A responsabilidade civil solidária e subsidiária
A obrigação solidária é aquela que podemos depreender do que consta no Art. 264 do Código Civilista, que diz: “Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda” (BRASIL, 2002). Por uma simples inferência, há a interpretação de que não existe forma solidária que não advenha de contrato ou lei que a disponha. Mas, por que tal fato acontece?
O artigo seguinte denota mais um fato à questão que ajuda a responder essa dúvida, pois o mesmo diz que não existe solidariedade presumida, que a mesma resulta de lei ou de vontade das partes. Mas essa destruição que atinge múltiplas pessoas pode ser considerada como obrigação solidária? De acordo com o que prediz Cavalieri é perfeitamente possível (2014, p. 554). Se é lógico admitir que se alguém porventura produzir um detrimento é responsável pelo estrago que causar, é lógico também afirmar que quando os agentes que produziram aquele estrago forem vários, responderão conjuntamente pelo estrago causado, na medida de suas implicações.
O art. 942 do CC/02 também trata da obrigação solidária:
Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação. Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932. (BRASIL, 2002).
Mais uma prova de que o nosso ordenamento trata e admite a forma solidária como forma de reparação do estrago causado. Já com relação a obrigação subsidiária há uma referência a esse respeito no elo consumerista:
Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando: I - o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados; II - o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador; III - não conservar adequadamente os produtos perecíveis (BRASIL, 1990).
O artigo trata do vínculo existente entre comerciantes, fabricantes e demais atores na relação de consumo. Pode ser responsabilizado em via secundária quando o fabricante, o construtor, produtor ou importador não puderem ser identificados; o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador ou - hipótese mais comum – quando o comerciante não conservar adequadamente os produtos perecíveis (CAVALIERI FILHO, 2014, p. 555).
Logo, nessa associação subsidiária, em que existe múltiplas características decorrentes de uma conexão consumerista, o que importa é haver a ligação entre os agentes presentes nessa conexão, pois há todo um sistema presente entre fabricante e fornecedor (CAVALIERI FILHO, 2014, p. 555), onde ambos podem ser processados por eventuais estragos, sendo passível ação de regresso a qualquer um dos agentes legais do vínculo.
A responsabilidade civil nas relações de consumo
A sociedade atual se mostra cada vez mais transformada em uma sociedade de consumo, sendo que “a economia tornou-se cada vez mais dirigida, e a intervenção do Estado recrudesceu sensivelmente” (PEREIRA, 2005, p. 573). Com base na crescente demanda, e para atender (e proteger) o interesse dos consumidores quanto à segurança que determinados serviços devem oferecer, está presente no ordenamento judicial o art.12 do CDC, que trata do fato do produto/acidente de consumo. Tanto no fato do produto quanto no fato do serviço, os responsáveis respondem independentemente da comprovação da autoria.
Todos os responsáveis na ligação consumerista respondem por eventuais rombos causados ao consumidor de maneira clara, objetiva e solidária, com aspas ao comerciante, visto que só poderá ser responsabilizado em último caso, quando não for passível de identificação os demais sujeitos que compõe tal ligação e que dela fazem parte, como o fabricante, o produtor, o exportador, etc. Há também sua responsabilização com vistas a produto mal conservado e que seja perecível (art. 13, I, II e III, CDC).
Essa classificação também há de ser aproveitada pelo dito consumidor equiparado. O vício do produto ou serviço, é aquele que frusta as expectativas do consumidor, havendo com o produto ou serviço, um claro problema de adequação, de modo a impedir ou reduzir sua capacidade de utilização por parte do consumidor. Nesse caso, todos da cadeia respondem solidariamente (art. 18 do CDC).
Porém, quando se tratar de vício que afete a quantidade, além da exclusão do preço do produto em si ou a substituição do produto e de eventuais valores gastos, há a possibilidade de restituição imediata com relação aos valores já despendidos. Já com relação ao vício de serviço, o cliente terá Direito à restituição imediata do valor debitado ou a execução feita novamente sem custos adicionais, como diz o art. 20, I, II e III do CDC.
A dita ignorância do fornecedor sobre vícios de qualidade por inadequação do produto ou serviço não irá eximi-lo de responder, conforme se depreende do art. 23 do CDC. Sempre que possível, o Código do Consumidor deve buscar relações com outras fonts do Direito com vistas a proteger o pólo mais fraco e suscetível de danificação do vínculo, o consumidor: “O CDC deve dialogar com as demais fontes do Direito, sem, contudo, perder a índole protecionista que o caracteriza” (MARQUES, 2006, p. 669).
Conforme o disposto no art. 27 do CDC, há o prazo de 05 anos para que a pretensão de acionar o poder judiciário para a solução da demanda, fato contado a partir da ciência de tal agravo. É de 30 dias o prazo para avarias visíveis e aparentes para produtos não duráveis e 90 dias quando for com correspondência aos duráveis. Para vícios ocultos o prazo começa a corer a partir do momento em que o defeito se manifestar de maneira aparente.
Segundo o que dispõe o § 3º do art. 12 do CDC, cabe o ônus da prova aquele que pretende fazer desaparecer sua implicação no caso, ou seja, a todos a quem beneficiar uma eventual preclusão do processo por falta de provas. Então, por lógica, caberá a essas partes a produção dessa prova, pois incumbi-la ao consumidor tornaria fácil o não cumprimento da obrigação. É famosa a frase no Direito que reforça esse entendimento: “ninguém poderá se beneficiar de sua própria torpeza”[1].
Com respeito ao caso fortuito e força maior, institutos presentes no Direito Civil como excludentes de encargo de determinada atitude, não se encontram abarcados pelo Código do Consumidor, porém, a doutrina atual tem uma forte aceitação com respeito a essa teoria em diversos casos que direitos da personalidade se encontram frustados ou amealhados, assim como eventuais lesões morais decorrentes de uma incumbência dita como objetiva, tendo em vista a teoria do risco, presente no art. 14,§ 3º, II, CDC.
Então, como explicitado, a excludente de reponsabilidade somente se afigura na medida em que são verificadas as situações específicas de cada caso, e conforme verificado também a esse vínculo de causalidade presente no porte do agente, na medida exata de suas incumbências com respeito aos produtos e serviços fornecidos ao consumidor, sendo possíveis de igual forma no Código do Consumidor assim como o são no Código Civil por analogia.
Pelo que consta nesta primeira parte, tem-se que esse instituto civilista provém de uma concepção que foi se aperfeiçoando com o decorrer do tempo, de maneira a abarcar um maior número de indivíduos possíveis. A definição de “incumbência” e suas diferentes classificações denotam a evolução no entendimento de que quem provoca uma lesão (ainda que a terceiros) deve ser responsabilizado juridicamente por sua atuação. Mas, de que maneira essa obrigação civil afeta o conteúdo diariamente gerado na internet por meio de provedores de conteúdo especializados? E como isso influencia a liberdade de expressão dos indivíduos nas mídias sociais? É a partir dessas relações que o próximo capítulo toma forma.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Código Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: Acesso em 13/04/2018.
BRASIL. LEI Nº 8.078, DE 11 DE SETEMBRO DE 1990. Disponível em: Acesso em 18/04/2018.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2014.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2014. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro, Responsabilidade. 7ª ed. São Paulo. Saraiva, 2011. V.7.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 8ª. Ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5 ed. São Paulo: RT, 2006.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 16. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. Programa de Direito Civil, V. I/ 341, Ed. Rio.
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: reponsabilidade civil. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 4.
VENOSA, Silvio de Salvio. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 12ª Ed. São Paulo: Atlas, 2012.
* O termo se refere a um princípio amplamente utilizado no direito, significando dizer basicamente que nehuma pessoa pode fazer algo de errado, fazendo com que essa ação lhe traga benefícios, como por exemplo, em um processo na justiça, alegar suspeição da causa, sendo que você, na qualidade de advogado, começou a provocar o juiz na sala de audiência de propósito