Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

O ciclo completo de polícia: uma solução?

Exibindo página 2 de 4

MODELO ATUAL DE ORGANIZAÇÃO POLICIAL

Após um período de pouco mais de 20 anos de Ditadura militar (1964 – 1988), foi promulgada em 1988 a constituição que vige até hoje no Brasil. Foi estabelecido no artigo 144 desse documento legal, as diretrizes para a organização e competências dos órgãos envolvidos na segurança pública. Os órgãos são a Polícia Militar e a Polícia Civil no âmbito estadual, bem como, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Ferroviária Federal no âmbito da união. Segue abaixo o referido artigo da constituição de 1988:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

  1. - polícia federal;
  2. - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis;

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. (BRASIL, 1988)

Nesse artigo, a Constituição Federal de 1988 preceitua que a segurança pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. Segundo Moraes (1999) a multiplicidade dos órgãos de defesa da segurança pública, pela nova constituição, teve dupla finalidade: o atendimento aos reclamos sociais e a redução da possibilidade de intervenção das Forças Armadas na segurança interna.

O artigo 144 § 6°, da Constituição Federal localiza as Polícias militares e os corpos de bombeiros militares como forças auxiliares e reserva do Exercito, subordinando-os, juntamente com as Polícias civis, aos governadores dos Estados,do Distrito Federal e dos Territórios. E por ultimo, concede aos municípios a faculdade de se criar, por meio de suas competências legislativas, as guardas municipais cuja função é a proteção de seus bens, serviços e instalações conforme dispuser cada lei.

O artigo 144 da Constituição Federal de 1988 também delega competências aos órgãos envolvidos na segurança pública do Brasil, vale ressaltar as competências da Polícia Militar e Polícia Civil por serem objetos do presente estudo e da Polícia Federal, tendo em vista as competências da Polícia Civil ser residual a elas:

§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;

  1. - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência;
  2. - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
  3. - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.

§ 4º - às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

§ 5º - às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil. (BRASIL, 1988)

Além das atribuições constitucionais, leis infraconstitucionais e constituições estaduais também designam funções ao Policiamento. Em Goiás, os estatutos das Polícias, estão nas leis 16.901 (Polícia Civil) e 8.125 (Polícia Militar).

A lei 16.901 estabeleceu os seguintes deveres para a Polícia Civil:

Art. 5º Compete à Polícia Civil:

– exercer, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e apurar as infrações penais, exceto as militares;

– planejar, coordenar, dirigir e executar as ações de polícia judiciária e de apuração de infrações penais, que consistem na produção e na realização de inquérito Policial e de outros atos formais de investigações;

– cumprir mandados de prisão e de busca domiciliar, bem como outras ordens expedidas pela autoridade judiciária competente, no âmbito de suas atribuições;

– preservar locais, apreender instrumentos, materiais e produtos de infração penal, bem como requisitar perícia oficial e exames complementares;

– organizar e realizar ações de inteligência, destinadas ao exercício das funções da polícia judiciária e à apuração de infrações penais, na esfera de sua competência;

– realizar correições e inspeções, em caráter permanente ou extraordinário, na esfera de sua competência;

– organizar e realizar pesquisas técnico-científicas relacionadas com as funções de polícia judiciária e com a apuração de infrações penais;

– elaborar estudos e promover a organização e o tratamento de dados e informações indispensáveis ao exercício de suas funções;

– estimular e participar do processo de integração dos bancos de dados existentes no âmbito dos órgãos do SUSP;

– manter, na apuração das infrações penais, o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade;

– propor ao Secretário da Segurança Pública o planejamento e a programação dos investimentos da Polícia Civil;

– coordenar, controlar, orientar e exercer as atividades de polícia judiciária, a cargo das delegacias de polícia, excetuando-se a competência da Polícia Federal, bem como executar em todo o Estado as atividades de repressão da criminalidade, ressalvadas as atribuições da Polícia Militar;

– propor ao Secretário da Segurança Pública a ampliação do aparelho Policial nas áreas em que ocorrer aumento da criminalidade;

– formar e treinar permanentemente os Políciais civis;

– articular-se com a Polícia Militar e com os demais órgãos da Secretaria da Segurança Pública, do Departamento de Polícia Federal e das Forças Armadas, a fim de colaborar na defesa e na segurança do Estado e das instituições;

– manter atualizados:

a)os arquivos sobre mandados de prisão e documentos correlatos;

b)o cadastro de fotografias de criminosos procurados, providenciando, sempre que necessário, sua divulgação pelos meios cabíveis;

c)as estatísticas sobre crimes e contravenções.

Ao ler esse artigo fica evidente que as atribuições de Polícia Judiciária foram entregues a Polícia Civil. É respeitado em tal lei aquilo que já foi preconizado na Constituição Federal, que são as funções residuais de Polícia Judiciária sendo de total responsabilidade da Polícia Civil.

As atribuições da Polícia Militar do Estado de Goiás foram editadas antes da Constituição de 1988, apesar disso, foram recepcionadas pela mesma. A lei 8125 do Estado de Goiás tem como objetivo organizar a Polícia Militar goiana e atribuir funções a essa instituição militar.

Art. 2º - Compete à Polícia Militar:

- executar com exclusividade, ressalvadas as missões peculiares às Forças Armadas, o Policiamento ostensivo fardado planejado pelas autoridades Políciais competentes, a fim de assegurar o cumprimento da lei, a manutenção da ordem pública e o exercício dos poderes constituídos;

- atuar de maneira preventiva com força de dissuasão, em locais ou áreas específicas, onde se presuma ser possível a perturbação da ordem;

- atuar de maneira repressiva, em caso de perturbação da ordem, precedendo o eventual emprego das Forças Armadas;

- atender à convocação do Governo Federal, em caso de guerra externa ou para prevenir ou reprimir grave subversão da ordem ou ameaça de sua irrupção, subordinando-se ao Comando da 11ª Região Militar para emprego em suas atribuições específicas de Polícia Militar e como participante da defesa territorial;

Nota-se com grande clareza que a referida Lei Estadual respeita, mais uma vez, aquilo que já foi preconizado pela Constituição Federal. Incumbe-se a Polícia Militar as atribuições de Polícia Administrativa cabendo a ela fazer a prevenção de crimes por meio do Policiamento ostensivo.


CAPÍTULO II

DO PODER DE POLÍCIA, TIPOS DE POLÍCIA E PRISÃO EM FLAGRANTE

PODER DE POLÍCIA

A administração pública seguiu a mesma esteira de evolução pela qual a sociedade avançou. O poder de Polícia também evoluiu. Nos primórdios da sociedade onde não existia Democracia e sim o absolutismo, caraterizado pela  fusão do Rei com o Estado, dando base para a famosa frase do Rei Luis XIV, da França, onde afirmava que ele era a lei.

A origem moderna do Estado é fundamentada no pensamento de Jean Jacques Rousseau (1712-1778), que explicava suas origens a partir de um contrato social, firmado entre os indivíduos de uma sociedade e o poder local, onde os primeiros, diante do reconhecimento de sua impotência para conter os conflitos, abdicam de uma parcela de sua liberdade individual em benefício de toda coletividade (STRECK; MORAES, 2001):

O direito de polícia do príncipe foi sofrendo restrições em seu conteúdo, deixando de alcançar, paulatinamente, primeiro as atividades eclesiásticas, depois as militares e financeiras, chegando a um momento em que se reduzia a normas relativas à atividade interna da Administração. Posteriormente, ainda, passou-se a ligar a polícia à ideia de coação; nesse momento, começou-se a distinguir a atividade de polícia das demais atividades administrativas, hoje chamadas serviço público e fomento GARRIDO FALLA, (apud DI PIETRO, 2006, p. 126)

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Um ponto chave para o nascimento do Estado de Direito é a organização do Estado por meio de uma constituição, carta politica que tem como fim limitar o poder do Estado e resguardar direitos e deveres básicos a todos os cidadãos.

O Estado Democrático de Direito tem um conteúdo transformador da realidade, não se restringindo, como o Estado social de Direito, a uma adaptação melhorada das condições sociais de existência. Assim, o seu conteúdo ultrapassa o aspecto material de concretização de uma vida digna ao homem e passa a agir simbolicamente como fomentador da participação pública quando o democrático qualifica o Estado, o que irradia os valores da democracia sobre todos os elementos constitutivos e, pois também sobre a ordem jurídica. E mais, a ideia de democracia contém e implica, necessariamente, a questão da solução do problema das condições materiais de existência. (STRECK; MORAIS, 2001, p. 93).

Na segunda metade do século XX há uma nova modificação no Estado preenchida por leis de proteção social sendo impulsionados pelos ideais partidários, principalmente dos partidos socialistas e das pressões sindicais. Fator importante para essas mudanças no Estado foi o êxodo rural e os avanços tecnológicos e científicos que proporcionaram um avanço na qualidade de vida das pessoas. Fatos como esse tiveram como fim os ditos direitos sociais que incluem o direito à educação, ao trabalho, à moradia, ao meio ambiente, à previdência social e ao lazer. Já na virada do milênio, o Estado tem nova configuração e sua intervenção na economia passa a ser mínima.

O poder de polícia está preconizado no Código Tributário Nacional, mais especificamente no artigo 78.

Considera-se poder de polícia como sendo a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. (PINTO, 2007, p. 730)

O paragrafo único do artigo 78 esclarece que “o exercício de poder de polícia sendo este quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder” (CODIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL).

Segundo Meireles (2000, p 57), “o poder de polícia é a faculdade que dispõe a administração pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em beneficio da coletividade ou do próprio Estado”. Cabe evocar os pensamentos de Melo, para um conceito mais completo do tema.

É a atividade da administração pública, expressa em atos normativos ou concretos, de condicionar, com fundamento em sua supremacia geral e na forma da lei, a liberdade e a propriedade dos indivíduos, mediante ação ora fiscalizadora, ora preventiva, ora repressiva, impondo coercitivamente aos particulares um dever de abstenção (‘non facere’) a fim de conformar-lhes comportamentos aos interesses sociais consagrados no sistema normativo (MELO, 2006, p. 175).

Como em todas as áreas do Direito, existem as correntes dominantes e as de menor adesão em relação aos doutrinadores da matéria, alguns poucos escritores acreditam em uma concepção mais ampla do Poder de Polícia, onde, além das atividades administrativas em que são executadas as leis, mas também na edição das mesmas, através do poder legislativo.

O Poder Legislativo, no exercício do poder de polícia que incumbe ao Estado, cria, por lei, as chamadas limitações administrativas ao exercício das liberdades públicas. A administração pública, no exercício da parcela que lhe é outorgada do mesmo poder, regulamenta as leis e controla a sua aplicação preventivamente (por meio de ordens, notificações, licenças ou autorizações) ou repressivamente (mediante imposição de medidas coercitivas) (DI PIETRO, 2006, p. 128).

Para se ter uma maior noção do que é o conceito de polícia faz-se necessário uma análise mais detalhada sobre os seus atributos.

Atributos do Poder de Polícia

A doutrina dominante refere-se aos atributos do poder de polícia como sendo o da auto-executoriedade, da discricionariedade e da coercibilidade, ainda contando com uma atividade negativa.

A auto-executoriedade é o poder que a administração tem de pôr em prática, por seus próprios meios e suas normas, sem precisar da autorização dos outros dois poderes. É por este atributo que as decisões administrativas impõem-se ao particular ainda contra a sua concordância e, se este se achar ofendido em seus direitos, deverá procurar o Poder Judiciário. Porém, esta faculdade não é absoluta: algumas regras tem que ser respeitadas, assim como leis e normas a que a administração pública está sujeita, sob o risco de nulidade de seus atos. Neste caso, não há de se falar que o princípio do contraditório e da ampla defesa foram deixados de lado.

A auto-executoriedade não existe em todas as medidas de polícia. Para que a Administração possa se utilizar dessa faculdade, é necessário que a lei a autorize expressamente, ou que se trate de medida urgente, sem a qual poderá ser ocasionado prejuízo maior para o interesse público. No primeiro caso, a medida deve ser adotada em consonância com o procedimento legal, assegurando-se ao interessado o direito de defesa, previsto expressamente no artigo 5º, inciso LV, da Constituição. No segundo caso, a própria urgência da medida dispensa a observância de procedimento especial, o que não autoriza a Administração a agir arbitrariamente ou a exceder-se no emprego da força, sob pena de responder civilmente o Estado pelos danos causados (cf. art.37, § 6º, da Constituição), sem prejuízo da responsabilidade criminal, civil e administrativa dos servidores envolvidos (DI PIETRO, 2006, p. 131-132).

A discricionariedade baseia-se no fato de que a Administração Pública poderá escolher, obedecendo aos critérios de oportunidade e conveniência, como agirá na fiscalização e quais atividades fiscalizará. Também como será, dentro do estabelecido pela Lei, as sanções aplicadas a possíveis irregularidades, sempre sendo proporcional nesses momentos.

A administração pode, em principio, determinar, dentro dos critérios de oportunidade e conveniência, quais atividades ira fiscalizar em um determinado momento e, dentro dos limites estabelecidos na lei, quais sanções deverão ser aplicadas e como deverá ser feita a graduação dessas sanções. De qualquer forma, a sanção sempre deverá estar prevista em lei e devera guardar correspondência e proporcionalidade com a infração verificada (ALEXANDRINO; VICENTE, 2005, p. 247).

A coercibilidade está intimamente ligada a auto-executoriedade, sendo que a aplicação das medidas da administração pública necessitam da força, inclusive do uso de Polícia em casos extremos.

A imposição coercitiva dos atos de polícia, também independe de prévia autorização judicial, mas está sujeita – assim como ocorre com todo e qualquer ato administrativo – a verificação posterior quanto à legalidade, ensejando, se for o caso, a anulação do ato e a reparação ou indenização do particular pelos danos sofridos, sempre que se comprove ter ocorrido excesso ou desvio de poder (ALEXANDRINO; VICENTE, 2005, p. 247)

Quanto ao Poder de Polícia ser uma atividade negativa, deve-se ao fato de, todas as vezes, impor uma abstenção ao particular, ou seja, uma obrigação de não fazer: mesmo quando impõe ao particular alguma aptidão ou algum documento, a administração pública não está interessada no que será feito e sim, garantir o bem da coletividade.

O poder público não quer estes atos. Quer, sim, evitar que as atividades ou situações pretendidas pelos particulares sejam efetuadas de maneira perigosa ou nociva, o que ocorreria se realizadas fora destas condições. Por outras palavras, mesmo quando se exige prática de um ato pelo particular, o objetivo é sempre uma abstenção: evitar um dano oriundo do mau exercício do direito individual (DI PIETRO, 2006, p. 132).

Todas as vezes que a administração publica exerce o poder de Polícia, ela o faz com o objetivo de evitar um dano maior a coletividade por um ato individual, mesmo que esse ato esteja embasado em um direito individual legitimo.

Dos Limites

Ainda que seja discricionário, o Poder de Polícia tem limitações quanto a sua forma, competência, aos fins e aos objetos e motivos.

Di Pietro ensina que:

Quanto aos fins, o poder de polícia só deve ser exercido para atender ao interesse público. Quanto a competência devem observar as normas legais pertinentes. Quanto ao objeto, ou seja, quanto ao meio de ação, a autoridades sofre limitações, mesmo quando a lei lhe dê várias alternativas possíveis. Tem aqui aplicação um principio de direito administrativo, a saber, o da proporcionalidade dos meios aos fins; isto equivale a dizer que o poder de polícia não deve ir além do necessário para a satisfação do interesse público que visa proteger; a sua finalidade não é destruir os direitos individuais, mas, ao contrário, assegurar o seu exercício, condicionando-o ao bem estar social; só poderá reproduzi-los quando em conflito com interesses maiores da coletividade e na medida estritamente necessária ä consecução dos fins estatais (DI PIETRO, 2006, p. 133).

O poder de Polícia deve ser limitado tendo em vista o respeito aos direitos individuais. O poder de Polícia jamais deve ir além do necessário para lograr os objetivos desejados.

POLÍCIA ADMINISTRATIVA E JUDICIÁRIA

O Poder de Polícia é exercido pela administração pública, onde essa executa leis elaboradas pelo legislativo, e por muitas vezes levando demandas ao judiciário. Desta forma, a atuação desse poder se divide em dois ramos, o da Polícia Judiciária e o da Polícia administrativa. No Brasil a função de Polícia Judiciária fica a cargo da Polícia Federal e Civil e o da Administrativa com vários órgãos da administração.

Assim, o conceito de poder de polícia se amolda em duas linhas, polícia administrativa e polícia judiciária, enquanto a primeira incide sobre bens, direitos e atividades, atuando no âmbito da função administrativa, a outra se destina a investigar os delitos cometidos, apurando sua veracidade e autoria. (FERNANDES; CAROLINO. 2012).

Por muitas vezes essas Polícias invadem áreas de atuações das outras, tendo em vista a linha tênue que separa suas funções. Sobre esse tema a Professora Maria Sylvia diz:

A diferença não é, no entanto absoluta, pois a polícia administrativa tanto pode agir preventivamente (como por exemplo, proibindo o porte de arma ou a direção veiculo automotores), como pode agir repressivamente (a exemplo do que ocorre quando apreende a arma usada indevidamente ou a licença do motorista infrator). No entanto, pode-se dizer que, nas duas hipóteses, ela está tentando impedir que o comportamento individual cause prejuízos maiores à coletividade; nesse sentido, é certo dizer que a polícia administrativa é preventiva. Mas, ainda assim, falta precisão ao critério, porque também se pode dizer que a polícia judiciária, embora seja repressiva em relação ao indivíduo infrator da lei penal, é também preventiva em relação ao interesse geral, porque, punindo – o, tenta evitar que o individuo volte a incidir na mesma infração (DI PEITRO, 2006, p. 129).

Existem criticas a esse modelo de divisão, como se constata abaixo:

Há preponderância da polícia de segurança pública, destinada à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. A polícia de segurança seria o gênero, enquanto as polícias de prevenção, de repressão, de investigação, de fronteira e a judiciária seriam as espécies SANTINI (apud, VITTA, p. 23).

Silva Junior deixa claro as diferenças entre essas Polícias:

Desde já convém distinguir a polícia administrativa, que interessa neste estudo, da polícia judiciária e da polícia de manutenção da ordem pública, estranhas às nossas cogitações. Advirta-se, porém, que a polícia administrativa incida sobre os bens, diretos e atividades, ao passo que as outras atuam sobre as pessoas. Individualmente ou indiscriminadamente. A polícia administrativa é inerente e se difunde por toda a Administração Pública, enquanto que as demais são privativas de determinados órgãos (Polícias Civis) ou corporações (Polícias Militares). Modernamente se tem distinguido a polícia administrativa geral da polícia administrativa especial, sendo aquela a que cuida genericamente da segurança, da salubridade e  da moralidade pública, e esta de setores específicos da atividade humana que afetem bens de interesse coletivo, tais como a construção, a indústria de alimentos, o comércio de medicamentos, o uso das águas, a exploração das florestas e das minas, para quais há restrições próprias e regime jurídico peculiar (MEIRELLES, 1994 apud SILVA JÚNIOR, 2008, p. 29).

Outra corrente vem ganhando força nesse tema. Encabeçada por Cretella Junior, essa nova corrente diz que a Polícia Judiciária não reprime e sim auxilia na repreensão até a condenação ser transitada em julgado. E que a Polícia Administrativa, além de prevenir, também reprime quando emprega a sua força para assegurar a incolumidade das pessoas sem recorrer a decisões judiciais e afins.

A polícia judiciária é também denominada “repressiva”, nome que merece reparo porque ela não “reprime” os delitos, mas auxilia o Poder Judiciário nesse mister. Polícia auxiliar é, porém, a expressão correta. [...] embora não seja denominação corrente nos autores especializados denominamos “polícia mista” ao organismo estatal que acumula ou exerce, sucessiva ou simultaneamente, as duas funções, a “preventiva” e a “repressiva” como é o caso da polícia brasileira em que o mesmo agente previne e reprime LAZZARINI, (apud SILVA JÚNIOR, 2008, p. 32).

Merece ser destacado que no Brasil a Polícia Militar exerce as funções de Polícia administrativa e a Polícia Civil as de Polícia judiciária, ou seja, nenhuma delas pode cumprir a função da outra, culminando assim, em um sistema de “meias Polícias” atuando em um mesmo território.

PRISÃO EM FLAGRANTE

Como foi dito acima, temos duas Polícias que frequentemente estão se encontrado na esfera administrativa e judiciária no Brasil: Polícia Militar e Polícia Civil. Cada uma delas cumpre uma função, como se fosse metade de um ciclo completo. Para exemplificar melhor o encontro dessas corporações cabe falar sobre a prisão em flagrante que é no Brasil o meio pelo qual essas duas corporações mais se encontram.

É a prisão realizada no momento ou um pouco depois do crime ser cometido. Só pode ser praticada em hipóteses descritas em lei e não necessita de uma ordem judicial para tanto. Lima (2011, p. 177), conceitua a prisão em flagrante da seguinte forma:

A expressão “flagrante” deriva do latim “flagrare” (queimar), e “flagrans”, “flagrantis” (ardente, brilhante, resplandecente), que no léxico, significa acalorado, evidente, notório, visível, manifesto. Em linguagem jurídica, flagrante seria uma característica do delito, é a infração que está queimando, ou seja, que está sendo cometida ou acabou de sê-lo, autorizando-se a prisão do agente mesmo sem autorização judicial em virtude da certeza visual do crime. Funciona, pois, como mecanismo de autodefesa da sociedade.

Nas lições de Tavora; Alencar (2011, p. 530) pode ser visto com maior clareza o conceito de prisão em flagrante:

É uma medida restritiva de liberdade, de natureza cautelar e caráter eminentemente administrativo, que não exige ordem escrita do juiz, porque o fato ocorre de inopino (art. 5º, inciso LXI da CF). Permite-se que se faça cessar imediatamente a infração com a prisão do transgressor, em razão da aparente convicção quanto à materialidade e a autoria permitida pelo domínio visual dos fatos.

Segundo o Art. 301 do Código de Processo Penal, “Qualquer do povo poderá e as autoridades Policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”., ou seja, qualquer cidadão, independente do poder de Polícia, poderá dar voz de prisão a um criminoso quando este estiver na prática do ato ilícito. No Brasil, em grande parte das ocorrências quem pratica essa prisão em maior numero é a Polícia Militar, por estar com suas atenções e recursos mais voltados ao “serviço de rua”.

O sujeito passivo poderá ser qualquer pessoa que esteja praticando, ou que acabou de praticar o ato delituoso. Em termos gerais, qualquer pessoa poderá ser presa em flagrante, porém, há exceções constitucionais e legais para essa generalidade. É aquilo que a doutrina chama de imunidades prisionais.

São exemplos de imunidades prisionais: a) diplomatas, que não são submetidos a prisão em flagrante, por força de convenção internacional; b) Presidente da República, conforme art. 86, § 3º, da Constituição Federal; c) Membros do Congresso Nacional, que só podem ser presos por crime inafiançável, conforme estabelece o art. 53, § 2º, da Constituição Federal; d) magistrados e membros do Ministério Público, que somente podem ser presos em flagrante por crime inafiançável, devendo a autoridade fazer a imediata comunicação e apresentação, respectivamente ao Presidente do Tribunal ou ao Procurador Geral; além de outros casos previstos em lei. (COSTA NETO, 2012).

As espécies de flagrante delito estão elencadas no artigo 302 do Código de Processo Penal:

Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: I - está cometendo a infração penal; II - acaba de cometê-la; III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

A doutrina elenca em três os principais tipos de flagrante delito no arcabouço jurídico brasileiro, segue abaixo uma breve explicação sobre cada um deles.

Flagrante Real

É aquele em que o infrator está na consumação do ato criminoso. Consiste na interrupção do crime, quando este está para ser cometido, embora já tenha iniciado os atos de preparação, não se considera que ele foi totalmente consumado, tendo em vista o autor ter sido surpreendido no momento em que ia alcançar o seu objetivo.

Segundo Távora; Alencar (2011, p. 531), essa “é a modalidade que mais se aproxima da origem da palavra flagrante, pois há um vínculo de imediatidade

entre a ocorrência da infração e a realização da prisão”. É importante, também, citar que o flagrante Real, ou Flagrante Próprio, ou ainda, Flagrante Propriamente Dito tem maior peso e concretude no valor probatório, levando em consideração a certeza visual diante do fato criminoso.

Flagrante Imperfeito

O Flagrante Imperfeito, ou Flagrante Irreal, ou ainda, Quase Flagrante, é aquele que está preconizado no inciso III do artigo 302 do Código de Processo Penal. Ocorre quando o criminoso é perseguido após a prática da infração e é pego, sendo de fácil presunção a sua autoria no crime.

A expressão “logo após” compreende todo espaço de tempo que flui entre o acionamento da autoridade Policial, seu comparecimento ao local e a colheita de elementos necessários para o inicio da perseguição ao autor. A doutrina mais abalizada entende que carece de fundamento legal a crença popular de que a prisão em flagrante só pode ser efetuada em até 24 horas após o cometimento do crime. Não havendo solução de continuidade, isto é, se a perseguição não for interrompida, mesmo que demore horas ou dias, havendo êxito na captura do acusado, estaremos diante de flagrante delito. (COSTA NETO, 2012).

O professor Mirabete concorda e amplia os conhecimentos acima

descritos:

Deve-se entender que o “logo após” do dispositivo é o tempo que corre entre a prática do delito e a colheita de informações a respeito da identificação do autor, que passa a ser imediatamente perseguido após essa rápida investigação do autor procedida por Políciais ou particulares. Por isso, se tem entendimento que não importa se a perseguição seja iniciada por pessoas que se encontravam no local ou pela Polícia diante da comunicação telefônica ou radiofônica. Deve-se ter em conta, porém, que tal situação não se confunde com uma demora investigação a respeito do fato (MIRABETE, 2005, p. 403).

Fica evidente que no caso do Flagrante Imperfeito, o criminoso acabou de praticar o ato ilícito e foi perseguido pela Polícia Militar ou por qualquer cidadão transeunte e é encontrado em situação de fácil imputação ao mesmo o fato delituoso.

Flagrante Presumido

A última hipótese elencada no artigo 302 sobre espécies de flagrante é o presumido também denominado Ficto. Segundo o inciso IV do artigo 302, o flagrante presumido ocorre quando o criminoso “é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração”.

Mirabete faz uma conceituação clara e bem definida a respeito do Flagrante Presumido:

É necessário para a caracterização do flagrante presumido que a prisão ocorra “logo depois” do crime. Embora essa expressão, no léxico, seja sinônima de “logo após”, tem-se admitido que há uma situação de fato que admite um maior elastério ao juiz na apreciação da hipótese. Considerando- se o interesse na repressão dos crimes, há maior margem na discricionariedade da apreciação do elemento cronológico quando o agente é encontrado com objetos indicativos do crime, que permite estender o prazo a várias horas, ou considerando-se o problema do repouso noturno, até o dia seguinte (MIRABETE, 2000, p. 405).

Diferentemente do Flagrante Imperfeito, no Flagrante Presumido o lapso temporal é um pouco maior e ainda é necessário haver objetos indicativos do crime para que haja esse tipo de flagrante. Ficando ainda baseado na discricionariedade do juiz o aceite ou não da hipótese desse flagrante.

Sobre os autores
Rodrigo da Paixão Pacheco

Advogado. Membro das Comissões de Direito do Consumidor, Família e Sucessões e Advocacia Jovem, da OAB seccional Goiás. Mestrando em Serviço Social pela PUC Goiás. Possui graduação em Direito e Administração PUC Goiás. Pós graduando em Direito Civil e Processo Civil e Direito Penal e Processo Penal pela UCAM/RJ.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PACHECO, Rodrigo Paixão; PAIXÃO, Pedro Afonso Santos. O ciclo completo de polícia: uma solução?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5650, 20 dez. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67963. Acesso em: 21 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!