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Execução fiscal: afronta às garantias constitucionais do contribuinte?

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Agenda 05/11/2018 às 13:00

Critica-se o processo de cobrança da dívida ativa da fazenda pública em confronto com as garantias processuais constitucionais e seus reflexos no direito processual.

1. INTRODUÇÃO

O presente estudo tem como escopo fazer uma análise crítica ao processo de cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública em face das garantias constitucionais e dos seus reflexos no Direito Processual. O que se perquire, nesse vão de ideias, é demonstrar a (im)pertinência das prerrogativas processuais conferidas à Fazenda Pública em contraponto à extrema vulnerabilidade do particular, mormente frente ao poder de constrição que é próprio do ente estatal.

Entende-se como uma das garantias da Lei Maior a isonomia, que, aplicada ao Direito Processual, tem por finalidade garantir a verdadeira proteção da esfera jurídica do cidadão no processo, sendo uma forma de limitação do poder do Estado. Destarte, nenhuma das esferas estatais poderá, segundo o postulado em comento, estabelecer privilégios ou discriminações teratológicas no trato jurisdicional, sob pena de ferir seu núcleo axiológico essencial. É, portanto, mister que seja verificado se as prerrogativas atualmente aplicáveis à cobrança da dívida ativa das Fazendas Públicas se coadunam com a igualdade substancial ora reclamada.

Em franca colisão com o princípio da igualdade, exsurge o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, fundamento teórico das variadas vantagens processuais que fruem a Fazenda Pública. Segundo esse postulado básico do Direito Público, entende-se que o Poder Público é supremo, que todos os atos estatais têm a finalidade precípua de atender os interesses da coletividade, devendo, assim, sobrepor-se aos interesses individuais. Cumpre destacar que o aludido princípio não está presente de forma expressa na Carta Constitucional, trazendo apenas regras que implicam sua manifestação de forma concreta.

Tendo em vista a vasta amplitude do tema, o estudo ora apresentado se restringirá à abordagem das prerrogativas no plano da Execução Fiscal, uma espécie do gênero Processo de Execução. Aquela, trata-se de um processo de execução com fulcro na Certidão de Dívida Ativa (CDA), título executivo extrajudicial, para pagamento de quantia certa contra devedor solvente com legitimidade ativa exclusiva da Fazenda Pública.

Dentro desse processo de cobrança da dívida ativa, estão inseridos diversos privilégios processuais, dentre os quais vislumbram-se os prazos processuais diferenciados, a remessa necessária em decisões de primeiro grau proferidas contra o ente público, bem como a arrecadação dos créditos por meio de um processo satisfativo diferenciado, nos moldes da Lei nº 6.830/80.

Os meios de defesa processual permitidos ao Executado (particular) são extremamente restritos, em conformidade com a execução ordinária. Ambas, a execução fiscal e a ordinária, possuem, como principal instrumento de defesa, os embargos à execução, que tem como finalidade desconstituir o título executivo ou revisar o valor nele contido, com natureza jurídica de processo de conhecimento.

Diante de tamanha restrição, consolidou-se o entendimento de que é cabível a apresentação da exceção de pré-executividade, que consiste em uma peça processual concebida por construção doutrinária, com conteúdo restrito às matérias que possam ser reconhecidas ex officio pelo juiz e não demandem dilação probatória, isto é, cujo direito possa ser de plano documentalmente demonstrado.

Em contraste com o processo de Execução Fiscal, surge a figura da Execução contra o Poder Público. O regime jurídico de direito processual público das ações de execução por quantia certa contra a Fazenda é especial, visto que os bens públicos, no âmbito processual, são impenhoráveis, não sendo possível a aplicação das regras comuns do processo executório.

O pagamento dos débitos do ente público pode ser realizado através do sistema de precatórios ou mediante requisição de pequeno valor. Ambos possuem a mesma natureza jurídica, diferenciando-se tão somente quanto ao valor do crédito e ao prazo para pagamento, sendo o primeiro gênero que possui três espécies: requisição de pequeno valor (RPV), precatórios comuns e precatórios de natureza alimentícia.

O precatório, em sentido amplo, pode ser entendido como o documento que exprime uma requisição expedida pelo Presidente dos Tribunais, fruto de uma decisão judicial condenatória contra a Fazenda, para que o pagamento da dívida seja feito por meio de inclusão no orçamento pelo Poder Executivo.

Pelo exposto, resta indubitável a ampla gama de privilégios processuais que cercam a constrição quando direcionada pelas Fazendas contra o particular, em cenário absurdamente leonino se comparado com os parcos mecanismos postos à disposição do particular para perseguir seu crédito do Estado-devedor. Isto quer significar que se deve arguir se, na hipótese, o núcleo intangível das garantias concedidas pelo Poder Constituinte Originário, sobretudo aplicado ao processo, não foi completamente esvaziado.


2. EXECUÇÃO FISCAL

2.1 Cabimento: a certidão de dívida ativa

A execução fiscal é um procedimento diferenciado para cobrar uma determinada espécie de título executivo, a saber, a Certidão da Dívida Ativa. É dizer, toda Ação de Execução deverá ser fundada em um título executivo, judicial (CPC, art. 515) ou extrajudicial (CPC, art. 784), que consubstancia uma obrigação líquida, certa e exigível. Portanto, para que a pretensão executiva seja exercida pela Fazenda Pública, faz-se necessário que esta esteja baseada em uma Certidão de Dívida Ativa (CPC, art. 784, IX), que corresponde a um título executivo extrajudicial.

Todavia, a determinação de quais débitos redundam em dívida ativa não estar vinculada somente aos de natureza tributária, consoante disposição da própria art. 2º, caput, e § 1º, afirma ser dívida ativa qualquer valor de natureza tributária ou não, definido na Lei nº. 4.320/64, bem como qualquer valor cuja cobrança seja atribuída por lei às pessoas jurídicas de direito público. Isto posto, entende-se que para que um débito possua natureza de dívida ativa deverá haver previsão legal que o defina como tal, podendo ser inclusive de origem tributária.

A criação desse título (CDA) se dá após um procedimento administrativo, quando da verificação, pelo Ente Público, de um inadimplemento no qual são garantidos ao provável devedor a possibilidade de contraditório e ampla defesa na seara administrativa. Denegada ou ausente a impugnação, será produzido ao final um documento que consubstancia o direito creditício da Fazenda Pública, dotado de presunção juris tantum de liquidez e certeza.

Nota-se, porém, que a certidão da dívida ativa não se confunde com os títulos executivos advindos das relações privadas, a destacar pelo fato de que a produção destes últimos se dá por meio de uma decisão judicial condenatória ou com atuação conjunta do devedor. Por sua vez, a CDA é emitida de forma unilateral pelo Ente público competente, não havendo qualquer participação do devedor para tal ato, conforme os ditames do art. 201 do Código Tributário Nacional. Com propriedade, James Marins, explica que:

Nas obrigações de cunho civil ou comercial, para que o credor se ostente detentor de título executivo extrajudicial é preciso que tenha havido a participação expressa do obrigado na sua constituição, e que este documento reúna as condições necessárias à sua exequibilidade, isto é, liquidez, certeza e exigibilidade. (...) Não podendo o credor civil constituir unilateralmente o seu título, compete-lhe invocar a tutela jurisdicional do Estado, de modo a que lhe seja reconhecida pelo Estado-juiz a certeza, liquidez e exigibilidade de seu crédito, tornando-o apto para a cobrança executiva a partir, então, da corporificação de um título executivo judicial. (...) na obrigação de natureza tributária, a administração pode formalizar unilateralmente o título executivo que aparelhará a execução forçada judicial. (MARINS, James. Princípios fundamentais do direito processual tributário. São Paulo: Dialética, 1998. p. 24.)

Assim sendo, por se tratar de um documento que goza de presunção legal de liquidez e certeza, bem como ser apto a ensejar a interferência de forma abrupta na esfera patrimonial do devedor, a CDA possui requisitos vitais para sua regularidade, que estão descritos no art. 2º, § 5º, da Lei nº 6.830/80, para que conste de forma inequívoca o débito e o titular deste.

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Descumpridos tais requisitos, o título queda-se maculado, sendo cabível ao exequente a possibilidade de emendar ou substituí-lo. Contudo, determina o Superior Tribunal de Justiça, corroborando a inteligência do art. 2º, § 8º, da Lei de Execução Fiscal, que o momento processual limite para alteração da certidão da dívida ativa é a decisão nos embargos, como se pode verificar no enunciado da Súmula 391, in verbis: “A Fazenda Pública pode substituir a certidão de dívida ativa (CDA) até a prolação da sentença de embargos, quando se tratar de correção de erro material ou formal, vedada a modificação do sujeito passivo da execução”. É dizer, da súmula supracitada depreende-se que a sentença dos embargos à execução é o termo fatal para substituir ou emendar o título executivo em casos de vícios contidos neste.

2.2 Legitimidade ativa e passiva

Para melhor compreensão da legitimação ativa no processo de execução fiscal, faz-se essencial discernir o conceito de Fazenda Pública, uma vez que esta, sempre, figurará no polo ativo da ação em comento.

Fazenda Pública é uma terminologia adotada para designar a atuação do Estado em juízo, ou ente público em juízo, que compreende as pessoas jurídicas de direito público. Nesse sentido aduz José dos Santos Carvalho Filho:

Em algumas espécies de demanda, as pessoas de direito público têm sido nominadas de Fazenda Pública, e daí expressões decorrentes, como Fazenda Federal, Fazenda Estadual e Fazenda Municipal. Trata-se de mera praxe forense, usualmente explicada pelo fato de que o dispêndio com a demanda é debitado ao Erário da respectiva pessoa. Entretanto, Fazenda Pública igualmente não é pessoa jurídica, de modo que, encontrando-se tal referência no processo, deverá ela ser interpretada como indicativa de que a parte é a União, o Estado, o Município e, enfim, a pessoa jurídica a que se referir a Fazenda. (CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 22. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 1044.)

Deste modo, estão abrangidos no conceito de Fazenda Pública a União, Estados, Distrito Federal, Municípios e suas respectivas autarquias, fundações públicas de direito público e agências reguladoras. São acrescidos a esse rol os conselhos de fiscalização profissional, ainda que dotados de personalidade jurídica de direito privado, segundo determina a Lei nº 9.649/98, em seu art. 58, § 2º. O Tribunal Supremo, na ADIN 1.717-6, reconheceu que essas entidades possuem natureza jurídica de direito público, gozando, portanto, dos benefícios de Fazenda Pública:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS. 1. Estando prejudicada a Ação, quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, a Ação Direta é julgada procedente, quanto ao mais, declarando-se a inconstitucionalidade do "caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo art. 58. 2. Isso porque a interpretação conjugada dos artigos 5º, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre com os dispositivos impugnados. 3. Decisão unânime. (STF - ADI: 1717 DF, Relator: SYDNEY SANCHES, Data de Julgamento: 07/11/2002, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 28-03-2003 PP-00061 EMENT VOL-02104-01 PP-00149)

Quanto às empresas públicas e sociedades de economia mista, embora façam parte da Administração Pública Indireta, em regra, não se enquadram à concepção de Fazenda Pública, pois que revestem a natureza jurídica de direito privado. Contudo, o entendimento do STF é que, quando se tratar de empresa pública que detenha o monopólio da atividade prestadora de serviço público e não explore atividade econômica, serão consideradas Fazenda Pública, sendo contempladas com todos os privilégios inerentes:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS. IMPENHORABILIDADE DE SEUS BENS, RENDAS E SERVIÇOS. RECEPÇÃO DO ARTIGO 12 DO DECRETO-LEI Nº 509/69. EXECUÇÃO.OBSERVÂNCIA DO REGIME DE PRECATÓRIO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. À empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, pessoa jurídica equiparada à Fazenda Pública, é aplicável o privilégio da impenhorabilidade de seus bens, rendas e serviços. Recepção do artigo 12 do Decreto-lei nº 509/69 e não-incidência da restrição contida no artigo 173, § 1º, da Constituição Federal, que submete a empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica ao regime próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias. 2. Empresa pública que não exerce atividade econômica e presta serviço público da competência da União Federal e por ela mantido. Execução. Observância ao regime de precatório, sob pena de vulneração do disposto no artigo 100 da Constituição Federal. Recurso extraordinário conhecido e provido. (STF - RE: 220906 DF, Relator: Min. MAURÍCIO CORRÊA, Data de Julgamento: 16/11/2000, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 14-11-2002 PP-00015 EMENT VOL-02091-03 PP-00430).

Logo, os entes que perfazem a Fazenda Pública possuem autorização para cobrar débitos por meio de execução fiscal. Nesses casos, são legitimados ativos para a execução do crédito aqueles competentes para criá-los, ressalvadas as hipóteses de delegação de competência para a efetiva cobrança, que pode ocorrer entre a Fazenda Pública e entidades da Administração Indireta.

No tocante à legitimidade passiva em sede de execução fiscal, seguirá a mesma regra adotada pelo CPC, no art. 779. Isto é, figurará como réu da execução o devedor, seus sucessores, o garantidor ou responsável, o espólio e a massa falida. O legitimado passivo deve constar de forma expressa na CDA, conforme aduz o art. 2º, § 5º, inciso I, e art. 4º da Lei de Execução Fiscal.

Indispensável mencionar a ocorrência do redirecionamento da execução fiscal, tornando um terceiro, responsável direto, executado no lugar do devedor principal, quando demonstrada a impossibilidade de adimplemento da obrigação por parte deste último. Insta salientar que o nome do responsável tributário não precisa constar no título executivo.

Sobre esse assunto ilustra o clássico julgado do Superior Tribunal de Justiça:

EXECUÇÃO FISCAL - RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA - SUCESSÃO - CERTIDÃO - DESNECESSIDADE - NOME DO SOCIO OU DA FIRMA SUCESSORA. O ADQUIRENTE DE FUNDO DE COMERCIO OU ESTABELECIMENTO COMERCIAL, INDUSTRIAL OU PROFISSIONAL QUE CONTINUAR A RESPECTIVA EXPLORAÇÃO RESPONDE INTEGRALMENTE PELOS TRIBUTOS RELATIVOS AO FUNDO OU ESTABELECIMENTO ADQUIRIDO SE O ALIENANTE CESSAR A EXPLORAÇÃO DO COMERCIO, INDUSTRIA OU ATIVIDADE. COMPROVADA, NO CASO, A SUCESSÃO, A DISSOLUÇÃO IRREGULAR, A RESPONSABILIDADE DA EMBARGANTE E A RESPONSABILIDADE PESSOAL DE SEU SOCIO-GERENTE, ANTIGO SOCIO DA EMPRESA ADQUIRIDA. DESNECESSARIO CONSTAR DA CERTIDÃO, O NOME DO SOCIO OU DA FIRMA SUCESSORA. PRECEDENTES DESTE COLENDO TRIBUNAL. RECURSO PROVIDO.(STJ - REsp: 36540 MG 1993/0018468-7, Relator: Ministro GARCIA VIEIRA, Data de Julgamento: 08/09/1993, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 04.10.1993 p. 20524 RSTJ vol. 52 p. 216).

Em casos de dissolução irregular da sociedade devedora, o Superior Tribunal de Justiça permite que, desde já, seja redirecionada a execução para o sócio-gerente, conforme o verbete 435, in verbis: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”.

Nesse caso, embora o sócio-gerente ao qual a execução será redirecionada não seja o devedor, nem tampouco parte da relação obrigacional jurídico-tributária, ele ingressa de maneira automática no polo passivo da execução sem direito a contraditório, sobretudo porque o redirecionamento não se confunde com o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, previsto nos artigos 133 a 137 do CPC.

2.3 Procedimento

Assim como qualquer processo judicial, a execução fiscal é inaugurada por meio de uma petição inicial, instruída por seu respectivo título (CDA), documento fundamental para a admissibilidade da demanda.

Após o juízo de admissibilidade, a LEF, em seu art. 7º, dispõe que o despacho que deferir a inicial ordenará a citação, eventual penhora, arresto, registro de penhora ou arresto e avaliação de bens do citado.

A princípio, é possível verificar importante distinção em relação ao ato citatório do procedimento geral da execução de quantia de título executivo extrajudicial, pois que o propósito deste é o pagamento da dívida em três dias ou oposição de embargos no prazo legal sem qualquer garantia em juízo (art. 914, CPC).

No entanto, a citação na execução fiscal é para que o executado salde a dívida em cinco dias ou apresente garantia para impedir o avanço dos atos executórios previstos no art. 11 da Lei nº 6.830/80, bem como para possibilitar a oposição de embargos.

Destaca-se que a modalidade de citação adotada pela Lei de Execução Fiscal é a postal, com o intuito de tornar o processo mais célere. Contudo, excepcionalmente, a modalidade ficta é admissível nesse procedimento, conforme enunciado de súmula editada pelo STJ: “Súmula 414 - A citação por edital na execução fiscal é cabível quando frustradas as demais modalidades”.

Quanto à comunicação dos demais atos processuais, a Fazenda Pública será intimada pessoalmente com vista dos autos, de acordo com o que determina o art. 25 da LEF, em consonância com o previsto no art. 183 do CPC, que determina que o início dos prazos para a manifestação da Administração Pública é a partir da sua intimação pessoal. Desta feita, verifica-se um regramento que consagra um benefício processual ao Ente Público.

Na ocasião em que a Fazenda Pública figure como exequente, a penhora recairá, em primeiro momento, sobre bens indicados pelo próprio ente, e apenas será dada ciência ao executado.

A Lei de Execução Fiscal trouxe uma ordem preferencial de realização da penhora, estabelecida no art. 11, diferindo da regra prevista no artigo 835 do Código de Processo Civil. Apesar de tal previsão legal, o executado poderá demonstrar que o meio executivo por ele apresentado será menos danoso e não prejudicará a satisfação do crédito.

Tendo em vista que o principal meio executivo para o fiel cumprimento da obrigação é o dinheiro, é admitido o uso da penhora online, isto é, a constrição judicial de aplicações financeiras por meio de sistema eletrônico. Tal mecanismo encontra guarida no art. 854 do CPC, sendo, contudo, limitado ao valor exequendo.

A princípio, ocorrerá uma indisponibilidade do montante devido, sem o conhecimento antecipado do executado. Efetivado o bloqueio, o réu será intimado para manifestação, no prazo de cinco dias, podendo alegar eventual indisponibilidade excessiva ou impenhorabilidade da quantia. Denegada a manifestação, ou na ausência desta, ocorrerá a conversão da importância bloqueada em penhora, devendo o executado ser intimado para ciência deste ato.

No tocante aos mecanismos de defesa do executado, os embargos, indubitavelmente, é o meio fundamental, que está apontado no art. 16 da LEF, com prazo de trinta dias para sua interposição. Constata-se, todavia, que existem três formas de contagem do termo para apresentação dos embargos à execução fiscal.

Conforme os arts. 9º e 16 da Lei nº 6.830/80, verifica-se que o prazo poderá ser computado das seguintes formas: quando o executado garante a execução, conta-se do aludido depósito trinta dias subsequentes; da juntada da prova da fiança bancária contratada pelo executado; a partir da intimação da penhora, isto é, do efetivo cumprimento do mandado, e não da juntada deste aos autos.

O Superior Tribunal de Justiça proferiu diversos julgados acerca das modalidades de contagem do prazo para embargos, nestes termos:

PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AOS ART. 165, 458 E 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. EMBARGOS à EXECUÇÃO FISCAL. PRAZO. TERMO INICIAL. DATA EM QUE FOI REALIZADO O DEPÓSITO EM DINHEIRO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, DESPROVIDO. (REsp 1062537 RJ 2008/0076577-0, Orgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA, Publicação DJe 01/07/2008, Julgamento 24 de Junho de 2008, Relator Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI). (Original não grifado).

PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE DO ACÓRDÃO POR FALTA DE MOTIVAÇÃO. ARTS. 131, 165 E 458, II, DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. TERMO A QUO DO PRAZO PARA EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. GARANTIA DO JUÍZO MEDIANTE PENHORA. JUNTADA DO MANDADO. RECURSO REPETITIVO. ART. 543-C DO CPC.1. Não há nulidade no julgamento se a fundamentação, embora concisa, for suficiente para a solução da demanda.2. Não se conhece de Recurso Especial em relação a ofensa a art. 535 do CPC quando a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Aplicação, por analogia, da Súmula 284/STF.3. O termo inicial para a oposição dos Embargos à Execução Fiscal é a data da efetiva intimação da penhora, e não a da juntada aos autos do mandado cumprido. 4. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Processo REsp 1112416 MG 2009/0045613-2 Orgão Julgador S1 - PRIMEIRA SEÇÃO Publicação DJe 09/09/2009 Julgamento 27 de Maio de 2009 Relator Ministro HERMAN BENJAMIN). (Original não grifado)

A lei que rege o procedimento de Execução Fiscal prevê a garantia em juízo como requisito de admissibilidade dos embargos. Entretanto, sobreveio celeuma doutrinária sobre a aplicabilidade dessa regra, uma vez que desde o ano de 2006, com o advento da Lei n. 11.382, a oferta de garantia deixou de ser um requisito para propositura dos embargos no processo de execução ordinário.

Não obstante, jurisprudência e doutrina majoritárias superaram a controvérsia, fixando que permanece indispensável ao oferecimento dos embargos a garantia do juízo nos termos da LEF. O fundamento é que tanto a Lei n. 11.382/06, que alterou a regra do CPC/73, como o atual Código de Processo Civil são leis gerais posteriores, não afetando, pois, as normas especiais que regulamentam a execução pró-fazendária. Nesse sentido, o julgado do Superior Tribunal de Justiça que abaixo colaciona-se:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. APLICABILIDADE DO ART. 739-A, §1º, DO CPC ÀS EXECUÇÕES FISCAIS. NECESSIDADE DE GARANTIA DA EXECUÇÃO E ANÁLISE DO JUIZ A RESPEITO DA RELEVÂNCIA DA ARGUMENTAÇÃO (FUMUS BONI JURIS) E DA OCORRÊNCIA DE GRAVE DANO DE DIFÍCIL OU INCERTA REPARAÇÃO (PERICULUM IN MORA) PARA A CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO AOS EMBARGOS DO DEVEDOR OPOSTOS EM EXECUÇÃO FISCAL. (...) 6. Em atenção ao princípio da especialidade da LEF, mantido com a reforma do CPC/73, a nova redação do art. 736, do CPC dada pela Lei n. 11.382/2006 - artigo que dispensa a garantia como condicionante dos embargos - não se aplica às execuções fiscais diante da presença de dispositivo específico, qual seja o art. 16, §1º da Lei n. 6.830/80, que exige expressamente a garantia para a apresentação dos embargos à execução fiscal. 7. Muito embora por fundamentos variados - ora fazendo uso da interpretação sistemática da LEF e do CPC/73, ora trilhando o inovador caminho da teoria do "Diálogo das Fontes", ora utilizando-se de interpretação histórica dos dispositivos (o que se faz agora) - essa conclusão tem sido a alcançada pela jurisprudência predominante, conforme ressoam os seguintes precedentes de ambas as Turmas deste Superior Tribunal de Justiça (...). (REsp 1272827 / PE Relator(a) Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES (1141) Órgão Julgador S1 - PRIMEIRA SEÇÃO Data do Julgamento 22/05/2013 Data da Publicação/Fonte DJe 31/05/2013 RDTAPET vol. 38 p. 227 RTFP vol. 114 p. 373).

Nesse passo, torna-se relevante a análise do efeito suspensivo em sede de embargos, posto que a Lei de Execução Fiscal não especifica sobre essa matéria. Ante a ausência de regramento em lei especial, aplica-se a regra geral, qual seja, a prevista no art. 919, caput, e § 1º, do CPC.

De acordo com a inteligência do dispositivo supra, os embargos à execução não detêm, de forma automática, o efeito suspensivo. Porém, este poderá ser admitido pelo juízo, se requerido pelo embargante e por ele demonstrados os requisitos gerais da tutela provisória de urgência, isto é, o fumus boni iuris e o periculum in mora, para que sejam assegurados seus direitos na ação de execução pendente. Nesse sentido, destaca-se o seguinte precedente:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. REQUISITOS PARA A ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO AOS EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). A oposição de embargos à execução fiscal depois da penhora de bens do executado não suspende automaticamente os atos executivos, fazendo-se necessário que o embargante demonstre a relevância de seus argumentos ("fumus boni juris") e que o prosseguimento da execução poderá lhe causar dano de difícil ou de incerta reparação ("periculum in mora"). Com efeito, as regras da execução fiscal não se incompatibilizam com o art. 739-A do CPC/1973, que condiciona a atribuição de efeitos suspensivos aos embargos do devedor ao cumprimento de três requisitos: apresentação de garantia, verificação pelo juiz da relevância da fundamentação e perigo de dano irreparável ou de difícil reparação. (...)a conclusão acima exposta tem sido adotada predominantemente no STJ. Saliente-se, por oportuno, que, em atenção ao princípio da especialidade da LEF, mantido com a reforma do CPC/1973, a nova redação do art. 736 do CPC, dada pela Lei 11.382/2006 - artigo que dispensa a garantia como condicionante dos embargos -, não se aplica às execuções fiscais, haja vista a existência de dispositivo específico, qual seja, o art. 16, § 1º, da LEF, que exige expressamente a garantia para a admissão de embargos à execução fiscal. Precedentes citados: AgRg no Ag 1.381.229-PR, Primeira Turma, DJe de 2/2/2012; e AgRg nos EDcl no Ag 1.389.866-PR, Segunda Turma, DJe de DJe 21/9/2011. REsp 1.272.827-PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22/5/2013. Informativo nº 0219. Período: 23 a 27 de agosto de 2004. (Original não grifado).

Por fim, cumpre salientar que os embargos têm natureza de ação, não sendo apenas um meio de defesa. Será, portanto, distribuído por dependência a um processo de execução fiscal já existente, sendo cabível alegação de qualquer matéria útil à sua defesa.

Superado o tema dos embargos, relevante abordar, ainda que de forma sucinta, os demais meios de defesa cabíveis nesse procedimento executivo. De plano, menciona-se que a exceção de pré-executividade é produto do ilustre doutrinador Pontes de Miranda, que passou a ser admitida pela jurisprudência pátria para que o executado possua a oportunidade de alegar questões de ordem pública, conhecíveis de ofício pelo magistrado, desde que sejam matérias que não demandem dilação probatória, isto é, que possam ser demonstradas documentalmente.

Para eliminar qualquer imprecisão sobre o cabimento da exceção de pré-executividade no processo de execução fiscal, o STJ teceu a Súmula 393, cujo enunciado reza que “A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória”.

A peça defensiva em exame traz consigo grandes benefícios ao executado, porquanto, para sua apresentação em juízo inexiste o requisito da garantia, que é imprescindível aos embargos. Além do mais, não está sujeita a prazo, visto que veicula questões de ordem pública que não se convalidam com o tempo.

Outro meio concedido ao executado para resguardar seus direitos em face de uma execução fiscal é através de ações autônomas, tais quais a anulatória. Tais ações não têm caráter de defesa direta, mas possuem resultado equivalente, pois atacam a existência do débito fiscal e, inexistindo este, extingue-se o processo de cobrança executivo.

Finalmente, por força do art. 40 da Lei nº 6.830/80, ocorrerá a suspensão do processo quando não localizado o devedor ou bens passíveis de penhora, proporcionando à Fazenda Pública o prazo de um ano para rastreio do executado ou de seus bens. Transcorrido esse período, arquiva-se os autos e inicia-se o cômputo do prazo da prescrição intercorrente. O Superior Tribunal de Justiça editou súmula nesse sentindo: “Súmula 314 - Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal intercorrente”.

Sobre a autora
Mila Duarte Queiroz

Advogada Tributarista.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

QUEIROZ, Mila Duarte. Execução fiscal: afronta às garantias constitucionais do contribuinte?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5605, 5 nov. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/69845. Acesso em: 22 dez. 2024.

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