça fiscal, associando os princípios da progressividade e da seletividade, assegurando aquela máxima tributação para quem aufere rendimentos mais elevados e detém maior patrimônio. Algumas teorias buscam explicar o caráter compulsório da obrigação tributária, dentre elas a teoria da compulsoriedade, onde tributos não representam donativo, mas uma contribuição compulsória, forçada ou imposta[3].
Os impostos são inevitáveis e, em razão disso, os cidadãos esperam que o governo proporcione diversos serviços. Dessa forma, um sistema tributário será mais eficiente do que outro se levantar o mesmo montante de recursos a um menor custo para os contribuintes[4].
Em decorrência das necessidades do Estado e dos governos em gerar e administrar recursos para sua manutenção, surge a imposição tributária. Esta se dá em forma de apropriação dos bens dos cidadãos para atendimento das citadas necessidades, na tentativa de ofertar a melhor forma de atendimento às necessidades públicas, sendo esse o único motivo capaz de justificar a razão da imposição tributária em atendimento das necessidades públicas[5].
No campo econômico, a dinâmica da atuação do governo sobre a capacidade produtiva (produção agregada) e despesas planejadas (demanda agregada) tem como objetivo fazer a economia operar a pleno emprego, com baixas taxas de inflação e distribuição equitativa da renda. Dentre os mecanismos de política macroeconômica usuais, está a política fiscal. A política fiscal refere-se a todos os instrumentos de que o governo dispõe para arrecadação de tributos (política tributária) e controle de suas despesas (política de gastos).
Nesse sentido, a política macroeconômica surge, principalmente, a partir da constatação de que o mercado requer intervenção em certas hipóteses de modo a neutralizar suas falhas, ou seja, percebeu-se que a liberdade plena dos agentes econômicos nem sempre faria os ajustes necessários para manutenção do equilíbrio entre a oferta e demanda. Dessa maneira, existe uma interdependência da economia com o direito, como forma elementar de regular a estrutura societal e a infraestrutura produtiva nas relações de produção, circulação e distribuição.
A política fiscal de um determinado país é um elemento determinante para criação de riqueza, para o crescimento econômico e para a relação entre o cidadão e o governo. A política fiscal é, em síntese, a política de receitas e despesas do governo, envolve a definição e aplicação da carga tributária sobre os agentes econômicos e define como devem ser os gastos governamentais.
Um governo executa uma política fiscal quando cobra impostos ou coloca títulos no mercado para arrecadar recursos que lhe possibilitem ampliar gastos. Esse mecanismo permite que a política fiscal-orçamentária seja orientada pelo orçamento público. Em outras palavras, as garantias constitucionais são ferramentas jurídicas garantidoras, não apenas da observância pactual, mas da execução forçada por penalidades, como elemento dissuasivo para determinados comportamentos oportunistas.
3 Sanções Políticas – Arrecadação Tributária e Limites Jurídicos na Ordem Econômica
O sistema jurídico e econômico está ligado ao sistema político, necessitando, assim, de uma economia de mercado inspirada com direito e de um direito que considere as regras de mercado, seguindo o que determina o velho brocardo “fiat justitia, pereat mundus”[6] . Como o papel do sistema judicial é aplicar o direito, ele só está preparado para decidir entre o legal e o ilegal, assim, torna-se evidente que o sistema jurídico não pode ser insensível ao que ocorre no sistema econômico. Em outras palavras, analisa-se até que ponto as garantias constitucionais, quando impõem sanções a infrações de natureza penal, podem ser aplicadas às ilicitudes puramente fiscais.
O presente trabalho pretendeu analisar as potestades sancionadoras de matéria fiscal/tributária, consideradas sanções restritivas políticas no campo fiscal, tendo em vista o descumprimento na relação tributária privada. Tais sanções se traduzem na interferência direta na ordem econômica pela via da execução fiscal, justamente como função para garantir a eficácia normativa. Nesse contexto, cabe ao Estado agir como agente fiscal sob os princípios constitucionais para efetivação da arrecadação de tributos, bem como, utilizar-se de meios coercitivos, que, na lógica econômica, poderão ser considerados excessivos e inconstitucionais. Tendo em vista a segurança jurídica das relações econômicas e o primor pela manutenção da ordem econômica nacional, é dever do Estado estabelecer mecanismos de arrecadação dos tributos, obedecendo os meios coercitivos legais e seguindo os preceitos da administração pública nas cobranças dos titulares de débitos tributários, sejam pessoas jurídicas ou pessoas físicas.
O problema fiscal que assola o Brasil na atualidade é uma característica visível nos diversos ciclos econômicos enfrentados de forma mais ou menos acentuada em diversos períodos históricos, com tendência de se prolongar e se aprofundar dependendo das causas estruturais que potencializaram o efeito crítico. O debate sobre quem financia o Estado, qual seu tamanho e a distribuição da carga tributária é amplo, com origem primordial na economia, seja na economia clássica, no pensamento neoclássico ou keynesiano.[7]
O pressuposto pensamento keynesiano tem como base uma estrutura de mercado concorrencial com mecanismos que corrigem automaticamente os desequilíbrios de mercado, outrossim, de forma que o Estado é compreendido como agente secundário, reservando-lhe a segurança da ordem e, consequentemente, produção de bens e serviços públicos que não são interessantes ao mercado.
Na década de 1930, Keynes apontou a necessidade da regulação estatal na economia, principalmente na produção de bens e serviços públicos, para garantir o processo de acumulação capitalista. Da mesma forma, esta representaria um ponto determinante na política fiscal e monetária que visa a garantia do pleno emprego, fortalecendo o Estado de bem-estar social, bem como, objetivando as políticas de estabilização e de redução das desigualdades.[8]
Na concepção neoclássica, um sistema tributário não poderá romper o equilíbrio de mercado, a tributação obedecerá aos princípios da “neutralidade” e da “equidade”. No primeiro caso, os impostos não poderão afetar as decisões dos agentes econômicos na alocação de recursos, o que afetaria a eficiência no universo da racionalidade econômica. Por outro lado, os impostos deverão ser distribuídos de forma equitativa entre os membros da sociedade, de forma a não alterar a estrutura distributiva da renda, visto que o automatismo de mercado produz uma alocação ótima, não podendo o sistema tributário romper tal equilíbrio[9].
A partir dos anos 1920, especialmente diante da crise de 1929 e grande depressão de 1930 nos EUA, o Estado acrescentou às funções de justiça e segurança, ser ofertante de bens públicos de eletricidade, saneamento, infraestrutura, dentre outros bens e serviços. As novas funções econômicas do Estado ampliaram-se a partir da matriz keynesiana em praticamente todos os países capitalistas, com expressivo aumento dos gastos públicos, crescente participação do Estado na produção nacional e ampla gama de leis que regulamentavam a atividade econômica[10].
Evidencia-se a necessidade de atuação econômica do setor público, pois à medida em que o mercado não consegue fornecer bens públicos, a presença do Estado cumpriria a função alocativa[11], via de regra, porque o sistema de preços não leva uma justa distribuição de renda, daí a função distributiva[12] no setor público, elementos que são financiados pela política fiscal que será adotada para atender as necessidades de um governo. Finalmente, a intervenção estatal altera o comportamento dos preços e emprego, destacando-se que não existe o automatismo de mercado, conduzindo para uma função estabilizadora.
Pode-se considerar Estado como um conjunto de órgãos, entre eles, legislativos, tribunais e outros que tornam possível a ação do governo, sendo esta ação, um conjunto de projetos e programas em que parte da sociedade os propõe através de um governo que desempenha a função de Estado em um período determinado[13].
Nas numerosas definições de “política pública”, a ideia de que formuladores das políticas estão inseridos num processo técnico-político que visa definir e compatibilizar objetivos e meios entre atores sociais e sujeitos a restrições. Preconiza-se que as políticas são ações intencionais de governos que contém algum ou alguns objetivos articulados, que são justificados e formulados[14].
A definição mais conhecida nos estudos de política pública é de Thomas Dye, que, de forma sucinta, descreve a política pública como “tudo o que um governo decide fazer ou deixar de fazer”, descrevendo um tratamento da política pública como todo e qualquer comportamento governamental, a tomar decisões sustentadas por sanções contra quem as transgredir, o que se refere às iniciativas sancionadas por governos[15].
As teorias econômicas e da política pública tendem a supostamente dar uma organicidade às ações encadeadas das políticas econômicas que norteiam as ações governamentais de um determinado Estado. Assim, a política econômica no capitalismo trata de processos por meio dos quais o Estado intervém no mercado, corrigindo-o, orientando-o para determinados planos, projetos e programas formulados.
No tocante à congruência entre Direito e Economia, nas significativas variantes do capitalismo moderno, existe sobrepujamento de um sobre outro, dependendo dos estímulos considerados nesses sistemas, de maneira a gerar um processo contínuo de inter-relacionamento ou acoplamento estrutural, de modo que, o direito é produzido pela estrutura econômica, mas também interage em relação a ela, produzindo alterações, numa condiciona recíproca[16].
No caso do federalismo, especialmente o brasileiro, a federação pode ser definida, acima de tudo, como pacto entre unidades territoriais e políticas diferentes, mediante a construção de acordos e negociação de políticas distintas. Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988, ao estabelecer a forma federativa de Estado como princípio fundamental que rege a nação brasileira, fixou ainda a obrigatória descentralização federativa, municipalizando inúmeras atividades públicas[17].
Existe um desenho institucional complexo no federalismo brasileiro, composto por diversas arenas de negociação, coordenação e produção de políticas e serviços públicos, incentivados por diversos interesses, que vão desde a competição até a cooperação. As restrições orçamentárias e financeiras e o aumento da demanda social por bens e serviços públicos exigem articulações federativas mais amplas, que atendam a diversificação das preferências dos cidadãos e o constante desenvolvimento tecnológico. Essa dinâmica pressiona para que haja a adoção de instituições públicas que supram as novas relações sociais estabelecidas pelo pacto federativo[18].
Na mesma direção da temática do federalismo, destaca-se que o governo central deve prover bens e serviços públicos para a população inteira do país. Os níveis descentralizados proveem bens e prestam serviços de maneira limitada à amplitude dos respectivos territórios. Ao adaptar as saídas de tais bens e serviços às preferências e circunstâncias específicas dos cidadãos, o fornecimento descentralizado aumenta o bem-estar econômico acima dos resultados dos níveis mais uniformes desses serviços em nível nacional[19].
A Federação significa aliança, pacto, união entre Estados, com a finalidade de formar uma única unidade soberana, através de Constituição Republicana Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88). A principal ideia que recai sobre o federalismo é a descentralização do poder, através da distribuição de parcelas de administração política entre os entes federados. Tais entes são tratados de forma isonômica, não existindo disparidade entre os mesmos (Estados Membros)[20].
Assim sendo, os Estados membros não possuem soberania, logo, não possuem liberdade para se separar da federação, devendo se subordinar ao Poder central, ainda que motivado por decisões não unânimes. Ainda, conferem por inteiro a soberania a um ente central, mantendo apenas autonomia. Desse modo, os Estados membros da federação são autônomos, mas não são soberanos[21].
O princípio consagrado na CRFB/88 é o da capacidade contributiva, essencial para o critério de justiça social, que se associa nos princípios de progressividade e da seletividade, este tende a determinar uma sustentação nas finanças públicas, que preconiza os tributos, apontando para a questão-chave: quem paga a conta e financia o Estado nos diversos entes federativos.
4 Crise Fiscal e Carga Tributária na Década Recente
Na década recente, os problemas fiscais verificados nas contas públicas brasileiras se acentuou drasticamente, tendo em vista o alto grau de endividamento público, crescente déficit orçamentário resultante dos desequilíbrios entre receitas e despesas do Governo Federal, Estados e Municípios. O déficit do setor público representa um nó estrutural, devido às dificuldades que cria para administração pública em consequência da acumulação de desequilíbrios ao longo de anos, financiados em sua grande parte por aumento do endividamento público. Em certa medida, a decisão de aumentar a receita ou reduzir a despesa é uma decisão de caráter técnico-político, tomando como eminente solução para crise fiscal do Estado o aumento da carga tributária[22].
A Constituição Federal é o garantidor do federalismo fiscal, assegurando a autonomia financeira dos entes da federação: União Estados e Municípios. Embora o Sistema Tributário na Constituição seja um tema controverso, a segurança para os cidadãos é fato positivo, tendo em vista que, o sistema federativo cria dificuldades em promover alterações ou reestruturações fiscais, viáveis apenas por meio de emendas constitucionais[23].
A política fiscal ocupa papel central na avaliação da política econômica recente, os ajustes considerados necessários são pauta para retomada do crescimento, o debate focado na política fiscal é complexo com vários matizes, que variando no tempo, ocupa importância no regime da política econômica brasileira[24].
Em estudo recente, a evolução da dívida bruta do governo geral (DBGG)[25] surge como o principal indicador do endividamento público, cujo rápido crescimento nos últimos anos (entre 2013 e 2016), saltou de 51,3% para 72,5% do produto interno bruto (PIB). Se mantida a tendência recente, o resultado, segundo a autoridade monetária, seria uma trajetória explosiva, comprometendo a capacidade do Governo Federal e seus entes federativos[26].
A Emenda Constitucional (EC) no. 95[27], aprovada em 2016, tem como objetivo evitar que essa trajetória se concretize, estabelecendo um limite para o crescimento dos gastos públicos no horizonte de longo prazo, revertendo a trajetória ascendente da dívida pública, essencial para retomada da confiança na economia pelos agentes de mercado e redução do custo do capital, bem como, para reversão da tendência de queda dos investimentos[28].
De fato, os problemas do déficit público são derivados da crise fiscal do Estado brasileiro e seus entes federados (União, Estados e Munícipios), sendo considerado pelos estudiosos na área de economia e direito como causa fundamental, no plano interno, de boa parte dos problemas atuais que afligem o país. O forte desequilíbrio orçamentário resultou da necessidade de financiamento de despesas superiores às receitas públicas. Quando o Estado aumenta os seus gastos (ou reduz impostos), ocorre um aumento das despesas agregadas, originando desequilíbrio no nível geral de preços e aumento da demanda por moeda, assim, provoca-se um aumento da taxas de juros, que resultará na queda do investimento e aumento das necessidades de financiar o acréscimo das despesas do Estado, tendo em vista o aumento da taxa de juros[29].
Quando o governo se encontra em situação de déficit, as medidas tradicionais de política fiscal – aumento de impostos e corte de gastos, denotam um problema político central, devendo tal déficit ser financiado pelo governo. De forma geral, o financiamento poderá ser realizado por recursos extrafiscais, cujas principais fontes são: a) emitir moeda, com empréstimo realizado pelo Tesouro Nacional junto ao Banco Central; b) venda de títulos da dívida pública ao setor privado interno e externo[30].
As reformas na área fiscal, fruto de uma necessidade urgente em função da crise nas finanças públicas, se arrastam desde os anos 1980, ganhando um caráter simbólico no Plano Real no ano de 1994, quando ocorreu a estabilização da economia, de forma a admitir um novo regime fiscal, marcado pela renegociação das dívidas estaduais, pela reforma da previdência e as privatizações. O processo de alteração da política econômica buscava recuperar a confiança, fruto de um colapso cambial no final da década de 1990[31].
Dessa maneira, o maio rigor da política fiscal foi um mecanismo adotado para demonstrar um controle das contas públicas, com clara demonstração da sustentabilidade da dívida pública. Porém, ocorreu uma descontinuidade, fruto das condições macroeconômicas da economia brasileira no final dos anos noventa e início do século XXI, indicando uma reversão nos padrões estabilizadores, dando lastro para uma rigidez orçamentária maior, tornando como necessário, normas para cumprimento das metas de superávit primário, que tornou obrigatório na Lei Diretrizes Orçamentários[32].
O compromisso de controle da dívida pública na execução orçamentária, com contingenciamento de gastos públicos no montante exigido para que a meta de superávit primário fosse alcançada, o superávit ganhou caráter de despesas obrigatória e despesas discricionárias, papel residual, sempre condicionada aos ajustes da meta fiscal[33].
No ano de 2001, o governo brasileiro aprovou a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)[34], e, assim, reforçou o controle das contas de Estados e Municípios, definindo os limites legais de dívida consolidada e de despesas especificas, normas de contratação de operações de crédito e critérios de eliminação do excesso de endividamento, essa era a nova concepção do regime fiscal em defesa da estabilidade e minimização dos riscos, com uso de instrumentos fiscais para garantir o ajuste intertemporal das contas públicas[35].
Tal agenda, que tinha como base uma política fiscal rígida, tinha que conciliar outra agenda conflitante - o aumento da carga tributária e os problemas derivados do pacto federativo - administrando a dívida pública crescente, com adoção de políticas de desenvolvimento e o relacionamento entre as esferas governamentais. Segundo Estudos da Receita Federal do Brasil (SRFB,2015), a distribuição da carga tributária entre os três níveis da Federação apontam para tendência de concentração de recursos arrecadados na União (68%), com participação dos Estados (25%) e, finalmente, os municípios (7%), mantendo uma tendência de aumento da carga tributária na ordem de 32,66% do PIB – Produto Interno Bruto[36].
No contexto recente, as questões centrais da política fiscal estão vinculadas a carga tributária, que desde a promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal em 2000, avançou significativamente como condutor sólido da credibilidade das contas fiscais, que foi questionado por organismos internacionais. Assim, evitou-se que o superávit fiscal impactasse de forma positiva na dívida pública, visto que, pela primeira vez em 2014, o Governo Federal apresentou déficit primário. Tais alterações nas definições legais e medidas de contabilidade não usuais garantiram o mau resultado nos padrões e regras orçamentárias, com medidas consideradas incompatíveis com LRF e com CRFB/88, assim como pelo Tribunal de Contas da União (TCU)[37].
A atual crise fiscal brasileira, com crescente déficit público, traduz-se em riscos negativos que se desdobram na não implementação de reformas pelos organismos multilaterais internacionais (FMI – Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial), assim como se consubstanciaram na crescente perda de confiança do mercado, tendo em vista as divisões políticas entre os poderes Executivo e Legislativo, com quedas adicionais de arrecadação da contração do Produto Interno Bruto, essencialmente após a reeleição da Presidente Dilma Rousseff, em 2014[38].
Os impactos negativos se desdobraram pelos sucessivos escândalos de corrupção envolvendo a Petrobrás, com o cancelamento de investimentos, investigações que provocaram mais falências em atividades a montante, inclusive do setor da construção civil, de fato provocando uma recessão profunda nos anos de 2015 e 2016, com uma contração do PIB na ordem de 3,8% e 3,6%, respectivamente[39].
Com as dificuldades enfrentadas para equilíbrio das contas públicas, vide resultado da queda da atividade econômica em quase todos os setores, com aumento no desemprego e na arrecadação das três esferas federativas e crescimento das despesas correntes, ocorreu uma deterioração da situação fiscal brasileira.
Para sair dessa situação e criar espaço fiscal para realizar investimentos, as Administrações Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais terão que adotar medidas para ampliar a arrecadação, reduzir despesas e melhorar a qualidade e a eficiência do gasto público, evitando-se, contudo, majorar ou criar tributos e contribuições ou cortar programas públicos de grande impacto social por meio da vinculação de receitas e despesa pública no estabelecimento dos “mínimos constitucionais”, fruto da elevação para o Estado de suas despesas obrigatórios[40].
As questões da política fiscal remetem ao problema da estrutura tributária brasileira, o grau de regressividade e progressividade, para atender a dinâmica das políticas econômicas brasileira, com efeitos de forte interpretação entre os fenômenos sociais do direito e da economia.