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Prescrição intercorrente no Processo do Trabalho.

Uma análise crítica do entendimento adotado pela Reforma Trabalhista

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Agenda 23/11/2018 às 10:05

O presente trabalho tem o objetivo de analisar a aplicação da prescrição intercorrente no âmbito da Justiça do Trabalho e as consequências do entendimento adotado pela reforma trabalhista no processo de execução.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo a análise da prescrição intercorrente, bem como aplicabilidade na Justiça do Trabalho, principalmente durante o processo de execução de sentença. Tal tema é objeto de controvérsias há pelo menos trinta anos, nunca tendo sido positivado na legislação trabalhista até o ano de 2017, quando entrou em vigor a chamada Reforma Trabalhista, aprovada pela Lei nº 13.467/17.

Tal mudança legislativa, todavia, não pacificou o entendimento e a aplicação do instituto da prescrição intercorrente, visto que muitos magistrados entendem que tal alteração vai de encontro aos princípios basilares que norteiam o direito trabalhista.

Faz-se necessário, portanto, fomentar o diálogo entre os diversos entendimentos sobre o tema, a fim de que se chegue à opção mais razoável que possa ser aplicada ao processo trabalhista, de modo a não privilegiar de maneira exagerada qualquer das partes do processo, ao mesmo tempo que seja garantido o máximo de direitos, com a menor exigência de obrigações.

Com o presente trabalho pretende-se abordar as consequências da aplicação da prescrição intercorrente no processo do trabalho nos moldes adotados pela Reforma Trabalhista, bem como analisar as influências desta aplicação em institutos já consagrados, como a fraude à execução e a desconsideração da personalidade jurídica.

A fim de conseguir tal intento, o segundo capítulo do presente trabalho traz o histórico da prescrição no direito brasileiro, e, especificamente, na Justiça do Trabalho no Brasil. Também será abordado o conceito da prescrição, sua natureza jurídica e os requisitos para sua aplicação, além de apresentar conceitos e características da prescrição intercorrente, tanto no direito em geral, como na seara do direito trabalhista.

No capítulo seguinte serão abordadas as controvérsias que cercam a aplicação da prescrição intercorrente na Justiça do Trabalho, discutindo-se a interpretação do art. 844 da CLT, o aparente conflito entre Súmulas do TST e STF e as consequências da inclusão do art. 11-A na CLT, que trata da aplicação da prescrição intercorrente.

Ao seu fim, o presente trabalho analisará a relação entre a aplicação da prescrição intercorrente no processo do trabalho e os diversos atos que podem ser considerados atentatórios à dignidade da Justiça, de modo a examinar a sua influência em processos executórios frustrados por conta da inexistência de bens do empregador executado.

A fim de se concluir os objetivos aqui traçados, será utilizada a metodologia de pesquisa bibliográfica, de modo a se fazer um levantamento da bibliografia existente na doutrina especializada. Haverá, do mesmo modo, a análise de dados disponibilizados pelo Justiça do Trabalho, a fim de demonstrar o impacto das execuções frustradas ante o total de processos trabalhistas existentes.

O presente trabalho se propõe, portanto, a lançar uma luz sobre o assunto aqui trazido, a fim de proporcionar a maior quantidade possível de pontos de vista, pois somente assim é possível trazer o mínimo de harmonia ao assunto.


1. A PRESCRIÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

O tempo é um fato jurídico de extrema importância nas relações regidas pelo Direito. Sob sua influência podem ser adquiridos, mantidos ou extinguidos direitos, deveres e as próprias relações, razão pela qual a discussão da influência do tempo sempre esteve presente no meio jurídico.

Deste modo, antes de discutir os efeitos da passagem do tempo na esfera do direito trabalhista, é importante que seja trazida aqui a conceituação, as características e o histórico da mais comum forma de extinção de direito ou da sua pretensão: a prescrição, assuntos este que serão tratados pelo presente capítulo.

1.1 Breve histórico da Prescrição

Segundo Venosa (2004), o instituto da prescrição era desconhecido do direito romano, onde vigorava a ideia de perpetuidade das ações. Citando Antônio Luís Câmara Leal, Venosa explica que, posteriormente, os pretores foram investidos pela lei Aebutia do poder de criar ações não previstas no direito honorário, pelo que puderam fixar um prazo para a duração das mesmas, originando, assim, as ações temporários, diferentes das demais ações, que eram perpétuas.

Uma vez estabelecida a temporariedade da ação, tornava-se necessário precedê-la de uma parte introdutória, escrita antes ou no começo da fórmula, na qual o Juiz poderia absolver o réu se estivesse extinto o prazo da ação. A esta parte introdutória dava-se o nome de praescriptio, vocábulo que deriva do verbo praescribere, que significa escrever antes, ou no começo.

Ainda conforme Venosa, com o passar do tempo, o conceito da praescriptio evoluiu de modo a significar extensivamente a matéria contida nesta parte preliminar da fórmula, surgindo, assim, a acepção de extinção da ação pela expiração do seu prazo.

Como lembra Lattanzi (2009) para o direito romano os crimes de maior potencial ofensivo eram considerados imprescritíveis, entendimento ainda presente atualmente em países de tradição consuetudinária, já que a prescrição estava associada à ideia de perdão. A prescrição da condenação, porém, foi reconhecida entre os séculos XVI e XVIII em países como Itália, Alemanha e França, atualmente sendo aceita, praticamente sem exceção, pelos Códigos Penais de todo mundo, inclusive pelo Direito Eclesiástico.

Em relação ao Brasil, de acordo Motta (2008) até a promulgação do Código Civil de 1916, a legislação aplicável às relações jurídicas eram as Ordenações Filipinas, de 1603, que previa o prazo de 30 anos para o ajuizamento das ações que exigissem o cumprimento de obrigações contraídas contratualmente. Ademais, o Código Comercial de 1850 também trazia, em seu art. 448, o prazo prescricional de 1 ano para "ações de salários, soldadas, jornais, ou pagamento de empreitadas contra comerciantes". Este prazo seria contado "do dia em que os agentes, caixeiros ou operários tiverem saído do serviço do comerciante, ou a obra da empreitada for entregue."

Promulgado o Código Civil de 1916, este revogou os citados dispositivos legais, pois passou a regular, no seu art. 177 e seguintes, os prazos prescricionais nas relações jurídicas. Especificamente sobre a relação de trabalho, o CC 1916 prevê, no § 10 de seu art. 178, o prazo prescricional de 5 anos para a propositura de ações pelos “serviçais, operários e jornaleiros” que pretendessem cobrar seus salários. A distinção entre os conceitos de prescrição e decadência, entretanto, eram um tanto confusas no CC 1916,

Atualmente, o Código Civil de 2002, buscando facilitar o estudo dos institutos jurídicos privados, inaugurou um tratamento diferenciado em relação aos conceitos de prescrição, tratados nos artigos 189 a 206, e decadência, nos artigos 207 e 2011. Conforme Tartuce (2016) o atual Código Civil adotou a teoria do doutrinador paraibano Agnelo Amorim Filho, que associa a prescrição às ações relacionadas com direitos subjetivos, próprios das pretensões pessoais.

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Sobre o mesmo assunto, Gonçalves (2012) entende que o atual código civil desfaz qualquer dúvida sobre a diferenciação de prescrição e decadência, pois prazos de prescrição são, exclusivamente, os discriminados, de forma taxativa em sua Parte Geral, nos arts. 205 e 206. Já os prazos decadenciais são todos os demais, estabelecidos como complemento de cada artigo, tanto na Parte Geral como na Especial.

1.2 Histórico da prescrição na Justiça do Trabalho

Especificamente na seara trabalhista, o Decreto-lei n. 1.237, de 1939, regulamentado pelo Decreto n. 6.596, instituiu que o prazo prescricional de 2 (dois) anos para a propositura de qualquer reclamação trabalhista, salvo disposição legal em contrário. Este prazo perdurou até o surgimento da CLT, que originalmente trazia o prazo prescricional de 02 (dois) anos para que o trabalhador urbano pleiteasse, por meio de reclamação trabalhista, a reparação de qualquer infração de dispositivos da CLT.

Anos após, a Constituição Federal de 1988 trouxe a prescrição trabalhista ao nível de postulado constitucional. Em seu art. 7º, inciso XXIX, a CF/88 estabelece que é direito do trabalhador a ação quanto a créditos resultantes da relação de trabalho, estipulando o prazo prescricional de 05 (cinco) anos para o trabalhador urbano, até o limite de 02 (dois) anos após a extinção do contrato; e de 2 (dois) anos para o trabalhador rural, contados, também, a partir da extinção do contrato.

Esta diferenciação entre os trabalhadores urbanos e rurais se encerrou com a Emenda Constitucional nº 28, que revogou as alíneas “a” e “b” do citado artigo, equiparando, parar efeitos prescricionais, ambos os tipos de trabalhadores, nos moldes da prescrição admitida anteriormente somente ao trabalhador urbano. Este prazo, no entanto, somente passou a ser prescrito legalmente aos trabalhadores domésticos a partir da Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015. Estes prazos tornaram-se, portanto, aplicáveis à praticamente todas as relações de trabalho.

Deste modo, percebemos que há dois prazos prescricionais a serem aplicados no processo trabalhista.

O primeiro destes configura a prescrição bienal. Esta se dá por conta do limite de dois anos dados ao trabalhador para que intente a ação trabalhista, contados a partir da extinção do contrato de trabalho.

O outro prazo é o da prescrição quinquenal. Esta pode ocorrer tanto durante a vigência do contrato, pois o trabalhador tem cinco anos para ajuizar a reclamação trabalhista a contar da data da lesão do seu direito, isto quando ainda há o vínculo trabalhista; bem como após a extinção do contrato individual de trabalho, já que, ajuizada a reclamatória trabalhista, esta poderá reparar somente as lesões ocorridas nos cinco anos anteriores ao seu ajuizamento.

Conforme ensina Delgado (2016) por algum tempo houve discussões doutrinárias a respeito da aplicação da prescrição quinquenal, existindo a corrente, minoritária, que entendia pela possibilidade de se pleitear as parcelas referentes aos últimos cinco anos anteriores ao término do contrato de trabalho, contanto que a reclamação fosse proposta nos dois anos seguintes à extinção do mesmo. Ou seja, a prescrição quinquenal seria contada a partir do término do contrato, enquanto a bienal deveria ser a contagem do prazo entre a extinção do contrato e a propositura da reclamação.

Tal discussão, porém, atualmente está superada, visto que a Súmula nº 308 do TST pacificou o entendimento de que a prescrição quinquenal é contada a partir do ajuizamento da ação, et verbis:

“Súmula nº 308 do TST

PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 204 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I. Respeitado o biênio subseqüente à cessação contratual, a prescrição da ação trabalhista concerne às pretensões imediatamente anteriores a cinco anos, contados da data do ajuizamento da reclamação e, não, às anteriores ao qüinqüênio da data da extinção do contrato. (ex-OJ nº 204 da SBDI-1 - inserida em 08.11.2000)

II. A norma constitucional que ampliou o prazo de prescrição da ação trabalhista para 5 (cinco) anos é de aplicação imediata e não atinge pretensões já alcançadas pela prescrição bienal quando da promulgação da CF/1988. (ex-Súmula nº 308 - Res. 6/1992, DJ 05.11.1992)”

No que tange à prescrição intercorrente, esta sempre foi motivo de grande debate jurídico, havendo, inclusive, um aparente conflito entre a Súmula 327 do STF e 114 do TST, as quais serão abordadas em capítulo subsequente, dada a importância de tais Súmulas e de seus históricos para a presente discussão. Entretanto, a matéria não havia sido legislada no direito trabalhista até a Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, que incluiu na CLT o art. 11-A, tratando deste tipo específico de prescrição. Esta recente alteração também será abordada detalhadamente mais adiante.

1.3 Conceito e Natureza Jurídica da Prescrição

O jurista cearense Clóvis Beviláquia (1927) entende que a prescrição é a perda da ação atribuída a um direito, e de toda a sua capacidade defensiva, e que tal perda se dá em consequência do não da ação correspondente durante determinado espaço de tempo. Este entendimento de que prescrição ataca a ação que defende um direito, tradicionalmente sempre foi defendido pela doutrina.

Entretanto, como ensinam Gagliano e Pamplona Filho (2012), o direito de ação, ou seja, de pedir o provimento jurisdicional do Estado, é sempre público e indisponível, independentemente se o autor detém ou não o direito subjetivo que alega ter, de modo que a ordem pública sempre deverá lhe garantir o direito de ação. Vê-se, portanto, que é incorreto dizer que a prescrição ataca a ação. Daí vem a ideia de que a prescrição atinge a pretensão que surge do direito violado. Esta pretensão, ainda conforme Gagliano e Pamplona Filho, caracteriza-se pelo poder de exigir, coercitivamente, de outrem, o cumprimento de um dever jurídico.

Como ensina Pereira (2017), o conceito de prescrição como extinção da pretensão veio da dogmática alemã, segundo a qual a lei, ao mesmo tempo que reconhece um direito, estabelece que a pretensão (Anspruch) deve ser exigida em um prazo determinado. Deste modo, o sujeito titular do direito não conserva, indefinidamente, a faculdade de intentar um procedimento a fim de defendê-lo.

Vê-se, portanto, que o direito em si pode permanecer indefinidamente, inclusive mantendo sua eficácia. No entanto, a pretensão de reparação do direito violado é totalmente desamparada com o alcance da prescrição, visto o titular deste direito ter se mantido inerte durante o prazo previsto em lei.

O atual Código Civil adotou este entendimento, trazendo de modo bem simples e didático o conceito de prescrição, em seu art. 189, segundo o qual “Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.”.

Temos, assim, que do direito violado nasce a pretensão, que é a faculdade de se exigir o cumprimento de um direito infringido, que deverá ser aperfeiçoado dentro do prazo prescricional que a lei prevê, após o qual esta pretensão será extinta pela prescrição. Caso não haja previsão legal da prescrição, tal pretensão será imprescritível.

Poder-se-ia pensar esta limitação da pretensão como uma punição ao credor de um direito que fosse negligente. Entretanto, como leciona Pereira (2017), este argumento não é de boa juridicidade, pois o que deve ser punido é o comportamento contraveniente à ordem, e este não é o caso do credor que se quedou inerte contra seus próprios interesses. Deve-se, portanto, buscar na ordem da segurança jurídica o fundamento do instituto da prescrição. Isto porque a prescrição afasta as incertezas jurídicas e a instabilidade que uma pretensão perpétua traria a sociedade.

Segundo Gagliano e Pamplona Filho (2012), o ordenamento jurídico deve, na medida do possível, prever a disciplina das relações sociais, de modo que todos possam ter a expectativa de saber como se portar para que seus fins sejam atendidos. Por este motivo não é razoável que se estabeleçam relações jurídicas perpétuas, que viriam a obrigar terceiros sem qualquer limitação de tempo, ficando estes à mercê do titular do direito, que se tornaria uma ameaça eterna sobre os sujeitos obrigados.

Deste modo, é com a finalidade de preservação da certeza, da segurança jurídica e da estabilidade social que o direito deve limitar no tempo, fixando prazos exequíveis e equânimes, a exigibilidade de certos direitos subjetivos, razão pela qual foram criados institutos como a prescrição, a decadência e a preclusão.

1.4 Requisitos para aplicação da prescrição

Como consequência do entendimento da prescrição como limitação da pretensão do credor de um direito, pode-se enumerar, de maneira bastante didática, os requisitos para a sua aplicação. De acordo com Mello (2017), são necessárias 4 condições para que se configure a prescrição, quais sejam:

“a) exista um dreito material da parte a uma prestação a ser cumprida, a seu tempo, por meio de ação ou omissão do devedor;

b) ocorra a violação desse direito material por parte do obrigado, configurando o inadimplemento da prestação devida;

c) surja, então, a pretensão, como consequência da violação do direito subjetivo, isto é, nasça o poder de exigir a prestação pelas vias judiciais; e,

d) se verifique a inércia do titular da pretensão em fazê-la exercitar durante o prazo extintivo fixado em lei.”

Tal posicionamento coaduna-se com o que ensina Gonçalves (2012), que, sugerindo uma atualização do ensinamento de Câmara Leal, defende não ser necessária a existência de uma ação exercitável, mas sim uma pretensão, o que se harmoniza com atual Código Civil. De forma mais sucinta que Mello, Gonçalves conclui que os requisitos mínimos para a aplicação da prescrição seriam: a) a violação do direito e, portanto, o nascimento da pretensão; b) a inércia do titular; c) o decurso do tempo fixado em lei.

1.5 Algumas considerações sobre a decadência e sua diferenciação da prescrição

Assim como a prescrição, e muito próxima desta, a decadência é mais um efeito do tempo nas relações jurídicas, aliado à inércia do titular de certo direito. Possui, no entanto, diferenças importantes no seu modo de operar e nos seus fundamentos.

Sobre esta diferenciação, Pereira (2017) ensina que

“(...) a decadência é a perda do direito potestativo pela falta de exercício em tempo prefixado, enquanto a prescrição extingue a pretensão um direito subjetivo que não tinha prazo para ser exercido, mas que veio a encontrar mais tarde um obstáculo com a criação de uma situação contrária, oriunda da inatividade do sujeito”

Mesmo posicionamento tem os autores Farias e Rosenvald (2011), segundo os quais “a decadência é a perda do próprio direito (potestativo) pelo seu não exercício em determinado prazo, quando a lei estabelecer lapso temporal para tanto”. O redator da Parte Geral do atual Código Civil, José Carlos Moreira Alves, adota o mesmo entendimento de que a decadência ocorre quando um direito potestativo não é exercido dentro do prazo para exercê-lo, tanto extrajudicialmente como judicialmente, provocando a decadência deste direito.

Tais direitos potestativos, convém anotar, são aqueles aos quais não se opõe um dever de outrem, mas sim uma sujeição de alguém. Ainda segundo Farias e Rosenvald, os direitos potestativos inadmitem violação, pois são exercidos através de mera manifestação de vontade do titular, independendo da submissão de terceiros, não trazendo, por conseguinte, quaisquer pretensões, que são típicas dos direitos subjetivos.

Vimos, assim, que os efeitos da decadência recaem diretamente sobre o direito que não foi exercido no prazo estabelecido, o que atinge indiretamente a ação pela qual tal direito seria exercido.

Em relação aos prazos, uma grande diferença também pode ser apontada entres prescrição e decadência: nesta, o prazo inicia-se no momento do surgimento do direito. Naquela, o prazo é desencadeado somente quando há a violação do direito.

Outra notável diferença entre os dois institutos está na possibilidade de interrupção ou suspensão dos prazos. Sobre o assunto, Diniz (2007), ensina que:

“A decadência, teoricamente, corre contra todos, não admitindo sua suspensão ou interrupção em favor daqueles contra os quais não corre a prescrição, com exceção do caso do art. 198, I, do CC (CC, arts. 207 e 208, in fine) e do art. 26, § 2º, da Lei n. 8.078/90: só pode ser obstada a sua consumação pelo exercício efetivo do direito ou da ação, quando esta constituir o meio pelo qual deve ser exercido o direito; a prescrição pode ser suspensa, impedida ou interrompida pelas causas previstas em lei.”

Por último, convém lembrar que o prazo decadencial pode ser estabelecido pela lei (quando não poderá ser aumentado ou diminuído entre as partes), ou poderá, ainda, ser estipulado entre as próprias partes, situação em que estas poderão modificar os prazos, conforme seus entendimentos. Já em relação ao prazo prescricional, este só existe quando fundamentado em lei, razão pela qual nunca poderá ser convencionado ou alterado pelas partes.

1.6 Prescrição intercorrente

A prescrição intercorrente é aquela que ocorre no curso do processo judicial. Segundo Rizzardo (2015), este tipo de prescrição prejudica à parte por conta da sua inércia na promoção do regular andamento do processo. Ainda conforme o autor, tal situação ocorre, geralmente, quando o processo fica paralisado sem que a parte, titular de um direito e que busca a sua efetivação, tome as providências necessárias para o prosseguimento regular da ação.

A prescrição intercorrente foi admitida implicitamente pelo Código Civil de 2002, que no parágrafo único do artigo 202 dispõe que “A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper. ”

Como já tratado acima, existindo a inércia do titular de um direito em sua consecução, ocorre, naturalmente, o perecimento deste direito. No entanto, mesmo que haja o impulso inicial da parte que busca a satisfação de um direito, verificando-se a omissão do autor em qualquer momento, volta a correr o prazo prescricional, que, desta feita, torna-se intercorrente. Isto se dá por conta do desinteresse da parte em cumprir as atribuições que lhe são próprias. Assim, caso esta desídia leve o feito a permanecer paralisado pelo período de tempo correspondente ao prazo previsto para a pretensão do direito, a prescrição é consumada. Tem-se, assim, que o prazo a ser considerado para a aplicação da prescrição intercorrente coincidirá, caso não haja lei específica sobre o assunto, com o prazo prescricional para o ajuizamento da ação.

De acordo com o Novo CPC, que disciplina o assunto em seu artigo 921, antes que a prescrição intercorrente seja aplicada em um processo em execução em que o executado não possui bens, é possível suspender o processo pelo período de 1 ano, período de tempo no qual o prazo prescricional ficará suspenso. Decorrido este prazo sem que seja localizado o executado ou encontrados bens, o juiz deverá ordenar o arquivamento dos autos, que poderão ser desarquivados caso sejam encontrados bens, e começará a correr o prazo de prescrição intercorrente. Findo o prazo prescricional, e ouvidas as partes no prazo de 15 dias, o juiz poderá reconhecer a prescrição intercorrente, extinguindo o processo.

Percebe-se, portanto, que o reconhecimento da prescrição intercorrente não está vinculado somente ao seu elemento temporal. Também é necessário que se verifique a inércia da parte autora em adotar as providências necessárias ao deslinde do processo. Por conseguinte, não se reconhecendo na parte tal comportamento inerte, não é possível a aplicação deste instituto.

Em matéria trabalhista, o instituto da prescrição intercorrente sempre foi assunto bastante controverso, existindo diversos julgados com posicionamentos contrários, e até mesmo Súmulas divergentes, pois o TST entende que esta prescrição é inaplicável na Justiça do Trabalho (Súmula 114 do TST), e o STF a entende como compatível com o direito trabalhista (Súmula 327 do STF). Tal discórdia pode ser resolvida com a vigência da lei nº 13.467, de 2017, que incluiu o art. 11-A na CLT, que passou a admitir, expressamente, a apli cação da prescrição intercorrente na execução trabalhista, a ser declarada após o prazo de 2 (dois) anos contados a partir da data em que o requerente deixar de cumprir alguma determinação judicial no curso da execução.

Há, entretanto, quem critique a utilização da prescrição intercorrente, mesmo no âmbito do direito civil. Tartuce (2016), por exemplo, salienta que nunca concordou com a utilização deste tipo de prescrição na esfera privada, pois entende que ela poderia ser injusta, principalmente quando se leva em consideração a morosidade do nosso Poder Judiciário. Isto porque, com a prescrição intercorrente, o devedor que se esconde consegue alcançar a extinção da pretensão que lhe é cobrada, de modo que esta prescrição poderia prestigiar a má-fé do mesmo.

O mesmo autor entende, ainda, que o instituto da prescrição intercorrente poderia ser admitido em um contexto de justiça cível célere, quando a sua aplicação ocorreria tão somente nos casos de real inércia da parte, e não por uma possível morosidade da Justiça.

Tal preocupação deve ser premente, principalmente no âmbito da Justiça do Trabalho, tendo em vista as suas peculiaridades, seus princípios específicos, e a grande informalidade que permeia as relações trabalhistas no nosso país. Tal assunto, porém, será tratado detalhadamente em um capítulo posterior.

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