O governador eleito do Rio de Janeiro, o advogado, ex-juiz federal e ex-fuzileiro naval, Wilson Witzel, declarou que traficantes armados de fuzis poderiam ser abatidos pelas forças de segurança, a fim de se restabelecer a soberania nacional em regiões cuja população residente teve sua cidadania usurpada e está submetida ao jugo de organizações criminosas.
Diante de tal declaração, que vai de encontro com o pensamento politicamente correto até há pouco tempo hegemônico, surgiram manifestações em oposição, por parte da grande imprensa e de autointitulados “especialistas”.
Primeiramente, causa espanto ouvir uma jornalista de uma grande rede de televisão, que notoriamente luta contra o direito do cidadão de bem de portar um revólver 38, dizer que um traficante portando um fuzil “não representa ameaça”.
Quanto aos ditos “especialistas”, que consideram a medida proposta por Witzel como ilegal, cumpre observar que não se pode considerar sociólogos, sem experiência efetiva em resolver problemas de segurança pública, mais credenciados do que o próprio governador eleito.
Ademais, o especialista de verdade, general Augusto Heleno, que atuou nas forças de paz do Haiti, relatou, na sequência, que sua regra de engajamento, lá utilizada, era muito parecida: “Tivemos essa regra no Haiti durante mais de dez anos e não há casos de execuções indiscriminadas. É uma questão de treinamento e, de pouco a pouco, se readquirir o respeito”.
Cabe uma reflexão adicional se o direito vigente é apropriado para o enfrentamento de ações de organizações criminosas, que criam uma espécie de Estado paralelo, confrontando a soberania interna. Com efeito, o inciso XLIV do artigo 5º, da Constituição Federal, dispõe que constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. No entanto, no contexto político atual, faltam medidas efetivas para se enfrentar problema de tal magnitude.
Do ponto de vista da dogmática penal, as ações realizadas pelo tráfico de drogas no Rio de Janeiro remetem ao chamado “Direito Penal do Inimigo”, formulado pelo jurista alemão Günther Jakobs. O Direito Penal do Inimigo, aplicar-se-ia àqueles indivíduos que de modo duradouro se têm afastado do direito, não permitindo uma expectativa cognitiva mínima de adesão às regras mais elementares da sociedade, o que é demonstrado pela própria conduta do agente.
Em outras palavras, enquanto o cidadão comum, ao violar normas prescritas no direito penal, mantém a sua adesão ao contrato social vigente, o inimigo é uma pessoa que há muito rasgou esse contrato social, e sua conduta é direcionada a impor uma nova ordem própria, em afronta ao ordenamento constitucional e ao estado democrático de direito.
Desse modo, justifica-se, do ponto de vista teórico, aquilo que o bom senso diz ao cidadão médio: que membros de organizações criminosas altamente perigosas, que assumem condutas que agridem a sociedade como um todo ou mesmo apenas em parte, retirando das pessoas atingidas a mínima possibilidade de ter seus direitos e garantias constitucionais preservados, devem ser enfrentados com a devida força, necessária para o restabelecimento da ordem democrática. E como as autoridades, até o momento, não fizeram o enfrentamento necessário, em determinadas comunidades impera a barbárie.
Enfim, a fala do governador eleito encontra resistência justamente por parte daqueles cujas convicções residem na ilusão de que todas as pessoas, seja o cidadão comum, seja o “soldado” de uma organização criminosa, devem ser tratados exatamente da mesma maneira. Mesmo que estes últimos imponham um regime de opressão e terror a comunidades inteiras.
Esperemos que a razão supere a ilusão.
* O autor é advogado e autor do livro “Do Direito do Cidadão de Possuir e Portar Armas”.