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O CONTEÚDO LOCAL NAS LICITAÇÕES: DA VIOLAÇÃO À IGUALDADE E DO INCENTIVO À PRÁTICA COLUSIVA

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Agenda 31/10/2018 às 17:38

[1] “Fica evidenciado que o legislador buscou conferir maior instrumentalidade à contratação pública, funcionalizando-a para que políticas públicas possam ser implementadas com base no poder de compra do Estado” (ROXO, Gustavo Henrique Sperandio. Compras públicas como instrumento para o desenvolvimento econômico nacional: novidades e questionamentos oriundos das alterações promovidas pela Lei n. 12.349/2010. In: Revista de Direito da Administração Pública, Universidade Federal Fluminense, v.2, n. 1, jan/jun 2016, p. 157).

[2] OCDE (2012).

[3] “Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo”. (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, 807).

[4] “Seu fundamento, bem assim o dos concursos públicos, encontra-se no princípio republicano. Dele decorre, na abolição de quaisquer privilégios, a garantia formal da igualdade de oportunidade de acesso de todos, não só às contratações que pretenda a Administração avençar mas, também, aos cargos e funções públicas. Daí por que a escolha do licitante com o qual a Administração há de contratar deve ser, na República, a melhor escolha ou a escolha do melhor contratante” (GRAU, Eros Roberto. Licitação e contrato administrativo: estudos sobre a interpretação da lei. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 14).

[5] “Um dos princípios centrais do modelo licitatório é a isonomia. Todo certame visa oferecer aos agentes econômicos as mesmas oportunidades de acesso a mercados públicos, de sorte a consagrar o ideal de Estado democrático e republicano, bem como os princípios da ordem econômica, mormemte a livre iniciativa” (MARRARA, Thiago; CAMPOS, Carolina Silva. Licitações internacionais: regime jurídico e óbices à abertura do mercado público brasileiro a empresas estrangeiras. In: LIMA, Cíntia Rosa Pereira de et al. O direito brasileiro em evolução: estudos em homenagem à Faculdade de Direito de Ribeirão Preto. São Paulo: Almedina, 2017, p. 617).

[6] Artigo 3º, § 1º, II, da Lei n. 8.666/1993, quanto à impossibilidade de tratamento diferenciado de natureza comercial, legal, trabalhista, previdenciária ou qualquer outra. Coaduna-se com esse entendimento a afirmação de que “[a]quele que se dispuser a analisar a licitação a partir da perspectiva da participação de estrangeiros verá que a primeira diretriz acerca do tema é a previsão da igualdade de tratamento a ser dispensado àqueles e às empresas nacionais”. (MOREIRA, Egon Bockmann; GUIMARÃES, Bernardo Strobel; TORGAL, Lino. Licitação internacional e empresa estrangeira: os cenários brasileiro e europeu. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, vol. 269, p. 67-106, maio/ago. 2015, p. 72)

A despeito da previsão mencionada, o § 12 do referido artigo dispõe sobre a viabilidade de restrição de licitações a bens e serviços nacionais e produzidos de acordo com o processo produtivo básico legal, para os casos de implantação, manutenção e ao aperfeiçoamento dos sistemas de tecnologia de informação e comunicação, considerados estratégicos em ato do Poder Executivo federal. Entretanto, tal matéria não será abordada no presente artigo, apesar de parte das conclusões do presente trabalho poder ser utilizada para rechaçar essa previsão.

[7] Essas nuances são denominadas de “competição-pressuposto” e “competição-disputa”, respectivamente (GRAU, Eros Roberto. Licitação e contrato administrativo: estudos sobre a interpretação da lei. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 15). Ademais, “[a] igualdade entre os licitantes é o princípio primordial da licitação – previsto na própria Constituição da República (art. 37, XXI) –, pois não pode haver procedimento seletivo com discriminação entre participantes, ou com cláusulas do instrumento convocatório que afastem eventuais proponentes qualificados ou os desnivelem no julgamento (art. 3º, § 1º)” (MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo. 12ª ed,  atual. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 28).

[8] Destaque-se que o inciso XXI, do artigo 37 inicia-se com a expressão “ressalvados os casos especificados na legislação […]”.

[9] “Vale dizer: não é admissível que, a pretexto de radical entronização do princípio da isonomia, sacrifique-se o interesse público. Nem o inverso é concebível: a entronização do princípio do interesse público em sacrifício da isonomia. Ambos, princípios do interesse público e princípio da isonomia, coexistem, completando-se e se conformando, um ao outro, na base do procedimento licitatório” (GRAU, Eros Roberto. Licitação e contrato administrativo: estudos sobre a interpretação da lei. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 15).

[10] Nesse aspecto, observa-se a margem de preferência na Lei Complementar n. 123, de 2006, por meio da qual verifica-se a implementação de uma política de fomento às microempresas e empresas de pequeno porte. A eventual mitigação da concorrência, nesse caso, tem contrapartida tem relação com à política de incentivos, em uma perspectiva dúplice: a) de estímulo ao surgimento de novas microempresas e empresas de pequeno porte, atraídas pela vantagem competitiva; b) de perenização do estatuto dessas empresas, uma vez que perderiam os benefícios de inúmeras ordens (inclusive de margem de preferência), caso deixassem de ser micro ou de pequeno porte.

[11] Há, também, a preferência decorrente da aplicação do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n. 13.146/2015), mas que não será abordada no presente trabalho.

[12] Até porque, “[e]m princípio, a vantajosidade buscada pela licitação é aquela puramente econômica. No entanto, pode-se admitir que a vantajosidade da futura contratação seja avaliada sob outros prismas, que não o puramente econômico [...]” (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 15ª ed. São Paulo: Dialética, 2012, p. 68). A concepção de puramente econômica, aqui, teria o sentido de economia imediata.

[13] Em destaque, as alterações iniciadas pela Lei n. 12.349/2010.

[14] Note-se que o conteúdo nacional não diz respeito à origem da empresa – se nacional ou estrangeira –, mas à origem do bem ou do produto.

[15] Difere-se do critério de desempate previsto no § 2º, do artigo 3º, da referida lei, que é genuìno e irrefutável, na conformidade da legislação pátria. Na realidade, o referido critério, de fato, é uma preferência diante de propostas iguais e não uma vinculação de uma política pública, por meio de discriminação de licitantes.

[16] Saliente-se que o conteúdo local mencionado no presente trabalho não tem relação com àquele previsto na Lei n. 13.019/2014, que estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil. Neste caso, a proximidade local com a administração pública é um critério que poderá ser considerado, por uma questão prática, para a contração, consoante o disposto nos § § 1º e 3º, do artigo 58 da mencionada lei.

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[17]  “[…] é relevante salientar que os critérios para a caracterização do produto manufaturado como nacional são aqueles previstos no art. 6º, XVII, da Lei n. 8.666/1993 e no art. 2º, IV, do Decreto n. 7.546/2011, ou seja, necessariamente o bem deve ser produzido em território nacional de acordo com o processo produtivo básico (PPB) ou com as regras de origem estabelecidas pelo Poder Executivo Federal, tendo como padrão mínimo os parâmetros estipulados no âmbito do Mercosul” (ROXO, Gustavo Henrique Sperandio. Compras públicas como instrumento para o desenvolvimento econômico nacional: novidades e questionamentos oriundos das alterações promovidas pela Lei n. 12.349/2010. In: Revista de Direito da Administração Pública, Universidade Federal Fluminense, v.2, n. 1, jan/jun 2016, p. 168).

[18] “[…] mesmo sob o pretexto de promover o desenvolvimento econômico nacional, nenhum órgão licitante poderá estabelecer margem de preferência aos produtos manufaturados e serviços nacionais se não houver um decreto editado pelo presidente que institua tal tratamento privilegiado. Por mais relevante que possa ser a proteção a determinados setores da economia nacional, é apenas do chefe do Poder Executivo a competência para expedir decretos e regulamentos para a fiel execução da lei, na forma do art. 84, IV da Constituição Federal” (ROXO, Gustavo Henrique Sperandio. Compras públicas como instrumento para o desenvolvimento econômico nacional: novidades e questionamentos oriundos das alterações promovidas pela Lei n. 12.349/2010. In: Revista de Direito da Administração Pública, Universidade Federal Fluminense, v.2, n. 1, jan/jun 2016, p. 165). No presente caso, fora editado o Decreto n. 7.546/2011, por meio do qual ficou regulamentada a disposição legal, bem como fora instituída a Comissão Interministerial de Compras Públicas (CI-CP).

[19] De acordo com o inciso I, do artigo 2º, do Decreto 7.546/2011.

[20] Na conformidade do inciso II, do artigo 2º, do Decreto 7.546/2011.

[21] Para os defensores dessa política,“[…] a utilização do poder de compra do Estado – quando alinhada a outras medidas de polìtica industrial de corte horizontal e vertical – pode direcionar a iniciativa privada nacional rumo a caminhos mais satisfatórios, tornando possível o alcance de transformações estruturais nas dinâmicas econômica e social da nação” (ROXO, Gustavo Henrique Sperandio. Compras públicas como instrumento para o desenvolvimento econômico nacional: novidades e questionamentos oriundos das alterações promovidas pela Lei n. 12.349/2010. In: Revista de Direito da Administração Pública, Universidade Federal Fluminense, v.2, n. 1, jan/jun 2016, p.  158)

[22] No Senado Federal, o projeto tinha a numeração originária PLS 559/2013.

[23] “O preceito magno da igualdade, como já tem sido assinalado, é norma voltada quer para o aplicador da lei quer para o próprio legislador. Deveras, não só perante a norma posta se nivelam os indivíduos, mas, a própria edição dela assujeita-se ao dever de dispensar tratamento equânime às pessoas” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3ª ed, 22ª tir. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 09).

[24] “É sempre possível desigualar entre categorias de pessoas, desde que haja uma razão prestante, aceitável, que não brigue com os valores consagrados no texto constitucional” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Princípio da isonomia: desequiparações proibidas e desequiparações permitidas. In: RTDP, São Paulo, Malheiros, n. 1, jan./mar. 1993, p. 81-82).

[25] “É inadmissível, perante a isonomia, discriminar pessoas ou situações ou coisas (o que resulta, em última instância, na discriminação de pessoas) mediante traço diferencial que não seja nelas mesmas residentes. Por isso, são incabíveis regimes diferentes determinados em vista de fator alheio a elas; quer dizer: que não seja extraído delas mesmas.

Em outras palavras: um fator neutro em relação às situações, coisas ou pessoas diferençadas é inidôneo para distingui-las. Então, não pode ser deferido aos magistrados ou aos advogados ou aos médicos que habitem em determinada região do País – só por isto – um tratamento mais favorável ou mais desfavorável juridicamente. Em suma, discriminação alguma pode ser feita entre eles, simplesmente em razão da área espacial em que estejam sediados” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3ª ed, 22ª tir. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 29-30).

[26] Em trabalho anterior à inovação legislativa, quando da supressão do artigo 171, da Constituição Federal, a doutrina pátria já entendeu que “[…] é claro a todas as luzes que a eliminação de um uma garantia assentada em elemento `subjetivo´ - a empresa em sua identidade nacional, como dantes definida – nada, absolutamente nada tem a ver com preferências assentadas sobre fatores de natureza `objetiva´, como os atinentes ao local onde se desenvolveu o produto ou o fato deste possuir maior valor agregado nacional, questões estas absolutamente estranhas à espécie de empresa que os ofertasse e independentes de sua tipologia […] Desde logo, salta aos olhos que leis podem estabelecer distinção entre situações e em face delas outorgar tratamentos específicos diversos, sem necessidade de que a Constituição a tanto as autorize. Basta que não ofendam os princípios e regras constitucionais”(MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Preferências em licitação para bens e serviços fabricados no Brasil e para empresas brasileiras de capital nacional. In: Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico (REDAE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 15, ago/set/out 2008, p. 3 e 5). Conquanto a teoria viabilizasse a hipótese de existência de preferências a produtos e bens nacionais, o desenho legislativo em análise – diferentemente do que ocorre no § 2º, do artigo 3º, da Lei n. 8666/1993 – compreende uma violação evidente ao princípio da igualdade ou isonomia.

[27] “Logo. o igual é intermediário entre o maior e o menor, mas o ganho e perda são respectivamente menores e maiores em sentidos contrários; maior quantidade do bem e menor quantidade do mal representam ganho, e o contrário é perda; e intermediário entre os dois é, como vimos, o igual, que dizemos ser justo.” (ARISTÓTELES. Ética a nicômaco. Tradução de Eudoro de Souza. São Paulo: Nova Cultural, 1991, p. 99). Assim, é injusto que o encargo exceda o intermediário entre o produto nacional e o estrangeiro.

[28] “Os primeiros (interesses públicos) são implementados na medida em que a licitação enseja acirrada competição entre os possíveis interessados, com a conseqüente obtenção, pelo Poder Público, de melhores preços e condições.  Os segundos (interesses privados) se vêm atendidos pois,com ela, abre-se para o particular a oportunidade de disputa igualitária com seus concorrentes, na busca de novos mercados” (SUNDFELD, Carlos Ari.  Licitação e contrato administrativo – de acordo com as leis n. 8.666/93 e n. 8.883/94.  São Paulo: Malheiros, 1994, p. 16).

[29] Isso, porquanto a lista dos produtos e serviços eleitos para se beneficiarem da política do conteúdo local é definida por agentes públicos, a partir de sua compreensão de desenvolvimento econômico nacional.

[30]Like the market, the legal system confronts the individual with the costs of his act but leaves the decision whether to incur those costs to him. Although heavier sanctions – penalties – are sometimes imposed […], normally this is done only when necessary to create the correct economic incentives. Similarly, injunctions are issued in lieu of awarding compensatory damages when we do not want people to bypass the market, because market transaction costs are lower than legal transaction costs, or when damages are impossible to measure or are otherwise inadequate as a remedy”. (POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law. 9ª ed. Nova Iorque: Aspen, 2014, p. 723)

[31]“We have seen that the ultimate question for decision in many lawsuits is what allocation of resources would maximize efficiency. The market normally decides this question, but it is given to the legal system to decide when the costs of a market determination would exceed those of a legal determination”. (POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law. 9ª ed. Nova Iorque: Aspen, 2014, p. 723)

[32]“That process creates a market for legislation in which legislators `sell´ legislative protection to those who can help their electoral prospects with money or votes” (POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law. 9ª ed. Nova Iorque: Aspen, 2014, p. 732).

[33] “[…] the legal process sometimes makes errors in applying substantive law. For example, the wrong party may be held liable, or the right party may be held liable but for the wrong amount. Errors distort incentives and impose a variety of costs on society” (COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Law and economics. 6a edição. Boston: Person, 2012, p. 385).

[34] “Governos podem simplesmente errar na alocação de recursos ou, ainda, efetivar medidas contraproducentes. A administração pública carece de informação e capacidade para efetivar as escolhas mais eficientes [...] Adicionalmente, é sustentado que o Estado tem uma desvantagem informacional em relação às empresas privadas vinculadas à política industrial. Nesse sentido, as empresas utilizam essa vantagem para extrair mais do que merecem, o que consistiria em um problema de risco moral (moral hazard)”. (ZIEBARTH, José Antonio Batista de Moura. Estado, políticas públicas e governança democrática: uma contribuição jurídica para a interface entre a política de concorrência e outras políticas públicas à luz de um novo modelo de intervenção estatal no Brasil. Dissertação de mestrado. São Paulo: USP, 2013, p. 53)

[35] Além da corrupção financeira corriqueira, existe uma outra, “na qual o objetivo do corruptor não é tanto o benefício financeiro, mas sim dominar o Estado para servir a seus próprios interesses. A consequência dessa corrupção é o Estado se transformar em um ente que não persegue o interesse público, mesmo enquanto regulador, porque está dominado pelo poder privado” (SALOMÃO FILHO, Calixto. Quarto e último encontro: poder econômico e corrupção. In: FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio et al (Org.). Poder econômico: direito, pobreza, violência, corrupção. Barueri: Manole, 2009, p. 186).

[36] “O atual monopólio, nos países subdesenvolvidos, ainda se comporta como o monopólio do período colonial: ele precisa do Estado para se proteger. Ele sabe que, no mundo, o jogo não é o da tecnologia pura, mas sim, o do poder. Esse monopólio não vai, portanto, se comportar como aquele monopólio criativo schumpeteriano. É essa a minha hipótese histórica” (SALOMÃO FILHO, Calixto. Quarto e último encontro: poder econômico e corrupção. In: FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio et al (Org.). Poder econômico: direito, pobreza, violência, corrupção. Barueri: Manole, 2009, p. 185). Considera-se, assim, o monopólio em sentido amplo.

[37] POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law. 9ª ed. Nova Iorque: Aspen, 2014, p. 732.

[38] Para além do ilícito concorrencial, previsto na Lei n. 12.529/2011, o ordenamento jurídico brasileiro ainda reconhece um tipo penal específico para o conluio em contratação pública, por meio do artigo 90, da Lei n. 8.666, de 1993 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos).

[39] O cartel em licitações é também denominado de bid rigging. “Bid rigging occurs when bidders agree among themselves to eliminate competition in the procurement process, thereby raising prices, lowering quality and/ or restricting supply […]Bid rigging deprives the public sector of genuine opportunities to achieve value for money and is, as such, a major risk to the effectiveness and integrity of public procurement procedures. The financial crisis of the last few years has added to the awareness of the importance of competition in public procurement to achieve value for money and of the need to combat collusive practices which may raise prices or lower quality of public purchases. In this context, the fight against bid rigging has become one of the priorities of competition authorities around the world” (ECONÔMICO, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento. Recommendation of the OECD Council on Fighting Bid Rigging in Public Procurement. Paris: OCDE, 2016). Não obstante, deve-se notar que “public procurement is an area where cartels are probably quite common and successful” (HEIMLER, Alberto. Cartels in Public Procurement. Journal of Competition Law & Economics, 8(4). Oxford: Oxford University Press, 2012, p. 851).

[40] Observa-se, no rol dos atributos que favorecem a prática anticoncorrencial: a) a existência de um pequeno número de empresas; b) o nível reduzido ou nulo de entradas no mercado; c) as condições quanto à oferta e à procura no mercado; d) as propostas recorrentes/licitações frequentes; e) a existência de associações comerciais ou de classe; f) a natureza dos produtos ou serviços idênticos ou simples; g) nível reduzido ou nulo de alternativas e h) o nível reduzido ou nulo de inovação tecnológica (ECONÔMICO, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento. Public Procurement – The Role of Competition Authorities in Promoting Competition. Paris: OCDE, 2008).

[41] O conjunto de firmas submetendo lances deve ser pequeno e estável, este último no sentido de não variação dos poucos participantes (PORTER; Robert H.; ZONA, J. Douglas. Detection of bid rigging in procurement auctions. Chicago: Journal of Political Economy, 1993, vol. 101, n. 3, p. 518-538).

[42] Note-se que, por vezes, as barreiras à entrada são erigidas ou incentivadas pelas empresas envolvidas na cartelização, através da conversão de parte do excedente do consumidor obtido pela comum prática de preços monopolistas para a manutenção da estrutura (ARAÚJO, Fernando. Introdução à Economia. 3ª. ed. Coimbra: Almedina, 2014). Isso pode ocorrer pela captura de agente regulador, ou mesmo pela prática de preços predatórios para afastar eventual entrante do mercado.

[43] ECONÔMICO, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento. Report on the nature and impact of hard core cartels and sanctions against cartels under national competition laws. Paris: OECD Press, 2002, p. 07.

[44] A transparência excessiva, com a divulgação de informações detalhadas da proposta vencedora do certame (e, por sua vez, dos beneficiários de determinada política), deve ser mitigada, já que isso permite a obtenção de informações pelos concorrentes, inclusive para a confirmação do cumprimento das condições do acordo do cartel (OCDE, 2008). No entanto, esse entendimento é passível de controvérsias no Brasil, na medida em que o princípio da publicidade rege as licitações, em função de um mandamento constitucional, verificado no caput do artigo 37. Sobre esse debate, verificar Ceccato (2017).

[45] Indaga-se, pois,“[…] a lei é feita para atender ao interesse de todos, ao interesse coletivo – aquilo que os norte-americanos chamam de republicanismo – ou a lei é direcionada para interesses menos alevantados, ou mais específicos a determinados grupos?” (FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Primeiro encontro: poder econômico o jogo e as regras. In: _______ et al (Org.). Poder econômico: direito, pobreza, violência, corrupção. Barueri: Manole, 2009, p. 02).

[46] Diferentemente do que ocorre na seara da Lei Complementar n. 123, de 2006, que dispõe, no artigo 49, de inúmeros mecanismos de válvulas de escape, os quais podem afastar a margem de preferência concedida às microempresas e empresas de pequeno porte, em atendimento à vantajosidade. Por via indireta, nota-se a defesa da inconstitucionalidade do dispositivo da margem de preferência prevista na Lei n. 8.666/1993, nos seguintes termos: “[…]seria inconstitucional estabelecer preferência de cunho absoluto, reservando a totalidade das contratações administrativas para ME e EPP. Isso significaria excluir a possibilidade de competição das empresas de maior porte e acarretariam severos prejuízos aos cofres públicos”. (MARÇAL, Justen Filho. O Estatuto da Microempresa e as licitações Públicas. 2ª ed. São Paulo: Dialética, 2007, p. 40). Estudo especializado acerca da questão da margem de preferência com base na Lei Complementar n. 123/2006 pode ser observado em Marrara e Recchia (2018).

[47] Afinal, a autoridade apenas pode revogar a licitação por motivo de interesse público, em razão de fato superveniente comprovado e suficiente para a justificação da conduta; não por margem de conteúdo local previamente disposto no ato convocatório.

[48] Em uma referência não específica, “[p]ode-se dizer que existe um consenso de que as condutas anticompetitivas que afetam diretamente o comércio internacional e o investimento devem ser declaradas ilegais em cada país que faz parte de um acordo internacional, cabendo a estes decretar ou emendar sua lei nacional para fazer valer tal premissa” (GABAN, Eduardo Molan; DOMINGUES, Juliana Oliveira. Direito antitruste: o combate aos cartéis. 2ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 218).

[49] Diante do exposto, para além da supressão referida, deve-se atentar que “[n]ão é possível, a nosso ver, seguir a proposta de rearticular o Direito público em torno da noção de política pública”, mas de uma concepção conjuntural, que abarque as relações entre a política, os atores sociais e econômicos, além dos valores da democracia, da soberania e o Estado brasileiro (BERCOVICI, Gilberto. Constituição econômica e desenvolvimento: uma literatura a partir da Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 63).

[50] Defende-se que “[...] deveriam ser incluídas proibições nos seguintes campos: i) cartéis internacionais que fixem preços ou dividam mercados; ii) boicotes, com o objetivo de excluir produtos estrangeiros; e iii) qualquer atividade com o propósito de excluir empresas estrangeiras e negar acesso aos mercados. Isso se daria, por exemplo, através de um acordo geral entre os países atuantes no comércio internacional, sendo promovido pelas entidades internacionais econômicas, por meio de organizações como a OMC e a OECD” (GABAN, Eduardo Molan; DOMINGUES, Juliana Oliveira. Direito antitruste: o combate aos cartéis. 2ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 218).

Sobre o autor
Allan Fuezi Barbosa

Mestrando em Direito da Concorrência e da Regulação pela Universidade de Lisboa, tendo realizado período sanduíche na Alma Mater Studiorum - Università di Bologna. Pós-Graduado em Direito Europeu pelo Instituto de Direito Europeu - Universidade de Lisboa. Pós-Graduado em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Graduado em Direito pela Universidade Católica do Salvador (UCSal) e em Administração pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Informações sobre o texto

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