Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Desafios da arbitragem societária no Brasil: o direito de voto

Agenda 18/08/2018 às 18:11

O emprego da arbitragem na solução de dissídios envolvendo o direito de voto nas sociedades anônimas proporciona inúmeras vantagens, notadamente celeridade e flexibilidade.

Ante a função econômica e social desempenhada pelas sociedades anônimas, consubstanciada na geração de riquezas, empregos, financiamento das atividades estatais mediante o pagamento de tributos, apoio de iniciativas culturais, projetos e programas sociais, ganha relevo o uso da arbitragem na solução de dissídios societários, notadamente porque estimula o aporte de recursos de terceiros, nacionais e estrangeiros.

E não poderia ser diferente, haja vista as inúmeras vantagens proporcionadas pela arbitragem se comparada com o Judiciário, dentre elas, a possibilidade de escolha dos próprios árbitros, a independência, a imparcialidade e a formação específica destes, a celeridade e a flexibilidade do procedimento.

O § 3º do art. 109 da Lei 6.404/76 prevê a adoção da cláusula compromissória de arbitragem pelas sociedades anônimas, com reflexo no estatuto social da companhia. É a chamada cláusula compromissória estatutária. Ademais, a Lei n. 13.129/2015 incluiu o artigo 136-A na Lei n. 6.404/76, dispondo que, se prevista a cláusula arbitral no estatuto da companhia, todos os acionistas estão obrigados, facultando-se aos discordantes o direito de retirar-se da sociedade.

Adotada a cláusula de arbitragem, diga-se de passagem, não se admite o ajuizamento de ação perante o Judiciário. Permitido é tão somente o pleito tutelas de urgência para garantir a utilidade e a eficácia do provimento final até a instauração do juízo arbitral.

No particular que tange à arbitragem dos conflitos envolvendo o direito de voto, existem reações adversas e alguma resistência, por vezes travestidas de tecnicismo jurídico. Em oposição ao emprego da arbitragem nesse contexto, invoca-se o art. 1º da Lei de Arbitragem, segundo o qual são arbitráveis tão somente os direitos patrimoniais disponíveis, aduzindo se que o direito de voto nos expedientes societários é um direito político e não patrimonial, sendo, pois, indisponível.

Ora, conquanto o exercício do voto configure direito político, convenhamos, o voto do acionista tem natureza diversa da manifestação de cidadania. Nesta, o cidadão, ao votar, elege seus representantes para o exercício de cargos de administração, prevalecendo o interesse do Estado, eminentemente político-ideológico, enquanto nas sociedades anônimas o voto é manifestação do interesse privado.

O voto acionário, com efeito, é de índole eminentemente econômico-financeira, dada a finalidade lucrativa das sociedades anônimas. É, pois, um direito patrimonial. Ao eleger membro da Administração ou do Conselho Fiscal, o acionista o faz no seu exclusivo interesse, assim egoístico, como financeiro. Se objetiva proteger a entidade produtiva e geradora de riquezas da qual tem participação acionária é porque vislumbra auferir ganhos patrimoniais.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

E mais: o voto acionário é direito disponível. Seu exercício é não personalíssimo. Os acionistas podem, deveras, numa convenção de voto, regular entre si o exercício do voto, observadas as restrições previstas no art. 177, § 2º do Código Penal. Podem estipular, por exemplo, quem exercerá o direito de voto no usufruto, no penhor e na alienação fiduciária das ações. Tudo a demonstrar a natureza disponível do voto acionário, autorizando, pois, o seu enquadramento nas hipóteses arbitráveis.

Consideremos as situações envolvendo o abuso do direito de voto, é dizer, aquelas nas quais o acionista se encontra impedido de votar, seja porque tal exercício causaria dano à companhia ou a outros acionistas, seja porque resultaria em vantagem indevida para si em detrimento da companhia e dos demais acionistas.

Pois bem. É perfeitamente admissível a solução de dissídios advindos de deliberações tomadas na presença de conflito de interesse ou benefício particular pela arbitragem. A sentença arbitral tem, deveras, o condão de anular a deliberação realizada com voto de acionista detentor de interesse conflitante com o da companhia, de sorte a condená-lo a indenizar a companhia pelos danos causados.

Quanto ao mais, novos desafios se impõem ao exercício pleno do direito de voto. É o caso das companhias nas quais o grau de dispersão do controle é tamanho que se faz necessário reduzir o custo de participação dos acionistas nas assembleias a fim de viabilizar a formação do quorum para as deliberações assembleares. Uma solução possível é o uso da procuração eletrônica, que não é vedada pela legislação. Ora, mesmo nas deliberações à distância, havendo litígios no exercício do voto, a arbitragem continua sendo meio adequado à sua composição.

Assim, o emprego da arbitragem na solução de dissídios envolvendo o direito de voto proporciona inúmeras vantagens, notadamente celeridade e flexibilidade. Desta feita, muito importante é seu alinhamento com as tendências relacionadas ao voto nas sociedades anônimas, para azeitar a governança corporativa, rumo ao desenvolvimento econômico e social do país.

Sobre o autor
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!