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Pode o locador pedir a desocupação do imóvel durante a locação?

Em caso afirmativo, qual o prazo para o locatário desocupar?

Agenda 11/03/2019 às 14:54

Para saber se o locador pode pedir o imóvel, é necessário avaliar o contrato, prazo da locação e se houve prorrogação.

Conceito de locação e requisitos do contrato

O contrato de locação é de larga utilização no mundo moderno e guarda suas raízes na civilização romana. Em nosso país, é o segundo contrato em importância, ficando atrás somente do contrato de compra e venda.

Na locação, um dos contratantes entrega temporariamente ao outro um bem, em condições de utilização, mediante determinada contraprestação devida por aquele que a recebe para uso. A retribuição pela utilização do bem cedido em locação é o pagamento de um aluguel, normalmente mensal, de acordo com o prazo de utilização.

De modo simples, podemos elencar alguns requisitos para que se configure o contrato de locação, conforme a seguir:

i) um bem objeto da locação (carro, imóvel, máquinas etc);

ii) que o bem a ser entregue em locação detenha condições de ser imediatamente utilizado ao fim a que se destina;

iii) a temporariedade, ou seja, a transferência do bem para utilização é temporária e não definitiva;

iv) o pagamento de uma retribuição pela utilização, que é o aluguel;

v) a devolução do bem ao final da locação, no mesmo estado em que foi entregue ao início do contrato.


Locação não residencial

De modo geral, os requisitos básicos para a existência de uma relação de locação estão expostos acima. A locação geral está regulada pelo Código Civil Brasileiro, no artigo 565 e seguintes, ficando a locação de imóveis urbanos regulada por lei especial, a Lei 8.245/91.

A lei do inquilinato trata de três tipos de locação: a) locação residencial; b) locação não residencial (antiga locação comercial); e c) locação para temporada.

O texto em questão tratará das locações residenciais, não se destinando a analisar as demais locações.

A questão objeto deste texto é saber se o locador pode pedir a desocupação do imóvel locado e qual prazo o locatário teria para a entregá-lo. Para responder a pergunta, é necessário avaliar o contrato, prazo da locação e se houve prorrogação.


Regra geral que impossibilita o locador em reaver o imóvel locado durante o prazo do contrato

Importante trazer ao texto o entendimento da lei de locações, que veda ao locador reaver o imóvel locado durante o prazo do contrato, ou seja, se o contrato estiver em vigência, não poderá o locador pedir sua desocupação.

No entanto, se a regra é a de que ao locador é vedado reaver o imóvel durante o prazo do contrato, pode o locatário fazer a entrega do imóvel, ainda que o prazo do contrato de locação não tenha se ultimado. Em consequência da entrega antecipada, o locatário suportará o pagamento de uma multa rescisória, normalmente prevista no próprio contrato de locação, segundo o art. 4º da Lei 8.245/91.

Prosseguindo, importante avaliar o contrato de locação, para sabermos de sua vigência e o prazo em que o mesmo foi celebrado, pois disso decorrem consequências distintas.

Deste modo, com relação ao prazo do contrato e a vigência, temos as seguintes situações, não incluindo nesse rol a locação por temporada e a locação não residencial (comercial):

I) Contrato de locação celebrado por escrito, por qualquer prazo, ainda em vigência;

II) Contrato de locação celebrado escrito, por de trinta meses, prorrogado por prazo indeterminado;

III) Contrato de locação celebrado verbal ou por prazo inferior a trinta meses, prorrogado por prazo indeterminado;

 Passaremos então ao primeiro item, a saber:

a) Contrato de locação celebrado por escrito, por qualquer prazo, ainda em vigência;

O fundamento básico da locação de imóveis urbanos é o de que o proprietário, uma vez locado o imóvel, cedendo a utilização do mesmo por determinado período, não poderá ter esse imóvel antes do término do contrato. Deste modo, é conferido ao locatário, durante a vigência contratual, a segurança de que o mesmo poderá ter o uso do imóvel, segundo estipulado em contrato, sem que sofra nenhuma surpresa no curso da locação.

Essa regra norteadora da locação só poderá ser superada em determinados casos expressamente previstos no artigo 9º da Lei do Inquilinato, como o mútuo acordo (inc. I), em razão da prática de infração legal ou contratual pelo locatário (inc. II) ou em decorrência da falta de pagamento de aluguel e demais acessórios da locação (inc. III). Deste modo, se o locatário não der causa praticando uma infração ou sendo inadimplente no pagamento do aluguel, a locação não poderá ser desfeita, salvo, é claro, se ele concordar expressamente.

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No entanto, durante a vigência do contrato de locação, é facultado ao locatário entregar o imóvel locado, arcando com a multa rescisória, que será cobrada na proporção prevista no Código Civil Brasileiro, ou seja, a penalidade será abrandada na proporção em que a obrigação foi cumprida, aplicando-se a proporcionalidade matemática.

Importante ressaltar que cláusulas contratuais estipulando que o locador poderá rescindir o contrato durante sua vigência NÃO possuem qualquer eficácia no ordenamento jurídico, pois nesse caso o princípio da autonomia da vontade das partes não poderá suplantar a expressa disposição de lei que, por ser norma cogente, de ordem pública, não admite seu afastamento por mero ajuste entre as partes.

“Art. 4o Durante o prazo estipulado para a duração do contrato, não poderá o locador reaver o imóvel alugado. O locatário, todavia, poderá devolvê-lo, pagando a multa pactuada, proporcional ao período de cumprimento do contrato, ou, na sua falta, a que for judicialmente estipulada.”.

b) Contrato de locação celebrado escrito, por prazo igual ou superior a trinta meses, que se encontra prorrogado por prazo indeterminado;

Neste caso temos configurado o direito da denúncia vazia, que é a possibilidade que a lei confere ao locador de denunciar o contrato de locação, tendo como consequência a desocupação do mesmo pelo locatário.

Denunciar é dar por findo, é encerrar o contrato de locação. A denúncia é vazia, pois não necessita de qualquer fundamentação ou motivo para ser exercida. Basta ao locador manifestar formalmente a sua intenção de não prosseguir o contrato, uma vez que o prazo se tenha expirado, para que o locatário desocupe o imóvel. O prazo para desocupação é de 30 (trinta) dias, ficando o locatário obrigado a cumpri-lo, sujeitando-se a ação de despejo e cobrança de multa.

Seguem abaixo alguns dispositivos da lei do inquilinato:  

“Art. 46. Nas locações ajustadas por escrito e por prazo igual ou superior a trinta meses, a resolução do contrato ocorrerá findo o prazo estipulado, independentemente de notificação ou aviso.

§ 1º Findo o prazo ajustado, se o locatário continuar na posse do imóvel alugado por mais de trinta dias sem oposição do locador, presumir - se - á prorrogada a locação por prazo indeterminado, mantidas as demais cláusulas e condições do contrato.

§ 2º Ocorrendo a prorrogação, o locador poderá denunciar o contrato a qualquer tempo, concedido o prazo de trinta dias para desocupação.”

c) Contrato de locação celebrado verbalmente ou por escrito, por prazo inicial inferior a trinta meses, encontrando-se prorrogado prazo indeterminado;

São duas questões que devem ser evitados a qualquer custo em locação de imóveis urbanos: a locação verbal e a celebração de contratos por prazo inferior a trinta meses.

No caso da locação verbal, temos a precariedade do contrato firmado, que gera enorme fragilidade jurídica, já que de difícil comprovação de suas cláusulas e condições. A locação verbal não goza da proteção da denúncia vazia, algemando o locador em uma relação de difícil proteção.

No mesmo sentido, a locação, ainda que por escrito, mas celebrada com prazo inferior a trinta meses, é escolha a ser utilizada com cautela, senão evitada. Nesse tipo de locação uma vez que o prazo tenha se ultimado sem oposição do locador pelo término do contrato, a mesma se prorroga por prazo indeterminado.

Nas locações verbais ou celebradas por prazo inferior a trinta meses, a consequência da prorrogação da locação, por prazo indeterminado, é a dificuldade do locador em reaver o imóvel locado. Na hipótese da prorrogação, o locador somente poderá reaver o imóvel locado após cinco anos de vigência ininterrupta do contrato, com poucas alternativas legais para escapar dessa situação.

Havendo a prorrogação do contrato, o locador deverá esperar o prazo de cinco anos para reaver o imóvel, com poucas opções legais para tanto, que na prática cotidiana acabam se reduzindo aos casos de mútuo acordo, infração legal ou contratual, não pagamento do aluguel e acessórios da locação.

Existe ainda a denúncia cheia, que é a possibilidade de o locador reaver o imóvel locado, desde que haja fundamento, como para uso próprio.

Em síntese, durante o prazo do contrato de locação, segue a regra de que o locador não poderá reaver o imóvel. Se após o término do contrato, o locador não se manifestar, o mesmo prorrogar-se-á por prazo indeterminado, somente podendo reaver o imóvel nesse caso após cinco anos de vigência sucessiva da locação, com as poucas alternativas que são a inadimplência do locatário ou prática de alguma infração contratual. Poderá o locador ainda reaver o imóvel locado por denúncia cheia, ou seja, com fundamento, para uso próprio ou de cônjuge, ascendente ou colateral. 

Segue abaixo o texto legal:

“Art. 47. Quando ajustada verbalmente ou por escrito e como prazo inferior a trinta meses, findo o prazo estabelecido, a locação prorroga - se automaticamente, por prazo indeterminado, somente podendo ser retomado o imóvel:

I - Nos casos do art. 9º;

(...)

III - se for pedido para uso próprio, de seu cônjuge ou companheiro, ou para uso residencial de ascendente ou descendente que não disponha, assim como seu cônjuge ou companheiro, de imóvel residencial próprio;

(...)

V - se a vigência ininterrupta da locação ultrapassar cinco anos.”

De forma bem resumida, são as três possibilidades legais para a modalidade de locação RESIDENCIAL. Não abordamos as duas outras modalidades de locação, a por TEMPORADA e a NÃO RESIDENCIAL (antiga locação comercial).

Sobre o autor
Francisco Machado Egito

Advogado com pós-graduação em Direito Imobiliário e pós-graduação em Direito Notarial e Registral. Graduado em Gestão de Negócios Imobiliários. Administrador de condomínios e imóveis. Graduado em administração e contabilidade. Sólida experiência em negócios imobiliários. Professor universitário nas disciplinas de Direito Condominial, tributação em negócios imobiliários e Aspectos contábeis, tributários e previdenciários em condomínios. Coordenador da pós graduação em Direito e Gestão condominial e da pós graduação em Direito Condominial. Mestrando em administração pela UFF. Presidente da comissão de Direito Condominial da ABA-RJ. Coordenador da Comissão de Contabilidade Condominial do CRC-RJ. Membro das comissões de Direito Imobiliário da OAB Niterói e OAB RJ.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

EGITO, Francisco Machado. Pode o locador pedir a desocupação do imóvel durante a locação?: Em caso afirmativo, qual o prazo para o locatário desocupar?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5731, 11 mar. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67285. Acesso em: 22 dez. 2024.

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