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A aplicação das teorias subjetiva e objetiva como fundamento para desconsideração da personalidade jurídica das sociedades limitadas na Justiça do Trabalho

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No Direito do Trabalho, cabe desconsideração da personalidade jurídica somente quando restar caracterizado o abuso de direito, confusão patrimonial ou fraude.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo versa sobre a desconsideração da personalidade jurídica das sociedades limitadas no âmbito do processo do trabalho. O objetivo da pesquisa é analisar as duas teorias existentes acerca da desconsideração da personalidade jurídica, quais sejam: a teoria subjetiva (também conhecida como teoria maior) e a teoria objetiva (também conhecida como menor). A partir dessa análise, buscou-se entender qual a teoria mais adequada a ser aplicada no processo do trabalho.

A teoria subjetiva ou maior somente autoriza a aplicação do instituto em caso de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, sendo estes os requisitos específicos que regem essa hipótese. Por sua vez, a teoria objetiva ou menor, preconiza que basta a constatação da inexistência de bens sociais suficientes para a satisfação da dívida da pessoa jurídica, sendo majoritariamente adotada pela Justiça do Trabalho.

A desconsideração da personalidade jurídica nos Tribunais do Trabalho tem ocorrido quando se mostra esgotada a possibilidade de localização de bens em nome da pessoa jurídica na fase executória, visto a ausência do pagamento do crédito trabalhista reconhecido judicialmente, acompanhada pela não descoberta de bens penhoráveis.

Apesar da Justiça do Trabalho adotar comumente a aplicação da teria menor, há um embate acerca da escolha adotada no âmbito da Justiça Obreira, haja vista que para alguns doutrinadores, a aplicação da teoria menor no processo trabalhista fere a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, bem como as regras de limitação de responsabilidade dos sócios causando a insegurança jurídica, desestimulando a atividade empresarial e consequentemente a geração de empregos. Em contrapartida, para outros doutrinadores, a aplicação da teoria maior se tornaria um obstáculo quase intransponível para a efetividade da execução trabalhista.


2. DESENVOLVIMENTO

2.1 A SOCIEDADE LIMITADA COMO EXPRESSÃO DO PRINCÍPIO DA AUTONOMIA PATRIMONIAL

A principal característica das pessoas jurídicas em geral, e das sociedades empresárias em particular é que elas não se confundem com as pessoas que a integram, caracterizando, assim, uma autonomia patrimonial (COELHO, 2012)

Assim, o jurista Rubens Requião elucida que:

[...]uma das mais decisivas consequências da concessão de personalidade jurídica, outorgada pela lei é a sua autonomia patrimonial, tornando a responsabilidade dos sócios estranha à responsabilidade social, e mesmo quando se trate de sócio com responsabilidade ilimitada e solidária é sempre ela subsidiária (REQUIÃO, 1988, p.71).

Em outras palavras, Fábio Ulhoa Coelho esclarece que:

Em decorrência do princípio da autonomia da pessoa jurídica, é ela (e não os seus integrantes) que participa dos negócios jurídicos de seu interesse e titulariza os direitos e obrigações decorrentes. Também é ela quem demanda e é demandada em razão de tais direitos e obrigações. Finalmente, é apenas o patrimônio da pessoa jurídica (e não o de seus integrantes) que, em princípio, responde por suas obrigações (COELHO, 2012, p. 535).

Assim, tratando-se especialmente sobre o princípio da autonomia patrimonial, Marlon Tomazette (2013) enfatiza que a existência dessa autonomia é o que faz da sociedade um principal instrumento do desenvolvimento de moderna economia de mercado.

Em face dessas circunstâncias, pode-se afirmar que autonomia patrimonial viabiliza a prática de exploração econômica, que é uma grande fonte geradora de empregos e circulação de riquezas. As sociedades são, portanto, pessoas jurídicas dotadas de autonomia patrimonial, o que torna possível o exercício das suas atividades.

Essa autonomia jurídica se explica pelo fato de a sociedade limitada ser uma pessoa jurídica, a qual o ordenamento jurídico confere existência própria, possuindo, portanto, responsabilidade patrimonial própria. Isso se dá em decorrência do princípio da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, prevista no art. 1.024 do CC/02. (RAMOS, 2016).

Desse modo, um dos pontos de maior relevância para o estudo da sociedade limitada é compreender a extensão da sua responsabilidade e da responsabilidade dos seus sócios, o que gera importantes reflexos econômico-jurídicos nas relações das sociedades. No tocante à responsabilidade dos sócios pelas obrigações da sociedade, tem-se que a mesma está sujeita a limites, como afirma Fábio Ulhoa Coelho (2012). Nesse sentido:

Se os bens do patrimônio social são insuficientes para responderem pelo valor total das dívidas que a sociedade contraiu na exploração da empresa, os credores só poderão responsabilizar os sócios, executando bens de seus patrimônios individuais, até um certo montante. Alcançando este, a perda é do credor (COELHO, 2012, p 189).

Estes limites são mais visíveis nas sociedades limitadas, pois, em regra, nesse tipo societário a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas. Isto ocorre devido à característica essencial do tipo societário em análise, qual seja a limitação da responsabilidade subsidiária dos sócios à integralização do capital social. (FAZZIO JÚNIOR, 2016).

Nesse toar, importa esclarecer que a expressão “limitada” se refere à responsabilidade dos sócios cotistas e não à responsabilidade em si da sociedade limitada. Assim, tem-se que a responsabilidade da sociedade é plena perante terceiros, visto que a mesma se encontra provida da autonomia jurídica (FAZZIO JÚNIOR, 2016).

Assim, pode-se afirmar que a responsabilidade dos sócios, em regra, é sempre subsidiária pelas dívidas contraídas pela sociedade e eventual responsabilidade pessoal dos sócios pelas dívidas das sociedades limitadas está estritamente atrelada à existência ou não da plena integralização do capital social (RAMOS, 2016).

Nesse sentido, Waldo Fazzio Júnior enuncia que: “Tratando-se de sociedade formada por cotas de responsabilidade limitada, os sócios respondem até o limite do capital social por inteiro, somente ficando liberados quando integralizado o capital” (FAZZIO JÚNIOR, 2016, p. 159).

Noutro viés, na hipótese de dívida da sociedade, quando esgotado o seu patrimônio e constatado que o capital social não fora totalmente integralizado, o credor da dívida poderá executar o patrimônio particular de qualquer sócio quotista, mesmo aquele que já tenha integralizado a parte que lhe cabia, visto que há uma solidariedade interna entre os sócios (RAMOS, 2016).

Importa esclarecer que essa responsabilização dos sócios, no caso de o capital social não estar integralizado, possui um limite, sendo que este limite se dá até o montante que faltar para a inteira integralização deste capital social (RAMOS, 2016).

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Além disso, esclareça-se que o sócio que for executado, mesmo já tendo integralizado a sua quota parte do capital social, tem direito de regresso contra os demais sócios, de maneira proporcional à quantia que cada sócio deve à sociedade a título de integralização de suas respectivas cotas sociais.

À primeira vista, poder-se-ia pensar que a limitação da responsabilidade dos sócios, como acima analisado, geraria uma situação prejudicial aos credores. Entretanto, se um país não possui em direito comercial uma categoria societária que limite a perda dos sócios, também não tem competitividade dos produtos nele produzidos com os demais produtos de outros países que possuem as regras de limitação de responsabilidade (COELHO, 2012).

Porém, a limitação à responsabilidade dos sócios não é incondicional conforme veremos no item subsequente.

2.2 A QUEBRA DO SISTEMA DE LIMITAÇÕES À RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS DA SOCIEDADE LIMITADA ATRAVÉS DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

Didaticamente, é possível estabelecer hipóteses legais em que comportam exceções à regra de limitação da responsabilidade dos sócios e ao princípio da autonomia patrimonial e a exceção que importa à presente pesquisa é justamente a desconsideração da personalidade jurídica no âmbito da Justiça do Trabalho, uma vez que nos processos que aí tramitam tem-se protegido o empregado e deixado de aplicar a regra de limitação da responsabilidade dos sócios da sociedade limitada, com vistas sempre a proteger a parte hipossuficiente (COELHO, 2012).

Adentrando-se ao plano conceitual, tem-se que a desconsideração da personalidade jurídica é o instituto por meio do qual o juiz deixa de considerar a autonomia patrimonial da sociedade empresária, compreendida na separação que existe entre o patrimônio da sociedade e os bens particulares dos sócios, com o intuito de responsabilizar estes por dívidas da sociedade (TEIXEIRA, 2016). Trata-se, portanto, de uma punição a uma conduta abusiva, praticada em prejuízo aos credores da pessoa jurídica.

Para Waldo Fazzio Júnior, a desconsideração de personalidade jurídica “[...] consiste em colocar de lado, episodicamente, a autonomia patrimonial da sociedade, possibilitando a responsabilização direta e ilimitada do sócio por obrigação que, em princípio, é da sociedade. Afasta-se a ficção para que aflore a realidade” (FAZZIO JÚNIOR, 2016, p. 118).

Quanto aos requisitos autorizadores da desconsideração da personalidade jurídica, tem-se que no ordenamento jurídico brasileiro existem duas teorias que regem a sua aplicação, as quais diferem uma da outra quanto aos requisitos necessários para se proceder à desconsideração. São elas, a teoria maior ou subjetiva e a teoria menor ou objetiva, que se estudará a seguir.

2.3 A TEORIA MAIOR OU SUBJETIVA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

Tese majoritária na doutrina é a de que a chamada teoria maior seria mais fiel à origem da desconsideração da personalidade jurídica com relação a sua aplicabilidade, pois exige, como esclarece Fábio Ulhoa Coelho (2008), a configuração de fraude e abuso da sociedade para o afastamento da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, não bastando a ausência de pagamento de suas obrigações a tempo e modo.

Na mesma esteira, Cléber Lúcio de Almeida (2016) aponta que a teoria maior ou subjetiva da desconsideração da personalidade jurídica constituiu medida excepcional, que somente terá autorizada a sua aplicação na hipótese de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial.

Élisson Miessa (2018), ao explicar a teoria maior, esclarece que há a necessidade de observância de dois pressupostos para que o patrimônio dos sócios responda pelas dívidas da sociedade. Em suas palavras:

Teoria subjetiva (teoria maior): o sócio responderá quando preenchidos dois pressupostos: a) os bens da pessoa jurídica sejam insuficientes para o pagamento da dívida; b) haja comprovação de fraude ou de abuso de direito, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial (CC/02, art. 50) (MIESSA, 2018, p. 432).

Por fim, é preciso esclarecer que a teoria em apreço encontra-se prevista no art. 50 do CC/02, norma esta que autoriza a aplicação do instituto em caso de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, sendo estes os requisitos específicos que regem essa hipótese.

2.4 A TEORIA MENOR OU OBJETIVA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

Ao contrário da teoria maior, pela teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica basta que haja o não pagamento de um crédito para se aplicar esse instituto. Nesse viés, se a sociedade não possui bens suficientes para adimplir com suas obrigações, será autorizada a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, independentemente da origem e das causas dessa situação (COELHO, 2006).

Vê-se, pois, que, para essa teoria, a simples configuração de situação de má gestão da sociedade empresária é capaz de ensejar o afastamento da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, para atingir bens dos sócios, desde que essa circunstância tenha impedido o adimplemento das obrigações da empresa.

O ordenamento jurídico brasileiro adotou a teoria menor no CDC/90, em seu art. 28, §5º. A ideia foi a de que essa teoria fosse aplicada buscando oportunizar ao consumidor a satisfação dos seus direitos da forma mais célere e simples possível, até porque se trata da parte hipossuficiente da relação consumerista.

Aliás, a tendência que se verifica, o que será constatado mais à frente, é que a teoria menor seja mais utilizada quando a desconsideração da personalidade jurídica tem como pano de fundo vínculos jurídicos em que há uma desigualdade entre as partes, e/ou que exigem uma proteção maior a um dos seus sujeitos, como acontece não apenas nas relações de consumo, mas também nas relações de emprego e, mesmo, nos vínculos regidos pelas normas de Direito Ambiental.

2.5 A APLICAÇÃO DAS TEORIAS DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADEJURÍDICA NA JUSTIÇA DO TRABALHO

A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica é muito comum no âmbito da execução trabalhista. No entanto, somente após a chamada Reforma Trabalhista ocorrida através da Lei 13.467/2017 a sua aplicação fora expressamente positivada no Direito Processual do Trabalho (SOARES, 2018).

Antes da Reforma Trabalhista, a aplicação da disregard doctrinese fundamentava com base no art. 2º, caput e §2º da CLT/43, que dispunha que os riscos da atividade cabiam ao empregador, bem como que, se os exploradores da atividade econômica constituíssem grupo econômico, mesmo cada uma possuindo personalidade jurídica própria, respondiam pelos débitos trabalhistas decorrentes do exercício da atividade (ALMEIDA, 2016).

Além disso, os arts. 10, 445 e 448 da CLT/43 juntamente com o art. 3º da Lei nº 2.757/56 e o art. 16 da Lei nº 6.019/74 também fundamentava a desconsideração da personalidade jurídica, haja vista que responsabilizavam todo aquele que se beneficiassem pelos serviços decorrentes das relações de emprego (ALMEIDA, 2016).

Ademais, o incidente da desconsideração da personalidade jurídica, previsto nos art. 133 a 137 do CPC/2015, passou a ser aplicado no processo trabalhista a partir da Instrução Normativa 39 de 2016 – IN 39/16 editada pelo Tribunal Superior do Trabalho, com algumas adaptações.

De acordo com o art. 6º da IN 39/16:

Art. 6° Aplica-se ao Processo do Trabalho o incidente de desconsideração da personalidade jurídica regulado no Código de Processo Civil (arts. 133 a 137), assegurada a iniciativa também do juiz do trabalho na fase de execução (CLT, art. 878).

§ 1º Da decisão interlocutória que acolher ou rejeitar o incidente:

I – na fase de cognição, não cabe recurso de imediato, na forma do art. 893, §1º da CLT;

II – na fase de execução, cabe agravo de petição, independentemente de garantia do juízo;

III – cabe agravo interno se proferida pelo Relator, em incidente instaurado originariamente no tribunal (CPC, art. 932, inciso VI).

§ 2º A instauração do incidente suspenderá o processo, sem prejuízo de concessão da tutela de urgência de natureza cautelar de que trata o art. 301 do CPC (BRASIL, 2016)

Com a nova redação trazida pela Reforma Trabalhista anteriormente mencionada, houve o acréscimo do art. 855-A, da CLT/43 que versa sobre a aplicação do incidente da desconsideração da personalidade jurídica previsto no CPC/15 ao processo do trabalho (SCHIAVI, 2017), aplicação está oportunizada pelo princípio da aplicação subsidiária da legislação processual comum no processo trabalhista.

Assim, o art. 855-A da CLT/43 estatui que “[...] Aplica-se ao processo do trabalho o incidente de desconsideração da personalidade jurídica previsto nos arts. 133 a 137 da Lei no 13.105”, CPC/15 (BRASIL, 1943).

Ressalta-se que a aplicação subsidiária do incidente da desconsideração da personalidade jurídica constante no CPC/15 após a Reforma Trabalhista, assim como na IN 39/16 abordada anteriormente, também não foi concebida de forma plena no processo do trabalho, haja vista as adaptações constantes no art. 855-A da CLT/43 relativo à aplicação do referido incidente na Justiça do Trabalho, que se transcreverá a seguir.

Art. 855-A.Aplica-se ao processo do trabalho o incidente de desconsideração da personalidade jurídica previsto nos arts. 133 a 137 da Lei no 13.105, de 16 de março de 2015 - Código de Processo Civil.

§ 1º Da decisão interlocutória que acolher ou rejeitar o incidente:

I - na fase de cognição, não cabe recurso de imediato, na forma do § 1º do art. 893 desta Consolidação;

II - na fase de execução, cabe agravo de petição, independentemente de garantia do juízo;

III - cabe agravo interno se proferida pelo relator em incidente instaurado originariamente no tribunal.

§ 2º A instauração do incidente suspenderá o processo, sem prejuízo de concessão da tutela de urgência de natureza cautelar de que trata o art. 301 da Lei no 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).

Essas adaptações serviram para compatibilizar o procedimento do incidente com os princípios e normas próprias que regem o processo do trabalho. Assim, por exemplo, não caberá recurso de imediato da decisão interlocutória que rejeitar ou acolher o incidente, haja vista o princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias vigente no processo do trabalho, devendo-se, em caso de eventual acolhimento ou rejeição, aguardar o momento oportunizado para a interposição do recurso ordinário para se recorrer da decisão (SOARES, 2018).

Por fim, uma ponderação importante é que a aplicação subsidiária do CPC/15 em relação a esse instituto não teve ressalvas no que se refere à observância do §1º do art. 133, CPC/15, que estabelece apenas que o pedido de desconsideração da personalidade jurídica deverá observar os pressupostos estabelecidos em lei. Essa situação dá margem para a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica conforme toda a legislação vigente sobre o assunto, ou seja, o referido dispositivo de lei não estabeleceu qual teoria se deve adotar para se proceder à desconsideração da personalidade jurídica através do incidente próprio, no âmbito do processo do trabalho.

No mesmo sentido a legislação trabalhista também é omissa quanto a qual regramento jurídico deverá ser seguido, o que significa que a legislação não estabeleceu se a desconsideração da personalidade jurídica deverá ser realizada somente quando preenchidos os requisitos da teoria maior ou da teoria menor.

Desse modo, eis o conflito entre os diversos doutrinadores sobre a aplicação das teorias maior e menor quanto à desconsideração da personalidade jurídica das sociedades limitadas na justiça especializada.

Como já mencionado, apesar da legislação trabalhista não dispor de dispositivos expressos especificando qual seria a teoria que se aplicaria no processo do trabalho, nessa seara tem prevalecido o entendimento de que a teoria que estaria em consonância com os princípios protetivos e da dignidade humana é a teoria menor, tendo sido, portanto, a teoria grandemente aplicada (MIESSA, 2018).

No entanto, essa circunstância acaba gerando calorosos debates, já que, quando se trata de desconsideração da personalidade jurídica no âmbito do processo do trabalho, deve-se verificar que há, de um lado, a necessidade de observância dos princípios protetivos trabalhistas, e, de outro, os princípios empresariais da autonomia patrimonial e da segurança jurídica.

Dentre os doutrinadores que defendem a aplicação da teoria menor está Josley Soares (2018). Para ele essa teoria é mais benéfica ao trabalhador, já que este se equivale ao consumidor quanto a sua hipossuficiência, tendo em vista que ambos são partes mais frágeis nas relações jurídicas. Sendo parte caracterizada pela hipossuficiência, deve-se buscar que os créditos pertencentes ao trabalhador sejam o quanto antes satisfeitos, até mesmo em razão de sua natureza alimentar, mostrando-se imprescindível para a garantia de sua dignidade humana.

Ainda de acordo com Josley Soares (2018), o art. 8º, da CLT/43 mostra-se como a norma que autorizaria a aplicação da teoria menor na Justiça do Trabalho, tendo em vista que o dispositivo legal preceitua que deverá ser aplicada a cláusula mais benéfica ao trabalhador.

Corroborando o entendimento esposado, Mauro Schiavi (2017) aduz que a aplicação da teoria menor se justifica em razão da dificuldade que o trabalhador reclamante possui para demonstrar a má-fé do administrador da sociedade e do caráter alimentar dos créditos trabalhistas.

Além disso, em consonância com o art. 2º, caput e 2º da CLT/43, a aplicação da teoria menor na esfera trabalhista se dá pelo fato de que os riscos da atividade empresarial são de responsabilidade da empresa, não podendo ser repassados ao trabalhador (ALMEIDA, 2016).

Neste viés, Sérgio Cavalieri Filho (2014) diz que o risco empresarial comum às atividades econômicas não pode ser suportado por terceiros ou trabalhadores, porém deve ser suportado pelos sócios ou administradores, ainda que os mesmos demonstrem conduta proba na gestão da sociedade.

Já Eliana dos Santos Alves Nogueira e José Gonçalves Bento (2016), argumentam que o art. 4º, §3º da Lei 6.830/80, que possui aplicação subsidiária ao processo trabalhista com fulcro no art. 889 da CLT/43, autoriza a aplicação da teoria menor.

Assim, para os referidos autores, o descumprimento da obrigação contratual de quitação das verbas trabalhistas se presume na existência de fraude ou abuso de direito (NOGUEIRA; BENTO, 2016).

Contrapondo-se à defesa da aplicação da teoria menor, Marlon Tomazette (2013) defende que a desconsideração da personalidade jurídica deve ocorrer somente em casos excepcionais, com a observância dos requisitos da teoria maior, haja vista a importância do princípio da autonomia patrimonial.

Para essa parte da doutrina, a desconsideração da personalidade jurídica, caracterizando-se como uma sanção, exige a presença de um ato ilícito para permitir-se a invasão do patrimônio dos sócios, seja o desvio de finalidade, seja a confusão patrimonial.

O referido autor enfatiza que “A aplicação generalizada da desconsideração acabaria por extinguir uma das maiores criações do direito: a pessoa jurídica. Por isso, há que se ter cautela sempre, não considerando suficiente o não cumprimento das obrigações da pessoa jurídica” (TOMAZETTE, 2013, p. 244).

A ideia é que a desconsideração não pode ser levada a cabo sem se perquirir a existência de má-fé por parte dos sócios da sociedade empresária, sob pena de esvaziamento do princípio da autonomia patrimonial, que, aliás, é o principal fundamento para a existência das pessoas jurídicas (FAZZIO JÚNIOR, 2016).

A questão aqui não é se esquivar dos riscos do empreendimento, que são atribuíveis ao empregador, mas fazer com que essa responsabilização se dê na medida da conduta ilícita praticada pelos sócios (FAZZIO JÚNIOR, 2016).

Segundo André Santa Cruz Ramos (2016), a desconsideração da personalidade jurídica também só pode ser efetivada mediante a demonstração de desvio de finalidade ou a comprovação da confusão patrimonial. Além disso, o referido autor é enfático ao defender que a teoria maior deveria ser a única regra legal do ordenamento jurídico brasileiro e salienta que o legislador do CC/02 deveria ter revogado, à época de sua edição, todas as disposições legais que contrariem a aplicação da teoria maior, visto que a aplicação da teoria menor gera insegurança para o mercado.

Corroborando ao entendimento de que a teoria da desconsideração da personalidade jurídica que deve ser aplicada ao processo do trabalho é a teoria maior, Maria Cristina Irigoyen Peduzzi (2014), Ministra do TST argumenta que:

A desconsideração da pessoa jurídica só deve ser afirmada quando o sócio utilizou-se com desvio de finalidade, contrariamente à lei e aos estatutos, com abuso de direito, vale dizer que, quando ocorrer a utilização indevida da pessoa jurídica em situações como fraude, simulação e abuso da personalidade (PEDUZZI, 2014, p. 35).

Marlon Tomazette (2013), por sua vez, explica que a aplicação da teoria maior no processo trabalhista não afasta a possibilidade da efetiva desconsideração da personalidade jurídica, que deverá ser aplicada com base no CC/02 por força do art. 8º da CLT/43, esclarecendo que não seria possível invocar as regras contidas no Código do Consumidor para observância nesse campo dada a especificidade da regra que rege a relação de consumo.

Dessa forma, importa ressaltar que a teoria menor enfoca apenas o trabalhador, esquecendo-se do empregador, consubstanciado na figura dos sócios, que acaba tendo seu patrimônio atingindo, sem agir de má-fé, e no caso das sociedades limitadas, desrespeitando-se o princípio da autonomia patrimonial anteriormente estudado, o da segurança jurídica e o da livre iniciativa.

Compreende-se no princípio da segurança jurídica, a garantia da estabilidade e permanência das relações jurídicas, garantias do direito adquirido e da não surpresa do particular (AWAZU, 2014). Já o princípio da livre iniciativa está consagrado no art. 1º, IV e no art. 170 da CRFB/88, é a base da ordem econômica, de modo que possui grande relevância nas questões envolvendo produção, circulação de bens ou serviços (OLIVEIRA, 2005).

Assim, o princípio da segurança jurídica se manifesta nas sociedades limitadas a partir de quando o capital social fica integralizado, de modo que os sócios adquirem o direito de não responder com o patrimônio pessoal pelas dívidas da sociedade. Nesse sentido, haverá a incidência também do princípio constitucional da livre iniciativa, haja vista que a segurança jurídica econômica das relações sociais incentiva a criação de novas sociedades empresárias, que fazem o capital do país girar, bem como geram empregos e renda.

Desse modo, segundo Deilton Ribeiro Brasil (s/d) o abuso do instituto da disregarddoctrine, caracterizada pela aplicação desenfreada da teoria menor, desestimula a atividade empresária, gerando insegurança aos agentes econômicos, bem como afastando da opção pelo exercício daquela, com prejuízo para a economia como um todo, inclusive resultando na diminuição de empregos.

Sobre as autoras
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA, Sthefany Silveira; RIBEIRO MÓL, Ana Lúcia. A aplicação das teorias subjetiva e objetiva como fundamento para desconsideração da personalidade jurídica das sociedades limitadas na Justiça do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7301, 28 jun. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67272. Acesso em: 22 nov. 2024.

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