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Pela Igualdade de Gênero

Agenda 24/07/2018 às 20:00

Homens e mulheres não são iguais, E "vive la différence"! Porém, como cidadãos, não deve haver distinção. Não é razoável, no século XXI, que as mulheres continuem a ostentar um tratamento legal mais favorável que os homens no que tange os cuidados com os filhos, em especial no nascimento destes.

No Brasil, a licença maternidade (de 120 dias) é muito maior que a concedida ao pai (de meros cinco dias). Como afirma CANDY FLORÊNCIO THOMÉ (A Licença-Paternidade como Desdobramento da Igualdade de Gênero. Um Estudo Comparativo entre Brasil e Espanha; Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, Belo Horizonte, v. 50, n. 80, jul./dez. 2009, p. 41-53), o fundamento da maioria das pessoas que consideram que a mulher deve assumir a maior parte das obrigações - e direitos - da criação de filhos é que ela teria um instinto maternal nato.

Esse chamado instinto maternal, como ensina ELISABETH BADINTER (Um Amor Conquistado: o Mito do Amor Materno, Ed. Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1985), está longe de o ser, aproximando-se mais de um dado cultural, e pouco ou nada difere do instinto paternal: depois da gravidez e amamentação, tanto o pai como a mãe têm iguais condições para criar os filhos, lembrando que até o aleitamento pode ser realizado pelo pai, com leite materno (congelado) ou animal.

Na verdade, o papel dos pais na criação dos filhos tem tido cada vez mais relevo, com muitos deles passando a dividir os cuidados do bebê com as mães. Desde a gestação, passando pelo nascimento e pelas fases de desenvolvimento da criança, os homens hoje assumem responsabilidades antes encaradas como somente femininas. Isto tudo sem se esquecer de que há outras formações familiares, como o pai solteiro, a filiação por adoção e os casais homoafetivos.

Diante dessa nova realidade, a disparidade entre o tempo destinado às licenças causa a impressão de que as mulheres são as únicas responsáveis pelo cuidado com as crianças. Assim, é fundamental buscar garantias legais para que o homem possa ter direito isonômico ao da mulher no que tange aos cuidados com o recém-nascido.

Nesse sentido, o modelo de licença parental tem sido muito profícuo em diversos países. Na Dinamarca, tal licença remunerada tem duração de seis meses a um ano, sendo custeada pela parceria governo-empresa. Este benefício é partilhado pelo casal. Em seis meses de licença, por exemplo, a mulher pode ficar em casa por três meses e o pai, igualmente, por mais três. Já na Nova Zelândia, desde julho de 2018 (Premier, Grávida e sem Licença Paga; O Globo, 20/01/2018, p. 24), o tempo de afastamento laboral é de 22 meses, ainda que (curiosamente) não contemple políticos eleitos, que, desta feita, não se enquadram na categoria de funcionários públicos. Neste caso, a solução é a licença não-remunerada.

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"A Primeira-Ministra JACINDA ARDERN, de 37 anos (grávida de seu primeiro filho e que não tem direito legal à licença maternidade, por ser titular de cargo eletivo), anunciou que seu marido (CLARKE GAYFORD) cuidará (da criança) em tempo integral: 'CLARKE e eu temos o privilégio de estar numa posição em que ele pode ficar em casa. Sabendo que tantos pais têm de fazer malabarismo para cuidar dos filhos, nos consideramos muito sortudos'. (Curiosamente), a Nova Zelândia foi o primeiro país do mundo a dar o direito de voto às mulheres, em 1893, e JACINDA é a terceira a governá-lo. Ela é, ainda, a mulher mais nova a ser eleita chefe de governo e durante a campanha, - que a levou ao poder em outubro, poucos meses depois de assumir a liderança do Partido Trabalhista -, esteve no centro de uma polêmica justamente sobre o assunto, ao ser questionada, mais de uma vez, sobre as consequências de uma eventual maternidade: 'É totalmente inaceitável considerar que, em 2017, as mulheres devam responder a esta questão.' - rebateu, à época. 'A escolha do momento para ter filhos pertence às mulheres. Isso não deve determinar poder ou não conseguir um emprego'. Ela será a segunda chefe de governo a dar à luz enquanto está no cargo na História recente: a situação só aconteceu antes uma vez, em 1990, quando a então premier do Paquistão, BENAZIR BHUTTO, deu à luz uma menina." (Premier, Grávida e sem Licença Paga; O Globo, 20/01/2018, p. 24)

Interessante notar que a motivação original para as políticas de licença pós-parto não foi uma preocupação com a criança, mas sim com a mãe. Diferentemente, pode-se dizer que a motivação para uma política de licença parental se volta para o bem estar da criança, nisto residindo a grande diferença que permeia a presente reflexão.

Portanto, para que haja uma efetiva igualdade de gênero nas relações de trabalho, deve haver a implementação de medidas legais que garantam a conciliação da vida laboral e familiar, de modo a possibilitar a criação de uma nova corresponsabilidade a partir do compartilhamento das responsabilidades familiares e domésticas entre os dois progenitores.

Sobre o autor
Reis Friede

Desembargador Federal, Presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (biênio 2019/21), Mestre e Doutor em Direito e Professor Adjunto da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Graduação em Engenharia pela Universidade Santa Úrsula (1991), graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1985), graduação em Administração - Faculdades Integradas Cândido Mendes - Ipanema (1991), graduação em Direito pela Faculdade de Direito Cândido Mendes - Ipanema (1982), graduação em Arquitetura pela Universidade Santa Úrsula (1982), mestrado em Direito Político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1988), mestrado em Direito pela Universidade Gama Filho (1989) e doutorado em Direito Político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1991). Atualmente é professor permanente do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Local - MDL do Centro Universitário Augusto Motta - UNISUAM, professor conferencista da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, professor emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército. Diretor do Centro Cultural da Justiça Federal (CCJF). Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região -, atuando principalmente nos seguintes temas: estado, soberania, defesa, CT&I, processo e meio ambiente.

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