RESUMO
O objetivo geral da pesquisa consistiu em analisar a possibilidade ou não da obrigatoriedade da cobrança de “taxas associativas” de associações de moradores. Para alcançar os objetivos propostos, fez-se necessário trabalhar com o método dedutivo, desenvolvendo uma pesquisa bibliográfica fundamentada em dados primários e secundários, por abranger estudo das doutrinas, legislações, jurisprudências e o que já se publicou em torno do tema, a exemplo de obras, artigos científicos, tanto os publicados em periódicos como na internet, revistas e dicionário jurídico. A liberdade plena de associação que é atribuída ao indivíduo em sede constitucional constitui uma espécie de cláusula geral da tutela da pessoa humana, o que implica em desenvolvimento de sua personalidade. É garantida no artigo 5º, incisos XVII e XX da Constituição Federal. Nesse sentido, de acordo com análise das jurisprudências neste estudo, conclui-se que, sendo livre a escolha e a própria adesão a associações, não pode existir cobrança a ser realizada por quem nunca foi entidade livremente escolhida para associação. Conforme já se manifestaram os tribunais que possuem interesse na matéria, como por exemplo, TSJ, STF, o citado direito constitucional de livre associação e o dever de contribuir com a divisão das despesas referentes ao imóvel não são conflitantes, são independentes. Isso porque a obrigatoriedade de contribuição é procedente das limitações impostas ao direito de propriedade, ou seja, é uma obrigação inerente àquela propriedade. Isso, portanto, torna impossível que alguns moradores se recusem a arcar com despesas comuns, sob pena de ofensa ao dever jurídico de respeito coletivo, o que não se relaciona com estar associado ou não. Percebe-se, de imediato, que não é do vínculo associativo propriamente dito que surge a obrigatoriedade de contribuição na divisão das despesas. As associações são, na verdade, uma forma de administração de serviços comuns, ou seja, não é a associação que cria a despesa, mas sim a situação de fato já materializada, na qual se encontram as propriedades/lotes. Ou seja, a despesa tem como natureza o direito de propriedade.
Palavras-chave: Associação de moradores. Cobrança de taxas associativas. Liberdade de associação. Propriedade.
ABSTRACT
The general objective of the research was to analyze the possibility or not of the mandatory collection of "associative fees of residents' associations. In order to reach the proposed objectives, it was necessary to work with the deductive method, developing a bibliographic research based on primary and secondary data, as it covers a study of doctrines, legislation, jurisprudence and what has already been published around the subject, such as works, scientific articles, both those published in journals and on the Internet, magazines and legal dictionary. The full freedom of association that is attributed to the individual in constitutional seat constitutes a kind of general clause of the guardianship of the human person, which implies in the development of his personality. It is guaranteed in article 5, paragraphs XVII and XX of the Federal Constitution. In this sense, according to the analysis of jurisprudence in this study, it was concluded that, since the choice and membership of associations is free, there can be no charge to be made by those who have never been freely chosen for association. As has already been shown the courts that have an interest in the matter, such as TSJ, STF, the aforementioned constitutional right of free association and the duty to contribute to the division of expenses related to the property are not conflicting, they are independent. This is because the obligation to contribute is derived from the limitations imposed on the right of ownership, that is, it is an inherent obligation of that property. This, therefore, makes it impossible for some residents to refuse to bear common expenses, under penalty of offense to the legal duty of collective respect, which is not related to being associated or not. It is realized, for the moment, that it is not associative link itself that the obligation to contribute in the division of expenses arises. Associations are, in fact, a form of administration of common services, that is, it is not the association that creates the expense, but the already materialized situation in which the properties / lots are found. That is, the expense has as its nature the right of ownership.
Keywords: Association of residents. Collection of associative fees. Freedom of association. Property.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO............................................................................................................. 09
2. DIREITO CIVIL, DIREITO DE PROPRIEDADE, CONDOMÍNIOS E
LOTEAMENTOS............................................................................................................. 12
2.1 Noções Gerais do Direito Civil.................................................................................... 12
2.2 Histórico e Conceitos de Direito de Propriedade...................................................... 17
2.3 Natureza Jurídica........................................................................................................ 21
2.4 Características do Direito de Propriedade................................................................ 22
3. DA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO....................................................................... 24
3.1 Breve análise histórica da Liberdade de Associação................................................ 25
3.2 Conceito, Características e elementos da Associação................................................ 25
3.3 Princípio da Liberdade Associativa e a Plena Liberdade de Associação
(Artigo 5°, XVII)................................................................................................................ 28
3.4 Os Princípios da Justiça.............................................................................................. 36
4. ASSOCIAÇÃO DE MORADORES: POSSIBILIDADE OU NÃO DA OBRIGATORIEDADE DE IMPOSIÇÃO DA COBRANÇA DE “TAXAS
ASSOCIATIVAS.............................................................................................................. 39
4.1 Das Taxas associativas................................................................................................. 39
4.2 Loteamento fechado, condomínio de lotes e condomínio pela lei 4.591/64.............. 39
4.3Análise dos Pontos de vista Jurisprudencial acerca da possibilidade ou não da obrigatoriedade do pagamento das Taxas Associativas em Associação de Moradores pelo TJ/SP e TJ/RS , STJ e STF.............................................................................................................................................. 45
CONCLUSÃO................................................................................................................... 52
REFERÊNCIAS............................................................................................................... 55
O homem é um ser social, e para tanto, vive numa sociedade. Essa necessidade, segundo Aristóteles, deve-se ao fato de existir, na natureza humana uma tendência a viver em sociedade e que ao realizar esta inclinação o homem realiza o seu próprio bem. Quer dizer, se vive em sociedade é porque esta é a finalidade do ser humano. Essa vida em sociedade provoca a necessidade do ser humano, animal político, de se associar a outros criando bairros/cidades (AMES,2006).
Essas associações foram criadas por necessidades humanas, razão pela qual, nasce o valor do homem e da comunidade bem como do direito e a necessidade de proteger este instituto e, devido aos grandes impasses que aportam no judiciário, como a obrigatoriedade do pagamento de taxas associativas. Diante disso, o tema desta pesquisa trata-se de associação de moradores: possibilidade ou não da obrigatoriedade da cobrança de “taxas associativas”.
Esta pesquisa teve como problema a ser respondido a seguinte indagação: existe possibilidade ou não de imposição de cobrança de taxas associativas em associação de moradores?
É importante ressaltar que as associações de moradores são, portanto, um importante elo de ligação entre os cidadãos e o poder público, razão pela qual é preciso fortalecê-las sem, com isso, demasiadamente burocratizá-las. Muito pelo contrário, a simplificação e o foco nos seus reais objetivos são fundamentais para garantir a sustentação financeira dessas entidades, a sua autonomia dentro da legalidade e legitimidade.
Deste problema surgem inúmeras problemáticas, divergências e posições, jurisprudências e doutrinárias, que se destacam as seguintes hipóteses:
-O pagamento de taxas mensais, não pode ser imposto, em especial por conta do princípio da liberdade associativa, tanto aos novos como aos antigos moradores. Não há no ordenamento jurídico brasileiro dispositivo legal que regule a cobrança de taxas por associações de moradores.
-A falta de amparo legal sobre cobrança de taxas associativas prejudica muito aqueles que anuíram o contrato, assim, são necessárias leis que aprofundem e viabilizem para uma melhor segurança jurídica.
Dessa forma, sob o argumento de que não são obrigados a associar-se ou a permanecerem associados, indivíduos têm fugido ao pagamento de quaisquer valores a título de contribuição no custeio de despesas comuns. Portanto, a cobrança da taxa associativa constitui-se numa situação de afronta aos direitos da personalidade e do princípio da liberdade de associação.
Quanto à justificativa social, Liberdade de associação trata-se de um direito fundamental de suma importância para a proteção da dignidade humana, bem como da democracia. A livre associação, com determinado fim, desde que lícito, que os cidadãos se unam e se organizam, para o desenvolvimento da sociedade. O artigo 5°, XX, da Constituição Federal (1988) assevera a liberdade de associação nos seguintes termos: “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado”. Citado direito fundamental conclui, assim, dupla face, quais sejam, a faculdade de associar-se (aspecto positivo) e a de não permanecer associado (aspecto negativo).
O objetivo geral da pesquisa consistiu em analisar a possibilidade ou não da obrigatoriedade da cobrança de “taxas associativas” de associações de moradores. Têm-se como objetivos específicos: definir Direito Civil e explicitar o Direito de Propriedade e sua natureza jurídica; loteamentos, condomínios, analisar o princípio da Liberdade de Associação; analisar as divergências doutrinárias e jurisprudenciais a respeito da possibilidade ou não de obrigatoriedade da cobrança de taxas em associação de moradores.
Para alcançar os objetivos propostos, se fez necessário trabalhar com o método dedutivo, desenvolvendo uma pesquisa bibliográfica fundamentada em dados primários e secundários, por abranger estudo das doutrinas, legislações, jurisprudências e o que já se publicou em torno do tema, a exemplo de obras, artigos científicos, tanto os publicados em periódicos como na internet, revistas e dicionário jurídico.
O método dedutivo parte de argumentos, observações, casos gerais para obter conclusões particulares. Segundo Maria Margarida de Andrade:
[...] a dedução é o caminho das consequências, pois uma cadeia de raciocínio em conexão descendente, isto é, do geral para o particular, leva à conclusão. Segundo esse método, partindo-se de teorias e leis gerais, pode-se chegar à determinação ou previsão de fenômenos particulares. (ANDRADE, 2001, p. 111).
Nessa pesquisa, o método de coleta de dados foi o bibliográfico, que de acordo com a explicação obtida de Oliveira (2006, p.119), “[...] a pesquisa bibliográfica tem por finalidade conhecer as diferentes formas de contribuição científica que se realizaram sobre determinado assunto ou fenômeno”.
Para atingir tais objetivos a monografia foi dividida em três capítulos, no primeiro serão apresentados os conceitos de Direito Civil, Direito de Propriedade, sua natureza jurídica sobre condomínios e loteamentos e as suas características.
Na sequência, o segundo capítulo, será analisado o princípio da liberdade de associação, iniciando por uma evolução histórica, abordando as noções gerais de Direito Civil, bem como uma breve análise histórica da liberdade de associação. São definidos o conceito, características e elementos da associação, bem como é apresentado o princípio da liberdade de associação (artigo 5°, XVII). Por fim, o último capítulo traz uma discussão acerca da possibilidade ou não da obrigatoriedade do pagamento das taxas associativas em associação de moradores.
Faz-se necessário observar desde já que a natureza jurídica da propriedade horizontal é complexa, por ser ela um misto da propriedade individual e da propriedade coletiva. A propriedade horizontal é um novo modelo de propriedade porque as partes componentes são inerentes à substância profunda da coisa; as partes integrantes são aquelas que, não fazendo parte da substância do bem, estão a ele incorporados de uma forma que o complementam na sua função econômica ou social, entretanto, sem existência autônoma.
2. DIREITO CIVIL DIREITO DE PROPRIEDADE, LOTEAMENTOS E CONDOMÍNIOS
O objetivo deste capítulo é discorrer a respeito de Direito Civil, Direito de Propriedade, condomínios e loteamentos. Serão apresentadas as regras da convenção e sua classificação; a natureza jurídica de condomínio e suas espécies com o propósito de responder o primeiro objetivo do presente estudo.
2.1 Noções Gerais do Direito Civil
Antes de discutir a legalidade da obrigatoriedade do pagamento das taxas associativas em associação de moradores, há que se argumentar, mesmo que forma breve, como esse tema tem sido tratado e regulamentado no novo Código Civil Brasileiro.
O direito romano era o direito da cidade que controlava os cidadãos independentes, alcançando todo o direito vigente, contendo regras de direito penal, administrativo e processual, dentre outros. No período medieval o Direito Civil passou por várias modificações históricas. Foi muito desenvolvido em Roma. Era, sem dúvida alguma, o direito da cidade que mandava na vida das pessoas independentes, abrangendo assim todo o direito vigente, conforme demonstrado na observação da autora;
[...] identificou-se com o direito romano, contido no Corpus Juris Cvilis, sofrendo concorrência do direito canônico, devido à autoridade legislativa da Igreja, que, por sua vez, constantemente, invocava os princípios gerais do direito romano. Na Idade Moderna, no direito anglo-americano, a expressão civil law correspondia ao direito moderno, e as matérias relativas ao nosso direito civil eram designadas como private law. Passou a ser um dos ramos do direito privado, o mais importante por ter sido a primeira regulamentação das relações entre particulares (DINIZ, 2011, p. 45).
Na Era Moderna, conforme Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, as matérias do Direito Civil eram denominadas como direito privado. A partir do século XIX, adotou um sentido mais abrangente para designar as matérias disciplinadas no Código Civil.
Faz-se necessário apresentar, conceitos de Direito Civil que segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho: “o Ramo do Direito que disciplina todas as relações jurídicas da pessoa, seja uma com as outras (físicas e jurídicas), envolvendo relações familiares e obrigacionais, seja com as coisas (propriedade e posse) (GAGLIANO,PAMPLONA FILHO,2011, p. 43)”.
Assim, pode-se dizer que o Direito Civil é a ramificação do Direito que se destina a controlar as relações familiares e patrimoniais que se entrelaçam entre as pessoas encaradas como tal, ou seja, componentes de uma sociedade (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2011).
Por sua vez, segundo Maria Helena Diniz, o Código Civil encontra-se dividido em duas partes: a geral e a especial. A geral diz que:
[...] com base nos elementos do direito subjetivo, apresenta normas concernentes às pessoas, aos bens, aos fatos jurídicos, atos e negócios jurídicos, desenvolvendo a teoria das nulidades e princípios reguladores da prescrição e decadência; e a especial, com normas atinentes: a) ao “direito de obrigações”; b) ao “direito de empresa”; c) ao “direito das coisas”; d) ao “direito de família”; e) ao “direito das sucessões”. Apresenta ainda, um livro complementar que encerra as disposições finais e transitórias (arts. 2.028 a 2.046) (DINIZ, 2011, p. 45-46).
Dentre as instituições disciplinadas nas leis do Direito Civil brasileiro, na parte especial, encontram-se o Direito da Família, de Obrigações, das Coisas, das Sucessões e das Empresas, são as divisões do Direito Civil (PEREIRA, 2008). O direito da família controla as relações entre os integrantes familiares, ou seja, são as normas relativas ao casamento, à união estável, às relações entre os cônjuges e conviventes, às de parentesco e à proteção de menores e incapazes (WALD, 2004).
O primeiro, por sua vez, regulamenta as relações creditícias. Tem poder de constituir relações obrigacionais para a consecução de fins econômicos ou civis, disciplinando os contratos e as obrigações oriundas de declaração unilateral de vontade e de atos ilícitos dentre outras (DINIZ, 2003). O segundo rege as relações entre os cidadãos e suas posses, aos direitos reais sobre coisas alheias, de gozo, de garantia e de aquisição. O terceiro disciplina as relações do empresário, da sociedade, do estabelecimento e os institutos complementares (MONTEIRO, 2003). O quarto e último estabelece as normas a respeito da transferência das fortunas, por força de herança, depois da morte de seu titular, ou seja, sobre o inventário e a partilha dos bens (WALD, 2004).
Sílvio de Salvo Venosa lembra que depois das guerras mundiais, surgiram em alguns países da Europa as primeiras codificações, os Códigos Civis, unificando essas matérias. Não obstante, o Direito Público continua interferindo no Direito Civil para atender interesses da coletividade. As primeiras codificações, os Códigos Civis, surgiram em determinados países europeus, dentre eles a França, a Itália e a Alemanha, depois das duas grandes guerras mundiais. No entanto, com o objetivo de atender aos interesses da coletividade, o Direito Público ainda interfere no Direito Civil. O Direito Civil no Brasil evoluiu do Direito Civil Europeu, e este, do Direito Romano. O primeiro Código Civil brasileiro teve como inspiradores o Código Francês Napoleônico (de 1804) e o Código Alemão Burgerlichen Gesetzbuchs – BGB (de 1896), mas que entrou em vigor apenas a partir de 1º de janeiro de 1900(VENOSA,2004).
Segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho o Código Napoleão é um dos mais duradouros diplomas normativos de direito privado do mundo ocidental, sendo, até hoje, o Código Civil vigente na França, embora alterado em muitas disposições.Esse Código foi o mais influente dos códigos legais, pois foi adotado em vários países sob ocupação napoleônica, formando as bases dos sistemas legais modernos de vários países da Europa (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2011).
Norberto Bobbio aborda a entrada em vigor do Código de Napoleão, na França, em 1804, com repercussão considerável no pensamento jurídico moderno e contemporâneo de sua época, repercussão que motivou o pensamento do direito em termos de codificação, como se o direito devesse estar encerrado num código, o que deveria ser extinto da atitude mental, considerando que os jovens que iniciassem os estudos jurídicos deveriam procurar de libertar dessa atitude (BOBBIO,2006).
Já para Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, o Código de Napoleão apenas abordava as questões de direito civil, como o registro civil ou a propriedade. Compõe-se, dessa forma, de três livros: “Das Pessoas”; outro “Dos Bens e as Diferentes Modificações da Propriedade” e um terceiro “Dos Diversos Modos pelos quais se adquire a Propriedade” (que compreende vários assuntos, entre os quais regimes matrimoniais, obrigações e garantias reais). O BGB foi uma consequência política da instalação do Império Alemão, tendo sido a primeira comissão legislativa para tal fim. Teve vigência como Direito Federal, na República Federal da Alemanha (Ocidental), incorporando-se ao ordenamento jurídico da Alemanha unificada com a queda do muro de Berlim
No que diz respeito às leis brasileiras, o Direito Civil não era codificado e conforme aponta Sílvio de Salvo Venosa,
Eram as Ordenações Manoelinas (ano 1521) e, especialmente, as Ordenações Filipinas (ano 1603), isso tudo somado a regimentos, alvarás, decretos extravagantes e resoluções oriundas do reino, do império e da república. Após nossa independência (ano 1822), o Brasil continuou regido pelas antiquadas Ordenações do Reino, que continuaram a vigorar por expressa determinação do imperador e, também, por decretos, resoluções e alvarás imperiais, mas essa confusão provocava o anseio pela codificação. A Constituição do Império, solenemente, determinava que organizar-se-á, o quanto antes, um Código Civil e um Criminal, fundados nas sólidas bases da justiça e da equidade (VENOSA, 2004, p. 32).
Importante lembrar que a Constituição Imperial de 1824 instituiu no art. 179, XVIII, a organização, o quanto antes, de um Código Civil e Criminal, fundado nas sólidas bases da justiça e da equidade. O código criminal, sancionado em 1830, não demorou. O código civil só entraria em vigor 92 anos depois.
O Direito Civil do Brasil não tinha codificação, sendo controlado por uma legislação assistemática, atrasada e obscura. Essa legislação era portuguesa, muito antiga, oriunda de diferentes ordenações e somando-se a elas, regimentos, alvarás, extravagantes decretos e resoluções vindas do reino, do império e da república de acordo com Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2011).
No Império, conforme lembram Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho “as tentativas foram muitas, mas a demora foi mais longa do que se podia imaginar. Em que pese ter sido editado o Código Criminal e o Código Comercial, a codificação civil brasileira passou por uma longa via crucis” (GAGLIANO, PAMPLONA FILHO,2011, p. 45). Assim, durante o período imperial, foi promulgado o primeiro Código Penal brasileiro e o Código Comercial, parcialmente em vigor até hoje. Muitas foram as tentativas de codificação civil no Império e na República.
Nesse sentido, Maria Helena Diniz aponta que Carvalho Moreira foi o primeiro a se preocupar com a matéria,
[...] ao apresentar um estudo a respeito da revisão e codificação das leis civis. Em 15 de fevereiro de 1855, o governo imperial entendeu que antes da codificação seria preciso tentar uma consolidação das leis civis, que se encontravam esparsas, e para tanto encarregou Teixeira de Freitas, que, em 1858, obteve a aprovação de sua Consolidação das Leis Civis, com 1.333 artigos. Contratou-se, então, Teixeira de Freitas para elaborar o projeto de Código Civil, que não foi aceito por ter unificado o direito civil com o direito comercial (DINIZ, 2011, p. 48-49).
Maria Helena Diniz lembra que em seguida se tornou reconhecido internacionalmente e seu trabalho foi um acontecimento para a história do Direito Privado. Em 24 de dezembro de 1858, o Imperador aprovou a Consolidação das Leis Civis, que legitimamente foi um Código de fato do Direito Civil brasileiro por mais de meio século.
A respeito da codificação civil brasileira, foi apresentado o projeto chamado de Apontamentos, mas não foi aprovado por uma comissão revisora, contratada para examiná-lo. Pouco antes da proclamação da República, uma comissão foi nomeada pelo então ministro da Justiça, Cândido de Oliveira, mas, esta comissão não apresentou nenhum projeto ou codificação civil (DINIZ, 2011).
Com o objetivo de atualizar o Código Civil de 1916, de acordo com Maria Helena Diniz, e com o escopo de atualizar o Código Civil de 1916, atendendo aos reclamos sociais, várias leis, que importaram em derrogação do diploma de 1916, foram publicadas, dentre elas: a do estatuto da mulher casada, a do divórcio, a da união estável, a dos direitos autorais, a dos registros públicos, a do compromisso de compra e venda, a do inquilinato, a do reconhecimento de filhos, a do condomínio, a do parcelamento do solo, a do estatuto da criança e do adolescente, etc. Diante desses reclames sociais, o direito civil, então, inclinou-se às contingências sociais criadas por leis especiais, acolhendo as transformações ocorridas, aluvionalmente, para atender às aspirações da era atual (DINIZ, 2011).
Para aquela época, o Código Civil apresentou-se adequado, mas, as leis nele contidas não combinavam com a nova realidade social da época, que clamava por tratamento igualitário entre as pessoas (DINIZ, 2011).
Nesse sentido, de acordo com Sílvio de Salvo Venosa,
Aprovado, sancionado e publicado em 2002, temos um novo Código Civil, a Lei n. 10.406 de 10 de janeiro de 2002 que, também, teve uma vaccacio legis de 1 ano, entrando em vigor no dia 11 de janeiro de 2003. O atual Código Civil segue – e muito – os conceitos e a estrutura básica de seu antecessor (VENOSA, 2004, p. 45).
Apesar de seguir os conceitos e a estrutura básica do Código Civil anterior, o CC atual, aprovado, sancionado e publicado no ano de 2002, por meio da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2003, possui alguns méritos; dentre eles, segundo a revisão legal e gramatical, e a derrogação de artigos que não são mais compatíveis com outras normas, seguindo os princípios da eticidade, socialidade e operabilidade como diretrizes mestras (VENOSA,2004).
Por fim, nesta visão geral do Direito Civil, é necessário para este trabalho verificar que a propriedade como instituto do Direito Civil Constitucional, mereceu um estudo detalhado no que diz respeito a sua função social. Além disso, é de suma importância compreender o direito de propriedade, conforme disposto no art. 1.228, caput, do Código Civil brasileiro, já que é um dos objetivos desse trabalho.
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha
§ 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
§ 2o São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.
§ 3o O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente.
Trata-se, portanto, do mais completo dos direitos subjetivos e centro do direito das coisas. Daí a relevância de conhecer um pouco de sua evolução e alguns conceitos.
2.2 Histórico e Conceitos de Direito de Propriedade
Primeiramente, necessário se faz um estudo do que seja o instituto da propriedade, bem como a sua evolução nas constituições brasileiras, para posteriormente destacar sua natureza jurídica e características.
Conforme os historiadores António Hespanha (português), Carlos Petit (espanhol) e Rebecca Scott (norte-americana), o direito de propriedade possui raiz nos primeiros estágios da cultura humana. Nas sociedades primitivas, de acordo com o entendimento de Haroldo Guilherme Vieira Fazano, ninguém era dono da terra e nenhuma pessoa conseguia renda de seu uso, isto porque, o direito de propriedade dizia respeito a objetos como armas, roupas e ornamentos (FAZANO,2010),
Nesse caminho, Haroldo Guilherme Vieira Fazano (2010) aponta que,
As coisas grandes, como o solo, o gado e a caça, pertenciam à comunidade, para benefício geral de todos. Esse tipo de uso da terra persistiu até a Idade Moderna, especialmente em alguns países europeus nos quais o sistema comunal de campo aberto foi usado para garantir o acesso livre a um pedaço de terra para qualquer um que a quisesse cultivar (FAZANO, 2010, p. 33).
Nota-se que, a terra em séculos passados, não possuía dono. Ela era propriedade de todos e tinha como finalidade beneficiar a comunidade como um todo. A quem interessasse um pedaço de terra para o cultivo e sustento da família podia adquirir sem pagar nada por ela, diferentemente da atualidade onde apropriar-se de um pedaço de terra tem que se pagar por ela.
Conforme esclarece John Eaton (1965) apud Haroldo Guilherme Vieira Fazano a propriedade privada da terra, somente nasceu,
[...] quando a produção e a troca de mercadorias se desenvolveram em proporções consideráveis. Na sociedade feudal, os direitos dos senhores feudais eram apenas uma extensão dos direitos do chefe tribal. A ocupação da terra no período feudal é radicalmente diversa das primitivas condições capitalistas ainda não surgidas (EATON, 1965 apud FAZANO, 2010, p. 34).
Complementando a ideia do autor acima citado, a posse da propriedade da terra na sociedade agrária medieval era considerada sinônimo de privilégio. Assim, os senhores feudais, detentores das terras, dominavam as relações de poder durante a Idade Média.
Para Fustel de Collanges a propriedade privada era uma instituição da qual a religião domestica não podia prescindir. Essa religião prescrevia isolar o domínio e a sepultura: a vida em comum tornava-se, pois impossível. A mesma religião ordenava que o lar estivesse fixo ao chão e qual a sepultura não fosse nem destruída, nem desloca (COLLANGES,2007).
Por sua vez, segundo afirmativa de Haroldo Guilherme Vieira Fazano (2010), as leis gregas e romanas, que refletiam a transformação para uma cultura urbana, atribuíram direitos exclusivos aos proprietários.
Avaliando o direito romano, é possível identificar “o estabelecimento de uma propriedade exclusiva, direta e absoluta, que persistiu por muito tempo, passando pela queda do império e pelo feudalismo e chegando à idade contemporânea” (FAZANO, 2010, p. 34).
Apenas com as transformações sociais, culturais e jurídicas que tiveram lugar na Prússia e na França, por meio de revoluções e conflitos sociais, delinearam-se, de acordo com o entendimento de Haroldo Guilherme Vieira Fazano, modificações na base política da propriedade, que levaram a um re-estudo dela com fundamento no Direito Romano (FAZANO, 2010).
É preciso ressaltar que, a propriedade também foi contestada por pensadores, como Rosseau, por exemplo, e por correntes ideológicas marxistas e socialistas, e conforme Haroldo Guilherme Vieira Fazano (2010, p. 34), a justificação da propriedade como direito natural, além de ser antiga, teve como embasamento a Revolução Francesa. “Na atualidade, tem como defensores os liberais e os neoliberais, herdeiros ideológicos dos movimentos libertários e individualistas”.
Como lembra Fábio Almeida, antes e depois de Rousseau, porém, a idéia de que há uma fonte legítima autorizando a propriedade privada das coisas que não consiste em nenhum atentado contra um direito qualquer, sendo ao contrário, passível de justificação moral e legal, encontrou seus defensores (ALMEIDA,2006).
O Código Civil brasileiro de 1916 silenciou a esse respeito, devido, talvez, de acordo com Haroldo Guilherme Vieira Fazano (2010), a influência dos princípios individualistas proclamados pela Revolução Francesa. Washington de Barros Monteiro (1995 apud FAZANO, 2010) e João Batista Lopes (1990 1995 apud FAZANO, 2010) observam, no entanto, que, apesar de ter sido promulgado em plena guerra, o Código Civil brasileiro de 1916, “não teve intuição do que viria a suceder em tal assunto. Não se estranhe assim que nele não se encontre qualquer referência ao condomínio em prédios de muitos pavimentos” (MONTEIRO, 1997; LOPES, 1990 apud FAZANO, 2010, p. 42).
Após a construção dos primeiros edifícios, Haroldo Guilherme Vieira Fazano (2010) pontua que, eles passaram
[...] a se reger pelos usos e costumes, aplicando-lhes, ainda, as disposições analógicas do condomínio geral. E tudo isso porque, com o crescimento das aglomerações urbanas, com o desenvolvimento vertical das cidades, com o encarecimento das obras, a ponto de somente por exceção tornar-se possível a edificação de um arranha-céu em regime de propriedade exclusiva, houve necessidade de uma disciplina jurídica para a apropriação das coisas dentro desse critério novo de comunhão (FAZANO, 2010, p. 42).
Pode-se afirmar que, com o crescimento da população e das cidades, valores altos das construções, viu-se a viabilidade de construir edifícios como sendo propriedade exclusiva e com isso a necessidade de se criar uma disciplina jurídica para que de fato o interessado pudesse adquirir o direito de propriedade nesse novo modo de se viver na comunidade, ou seja, no edifício.
Há que se considerar, por fim, que atualmente, José Afonso da Silva
A Constituição Federal de 1988, assim como as demais Cartas Magnas já citadas, discorre acerca da propriedade e a elenca de forma a tutelá-la como um direito fundamental do homem, em rol específico destinado a tais direitos, qual seja, seu artigo 5°. Vinculado a este, porém, postula-se, já no inciso seguinte do referido artigo, que “a propriedade atenderá à sua função social (SILVA,2007,p.271)”.
Os princípios basilares para a utilização da propriedade estão na Constituição Federal de 1988. Cabe ao julgador aplicar essa junção e aparar os excessos no caso concreto sempre que necessário. Percebe-se que com a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988 o cumprimento da função social da propriedade se tornou uma exigência, um instrumento de legitimação e de existência do direito de propriedade.
O doutrinador Carlos Roberto Gonçalves (2011) citado por Ulisses Vieira Moreira Peixoto (2017) afirma que o direito de propriedade é o mais amplo dos direitos subjetivos concedidos ao homem no campo patrimonial e sofre várias restrições ao seu exercício, impostas não somente no campo patrimonial, como também no interesse individual. ” Tem sempre em mira a necessidade de conciliar o exercício do direito de propriedade com as relações de vizinhança, uma vez que sempre é possível o advento de conflitos entre os conflitantes [ ...]” (GONÇALVES,201, apud PEIXOTO,2017, p.553).
Nessa direção, no que diz respeito a essa nova ordem Eroulths Cortiano Junior assevera que,
A reflexão propositiva aqui esboçada sobre discursos, saberes e ensino pretende ampliar as oportunidades de implantação de um novo discurso proprietário e de uma ordem jurídica solidarista. Se a Constituição de 1988 chama para a possibilidade da construção de um discurso proprietário renovado e informado por outros valores, cabe ao ensino jurídico participar dessa convocação. Compreender as limitações do discurso do ensino do direito de propriedade pode construir o que está sendo desconstruído, ou, então, evitar a desconstrução do que ainda está para ser construído (CORTIANO JUNIOR, 2002 apud FAZANO, 2010, p. 34-35).
Propriedade no conceito de Ulisses Moreira Peixoto trata-se “do direito que a pessoa física ou jurídica possui dentro dos limites normativos, de usar, gozar e dispor de uma coisa corpórea ou incorpórea” (PEIXOTO, 2017, p.98). Além disso, reivindicar de quem a detenha de maneira injusta.
Compreende-se que a Propriedade é um direito de primeira dimensão que alguém possui em relação a um bem determinado e vendável. O proprietário tem a faculdade de gozar, reaver, usar e dispor da coisa, e esse direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
Importante lembrar que a propriedade terá que, de uma forma ou de outra, atender a sua Função Social, como já citado no tópico anterior. Como é notório, a função social da propriedade constante na Constituição Federal de 1988 e do Código Civil de 2002 sofreu grandes influências de grandes doutrinadores clássicos como Leon Duguit e Orlando Gomes. Ela tem que atender como o intuito de Dever de Ordem Social, Uso irregular do Proprietário e do Direito de Vizinhança.
Maria Helena Diniz (2003, p. 113) entende que:
[...] a propriedade é a plenitude do direito sobre a coisa; as diversas faculdades, que nela se distinguem, são apenas manifestações dessa plenitude. Assim deve-se entender que o direito de propriedade exterioriza o domínio que o detentor tem e a capacidade de se utilizar do bem da forma como melhor lhe convier.
Pode-se afirmar que o conceito de propriedade reúne as capacidades do titular do referido direito de usar, gozar e dispor de certos bens, sem, contudo, ultrapassar tais direitos dos outros indivíduos como estabelecido no art.1228 do CC, já previamente relacionado nesta pesquisa. Alguns conceitos de propriedade foram apresentados. A seguir, para melhor compreensão do tema “propriedade”, e respondendo um dos objetivos do presente estudo será apresentado a natureza jurídica desse direito dada a sua relevância para o tema que se propôs a desenvolver neste estudo.
Vimos que o direito de propriedade foi evoluindo-se ao longo dos tempos. Atualmente, o direito de propriedade é um direito garantido pela Constituição Federal, conforme consta no artigo 5º inciso XXII, em perfeita harmonia com o interesse individual e coletivo. Para tanto se faz necessário identificar e descrever sua natureza jurídica, finalizando assim um dos objetivos da pesquisa.
Conforme já esclarecido no texto introdutório deste trabalho, quanto à natureza jurídica de propriedade pode-se assegurar que o princípio da função social relativizou o individualismo, definido no direito de propriedade na concepção passada. A propriedade não deixou de ser direito subjetivo tutelado pelo ordenamento jurídico brasileiro, mas a função social altera a estrutura e o regime jurídico do direito de propriedade, operando sobre o seu conceito e o seu conteúdo. Pode-se afirmar que natureza jurídica da propriedade é vista hoje em um sentido predominantemente social
Para João Roberto Parizatto, propriedade é um direito real absoluto, assegurando-se ao proprietário o direito de oposição erga omnes, ou seja, contra tudo e contra todos, que devem respeitá-la. Assim,
[...] a propriedade une a pessoa, o titular do direito e a coisa. Possui caráter de perpetuidade, eis que o princípio o direito sobre ela (uso) é para toda vida, não perdendo sua característica face ao uso. O art.1.228 do Código Civil assegura ao proprietário a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la de quem quer que injustamente a possua a detenha (PARISATTO, 2011, p.188).
Conforme explicação do autor, os direitos assegurados ao proprietário de usar, gozar e dispor daquilo que lhe pertence só encontra limites quando for contrário à sua função social. A propriedade é o direito real mais completo. Confere ao seu titular os poderes de usar, gozar e dispor da coisa, assim como de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha conforme está disposto no Código Civil art.1.228.
A propriedade possui características próprias. Ela é plena, de caráter absoluto. A propriedade, como instituto do Direito Civil Constitucional, merece um estudo específico e detalhado no que tange a suas características.
2.4 Características do Direito de Propriedade
De acordo com a visão tradicionalista, as características da propriedade são: realidade (os poderes dos proprietários são imediatos sobre a coisa, sem ingerência de terceiros); plenitude (que a difere dos demais direitos reais, conferindo-lhes a generalidade dos poderes de uso, gozo e disposição dos bens); elasticidade (tão logo cesse o exercício do direito de terceiro sobre algum dos seus elementos, este retorna ao todo da propriedade); exclusividade (implica na unicidade do direito e na possibilidade de excluir de terceiros o uso e gozo da coisa); independência (não se pressupõe qualquer outro direito sobre a coisa); imprescritibilidade (a propriedade não se extingue pela falta de exercício) e perpetuidade (não existe limite temporal).
O Direito das Coisas regula o poder dos homens sobre as coisas materiais suscetíveis de apropriação e os modos de sua utilização econômica. Em caráter excepcional, o Código Civil admite, em determinadas situações, que os Direitos Reais, incidam sobre bens imateriais, como a caução de créditos ou o usufruto sobre ações ou cotas de uma sociedade.
Para Carlos Alberto Dabus Maluf (2002, p.1), apud Washington de Barros Monteiro (2003) direito das coisas é o complexo das normas reguladoras das relações jurídicas referentes as coisas suscetíveis de apropriação pelo homem”. De modo geral, o direito das coisas compreende tão somente bens materiais, isto é, a propriedade e os seus desmembramentos.
Danielle Machado Soares (1999) lembra que à medida que a sociedade foi se tornando complexa, devido à concentração da população nos centros urbanos, uma nova forma de vida em comum foi criada, diante da necessidade de aproveitamento de áreas de terrenos mais propícias a habitação.
Sobre loteamento, embora de forma objetiva tratada neste capítulo, a Lei Lehmann conceitua o loteamento para fins urbanos (espécie de parcelamento do solo) como sendo a "subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes" (art.2º, § 1º, Lei 6.766/79).
Analisando a referida Lei acima citada, compreende-se o parcelamento do solo a divisão de uma gleba em lotes, que passam a ter vida autônoma, com acesso direto à via pública. A gleba parcelada perde a sua individualidade, a sua caracterização originária, dando nascimento a várias parcelas individualizadas, que recebem o nome de lotes. O parcelamento para fins urbanos, ou parcelamento urbanístico, destina-se a integrar a gleba na cidade, permitindo que ela passe a ter usos urbanos, ou seja, uso residencial, comercial, industrial e institucional.
Assim, concluindo esse capítulo, à medida que a sociedade foi-se tornando mais complexa com a aglomeração de pessoas nos centros urbanos, foram surgindo então a moradia em edifícios de dois ou mais pavimentos, que futuramente receberiam o nome de condomínios, temas que serão tratados com maior ênfase no terceiro capítulo deste estudo.
Este capítulo tem por objetivo apresentar questões pertinentes à associação de moradores, no qual pauta-se a análise em diversas doutrinas, estudos e artigos específicos acerca da demanda apresentada para propor assim um estudo sobre a associação de moradores; tecer uma breve análise histórica da liberdade de associação; conceituar e caracterizar os elementos da associação; e, por fim, discorrer sobre o princípio da liberdade associativa e a plena liberdade de associação (artigo 5°, XVII).
3.1. Breve análise histórica da Liberdade de Associação
A liberdade de associação trata-se de um direito fundamental do indivíduo adquirido no século XX em diversas constituições. Um estudo mais profundo sobre liberdade de associação facilitará na compreensão do tema proposto, já que é de suma importância na satisfação das várias necessidades dos indivíduos.
Em relação aos direitos e liberdades individuas e o aparecimento do Estado Moderno, de acordo com Guilherme Amorim Campos da Silva
[...] relegam a um segundo plano a existência de um direito de associação cujo exercício independa da vontade do poder estatal. A verificação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, revela a ausência de menção expressa à existência de uma liberdade de associação, uma vez que pautada na crença no indivíduo e sua centralidade como a base para o desenvolvimento estatal racional (SILVA, 2017, p. 2).
Guilherme Amorim Campos da Silva lembra com clareza que no Brasil, essa evolução da liberdade de associação, por parte do Supremo Tribunal Federal, acentuou que a primeira Constituição política do Brasil a dispor sobre a liberdade de associação foi, exatamente, a Constituição da República de 1891; e, desde esse momento, esse privilégio fundamental tem sido contemplado nos sucessivos documentos constitucionais brasileiros, com a exceção de que, só a partir da Constituição de 1934, a liberdade de associação recebeu contornos próprios, separando-se do direito fundamental de reunião, consoante se depreende do art. 113, § 12, daquela Carta Política (SILVA,2017).
Com efeito, a liberdade de associação é diferente de direito de reunião, possuindo, em relação a este, plena autonomia jurídica. Elas não se confundem entre si.
[...] revela-se importante assinalar, neste ponto, que a liberdade de associação tem uma dimensão positiva, pois assegura a qualquer pessoa (física ou jurídica) o direito de associar-se e de formar associações. Também possui uma dimensão negativa, pois garante a qualquer pessoa o direito de não se associar, nem de ser compelida a filiar-se ou a desfiliar-se de determinada entidade. Essa importante prerrogativa constitucional também possui função inibitória, projetando-se sobre o próprio Estado, na medida em que se veda, claramente, ao Poder Público, a possibilidade de interferir na intimidade das associações e, até mesmo, de dissolvê-las, compulsoriamente, a não ser mediante regular processo judicial (MELLO, 2007, p. 1 apud SILVA, 2017, p. 3).
A liberdade de associação enquadra-se, no entendimento de Gilmar Ferreira apud Guilherme Amorim Campos da Silva a satisfazer necessidades várias dos indivíduos, aparecendo, ao constitucionalismo atual, como básica para o Estado Democrático de Direito. Quando não podem obter os bens da vida que desejam, por si mesmo, os homens somam esforços, e a associação é a fórmula para tanto (FERREIRA,2004, apud SILVA, 2017).
Portanto, associando-se com outros indivíduos, promove-se, conforme Gilmar Ferreira apud Guilherme Amorim Campos da maior entendimento recíproco, cooperação e amizade, além de expandirem as potencialidades de personalidade, autoexpressão, compondo-se em meio orientado para a busca da autorrealização(FERREIRA,2004, apud SILVA, 2017).
Conclui-se que a associação de indivíduos assume papel de suma importância para a concretização da autorrealização dos indivíduos na comunidade onde estão inseridos, é importante aprofundar-se um pouco mais sobre as características e os elementos que compõem a associação. Daí a importância do tema para a pesquisa que se propôs a realizar.
3.2 Conceito, Características e Elementos da Associação
Conforme Marco Ruotolo apud Guilherme Amorim Campos da Silva, a liberdade de associação é considerada direito fundamental do homem concretizado ao longo do século XX em vários textos da Constituição. O estatuto afirma-se como de dimensão política, de maneira individual com valor coletivo na esfera dos espaços democráticos das instituições políticas fundadas a partir do Estado Moderno. Aspecto que merece destaque no que diz respeito à sua ascensão na Constituição Federal de 1988, como resposta, até mesmo, aos períodos ditatoriais anteriores, revestindo sua previsão, exercício e controle de inafastável tutela constitucional e fiscalização social (RUOTOLO, 2013,apud SILVA,2017).
A liberdade de associação é definida por Marco Ruotolo apud Guilherme Amorim Campos da Silva como todas as formas de agregação, através da qual mais indivíduos, como resultado do compromisso espontâneo e recíproco, empregam para colaborar para a realização de um propósito comum, se organizando para tal fim. O citado interesse, segue, pela finalidade de associação seja legal, uma obrigação para os sócios ficarem juntos, por um período determinado ou indeterminado (RUOTOLO, 2013,apud SILVA,2017).
De outra forma,
[...] se a finalidade for penalmente ilícita, o vínculo, mesmo que juridicamente relevante para fins criminosos, não terá efeito juridicamente vinculativo, próprio do contra-senso do vínculo ideal das organizações plurisubjetivas, constituem o caráter diferencial das associações relacionadas as reuniões, caracterizada pela co-presença de uma pluralidade de sujeitos no mesmo lugar, a diferença natural e espiritual, como resultado de dois fenômenos que os participantes levam para as associações, embora ligados por um vínculo ideal, restrito aos indivíduos, enquanto nessas reuniões se tornaria pela pluralidade física, se não até mesmo em massa (RUOTOLO, 2013, p. 41, apud SILVA, 2017,p. 02).
A falta de amparo legal no que se refere às taxas associativas, segundo enfatizam Henri Matarasso Filho, Alessandra Pereira e Theotônio Negrão Neto, envolve até mesmo os que anuíram expressamente à formação da associação de moradores, pois é indefinido qual é a natureza das taxas associativas, ou seja, se elas são de propterrem ou de natureza pessoal. A probabilidade de cobrança de taxa condominial decorre de lei, e tem, até mesmo por isso, natureza jurídica de dívida propterrem. Dentre outros, o embasamento da cobrança de tal contribuição é a de que, obrigatoriamente, devem ser sustentadas pela universalidade de proprietários. Assim, cumpre salientar que por intermédio da Lei 8.009/90, que trata sobre a impenhorabilidade do bem de família, artigo 3°, IV, o direito ao pagamento da taxa de despesas é um direito pessoal, oriundo da vedação do enriquecimento ilícito (MATARASSO FILHO, 2016, PEREIRA, 2016, NEGRÃO NETO,2016).
A partir desses pressupostos, é relevante elucidar que Maria Helena Diniz (2012), assevera que a obrigação propterrem passa a existir quando o titular do direito real é obrigado, devido a sua condição satisfazer certa prestação. Assim, trata-se de uma espécie jurídica que fica entre o direito real e o pessoal, consistindo nos direitos e deveres de natureza real que emanam do domínio.
Por sua vez, no entendimento de José Gomes, a natureza jurídica da liberdade de associação é negativa ou defensiva.Assegura que diante do procedimento passivo do Estado, a liberdade de associação tem como particularidade, o direito de criar a associação, sem que a ordem jurídica seja violada (GOMES,2008).
Jorge Miranda assevera que a liberdade de associação cria direitos que podem ser nomeados institucionais, porém, parte da doutrina lhes atribui a expressão “garantias coletivas”. Ao diferenciar os direitos decorrentes da liberdade de associação, Jorge Miranda dispõe o direito de constituição sem ferir a lei, a não ser coagido ou permanecer em associação, de deliberar e de dissolver a associação como direito individual (MIRANDA,1986).
Nessa mesma direção, conforme o entendimento de Henri Matarasso Filho, Alessandra Pereira e Theotônio Negrão Neto se aventando ao princípio da liberdade de associação, tem como exposto afiançar a liberdade de reunião e associação pacífica de um grupo de pessoas ajuntadas por finalidades comuns, não necessariamente atreladas em função de interesses econômicos ou profissionais (MATARASSO FILHO, 2016, PEREIRA, 2016, NEGRÃO NETO,2016).)
O princípio da liberdade encontra-se no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que a Carta Magna de 1988, consagrou-se apondo o referido princípio, ao reconhecer como um de seus fundamentos o pluralismo político, consolidado na liberdade de associação, confirma a participação de toda a sociedade no Estado Democrático de Direito.
Atrelado a esse entendimento, Marco Ruotolo apud Guilherme Amorim Campos da Silva alega que a liberdade de associação é abrangente de todas as maneiras de agregação, por meio da qual, mais sujeitos, como resultado do compromisso recíproco e espontâneo, utilizam para a realização de um propósito comum, se constituindo para tal fim O objetivo da associação tem que ser lícita. Por outro lado, se o intento for penalmente ilícito, o vínculo, mesmo que no âmbito jurídico representativo para fins criminosos, não terá efeito juridicamente vinculativo, inerente ao contrassenso do vínculo ideal das organizações plurisubjetivas.(RUOTOLO,SILVA,2017).
O direito de livre associação possui muita representatividade, e conforme enfatiza Cristiano Schiller diz respeito a um direito fundamental relevante para a proteção da dignidade humana e da democracia, bem como é um direito personalíssimo. A associação possui a legalidade da cobrança de todos aqueles moradores beneficiados, associados ou não (SCHILLER,2015).
Cabe aqui ressaltar que a liberdade de associação é direito fundamental do indivíduo incontestável ao longo do século XX em vários textos constitucionais. O estatuto afirma-se como de dimensão política, de caráter individual com valor coletivo no âmbito dos espaços democráticos das instituições políticas traçadas a partir do Estado Moderno. Aspecto que merece destaque diz respeito à sua promoção no ambiente da Constituição de 1988, como resposta, inclusive, aos períodos ditatoriais anteriores, revestindo sua previsão, exercício e controle de inafastável tutela constitucional e fiscalização social.
Nota-se que o direito de livre de associação assume posição de destaque nesta pesquisa. Para entendermos no que consiste o princípio da liberdade necessário se faz uma análise do artigo 5º XVII da Constituição federal de 1988, abordado a seguir, onde assume grande relevância para responder parte do segundo objetivo da pesquisa.
3.3 Princípio da Liberdade Associativa e a Plena Liberdade de Associação (artigo 5°, XVII)
O princípio da liberdade torna-se importante a noção de transparência e é também de grande importância no conteúdo desse princípio. Fundamentado na Carta Magna, pode-se afirmar que é plena a liberdade de associação alocado no Título I dos princípios fundamentais da Constituição Federal de 1988, traz no rol de artigos e em específico neste, o artigo 5º, XVII, XVIII, XIX, XX (BRASIL, 2013),
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XVII – é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; XVIII – a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento; [...] XIX – as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado; XX – ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado [...] (BRASIL, 2013).
Conforme pode-se notar, o artigo 5º explicita que ninguém poderá ser obrigado a associar-se, desde que para fins que não sejam ilícitos, vedada a de caráter paramilitar; sendo que sua criação e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, vedada a interferência estatal em seu funcionamento, constituindo-se um direito que, embora atribuído a cada pessoa, ou seja, o titular, somente poderá ser exercido de forma coletiva, com várias pessoas (BRASIL, 2012).
Em consonância com esses pressupostos, torna-se relevante elucidar que sob a ótica de José Joaquim Gomes Canotilho, os direitos fundamentais, ou seja, o da liberdade de associação são direitos característicos do próprio princípio democrático, intrínsecos ao Estado Democrático de Direito (CANOTILHO,2003).
O Título I da Carta Magna, “Dos Princípios Fundamentais” em seu primeiro artigo assegura que “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: I- a soberania; II- a cidadania; III- a dignidade humana [...]” (BRASIL, 2012, p. 13).
Dessa forma, conforme Sérgio Abinagem Serrano, a Constituição Federal de 1988 elevou a dignidade humana como um dos princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito”, o que vale dizer que qualquer ser nascido de mulher é digno, não podendo o Estado negar-lhe esta condição: “de ser humano”(SERRANO, 2004,p.1).
Por isso, no entendimento de Dalmo de Abreu Dallari, para os seres humanos não pode haver coisa mais significante do que a pessoa humana. Essa pessoa, por suas características naturais, por ser dotada de vontade, consciência e inteligência, por ser mais do que um simples fragmento de matéria, tem uma dignidade que a coloca acima de todas as coisas da natureza(DALLARI,1998).
O princípio da dignidade humana, de acordo com Maria Berecine Dias,
[...] é o mais universal de todos os princípios. É um macroprincípio do qual se irradiam todos os demais: liberdade, autonomia privada, cidadania, igualdade e solidariedade, uma coleção de princípios éticos. Representa o epicentro axiológico da ordem constitucional, irradiando efeitos sobre todo o ordenamento jurídico e balizando não apenas os atos estatais, mas toda a miríade de relações privadas que se desenvolvem no seio da sociedade (DIAS, 2011, p. 59).
Pode-se dizer, que, mesmo as teorias chamadas materialistas, que não aceitam a espiritualidade da pessoa humana, sempre foram forçadas a reconhecer que existe em todos os seres humanos uma parte não-material. Isto é, existe uma dignidade inerente à condição humana, e a preservação dessa dignidade faz parte dos direitos humanos, conforme afirma Ingo Wolfgang Sarlet.Ainda, os direitos fundamentais, no entendimento desse autor “constituem explicitações da dignidade da pessoa, por via de consequência e, ao menos em princípio, em cada direito fundamental se faz presenteum conteúdo ou, pelo menos, lguma projeção da dignidade da pessoa(SARLET,2002,p.89)”.
Ainda segundo Ingo Wolfgang Sarlet,
o respeito pela dignidade da pessoa humana deve existir sempre, em todos os lugares e de maneira igual para todos. O crescimento econômico e o progresso material de um povo têm valor negativo se forem conseguidos à custa de ofensas à dignidade de seres humanos. O sucesso político ou militar de uma pessoa ou de um povo, bem como o prestígio social ou a conquista de riquezas, nada disso é válido ou merecedor de respeito se for conseguido mediante ofensas à dignidade e aos direitos fundamentais dos seres humanos (SARLETT, 2002, p. 61).
Conforme pressupõe o referido autor, todos os indivíduos nascem essencialmente iguais e, portanto, com direitos iguais. Mas ao mesmo tempo em que nascem iguais todas as pessoas nascem livres. Essa liberdade está dentro delas, em sua inteligência e consciência.
Para Emilio Zart
[...] a dignidade da pessoa humana é condição preexistente a toda e qualquer normatividade, e por consequência, oponível ao Estado. No entanto, “a inexistência de um mínimo de condições econômicas atenta contra o princípio da dignidade humana, porque impede a fruição dos direitos constitucionalmente assegurados (ZART,2006,p.1).
Conforme entendimento do autor acima citado, a globalização do capitalismo tem agravado as desigualdades econômicas existentes no Brasil, determinando assim a interferência da ordem jurídica, para que o reconhecimento do princípio da dignidade humana não se torne mera retórica.
Uma questão que precisa ser enfatizada sobre o tema associações, segundo Caio Mario da Silva Pereira, é que se trata de certo fim não lucrativo, podendo ser de cunho social, assistencial, educacional, ambiental, dentre outros. Nessa direção, o autor aponta que as associações têm como particularidade a não distribuição, ou melhor, o não dividimento entre os integrantes dos resultados financeiros (PEREIRA,2008).
Desta forma, as associações deverão ser administradas por um estatuto social, podendo haver ou não capital no ato da constituição. Fica claro, portanto, que as rendas derivados da atividade desenvolvida são direcionadas a finalidade descrita em seu estatuto.
Renan Lotufo enfatiza que no artigo 56 do Código Civil comentado, aclara que é indispensável a criação de uma conexão com caráter social entre os associados. Dessa forma, tem-se que a qualidade de associado é intransmissível (LOTUFO,2004).
É necessário ressalvar que dentro desse entendimento, Henri Matarasso Filho, Alessandra Pereira, Teotônio Negrão Neto, asseveram que o Supremo Tribunal Federal (STF), no exame do RE 695.911/ SP-RG, reconheceu a repercussão geral da matéria relativa à possibilidade; ou não, de associação de proprietários em loteamento urbano ordena taxas de manutenção e conservação de adquirente de imóvel a ela não associado, em face do princípio da liberdade de associação(MATARASSO FILHO, 2016, PEREIRA, 2016, NEGRÃO NETO,2016). Conclui ementa:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO CONSTITUCIONAL. LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO. LOTEAMENTO FECHADO. ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. COBRANÇA DE TAXA DE MANUTENÇÃO E CONSERVAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DE EQUIDADE E ETICIDADE. PRINCÍPIO DE VEDAÇÃO DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA NOS AUTOS.
1. O exercício da liberdade de associação é independente das obrigações decorrentes das limitações do direito de propriedade, cujo uso é condicionado ao interesse coletivo e à proibição de locupletamento ilícito.
2. Se de um lado há o interesse comum dos moradores de implementarem infraestrutura e serviços que venham a beneficiar a todos, embora não se configure um condomínio nos termos estritos da lei e não seja ninguém obrigado a se associar, de outro, não é razoável que prevaleça o interesse particular daquele que se recusa a partilhar das despesas, se locupletando do esforço alheia. 3. O princípio da vedação do enriquecimento ilícito encontra amparo nos objetivos da República, como relevante fator na construção de uma sociedade livre, justa e, principalmente solidária (art. 3°, I, da CF). A negativa de alguns moradores de custearem as despesas comuns afronta ainda o princípio constitucional da solidariedade, que impõe a todos um dever jurídico de respeito coletivo, que visa beneficiar a sociedade como um todo. 4. Parecer pelo desprovimento do recurso extraordinário
No que diz respeito a tal princípio da livre iniciativa, Caio Mario da Silva Pereira, cita o parágrafo único do artigo 170, da Carta Magna, traz que, a livre iniciativa como regra, a qual é garantida a liberdade para o exercício de qualquer atividade econômica, ressalvados casos especiais que demandem autorização de órgãos públicos (PEREIRA,2008).
Torna-se relevante esclarecer que a imposição de taxas associativas traz muitas divergências de opiniões. Entretanto, ressaltam que, aceitar a tese de associação de moradores, segundo a visão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), o principal embasamento é pelo fato de que os novos moradores tinham conhecimento da conjuntura materializada e até, procuraram aqueles imóveis, devido às condições de conforto propostas pelas associações. Deste modo, não impor a cobrança privilegiaria o enriquecimento sem causa e afrontaria a boa-fé.
Entende-se que os novos moradores teriam, então, uma aceitação tácita e, por conseguinte, o afastamento da imposição aos moradores que ali já moravam antes da constituição da associação, essencialmente pelo embasamento da livre iniciativa para associação.
Ainda acordando com o entendimento anterior, evidenciam que as obrigações de ordem civil, sejam de natureza contratual ou real, presume-se, como fato pressuposto ou gerador, a existência de uma lei que exija, ou de um acordo firmado com a manifestação expressa de vontade das partes que pactuaram, já que há apenas duas fontes de obrigações, quais sejam, o contrato e a lei.
Diante de tal entendimento não se pode coagir alguém a associar-se, expressamente ou tacitamente, como também, diante da falta de previsão legislativa, a taxa associativa não pode ser conferida aos que anuíram expressamente com a cobrança.
Acontece que muitos destes loteamentos colocam em seus estatutos a cobrança de contribuição mensal para o custeio de despesas com segurança, manutenção das vias públicas, lazer, dentre outros, conferindo aos proprietários dos lotes o pagamento de taxas, sem, contudo, formalizarem a associação destes ao loteamento ou mesmo dar a chance para que os mesmos se manifestem no sentido de aderir de maneira formal à ação que estabeleceu os encargos, de maneira que a cobrança acaba advindo de forma automática àqueles que vierem a adquirir os lotes oferecidos.
Na maioria dos casos, os proprietários dos lotes acabam por pagar as referidas contribuições sem conhecimento, de fato, de qual é a destinação de tais valores ou se os mesmos estão sendo empregados na manutenção do loteamento, abrindo margem à recorrente má utilização e, até mesmo, ao desvio dos valores arrecadados.
Entretanto, Edvanilson de Araújo Lima, enfatiza também que por causas distintas, alguns dos proprietários de lotes nos loteamentos fechados acabam se tornando inadimplentes, levando à interposição de Ação de Cobrança pela administração do loteamento em face daqueles, situação esta que, de tão recorrente (LIMA,2017).
Outro assunto que não pode ser desprezado, conforme Carlos Roberto Gonçalves são as obrigações. Obrigação diz respeito a uma relação de natureza pessoal, de crédito e débito, de caráter transitório, ou seja, extingue-se por meio do seu cumprimento, cujo objeto consiste numa prestação aferível, economicamente (GONÇALVES,2011).
O lado passivo é o que tem sido levado mais em conta, para designar comprometimento ou dívida. Ao observar pelo lado ativo, é denominado de crédito. A parte do Direito Civil que cuida dessa relação jurídica é o Direito das Obrigações, de acordo com Carlos Roberto Gonçalves (2011).
É preciso situar o Direito das Obrigações, dentro do Direito Civil, segundo Maria Helena Diniz. De acordo com a divisão dos segmentos do Direito Civil, a parte que diz respeito aos vínculos jurídicos, de natureza patrimonial, que se estabelecem entre sujeitos determinados para a satisfação de interesses tutelados pela lei, se encontra sistematizada num conjunto de noções, princípios e regras a que se denomina, frequentemente, de “Direito das Obrigações” (DINIZ, 2011).
Segundo o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves, o Direito das Obrigações tem por objeto determinadas relações jurídicas que alguns denominam direitos de crédito e outros chamam direitos pessoais ou obrigacionais (GONÇALVES,2011).
Para Maria Helena Diniz, o Direito das Obrigações rege, exatamente, as relações travadas entre pessoas para a satisfação de interesses. Tem, portanto, natureza pessoal. Pode-se dizer, então, que é o conjunto de regras que controlam os vínculos jurídicos patrimoniais que visam às prestações de uma pessoa em proveito de outra (DINIZ,2011).
A obrigação pertence à categoria das relações jurídicas de natureza pessoal. De acordo com Carlos Roberto Gonçalves, é o vínculo jurídico que confere ao credor (sujeito ativo) o direito de exigir do devedor (sujeito passivo) o cumprimento de determinada prestação (GONÇALVES,2011).
Pode-se dizer que é um liame jurídico em virtude do qual um indivíduo fica coagido a satisfazer, ou não, uma prestação em proveito de outro. É cumprir com um compromisso financeiro. Na sua definição, conforme Orlando Gomes,
[...] tem-se levado em conta, preferentemente, o lado passivo, que se designa pelo termo obrigação ou, mais à justa, dívida. Vista, porém, do lado ativo, chama-se crédito. O acento pode recair tanto no direito como no dever. Em consequência, a parte do Direito Civil que se ocupa dessa relação jurídica, conhecida tradicionalmente como Direito das Obrigações, também admite a denominação Direito de Crédito (GOMES, 2008, p. 15).
As obrigações são um vínculo jurídico que podem ser chamados como uma relação de crédito e débito entre credor e devedor, que abrange o conteúdo patrimonial entre pessoas, com o objetivo de que toda relação jurídica seja possível à exigência da prestação e cumprimento da mesma. É importante ressaltar que nem sempre foi assim. Lembrando que, antigamente, no Direito Romano, as obrigações tinham um aspecto corporal no caso de inadimplemento, as obrigações no direito atual, possuem conotação unicamente patrimonial.
A definição clássica de obrigação vem, conforme Washington de Barros Monteiro,
[...] das Institutas: “Obligatio est juris vinculum, quo necessitate adstringimur alicujus solvendae rei, secundum nostrae civitatis jura” (“Obrigação é o vínculo jurídico que nos adstringe necessariamente a alguém, para solver alguma coisa, em consonância com o Direito Civil”). Obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre devedor e credor e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o adimplemento através de seu patrimônio. Já se apontava o vínculo como o núcleo central da relação entre o credor e o devedor, e a prestação como o seu conteúdo, exigível coercitivamente (MONTEIRO, 2003, p. 22).
A obrigação é a relação jurídica por meio da qual um indivíduo, o devedor, está compromissado a uma determinada prestação para com outro, o credor, que possui direito de exigi-la, obrigando o primeiro a satisfazê-la, ou seja, garantindo-lhe o pagamento por meio de seu patrimônio, de acordo com Carlos Roberto Gonçalves (2011).
A obrigação deve ser encarada, segundo aponta Nelson Rosenvald como uma relação complexa, formada por um conjunto de direitos, obrigações e situações jurídicas, compreendendo uma série de deveres de prestação, direitos formativos e outras situações jurídicas.
A obrigação é tida como um processo – uma série de atos relacionados entre si –, que desde o início se encaminha a uma finalidade: a satisfação do interesse na prestação. Hodiernamente, não mais prevalece o status formal das partes, mas a finalidade à qual se dirige a relação dinâmica. Para além da perspectiva tradicional de subordinação do devedor ao credor existe o bem comum da relação obrigacional, voltado para o adimplemento, da forma mais satisfativa ao credor e menos onerosa ao devedor. O bem comum na relação obrigacional traduz a solidariedade mediante a cooperação dos indivíduos para a satisfação dos interesses patrimoniais recíprocos, sem comprometimento dos direitos da personalidade e da dignidade do credor e devedor (ROSENVALD apud GONÇALVES, 2011, p. 204).
Nota-se que a obrigação é uma relação jurídica de natureza pessoal, porque estabelece entre dois indivíduos, o credor e o devedor, e econômica, por ser necessário que a prestação negativa ou positiva, de dar, fazer ou não fazer, possua um valor pecuniário, ou melhor, seja suscetível de pagamento monetário. O credor tem à sua disposição, como garantia do pagamento, os bens do devedor (ROSENVALD apud GONÇALVES, 2011).
É preciso destacar ainda que, apesar da obrigação objetivar uma prestação pessoal do devedor, na execução por não pagamento, desce-se ao seu patrimônio pessoal. Daí a grande relevância, no direito moderno, da responsabilidade patrimonial (PEREIRA, 2008).
Carlos Roberto Gonçalves lembra que o Título I, do Livro I da parte especial do novo Código Civil de 2002, trata das modalidades das obrigações, que emergem dos direitos pessoais. Conforme o artigo 233 “a obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não mencionados, salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso”. Depois de enunciados os direitos e deveres das pessoas, passa-se a tratar de sua projeção natural que são as obrigações e os contratos (GONÇALVES,2011).
No entanto, Maria Helena Diniz, ressalta que a expressão obrigação é usada em sentido técnico-jurídico, que não se identifica de forma nenhuma com dever jurídico, ônus jurídico ou estado de sujeição (DINIZ,2011).
Do ponto de vista técnico-jurídico, Maria Helena Diniz afirma que é incorreta a afirmação de que o réu tem a obrigação de contestar ou impugnar ou que o adquirente de imóvel tem obrigação de registrar. Existe, na realidade, o ônus de contestar ou de impugnar, como existe o ônus de registrar. Consiste, portanto, o ônus jurídico na necessidade de se observar determinada conduta, para satisfação de um interesse. Dessa forma, o objeto da obrigação consiste numa prestação pessoal; só a pessoa vinculada está adstrita ao cumprimento da prestação (DINIZ,2011).
Conforme Carlos Roberto Gonçalves, a obrigação é a relação jurídica por meio da qual um indivíduo, o devedor, está compromissado a uma determinada prestação para com outro, o credor, que possui direito de exigi-la, obrigando o primeiro a satisfazê-la, ou seja, garantindo-lhe o pagamento por meio de seu patrimônio (GONÇALVES,2011).
Portanto, a obrigação é uma relação jurídica de natureza pessoal, porque estabelece entre dois indivíduos, o credor e o devedor, e econômica, por ser necessário que a prestação positiva ou negativa, de dar, fazer ou não fazer, possua um valor pecuniário, ou melhor, seja suscetível de pagamento monetário. O credor tem à sua disposição, como garantia do pagamento, os bens do devedor, segundo Maria Helena Diniz (2011).
Conforme Antônio Augusto Queiroz Telles que, apesar da obrigação objetivar uma prestação pessoal do devedor, na execução por não pagamento, desce-se ao seu patrimônio pessoal. Daí a grande relevância, no direito moderno, da responsabilidade patrimonial (TELLES,1996).
É impossível abordar o tema associação e não enfatizar a natureza jurídica dos condomínios, associações e dos loteamentos, segundo Cristiano Schiller.O condomínio edilício não tem personalidade jurídica, porém, está legitimado a atuar em juízo, ativa e passivamente, representado, pelo síndico conforme dispõe o artigo 12, inciso XI do Código Processual Civil (CPC), em situação similar a do espólio e da massa falida (SCHILLER,2015).
As associações, por sua vez, são pessoas jurídicas de direito privado, ou seja, ela tem competência para adquirir direitos e obrigações legais, além de ter autonomia protegida constitucionalmente, conforme Cristiano Schiller. Nessa direção, o loteamento fechado, conforme o autor, possui a natureza jurídica de um condomínio edilício, cuja previsão encontra-se no artigo 9° da Lei nº 4.591/64 e os artigos 1.332 e 1333 do Código Civil ordenam, para que o condomínio se considere formal e regularmente que os condôminos organizem uma convenção de condomínio e a levem ao registro no Cartório de Registro de imóveis (SCHILLER, 2015).
Segundo Sérgio Botrel, que, a determinação de associar-se cabe apenas ao sujeito, como também o morador tem o direito de desassociar-se a qualquer instante, isso é uma segurança prevista no artigo 5°, XX da Constituição Federal de 1988 (BOTREL, 2009).
Dessa maneira, para Cristiano Schiller, a “despatrimonialização” foi um divisor de águas no Direito Civil, isto porque, o cerne fundamental passa a ser a dignidade da pessoa humana, não mais a proteção do patrimônio (SCHILLER, 2015),
Assim, essa relação jurídica de se associar, tem que ser investigada a partir dos princípios constitucionais; sendo o princípio da solidariedade, um dos mais representativos, prognosticado no artigo 2°, I, da Carta Magna (1988), que deve ser considerado juntamente como um dos outros princípios fundamentais do ordenamento jurídico brasileiro.Trata-se, portanto, conforme Sérgio Botrel, de um princípio informativo e balizador do conflito, entre os dois princípios centrais, o enriquecimento sem causa e a liberdade individual(BOTREL,2009).
Cristiano Schiller (2015) assevera ainda que, é preciso considerar o caso individualmente, pois tem que levar em conta dois fatores muito representativos para o direito, se a aquisição do imóvel ocorreu depois de constituída a associação e instituído o encargo pelos serviços prestados e se houve vantagem usufruída pelo serviço prestado pela associação (SCHILLER,2015).
Enfim, os indivíduos podem associar-se para atingir “metas econômicas ou para se defenderem, por um apoio recíproco, para fins religiosos, para promover interesses gerais ou da coletividade, para fins altruísticos, ou para se fazerem ouvir”, dessa forma, Gilmar Ferreira apud Guilherme Amorim Campos da Silva, ressalta que é necessário um maior êxtase à democracia participativa (FERREIRA, apud SILVA,2017).
O direito de associação está ligado aos princípios da livre inciativa, da autonomia da vontade e da garantia da liberdade de expressão, como também ao fundamento da proteção da dignidade da pessoa humana. Daí a importância se tecer alguns comentários acerca dos princípios da justiça, tema que será abordado a seguir finalizando assim o segundo objetivo da pesquisa.
A justiça é tema recorrente no âmbito das Ciências Jurídicas, tendo em vista sua vinculação obrigatória às questões éticas, morais, culturais e, até mesmo, geográficas de uma determinada sociedade. Percebe-se a dificuldade em consagrar o conteúdo da justiça em um ordenamento que reflita os anseios de todos os indivíduos que compõem um grupo socialmente organizado.
A teoria da justiça pode ser dividida em duas partes principais, quais sejam, uma interpretação da situação primeira e uma formulação dos múltiplos princípios disponíveis para escolha ali, e uma demonstração estabelecendo quais dos princípios seriam de fato tomados, segundo afirmativa de John Rawls. O primeiro objeto dos princípios da justiça social é a estrutura básica da sociedade, a ordenação das principais instituições sociais em um esquema de cooperação,
[...] esses princípios devem orientar a atribuição de direitos e deveres nessas instituições e determinar a distribuição adequada dos benefícios e encargos da vida social. Os princípios da justiça para instituições não devem ser confundidos com os princípios que se aplicam aos indivíduos e às suas ações em circunstâncias particulares. Esses dois tipos de princípios se aplicam a diferentes sujeitos e devem ser discutidos separadamente (RAWLS, 1997, p. 57-58).
Os princípios da justiça, conforme entendimento de John Rawls,devem ser aplicados nos ornamentos sociais que são considerados públicos nesse sentido. A publicidade das regras de uma instituição assevera que, aqueles nela engajados, saibam quais limites de conduta devem esperar uns dos outros, e que tipos de ações são permissíveis (RAWLS, 1997).
O estudo de John Rawls propõe uma Teoria da Justiça que embasa a necessidade da convivência cooperativa entre os seres humanos, protagonizando a justiça em lugar da eficiência das instituições sociais. Assim, a importância desse autor advém da demonstração de um modelo ideal para a concepção de justiça que propõe a coexistência dos direitos individuais e do Estado do bem-estar social (RAWLS, 1997).
Existe, segundo este autor “uma base comum para a determinação de expectativas mútuas”. Além do mais, em uma sociedade bem-ordenada, regulada de maneira efetiva por uma concepção compartilhada de justiça, também existe uma compreensão comum quanto ao que é justo e injusto (RAWLS, 1997, p. 59).
Ressalta-se que o princípio da justiça é o princípio mais importante do direito, sendo o valor e a qualidade que as condutas humanas devem assumir no âmbito das suas relações sociais. Na sua função judicial, o princípio da justiça diz respeito à igualdade de todo e qualquer cidadão, na medida em que todos são iguais perante a lei e todos têm os mesmos direitos conforme reza a Constituição Federal. É o princípio básico de um acordo que objetiva manter a ordem social através da preservação dos direitos.
O princípio da justiça é o valor ideal que estabelece a razão de ser o direito, sendo uma preocupação de todos os sistemas jurídicos obterem e integrar este valor nos seus ordenamentos de acordo com o progresso de que as sociedades vão sendo alvo. A justiça é um dos valores supremos da sociedade, conforme consta o Preâmbulo da Constituição federal de 1988.
Observou-se nos capítulos anteriores que com o crescimento da população e das cidades, houve a necessidade de construir edifícios como sendo propriedade exclusiva do indivíduo, e com isso, a precisão de se criar uma disciplina jurídica para que de fato o interessado pudesse adquirir o direito de propriedade nesse novo modo de se viver na comunidade. As pessoas se associam em determinadas comunidades associativas gozando de benefícios e participando do rateio das despesas, apesar de ninguém poder ser obrigado a associar-se ou a continuar-se associado, conforme (art. 5º, XVII, da CR/88).
O capítulo que se segue trata-se de uma análise jurisprudencial acerca da possibilidade ou não da obrigatoriedade de impor cobrança de taxas associativas, verificando a posição de vários ministros, desembargadores da temática em discussão.
4. ASSOCIAÇÃO DE MORADORES: POSSIBILIDADE OU NÃO DA OBRIGATORIEDADE DE IMPOSIÇÃO DA COBRANÇA DE “TAXAS ASSOCIATIVAS”.
O objetivo deste capítulo é fazer uma análise acerca da possibilidade ou não da cobrança de taxas associativas através de análises de jurisprudências no sentido de verificar o posicionamento de alguns Ministros sobre o tema em discussão.
4.1 Das Taxas associativas
O art. 5º, XX, da Constituição Federal de 1988 assegura a liberdade de associação nos seguintes termos: “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado”. Mencionado direito fundamental encerra, portanto, dupla face: a faculdade de associar-se (aspecto positivo) e a de não permanecer associado (aspecto negativo).
Assim, sob o argumento de que não são obrigados a associar-se ou a permanecer associados, muitos titulares de lotes em “condomínios de fato” têm se esquivado ao pagamento de quaisquer valores a título de contribuição no custeio de despesas comuns do seu loteamento. E, nessa empreitada, têm encontrado o respaldo dos tribunais, inclusive do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.
4.2 Loteamento Fechado, Condomínio de Lotes e Condomínio pela Lei 4.591/64.
Alguns conceitos serão apresentados sobre loteamento fechado, condomínio de lotes e condomínio conforme a Lei 4.591/64, lei conhecida como “Lei do Condomínio”, que ainda está em vigor e trata dos direitos de propriedade, como por exemplo, como convocar e fazer assembleias, organização das despesas do condomínio, utilização da edificação por parte dos condôminos e demais assuntos, dada a sua relevância nesta pesquisa respondendo assim outro objetivo proposto neste estudo.
Com o processo de urbanização desordenada das cidades, e inspirados na má qualidade de vida urbana gerada pela desenfreada e caótica ocupação do solo nos grandes centros, empresários do ramo imobiliário têm optado por moradias dotadas de comodidade, luxo e segurança. Estas são algumas das razões de uma nova modalidade de parcelamento do solo urbano, os Loteamentos Fechados, com características especiais que os diferem dos convencionais.
Pode-se dizer que o loteamento tem em vista integrar sua área à estrutura urbana já existente, desenvolvendo uma extensão da cidade e criando assim um novo bairro. Portanto, a característica mais marcante do loteamento é o planejamento de novas ruas e avenidas. Já condomínios possuem características distintas em relação ao loteamento. O que se segue é algumas definições de condomínios bem como da capacidade jurídica.
Para José Afonso da Silva,
[...] o loteamento é modalidade de urbanificação, forma de ordenação urbanística do solo ou ‘atividade deliberada de beneficiamento ou rebeneficiamento do solo para fins urbanos, quer criando áreas urbanas novas pelo beneficiamento do solo ainda não urbanificado, quer modificando solo já urbanificado’. Distingue-se da urbanização, que é ‘um fenômeno espontâneo de crescimento das aglomerações urbanas em relação com a população rural. ’ (SILVA, 1995, p.289).
Até a entrada em vigor da Lei Federal nº 13.465/2017, que dispõe sobre a regularização fundiária rural e urbana, sobre a liquidação de créditos concedidos aos assentados da reforma agrária e sobre a regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal; a Lei do Parcelamento do Solo Urbano era omissa quanto à possibilidade de o município autorizar o fechamento de loteamentos, mas alguma doutrina já sustentava tal possibilidade com amparo na concessão de direito real de uso de terrenos públicos, positivada pelo art. 7º, caput, do Decreto-Lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1967, a antiga Lei de Loteamentos Urbanos.
Como a Lei Lehmann não revogou expressamente esse dispositivo, para essa corrente dogmática, o município poderia proceder à desafetação do uso comum dos logradouros públicos em questão e, em seguida, afetá-los ao uso especial dos habitantes do loteamento por meio da concessão de direito real de uso. Essa tese, contudo, carrega consigo uma série de dificuldades de ordem constitucional (REVISTA DA CIDADE, 2017).
Conforme leciona José Afonso da Silva,
[...] parcelamento urbanístico do solo é o processo de urbanificação de uma gleba, mediante sua divisão ou redivisão em parcelas destinadas ao exercício das funções elementares urbanísticas”. O parcelamento de solo urbano, segundo a Lei nº 6.766/79, poderá ocorrer mediante loteamento ou desmembramento, já o desdobro constitui na divisão de um lote sem o objetivo de urbanização, não se sujeitando aos efeitos da referida Lei, considerando que não detém potencialidade de influir nos padrões urbanísticos de uma cidade (SILVA,2006,p.329).
Assim, o desmembramento conceitua-se como a divisão do terreno em lotes destinados a edificação com o aproveitamento do sistema viário existente, não podendo ser confundido com parcelamento do solo, que é o loteamento em que implica abertura de vias de circulação pública ou sua modificação.
José Afonso da Silva, exemplifica a questão com propriedade:
[...] não se consideram loteamento nem a divisão de um lote maior em dois menores nem mesmo a divisão de uma quadra em lotes com aproveitamento das vias públicas já existentes. No primeiro coso temos simples desdobro de lotes; no segundo, desmembramento. O loteamento e o desmembramento – anota Hely Lopes Meirelles – constituem modalidades de parcelamento de solo, mas apresentam características diversas: o loteamento é meio de urbanização e só se efetiva por procedimento voluntário e formal do proprietário da gleba, que planeja sua divisão e a submete a aprovação da Prefeitura, para a subseqüente inscrição no Registro Imobiliário, transferência gratuita das áreas das vias públicas e espaços livres do Município e a alienação dos lotes aos interessados; o desmembramento é apenas repartição da gleba, sem atos de urbanização, e tanto pode ocorrer pela vontade do proprietário (venda, doação, etc.), como por imposição judicial (arrematação, partilha, etc.), em ambos os casos sem qualquer transferência de área ao domínio público(SILVA, 2006, p. 332).
Pela leitura do artigo 2º da Lei Federal nº 6.766/79, “O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou desmembramento, observadas as disposições desta Lei e as das legislações estaduais e municipais pertinentes”, constata-se que não foi apreciada a figura do desdobro e do fracionamento. No entanto, é doutrinariamente aceito se previsto em Lei Municipal. O desdobro é a divisão da área do lote para formação de novo ou novos lotes, que devem atender as exigências mínimas de dimensionamento e índices urbanísticos para sua edificação. Já os chamados Loteamentos Fechados aproximam-se mais do loteamento disciplinado pela Lei nº 6.766/1979, que fala sobre o parcelamento do solo urbano, e apesar de apresentarem os mesmos requisitos urbanísticos exigidos para implantação de um loteamento convencional, possuem características próprias que acabam diferenciando-os, especialmente pelo fato de o acesso às vias e aos logradouros nos loteamentos fechados serem restritos ao trânsito de moradores e visitantes.
Logo, os Loteamentos Fechados, também conhecidos como "Condomínio de Fato", carecem de legislação específica, e a falta de previsão legal cria alguns impasses, dentre os quais se destaca a problemática referente ao rateio de despesas em comum. Nesse contexto, para fazer face às despesas de disponibilização e manutenção de serviços que beneficiam áreas comuns no âmbito dos loteamentos fechados, são criadas associações de moradores (BRASIL,1979).
A designação “loteamento fechado vem sendo conferida a certa forma de divisão de terras em lotes para a edificação que, apesar de materialmente se parece ao loteamento, na verdade deste se distancia no seu regime como nos seus efeitos e resultados.
Para Jose Afonso da Silva, o chamado “loteamento fechado”
Constitui modalidade especial de aproveitamento condominial de espaço para fins de construção de casas residenciais térreas ou assobradadas ou edifícios. Caracteriza-se pela formação de lotes autônomos com áreas de utilização exclusiva de seus proprietários, confinando-se com outras de utilização comum dos condôminos.O terreno assim “loteado não perde sua individualidade objetiva, conquanto sofra profunda transformação jurídica. (SILVA,2006, p.350).
O regime jurídico dessa modalidade de desenvolvimento urbano como acabou de indicar é de Direito Privado, com base no art. 8º da Lei 4.591/64, “quando, em terreno onde não houver edificação, o proprietário, o promitente comprador, a convenção de condomínio fixará”, com natureza jurídica, como visto, de condomínio privado.
Para que a associação tenha legitimidade de fato na cobrança das taxas é indispensável que se organize de modo válido, conforme recomendado em lei, sob pena de nulidade. Seus requisitos essenciais de formação são os seguintes: a denominação, os fins e a sede da associação; as condições para admissão, demissão e exclusão de associados; os direitos e deveres dos associados; as fontes de recurso para sua manutenção; o modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e administrativos; as condições para alteração das disposições estatutárias e para a dissolução.
Já os condomínios são considerados um marco na paisagem das cidades brasileiras no início do século XX e constituíram também uma marca no tempo e no espaço da sociedade brasileira. Dos condomínios de apartamentos aos condomínios de lotes, casas e sobrados muitas foram as transformações vivenciadas pela sociedade brasileira nos últimos tempos.
Condomínio de lotes (art. 1.358-A do CCB/02) “ pode haver, em terrenos, partes designadas de lotes que são propriedade exclusiva e partes que são propriedade comum dos condôminos”) é a modalidade de condomínio edilício em que a unidade autônoma corresponde a um lote. Este, por sua vez, é definido na legislação como "o terreno servido de infraestrutura básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos pelo plano diretor ou lei municipal para a zona em que se situe" (lei 6.766/79, art. 2º, §4º).
A principal nota diferenciadora, relativamente às conhecidas figuras do loteamento urbano, está na atribuição de fração ideal sobre o terreno e partes comuns. Além disso, enquanto no condomínio de lotes o terreno como um todo é, e se mantém privado, no loteamento o terreno sobre o qual estão estabelecidos os lotes são públicos, incorporado à municipalidade.
O condomínio de lotes resultará necessariamente de uma fragmentação do solo urbano, pelo que ocorre a incidência da lei 6.766/79.
É preciso atender, assim, aos requisitos urbanísticos constantes dessa normativa (aliás, conforme remissão expressa do art. 1.358-A, §2º do CCB/02). Tomem-se como exemplos a área mínima de 125m² e, eventualmente, "servidões de passagem, usufrutos e restrições à construção de muros" "em benefício do poder público, da população em geral e da proteção da paisagem urbana" (§4º do art. 4º da lei 6.766/79, dispositivo incluído pela lei 13.465/17).
Compreende-se que o condomínio de lotes é uma modalidade cuja disciplina combina requisitos da Lei do Parcelamento do Solo e da Lei de Condomínios e Incorporações. Exige-se, para além dos elementos do art. 18 da lei 6.766/79, “Aprovado o projeto de loteamento ou de desmembramento, o loteador deverá submetê-lo ao registro imobiliário dentro de 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de caducidade da aprovação”, também o memorial de incorporação e a minuta da futura convenção condominial, requisitos do art. 32 da lei 4.591/64, ”O incorporador somente poderá negociar sobre unidades autônomas após ter arquivado, no cartório competente de Registro de Imóveis”
Segundo Silvio de Salvo Venosa, condomínio é considerado uma modalidade de comunhão específica do direito das coisas. Trata-se, na verdade, de espécie de comunhão, e entretanto, é inseparável a necessidade que o objeto do direito seja uma coisa ou a comunhão refere outra natureza (VENOSA,2003).
O Código Civil brasileiro de (2002), veio expressamente disciplinar a matéria, dividindo-a em duas espécies de condomínio: a) condomínio geral, que se subdivide em voluntário (artigos 1.314 a 1.326), e necessário (artigos 1.327 a 1.330); b) condomínio edilício ou em edificações (artigos 1.331 a 1.358).
O Código Civil de 2002 divide condomínio em duas espécies distintas. São elas: condomínio geral, que se subdivide em voluntário e condomínio edilício ou em edificações. Segundo explicação de Caio Mário da Silva Pereira:
A primeira deriva de um acordo de vontade das partes. Em compensação, o condomínio necessário ou forçado é aquele imposto por lei, diante de coisa indivisa, como em casos de paredes, cercas, muros e valas. A segunda espécie caracteriza-se pela apresentação de uma propriedade comum ao lado de uma propriedade privativa (PEREIRA,2011,p.395).
É muito comum serem confundidos os institutos do condomínio geral e do condomínio edilício. Pode-se dizer, de maneira bem simples, que um (condomínio edilício) é espécie do outro (condomínio geral). Vejamos as definições de condomínio.
Na definição de Scialoja apud Roberto Barcellos de Magalhães:
[...] condomínio é uma relação de igualdades que se limitam reciprocamente; uma relação de equilíbrio que torna possível a coexistência de direitos iguais sobre a mesma coisa, limitando em cada um o poder de gôzo e de disposição da mesma, tanto quanto é exigido por igual direito dos outros (MAGALHÃES,1970,p.9).
Conclui-se que o condomínio é desse modo, uma relação de igualdades que se restringem reciprocamente, é uma situação de equilíbrio que torna possível a convivência de direitos iguais sobre a mesma coisa. Caio Mário da Silva Pereira, citado por João Roberto Parizatto ensina que:
[...] dá-se condomínio, quando a mesma coisa pertence a mais de uma pessoa cabendo a cada uma delas igual direito, idealmente, sobre o todo e cada uma de suas partes [...] a cada condômino é assegurada uma cota ou fração ideal da coisa, e não uma parcela material desta. Cada cota ou fração não significa que a cada um dos co-proprietários se reconhece a plenitude dominial sobre um fragmento físico do bem, mas que todos os comunheiros têm direitos qualitativamente iguais sobre a totalidade dele, limitados, contudo na proporção quantitativa em que concorre com os outros co-proprietários na titularidade sobre o conjunto (PEREIRA,1992 apud PARIZATTO,2011,p.350).
Nota-se que a definição apresentada se dá o nome condomínio a uma coisa que pertence a mais de uma pessoa onde todos têm o mesmo direito de usufruir daquele espaço com direitos e obrigações. Muitos doutrinadores questionam a falta de capacidade jurídica do condomínio. Vejamos a posição de alguns deles para que assim consigamos responder parte do primeiro objetivo da pesquisa.
Alguns juristas criticam a falta de capacidade jurídica do condomínio, como esclarece Carlos Alberto Dabus Maluf apud Haroldo Guilherme Vieira Fazano:
A nova lei civil perdeu a oportunidade de dar personalidade jurídica ao condomínio, tão necessário a este instituto que dela precisa para poder interagir com maior desenvoltura no mundo jurídico principalmente no que tange à aquisição de bens e imóveis que possam incorporar ao prédio já existente. Como caso concreto, podemos apontar, por exemplo, a impossibilidade da compra em nome do condomínio de terreno contiguo para ampliar as vagas de garagem pela falta de personalidade jurídica, obrigando que os próprios condôminos, se quiserem, adquiram em seu nome a propriedade, muitas vezes inviabilizando o negócio (MALUF,2002,p.62, apud FAZANO,2010,p.115).
O autor esclarece que o condomínio é de fato uma ficção jurídica que existe no campo do direito, sendo no entender da doutrina, quase que uma pessoa que, infelizmente pela nova lei civil brasileira, vai continuar sem personalidade jurídica.
Em relação à natureza jurídica do condomínio, é importante o esclarecimento de Washington de Barros Monteiro quando diz que:
[...] o Código Civil Brasileiro, tomando partido entre correntes tão diversas e tão embaraçosas aceitou a teoria da subsistência, em cada condômino, da propriedade sobre toda a coisa; o direito de cada condômino, em face de terceiros, abrange a totalidade dos poderes imanentes ao direito de propriedade; mas, entre os próprios condôminos, o direito de cada um é autolimitado pelo de outro, na medida de suas cotas, para que possível se torne sua coexistência. A parte ideal não representa uma entidade objetiva (MONTEIRO,2003,p.205-206).
Compreende-se aqui que a parte ideal é apenas um critério averiguador. Um meio para manifestar, num valor econômico, o direito de cada consorte perante os outros, permitindo-lhe assim total disponibilidade, durante o estado de indivisão.
Existe de fato uma lacuna na legislação brasileira em relação à personalidade jurídica dos condomínios já que esses não se constituem como pessoas físicas tampouco estão legalmente estabelecidos como jurídicas.
Outra observação relevante nesta pesquisa trata-se da ausência de vontade dos Condôminos de constituir uma Associação. Existe uma controvérsia quanto ao princípio constitucional da liberdade de associação, no qual cita o art. 5°, XX da Constituição Federal de 1988, segundo o qual ''ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado''.
O que se segue é análise dos pontos de vista jurisprudencial acerca da legalidade da obrigatoriedade do pagamento de taxas associativas em associação de moradores (TJ, STJ, STF) no sentido de verificar o posicionamento de alguns Ministros sobre o tema em discussão.
Sobre o tema, a Apelação Cível Nº 70073949950 (Nº CNJ: 0159110-35.2017.8.21.7000) a Desembargadora Relatora Walda Maria Melo que tinha como objeto que não basta apenas alegar a existência de um condomínio de fato para proceder à cobrança de contribuições, pois é necessária a formação e aprovação do Condomínio em Assembléia regularmente constituída e previsão orçamentária anual, bem como a prova de associação da demandada, concluindo sua ementa:
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA - ART. 543-C DO CPC - ASSOCIAÇÃO DE MORADORES - CONDOMÍNIO DE FATO - COBRANÇA DE TAXA DE MANUTENÇÃO DE NÃO ASSOCIADO OU QUE A ELA NÃO ANUIU - IMPOSSIBILIDADE.
1. Para efeitos do art. 543-C do CPC, firma-se a seguinte tese: "As taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram".
2. No caso concreto, recurso especial provido para julgar improcedente a ação de cobrança.
(REsp 1280871/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. p/ Acórdão Ministro Marco Buzzi, Segunda Seção, julgado em 11/03/2015, DJe 22/05/2015)
Portanto, é fundamental a anuência ou a adesão do proprietário aos termos constitutivos da associação de moradores, para efeito de tais cobranças, preponderando, inclusive, a liberdade associativa ao enriquecimento sem causa.
Sobre o tema, Embargos de Declaração Nº 0003736-24.2011.8.26.0654/50000, da Comarca de Vargem Grande Paulista, os Desembargadores Relatores Mary Grün e Luiz Antonio Costa, para efeitos do art. 543-C do CPC, que tinha como objeto que as taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram, concluindo sua ementa:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO COBRANÇA - Associação - Procedência Superveniência do entendimento contrário sob a sistemática dos recursos repetitivos, REsp nº 1.439.163-SP As “taxas” de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram - Embargantes que adquiriram o imóvel anteriormente à constituição da associação EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS.
1. Para efeitos do art. 543-C do CPC, firma-se a seguinte tese: "As taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram". 2. No caso concreto, recurso especial provido para julgar improcedente a ação de cobrança” (Recurso Especial nº 1.439.163 SP, Min. Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, R. P/ Acórdão: Min. Marco Buzzi, data de julgamento: 11/03/2015)
Portanto, as “taxas” e contribuições de manutenção ou de conservação criadas por associação de moradores ou administradora de loteamento só poderiam ser impostas aos embargantes se eles tivessem adquirido o imóvel depois da constituição da associação, ou a ela aderido, o que não é o caso.
As jurisprudências apresentadas e analisadas, do ponto de vista dos Tribunais de Justiça do Estado de São Paulo e Rio Grande do Sul deixaram claro que, as taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram. A seguir serão apresentados e analisados julgados do STJ.
Sobre o tema, o Desembargador Rogério de Oliveira Souza, Relator da Apelação Cível nº 0013606-70.2008.8.19.0209, que tinha como objeto o direito de crédito em face do morador que não se associou, concluindo sua ementa:
DIREITO CONSTITUCIONAL. COBRANÇA DE COTAS "CONDOMINIAIS". CONDOMÍNIO ATÍPICO OU DE FATO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA RESERVA LEGAL E DA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO (ARTIGO 5O, II E XX). Ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei, não podendo ser compelido a se associar a entidade privada. Associação de moradores não tem nenhum direito de crédito em face de morador que não se associou. Serviços de segurança, urbanização, lazer, etc. que cabem ao Poder Público prestar como obrigação constitucional de sua razão de ser. Privatização dos espaços públicos por entidade privada. Imposição de obrigação ao particular de pagar duplamente pelos mesmos serviços, pelos quais já paga através de impostos e taxas. Conhecimento e provimento do recurso. (TJRJ, NONA CAMARA CIVEL, Apelação Cível nº 0013606-70.2008.8.19.0209, Rel. Des. Rogério de Oliveira Souza, Julgamento em 22/06/2010).
O julgado acima homenageia o direito constitucional de livre associação e desvinculação da mesma e defende a inexigibilidade do pagamento de rateio de despesas que Associação de Moradores tenha eventualmente tido, senão quando os proprietários de imóveis tenham, voluntariamente, aderido à Associação.
Sobre o tema, o Desembargador Luiz Fernando de Carvalho Relator da Apelação Cível nº 0008271-48.2009.8.19.0011, que tinha como objeto a inexigibilidade do pagamento de rateio de despesas que Associação de Moradores tenha eventualmente tido senão quando os proprietários de imóveis tenham voluntariamente aderido à Associação, concluindo sua ementa:
CONSTITUCIONAL E CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA VISANDO O ADIMPLEMENTO DE TAXA DE MANUTENÇÃO DE CONDOMÍNIO DE FATO INSTITUÍDO POR ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. DEMANDADA QUE SE DESLIGOU DA ASSOCIAÇÃO E SE FILIOU A ENTIDADE SIMILAR. SENTENÇA QUE JULGA IMPROCEDENTE O PEDIDO. APELO DA AUTORA ALEGANDO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DA MORADORA, QUE USUFRUIRIA DOS SERVIÇOS DE MANUTENÇÃO SEM O DEVIDO PAGAMENTO. DIREITO. À LIBERDADE ASSOCIATIVA QUE MERECE PROTEÇÃO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DO NÃO-ASSOCIADO. PROVA NOS AUTOS QUE DEMONSTRA QUE A MORADORA SE FILIOU A OUTRA ASSOCIAÇÃO, PERANTE QUEM CONTRIBUI REGULARMENTE, NÃO HAVENDO QUE SE FALAR EM LOCUPLETAMENTO. INVIÁVEL A MANUTENÇÃO DA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO SE É IMPOSTO AO NÃO OPTANTE O PRINCIPAL ÔNUS DA COLIGAÇÃO, QUAL SEJA, O PAGAMENTO DA CONTRIBUIÇÃO MENSAL. SITUAÇÃO QUE CONFIGURARIA ASSOCIAÇÃO INDIRETA E COMPULSÓRIA, EM AFRONTA AO TEXTO CONSTITUCIONAL. GRUPO DE PARTICULARES QUE, MESMO EM UNIÃO, NÃO TEM O PODER DE IMPOR COBRANÇA A SEUS PARES. ATRIBUTO DA COERCITIVIDADE QUE A LEI RESERVA UNICAMENTE A ATOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO. (TJRJ, Terceira Câmara Cível, Apelação Cível nº 0008271-48.2009.8.19.0011, Rel. Des. Luiz Fernando de Carvalho, Julgamento em 14/08/2013).
Percebe-se que os argumentos a favor da cobrança pelos serviços de limpeza, segurança, organização, dentre outros, por parte da Associação de Moradores apregoam que: as despesas tidas com melhorias, benfeitorias em prol de toda a coletividade devem ser cobradas de todos os beneficiados com vistas a se evitar o enriquecimento sem causa; e que na esteira do art. 1.315 do Código Civil de 2002 há obrigação de o condômino ou com proprietário arcar com a sua parte devida nas despesas decorrentes da coisa comum.
Sobre o tema, o Ministro Ruy rosado de Aguiar, Relator da Apelação Cível Nº 0005567-23.2005.8.19.0037 fundamentou sua decisão com lastro no verbete da Súmula de nº 79 do TJRJ12, entendendo que o inadimplemento de cotas resultantes do rateio de despesas realizadas em benefício de todos os proprietários e moradores que compõem a associação configura locupletamento indevido, que independe do beneficiado ser associado ou não, concluindo sua ementa:
Apelação Cível. Cobrança de cotas condominiais. Condomínio de fato. Possibilidade. Precedentes Jurisprudenciais. Aplicação do verbete da Súmula nº 79 do E.TJ/RJ. O inadimplemento de cotas resultantes do rateio de despesas realizadas em benefício de todos os proprietários e moradores que compõem a associação configura locupletamento indevido, que independe do beneficiado ser associado ou não. Recurso a que se nega provimento. (TJRJ, Décima Sexta Câmara Cível, Apelação Cível nº 0005567- 23.2005.8.19.0037 (2007.001.03218), Rel. Des. Marília de Castro Neves, Julgamento em 06/03/2007).
Diz a jurisprudência que os proprietários de imóveis beneficiários dos serviços prestados por sociedade ou associação ao condomínio, ainda que atípico, devem contribuir no rateio das despesas, sob pena de enriquecimento ilícito. Traz à evidência decisão do STJ que corrobora sua tese, conclui a ementa:
CONDOMÍNIO ATÍPICO. ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. DESPESAS COMUNS. OBRIGATORIEDADE. - O proprietário de lote integrante de gleba urbanizada, cujos moradores constituíram associação para prestação de serviços comuns, deve contribuir com o valor que corresponde ao rateio das despesas daí decorrentes, pois não é adequado continue gozando dos benefícios sociais sem a devida contraprestação. Precedentes. Recurso conhecido e provido." (REsp 439.661-RJ, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 18-11-2002); "CIVIL - AÇÃO DE COBRANÇA - COTAS CONDOMINIAIS - CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO NÃO REGISTRADA - LOTEAMENTO - CONDOMÍNIO HORIZONTAL. I - O Registro da Convenção de Condomínio tem por finalidade precípua imprimir-lhe validade contra terceiros, não sendo requisito "inter partes". Por isso não pode o condômino sob este fundamento recusar-se a cumprir os seus termos ou a pagar as taxas para sua manutenção. II - Um condomínio, ainda que atípico, caracteriza uma comunhão e não se afigura justo, nem jurídico, em tal circunstância que um participante, aproveitando-se do "esforço" dessa comunhão e beneficiando-se dos serviços e das benfeitorias realizadas e suportadas pelos outros condôminos, dela não participe contributivamente. III - Recurso conhecido e provido." (REsp 139.952-RJ, rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ de 19-04-1999).
De acordo com a ementa, conclui-se que o condomínio, ainda que atípico, tem legitimidade para propor ação de cobrança de despesas condominiais. No caso, entretanto, a agravada é uma simples associação de moradores - quando muito, um condomínio atípico. As deliberações desses condomínios atípicos não podem atingir quem delas não tomou parte. Vale dizer que as obrigações assumidas pelos que espontaneamente se associaram para ratear as despesas comuns não alcançam terceiros que a elas não aderiram.
As jurisprudências apresentadas e analisadas, do ponto de vista do STJ, deixaram claro a inconstitucionalidade de pagamento de taxas alegando que o proprietário em particular já havia pago através de impostos cobrados pela associação. Num outro caso apresentado notou-se a cobrança de taxas associativas em prol dos benefícios usufruídos pelos moradores.
A seguir serão apresentadas e analisadas jurisprudências do STF.
Sobre o tema, o Ministro Ruy Marco Aurélio Relator do Recurso Especial Nº. 432106/RJ fundamentou sua decisão sob o argumento de que não são obrigados a associar-se ou a permanecer associados, muitos titulares de lotes em “condomínios de fato” têm se esquivado ao pagamento de quaisquer valores a título de contribuição no custeio de despesas comuns do seu loteamento, conclui ementa:
ASSOCIAÇÃO DE MORADORES – MENSALIDADE – AUSÊNCIA DE ADESÃO. Por não se confundir a associação de moradores com o condomínio disciplinado pela Lei nº 4.591/1964, descabe, a pretexto de evitar vantagem sem causa impor mensalidade a morador ou a proprietário de imóvel que a ela não tenha aderido. Considerações sobre o princípio da legalidade e da autonomia da manifestação da vontade – Art. 5º, incisos II e XX da CF/1988. (STF, 1ª Turma, RE 432106/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, Julgamento em 20/09/2011).
Em relação ao julgado acima, entendeu-se que, para que fossem anuladas tais contestações sobre o dever ou não de os associados contribuírem com as despesas feitas no condomínio atípico pela Associação de Moradores, o STF no RE 432.106-RJ17 decidiu favorável à desobrigação do pagamento de despesas por parte de não associado com lastro no direito constitucional do cidadão de não se associar compulsoriamente.
Sobre o tema, a Desembargadora relatora do Recurso Especial nº 0022139-18.2008.8.19.0209, a desembargadora em atenção ao princípio da eventualidade, afirma que, ainda que se entenda ter sido auferido benefício, indevida a cobrança de taxa condominial, devendo ser calculadas as despesas realizadas pela autora, rateadas pelos moradores da região. Aduz que a taxa condominial não corresponde aos gastos realizados pela ré, conclui ementa:
APELAÇÃO CÍVEL. COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÕES. ASSOCIAÇÃO DE MORADORES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.RECURSOS DOS RÉUS.PROPRIETÁRIOS DE IMÓVEIS QUE NÃO ADERIRAM À ASSOCIAÇÃO DE MORADORES NÃO ESTÃO OBRIGADOS AO PAGAMENTO COMPULSÓRIO DE QUALQUER CONTRIBUI-ÇÃO.PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DO STJ. PROVIMENTO DO RECURSO. (0022139-18.2008.8.19.0209 – APELACAO – 1ª Ementa – DES. NORMA SUELY – Julgamento: 11/03/2010 – OITAVA CAMARA CIVEL) [g.n.]
De acordo com o julgado acima, entendeu-se que nesse caso descabe a cobrança de contribuições impostas por associação de moradores, proprietários não associados que não aderiram ao ato que instituiu o encargo. O pagamento de mensalidade à associação depende da livre e espontânea vontade do cidadão em associar-se. É preceito constitucional que ninguém está obrigado a associar-se ou manter-se associado.
Sobre o tema, o Ministro Edson Fachin A G REG. No Recurso extraordinário com Agravo Pará nº 979.728, o ministro julgou com fundamento no artigo 102, III, a, do permissivo constitucional, aduz-se ofensa ao artigo 5º, XX, XXV, LIV e LV, da Constituição Federal, por violação da garantia de não obrigatoriedade de permanecer associado, e dos princípios da ampla defesa, do devido processo legal e do contraditório, além de alegar negativa de prestação jurisdicional, conclui ementa:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. INTERPOSIÇÃO EM 16.12.2016. ADMINISTRATIVO. COBRANÇA DE TAXAS CONDOMINIAIS. PRELIMINAR DE REPERCUSSÃO GERAL. AUSÊNCIA.
1.Nos termos da orientação firmada nesta Corte, cabe ao recorrente demonstrar de maneira formal e fundamentada a existência de repercussão geral da matéria constitucional em debate no recurso extraordinário, o que não ocorreu no caso em exame. Mesmo em caso de repercussão geral presumida ou reconhecida em outro recurso, é ônus do recorrente a demonstração da existência desse requisito.
2. Agravo regimental a que se nega provimento, com previsão de aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC. Nos termos do artigo 85, § 11, CPC, majoro em ¼ (um quarto) a verba honorária fixada anteriormente, devendo ser observados os §§ 2º e 3º do mesmo dispositivo.
No recurso extraordinário acima, o ministro com fundamento no artigo 102, III, a, do permissivo constitucional, aduz-se ofensa ao artigo 5º, XX, XXV, LIV e LV, da Constituição Federal, por violação da garantia de não obrigatoriedade de permanecer associado, e dos princípios da ampla defesa, do devido processo legal e do contraditório, além de alegar negativa de prestação jurisdicional.
As jurisprudências apresentadas e analisadas, do ponto de vista do STF, moradores de loteamentos fechados que não pagam taxas “condominiais” são beneficiados pelo esforço financeiro daqueles que honram regularmente seus encargos sociais. Existe, nesse caso específico, evidência de enriquecimento ilícito de uns em detrimento de outros. Enquanto que outro julgado entendeu ofensa à Constituição Federal, conforme o art.5º onde se encontra a violação da garantia do morador não ser obrigado a associar-se ou permanecer associado.
O tema desta pesquisa trata-se de associação de moradores: possibilidade ou não da obrigatoriedade da cobrança de “taxas associativas sendo que a problemática levantada foi a possibilidade ou não de imposição da cobrança de “taxas associativas” em associação de moradores.
A hipótese confirmada neste estudo foi que, o pagamento de taxas mensais não pode ser imposto, em especial por conta do princípio da liberdade associativa, tanto aos novos como aos antigos moradores, já que nenhum indivíduo é obrigado a associar-se ou permanecer associado.
Respondendo aos objetivos específicos, conclui-se que com o crescimento da população e das cidades construiu-se edifícios considerados de propriedade exclusiva e com isso surgiu a necessidade de se criar uma disciplina jurídica para que de fato o proprietário ou a quem interessar adquirir o direito de propriedade.
As pessoas se organizam formando um condomínio de fato ou atípico e se deparam com despesas que devem ser bancadas por toda coletividade que se beneficia dos serviços prestados por aquela comunidade. Entretanto, tem-se enfrentado oposição a este rateio com base no inciso XX, do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, que ordena que “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou permanecer associado”.
A liberdade plena de associação que é atribuída ao indivíduo em sede constitucional constitui uma espécie de cláusula geral da tutela da pessoa humana, o que implica em desenvolvimento de sua personalidade. É garantida no artigo 5º, incisos XVII e XX, da Constituição Federal. Nesse sentido, de acordo com análise das jurisprudências neste estudo, conclui-se que, sendo livre a escolha e a própria adesão a associações, não pode existir cobrança a ser realizada por quem nunca foi entidade livremente escolhida para associação.
É importante destacar que a liberdade de associação na modalidade criação de associação, conforme (art. 5°, inc. XVII CF/88), é que se encontram limites no próprio texto constitucional, e, muito embora não existam direitos absolutos no texto constitucional, é de se ressaltar, com clareza que a liberdade de associação enquanto direito de livremente vincular-se e desvincular-se de associação (art. 5°, inc. XX CF/88) ainda não apresentou limitações explicáveis.
Conforme já se manifestaram os tribunais que possuem interesse na matéria, como por exemplo, TSJ, STF; o citado direito constitucional de livre associação e o dever de contribuir com a divisão das despesas referentes ao imóvel não são conflitantes, são independentes. Isso porque a obrigatoriedade de contribuição é procedente das limitações impostas ao direito de propriedade, ou seja, é uma obrigação inerente àquela propriedade. Isso, portanto, torna impossível que alguns moradores se recusem a arcar com despesas comuns, sob pena de ofensa ao dever jurídico de respeito coletivo, o que não se relaciona com estar associado ou não.
É essencial deixar registrado que, de acordo com jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, as taxas de manutenção das associações de moradores não podem mais ser igualadas às taxas de condomínio e, deste modo, não são mais exigíveis de quem não é associado.
Os resultados apontaram que, do ponto de vista do princípio constitucional, não há como se escapar do dever de contribuir com as despesas comuns. Apesar de ninguém poder ser obrigado a associar-se ou a permanecer associado, conforme (art. 5º, XVII, da CR/88), não há direito individual absoluto ou ilimitado. No caso em questão, o limite à liberdade de associação se encontra, precisamente, no dever de probidade, na vedação ao enriquecimento sem causa, e porque não, no próprio objetivo de se construir uma sociedade baseada na ética e na solidariedade, conforme (art. 3º, I, CR/88).
Percebe-se, de imediato, que não é do vínculo associativo propriamente dito que surge a obrigatoriedade de contribuição na divisão das despesas. As associações são, na verdade, uma forma de administração de serviços comuns, ou seja, não é a associação que cria a despesa, mas sim a situação de fato já materializada, na qual se encontram as propriedades/lotes. Ou seja, a despesa tem como natureza o direito de propriedade.
Decisões importantes do STJ mostraram neste estudo que as taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou os que a elas não anuíram. Diante disso, entende-se que a imposição de tais cobranças fere, de forma clara, as garantias constitucionais da liberdade de associação e a proibição de se associar-se. Notou-se que a jurisprudência não pode ferir um princípio fundamental e constitucional; liberdade associativa conforme (art. 5º, XX, da CF). Ou seja, a compra de imóvel situado em loteamento fechado em data anterior à constituição da associação não pode impor a cobrança de encargos ao adquirente que não se associou nem a ela aderiu.
Desta forma, espera-se que esta pesquisa possa trazer à comunidade acadêmica e sociedade respostas ao questionamento decorrente da cobrança de taxas associativas em comunidades considerando-se o princípio da liberdade associativa. Espera-se também que este estudo possa tronar-se um instrumento incentivador para novas pesquisas sobre a temática em discussão e, verificar se houve ou não evolução no ordenamento jurídico brasileiro sobre cobrança de taxa associativa.
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