SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. I - CONCEITO. II - BREVE HISTÓRICO. III - O DIREITO COMPARADO. IV - HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA. V - A INEXISTÊNCIA DE BASE DE CÁLCULO E OS LIMITES TRIBUTÁRIOS. VI - OS SISTEMAS DE COBRANÇA. VII - A POLÊMICA QUANTO À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 23 DE 01/12/1983, A CHAMADA EMENDA "PASSOS PORTO" E A LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. VIII - AS PRINCIPAIS PRESCRIÇÕES DO DECRETO-LEI Nº 195/67. CONCLUSÃO. BIBLIOGRAFIA.
RESUMO
A contribuição de melhoria é um instituto tributário que possui vasta aplicação no direito comparado, podendo ser detectados três sistemas básicos de cobranças, a saber, sistema de custo, sistema de valorização e sistema misto, todavia, é um tributo de aspecto quantitativo simplificado, já que não possui base de cálculo.
PALAVRAS-CHAVES :Tributário. Contribuição de melhoria. Sistemas de Cobrança. Base de cálculo. Inexistência.
ABSTRACT
The betterment tax is a tributary institute which is vastly used in the comparative law. Three basic charge system can be identified: cost system, value system and hibrid system. Due to the fact that it doesn´t count on accrual basis, it is a simplified quantitative tax.
KEywords: Taxation. Betterment tax. Accrual basis. Charging systems. Accrual basis. Inexistence.
INTRODUÇÃO
O instituto da contribuição de melhoria conhece vasta aplicação no direito tributário, no decorrer deste artigo será exposto de forma lógica as concepções básicas deste tributo, com especial destaque para três aspectos: a inexistência da base de cálculo, os limites tributários e a polêmica quanto a Emenda Constitucional nº 23 de 01/12/1983.
Outrossim, a partir de uma análise lógica, o objetivo foi demonstrar que a contribuição de melhoria não possui base de cálculo, pois da mesma forma que determinadas taxas, é um tributo de aspecto quantitativo simplificado, nesta afirmação reside o ponto de maior divergência, porquanto a doutrina tradicional afirma que a base de cálculo realmente existe.
Assim sendo, o esquema proposto por Paulo de Barros Carvalho [01] em seu livro Curso de Direito Tributário é insuficiente, pois não descreve a estrutura típica dos tributos de aspecto quantitativo simplificado, já que estes não possuem alíquota e nem base de cálculo.
Além disso, foram analisados ainda os limites tributários de cobrança do tributo, bem como a polêmica arquitetada pela doutrina em torno da Emenda Constitucional nº 23 de 01/12/1983, sendo ambas discussões de suma importância, a primeira porque diz respeito à aplicabilidade do instituto na lei brasileira e a segunda porque se refere à própria recepção do instituto pela ordem constitucional.
I - CONCEITO
A contribuição de melhoria é uma espécie do gênero tributo vinculado a uma atuação estatal, qual seja, a construção de obra pública que acarrete valorização imobiliária ao patrimônio do particular, desta forma, é um tributo decorrente de obra pública que gera valorização em bens imóveis do sujeito passivo.
Assim, se o Poder público (União, Estados, Distrito federal e Municípios) promove a pavimentação de vias, acarretando esta obra a valorização dos imóveis circunscritos, ao Estado é permitida a cobrança de uma contribuição de melhoria pelas obras públicas que geraram a valorização nestes imóveis.
II - BREVE HISTÓRICO
Em sucinto panorama histórico, é possível constatar que a contribuição de melhoria é instituto antigo e de larga aplicação em outros países, com efeito, remonta ao ano de 1250, ao ser cobrada em Londres pela construção de diques para o rio Tâmisa, bem como a retificação e o saneamento de suas margens que permitiram sua navegabilidade e o incremento da vida econômica da população ribeirinha.
A rainha da Inglaterra determinou a feitura das obras no rio Tâmisa num raio de aproximadamente 120 km, pois Londres era uma cidade vulnerável a enchentes e inundações em virtude da ausência de diques contentores no rio, todavia, a obra custou muito aos cofres públicos da época.
Por conseguinte, vários imóveis de particulares que se situavam às margens do rio Tâmisa e que então não passavam de terrenos pantanosos e alagadiços, perceberam extraordinária valorização ante a feitura da obra pública.
O fato da valorização não passou desapercebido e veio da Câmara dos Lords a idéia de se cobrar um tributo (contribuição de melhoria) pela valorização dos imóveis, a ser paga pelos proprietários, pois não seria justo que alguns particulares obtivessem mais valia (valorização) às custas do dinheiro público, já que a obra do rio Tâmisa havia sido financiada por toda a sociedade.
Outrossim, conforme Geraldo Ataliba, nos Estados Unidos a contribuição de melhoria recebe o nome de special assessment (designação não rigorosa que abarca o benefit e o cost assessment) sendo responsável pelo financiamento de seus trens metropolitanos, magníficos viadutos, pontes, estradas, hidrovias e demais obras que surpreendem todo o mundo e impõem profunda admiração. [02]
No Brasil, foi expressamente acolhida, com sua denominação atual pela Constituição de 1934, contudo, já vinha sendo cobrada desde 1905 pela pavimentação de ruas, conforme demonstra o Decreto nº 1.209, de 1905 e o Decreto nº 21.390, de 1932.
III - DIREITO COMPARADO
A contribuição de melhoria enquanto espécie do gênero tributo conhece vasta existência no direito comparado, todavia, o instituto adquire contornos bem diversos conforme o sistema analisado. Segundo Edgar Neves da Silva, o mencionado instituto conhece as seguintes nomenclaturas no direito comparado:
beterment tax como é chamada na Inglaterra, special assessment nos Estados Unidos, contribuition sur les plus values na França, contributi di meglioria na Itália, contribuición de mejoras na Espanha, e a erschliessungsbeitrag e a strassenanliegere beitrag como são chamadas na Alemanha. [03]
Deste modo, será objeto de análise a contribuição de melhoria vigente nos Estados Unidos e na Alemanha, ante a diversidade de contornos do instituto nestes dois países.
O sistema americano adota a contribuição de melhoria tipo valorização ou plus valia ou mais valia, por este sistema, após a realização de obra pública que acarrete valorização imobiliária, deverá o proprietário arcar com a parcela correspondente à valorização de seu imóvel.
Portanto, se A tinha um imóvel no valor de 100, mas após a valorização promovida pela obra pública, obteve uma plus valia de 10, passando a valer 110, o proprietário deverá recolher 10 aos cobres públicos, a título de contribuição, pela melhoria (valorização) em seu imóvel.
Cumpre ressaltar que no modelo americano a verdadeira contribuição de melhoria recebe a designação de benefit assessment, pois os financistas deste país reúnem sob o gênero de special assessment, o cost assessment e o benefit assessment, todavia, apenas este último se constitui em legítima contribuição de melhoria.
A respeito dessa questão, o ilustre Geraldo Ataliba assevera:
Nos Estados Unidos nos livros de Public Finance (ciência das finanças) reúnem-se sob a designação de special assessment dois tipos de exações, de natureza distinta, mas de certa forma semelhantes em seus fundamentos remotos: o cost assessment e o benefit assessment. Só este corresponde ao betterment tax (legítima c.m.) da tradição do direito inglês, sendo o outro uma instituição convencional (semicontratual) norte-americana (que, entretanto, não nos é inteiramente desconhecida).
Ora, em vez de se adotar aqui a legítima c.m. (benefit assessment), adotou-se, por inadvertência, o cost assessment, que corresponde ao financiamento de obras públicas por um instrumento semicontratual:
a) a requerimento dos interessados;
b) com consentimento, quanto ao projeto e custos, por parte dos interessados;
c) os quais podem opinar, discutir e questionar a conveniência e oportunidade da obra, seu projeto e orçamento;
d) e pagamento, afinal, na medida do custo, repartido proporcionalmente por todos. [04]
Desta forma, para o professor Geraldo Ataliba o legislador brasileiro teria se equivocado ao adotar o instituto do cost assessment, quando na verdade deveria ter instituído o benefit assessment, genuína contribuição de melhoria aceita universalmente.
O erudito autor defende a idéia de que o custo da obra jamais pode ser utilizado como critério de cobrança para a contribuição melhoria, nesse sentido, afirma seguinte: "o gabarito da contribuição de melhoria é sempre a valorização, não importando o custo da obra".
Todavia, no sistema alemão a contribuição de melhoria se pauta pelo custo da obra, ou seja, não se utiliza o critério de valorização imobiliária, sendo o custo rateado entre os beneficiários da obra pública.
Por este sistema, se os imóveis de A, B, C e D foram abrangidos por uma obra pública que teve custo de 100,00 ao Estado, cada um deverá desembolsar 25,00 aos cofres públicos, rateando, assim, o custo da obra. [05]
O sistema alemão se aplicado de forma absoluta, pode dar ensejo a injustiças, pois o contribuinte estaria obrigado a pagar a contribuição de melhoria por qualquer tipo de obra pública, ainda que esta causasse desvalorização em seu imóvel, neste caso, estaria obrigado ao pagamento da exação, devendo acionar posteriormente o Estado em ação de indenização pelo desvalor de seu imóvel.
No Brasil foi adotado um sistema misto (mitigado ou heterogêneo), no qual a contribuição de melhoria é cobrada do contribuinte através do critério de valorização imobiliária, tendo como limite total o custo da obra.
Edgar Neves da Silva, [06] em seus estudos sobre a contribuição de melhoria, afirma que Colômbia e Peru possuem sistema de cobrança semelhante ao brasileiro, in verbis:
Duas são as experiências que conhecemos na América Latina, excluída a brasileira. A da Colômbia, mais antiga, e a do Peru.Percebe-se em ambos os casos, que a valorização é o fundamento buscado, mas com limite no custo da obra, como a nossa ordenação.
Destarte, é difícil dizer se o legislador brasileiro realmente copiou a legislação errada, como afirma Geraldo Ataliba ou se pretendeu criar, a semelhança de Colômbia e Peru, um tertius genius (terceiro gênero) ao combinar os critérios utilizados nos sistemas inglês e norte-americano (valorização) com o critério existente no sistema alemão (custo da obra).
IV- HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA
A hipótese de incidência ou como preferem alguns, o fato gerador da contribuição de melhoria é a construção de obra pública que acarrete valorização imobiliária ao patrimônio do particular.
Sob este aspecto, o Código Tributário Nacional prescreve:
Art. 81. A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é instituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.
Desta forma, existem três elementos ínsitos ao fato gerador:
a) a realização de obra pública, sendo que a cobrança tributária só é possível após a concretização da obra, sendo vedado ao Estado realizar uma obra pública pela metade e exigir de pronto a contribuição de melhoria, até porque, nessa hipótese, não haverá valorização, face à existência incompleta da obra.
b) a valorização, pois apenas a obra não é suficiente, já que existem obras públicas que ao invés de valorizar, acabam mesmo por acarretar a desvalorização do imóvel.
c) que a valorização ocorra sobre bens imóveis.
O núcleo da hipótese de incidência é a valorização imobiliária, desta forma, é ilegal a conduta de determinados entes federados ao lançar a contribuição de melhoria apenas com base no custo da obra.
Nesse sentido, os tribunais pátrios asseveram:
CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - VALORIZAÇÃO IMOBILIÁRIA - CF/67, ART. 18, II, COM A REDAÇÃO DA EC Nº 23/83 - CF/88, ART. 145, III - Sem valorização imobiliária, decorrente de obra pública, não há contribuição de melhoria, porque a hipótese de incidência desta é a valorização e a sua base é a diferença entre dois momentos: o anterior e o posterior à obra pública, vale dizer, o quantum da valorização imobiliária. (STF - RE 114.069-1 - São Paulo - 2ª T. - Rel. Min. Carlos Velloso - DJU 30.09.1994)
TRIBUTO - CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - FATO GERADOR - VALORIZAÇÃO DO IMÓVEL - ART. 81/CTN - PRECEDENTES DO STF E STJ - 1. A contribuição de melhoria tem como fato gerador a valorização do imóvel que lhe acarreta real benefício, não servindo como base de cálculo, tão-só o custo da obra pública realizada. 2. Recurso Especial conhecido e provido. (STJ - RESP 280248 - SP - 2ª T. - Rel. Min. Francisco Peçanha Martins - DJU 28.10.2002).
CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - Loteamento urbano. Pavimentação asfáltica e colocação de guias e sarjetas. Incidência da contribuição de melhoria na hipótese de valorização do imóvel. Lançamento que desconsidera este critério e não fixa alíquota percentual correspondente à valorização. Base de cálculo exclusivamente fixada no rateio do custo da obra em proporção à metragem linear da respectiva testada dos imóveis beneficiados. Inadmissibilidade. Violação do Código Tributário Nacional, arts. 81 e 82. Lançamento ajuizado de ofício. Reexame necessário não provido. (1º TACSP - AP 0913031-8 - (42772) - São João da Boa Vista - 2ª C.Fér. - Rel. Juiz Amado de Faria - J. 03.04.2002)
A valorização é apurada com base no valor venal do imóvel, conforme o disposto no art. 12 do Decreto-Lei nº 195/67, outrossim, vige a presunção relativa em favor do poder público de que é correto quantum de valorização apurado, cabendo ao contribuinte a prova em sentido contrário, esse é o entendimento que nos parece mais correto e vem sendo adotado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, in verbis:
TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA - SISTEMA DE DUPLO LIMITE - VALORIZAÇÃO REAL DO IMÓVEL - ÔNUS DA PROVA - 1. (...). 2. (....). 2.1.(...) 2.2. Presume-se que a obra pública agregou ao imóvel a mais-valia real, conforme a partilha procedida pelo poder tributante. Cabe, pois, ao contribuinte provar que, na realidade, não houve melhoria no sentido de valor, ou houve em menor quantia, ou que houve até mesmo piora no sentido de desvalor. Carregar o ônus da prova ao Poder Público é não só inviabilizar a administração como ir de encontro a princípio básico de direito público em geral, e de direito tributário em especial. Vigora, no caso da contribuição de melhoria, a mesma presunção que vigora ao IPTU e ao IPVA relativamente ao valor da base de cálculo. O Poder Público, dentro de critérios objetivos estabelecidos em Lei, define qual valor cada imóvel presumivelmente agregou. Se tal não corresponde à valorização real, cabe ao contribuinte demonstrar. 3. Apelação desprovida. (TJRS - APC 70005149901 - 1ª C.Cív. - Rel. Des. Irineu Mariani - J. 18.06.2003).
V - A INEXISTÊNCIA DE BASE DE CÁLCULO E OS LIMITES TRIBUTÁRIOS
A base de cálculo da contribuição de melhoria, segundo parte da doutrina pátria, é o quantum de valorização imobiliária, por exemplo, um imóvel de R$ 10.000 é valorizado em 10% desse valor, devido à obra realizada pelo poder público, assim sendo, o contribuinte deverá pagar uma alíquota (%) sobre R$ 1.000,00 (10% de 10.000), correspondente à valorização do imóvel a título de contribuição de melhoria.
Assim, a base de cálculo será R$ 1.000,00 e a alíquota será justamente a porcentagem (5%, 10%, ou 15% por exemplo) auferida sobre a base de cálculo, devendo a percentagem ser definida por lei do ente tributante que pretende cobrar a referida exação.
Portanto, ainda com base nesse exemplo, obtêm-se:
1. Valor do imóvel R$ 10.000,00
2. Percentual de Valorização da obra pública = 10% do valor do imóvel
2.1. 10% de 10.000,00 = R$ 1.000,00
3. Base de cálculo da contribuição de melhoria = R$ 1.000,00
. Alíquota : 15% (por exemplo) de 1.000,00 (base de cálculo)
Valor total a pagar de contribuição: 15% de 1.000,00 = R$ 150,00
Doutrinadores como Roque Antônio Carraza [07] e Sacha Calmon [08] defendem que a apuração da base de cálculo, bem como o valor final a pagar a título de contribuição de melhoria deve se dar do modo como foi anteriormente exposto.
Em que pese os ensinamentos de tributaristas desse jaez, não pode ser aceita essa forma de construção.
A verdade é que a contribuição de melhoria não possui alíquota e nem base de cálculo, sendo um tributo de aspecto quantitativo simplificado, a afirmação pode causar estranheza e até alarde para aqueles que, apegados às formas tradicionais, não conseguem prescindir da estrutura tradicional do tributo.
Assim, é imprescindível saber se a construção da doutrina tradicional resiste a uma análise lógica.
Ora, nos tributos tradicionais o valor final a ser pago ao Estado é decorrência de um processo em que é aplicada uma alíquota (%) sobre uma determinada base de cálculo, da seguinte forma:
Vp = Bc x Alq, onde Vp é o valor do tributo a pagar, Bc é a base de cálculo e Alq é a alíquota, deste modo, é possível extrair da fórmula as seguintes conclusões lógicas:
1º) Se Vp = Bc x Alq, então Vp ≠ Bc ≠ Alq
2º) Vp = Y (Bc x Alq), onde Y é ≠ de Bc e Alq
3º) Bc e Alq são componentes de Vp, de modo que, ao se retirar qualquer um dos elementos a fórmula perde a sua estrutura, não sendo possível a cobrança do tributo, já que não se sabe efetivamente, qual é o valor a pagar.
Assim, a primeira e obvia conclusão é que o valor final a pagar é diferente da base de cálculo, que é diferente da alíquota, são três elementos diversos e para se obter o valor final a pagar é necessário uma simples operação matemática entre a alíquota e a base de cálculo, surgindo daí um valor Y, que corresponde ao valor final a pagar, mas que é diferente de Bc e Alq (segunda conclusão).
Pois bem. Merece análise o exemplo do IPTU,
Vp (Iptu)= Bc x Alq, onde Bc é o valor venal do imóvel e Alq é o percentual incidente sobre a Bc, imagine que Bc é igual a 100 e Alq é igual a 5%, assim, chega-se ao seguinte resultado:
Vp (Iptu) = 100 x 5%, Vp (Iptu) = 5,0 (Y)
Ao se aplicar as três conclusões anteriores ao caso do IPTU, temos:
1º) Se Vp = Bc x Alq, então 5,0 (Y) ≠ 100 ≠ 5%
2º) Vp = Y (Bc x Alq), onde 5,0 (Y) ≠ 100 e 5%
3º) Bc e Alq são componentes de Vp, de modo que, ao se retirar qualquer um dos elementos a fórmula perde a sua estrutura, não sendo possível a cobrança do tributo, já que não se sabe efetivamente qual é o valor a pagar, ou seja, Bc e Alq sozinhas nada dizem, contudo, da junção de ambas é possível extrair o valor pagar, sendo este o resultado da operação matemática entre Bc e Alq.
Os impostos seguem este paradigma, entretanto, a contribuição de melhoria possui estrutura diversa.
O valor a se pagar a título de contribuição de melhoria corresponde ao quantum de valorização do imóvel, adotando-se a concepção clássica de que a base de cálculo da contribuição de melhoria seria a diferença entre o valor do imóvel antes e o valor do imóvel depois de realizada a obra pública, devendo ser aplicada uma alíquota sobre essa base, do seguinte modo:
Imagine que antes da obra o valor do imóvel era de 100 e, após a sua realização, passou a valer 150, assim, Bc vale 50 (150 - 100) e Alq é o percentual deste valor, significa dizer, 15%, da seguinte forma:
Vp (cont de melhoria) = Bc x Alq
Vp = 50 x 15% = 7,5 (Y)
Mas é justamente nesse aspecto que a doutrina tradicional erra, pois nessa forma de cálculo existem duas impropriedades técnicas:
a) a primeira impropriedade é a desconexão com a hipótese de incidência, pois o elemento essencial, que é o quantum de valorização do imóvel, está sendo desrespeitado. Ora, a valorização real e efetiva do imóvel foi de 50,00, sendo este o valor a se pagar a título de contribuição de melhoria, ao se considerar este valor como base de cálculo e aplicar sobre ele uma alíquota, por essa diretiz o contribuinte não estaria pagando toda a valorização do imóvel, mas apenas uma parte mínima dela, ou seja, o correspondente a 15% dessa valorização, o que viola frontalmente o art. 81 do CTN.
b) a segunda impropriedade pode ser constatada ao se submeter essa forma de cálculo ao teste da lógica até então descrita, nos seguintes moldes:
a) Se Vp (cont de melhoria) = Bc x Alq, então Vp ≠ Bc ≠ Alq
Ao procurar entender a estrutura da contribuição de melhoria, sob a égide do modelo tradicional dos tributos, a doutrina confunde a base de cálculo com o próprio valor a pagar, pois considera como base de cálculo o quantum da valorização, quando na verdade esta quantia já corresponde ao próprio valor a pagar pela contribuição de melhoria, não sendo necessária a aplicação de nenhuma alíquota.
Deste modo, a forma de cálculo combatida violou o postulado lógico por meio do qual Vp ≠ Bc.
Outrossim, violou ainda o terceiro postulado lógico, por meio do qual os elementos Bc e Alq devem existir simultaneamente, pois ao se retirar qualquer destes elementos, resta desnaturada toda a estrutura, deste modo, ao se partir da premissa de que essa concepção doutrinária iguala Vp à Bc, como de fato o faz, torna-se perfeitamente dispensável o elemento Alq, não havendo coincidência com a estrutura normal dos tributos.
Como decorrência, caracteriza ainda, uma violação ao segundo postulado lógico Vp = Y (Bc x Alq), pois se o elemento Alq for suprimido da fórmula, a situação passaria ser a seguinte: Vp = Y (Bc), onde Y representaria Bc e Vp, ou seja, não haveria diferença entre os três elementos.
Por outro lado, ao se partir da premissa de que a base de cálculo da contribuição de melhoria (Bc) é o valor do imóvel e que a alíquota (Alq) é o percentual de valorização deste imóvel (Vi), é essencial constatar se essa afirmação está de acordo com os três postulados lógicos anteriormente expostos:
Estrutura tradicional dos tributos
1º) Se Vp = Bc x Alq, então Vp ≠ Bc ≠ Alq
1.1. Alq = % da Bc, mas é ≠ de Bc
2º) Vp = Y (Bc x Alq), onde Y é ≠ de Bc e Alq
2.1.) Vp = Y (Bc x % da Bc)
Estrutura da Contribuição de Melhoria
1º) Se Vp = Bc x Alq, então Vp ≠ Bc ≠ Alq
- 1.1. Alq = % de Vi
2º)Vp = Y (Bc x Alq), onde Y é ≠ de Bc e Alq
- 2.1. Vp = Y (Bc x % de VI)
É perceptível que na tentativa de aplicar o modelo tradicional na compreensão do paradigma da contribuição de melhoria, não há consonância, pois na demonstração acima existe uma desconexão entre a alíquota e a base de cálculo no modelo de contribuição, fato que não acontece no paradigma tradicional, a saber:
1.1. Alq = % da Bc (modelo tradicional)
1.1. Alq = % de Vi (modelo de contribuição de melhoria)
Com efeito, a desconexão se dá porque o percentual de valorização do imóvel corresponde ao próprio valor a pagar, só que vertido em porcentagem, por este motivo, a alíquota não se liga à base de cálculo, deixando de ser elemento neutro (simples porcentagem da base de cálculo) para se conectar a hipótese de incidência.
Por conseguinte, ocorre novamente a violação aos postulados lógicos, quais sejam, Vp ≠ Bc ≠ Alq, pois na demonstração acima Alq corresponde ao próprio Vp, sendo dispensável o elemento Bc na apuração do valor a pagar.
No modelo tradicional, via de regra, a alíquota corresponde a uma % da base de cálculo, já no paradigma da contribuição a alíquota corresponde a uma porcentagem de valorização do imóvel.
Por essa diretriz, a alíquota da contribuição de melhoria deixa de ser elemento neutro, significa dizer, na estrutura tradicional a alíquota é apenas a porcentagem que é aplicada sobre a base de cálculo, sendo desvinculada do fato gerador, assim, por ser apenas um percentual aplicado sobre uma quantia numérica (Bc), conclui-se que é elemento neutro, mas a estrutura da contribuição de melhoria destoa dessa realidade, já que a alíquota perde a sua neutralidade, pois se encontra vinculada ao fato gerador, confundindo-se com ele próprio (violação ao postulado lógico, por meio do qual Vp ≠ Bc ≠ Alq).
Desta forma, é possível afirmar que a contribuição de melhoria não possui base de cálculo e nem alíquota, pois no modelo tradicional a base de cálculo pressupõe a existência de uma alíquota e vice-versa, devendo os dois elementos coexistir simultaneamente, ora, não sendo possível esta coexistência no paradigma da contribuição, a conclusão lógica é de que tais elementos (Bc e Alq) simplesmente não existem, sendo a contribuição de melhoria um tributo de critério quantitativo simplificado.
A tipologia dessa exação pode ser dada pela seguinte fórmula:
Vp = Vid - Via, onde Vp é o valor a pagar a título de contribuição de melhoria, Vid é o valor do imóvel depois da obra e Via é o valor do imóvel antes da obra, sendo que da simples subtração de tais valores já se obtém o valor referente à contribuição de melhoria, não sendo necessária a aplicação de uma alíquota sobre uma base de cálculo, como se faz necessário na estrutura tradicional dos tributos.
Outrossim, no que diz respeito aos limites do valor a pagar da contribuição de melhoria, o CTN prescreve:
Art. 81. A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é instituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.
A lei pátria prescreve a imposição de dois limites, quais sejam: a) o limite individual e b) o limite total.
a) limite individual, por este limite o contribuinte não responderá por parcela superior à efetiva valorização individual de seu imóvel, vale dizer, se a valorização real do imóvel é de 10,00, não pode a fazenda, através de índices fictícios, querer cobrar uma valorização de 20,00, sendo sempre dado ao contribuinte o direito de discutir judicial e administrativamente esse valor. Mais do que isso, o referido limite impõe que a administração analise discriminadamente a valorização imobiliária, pois a mesma obra que valorizou um imóvel em 10%, pode não ter valorizado outro da mesma forma.
b) limite total, por este limite o somatório das contribuições individuais não pode ser superior ao custo total da obra, assim, no exemplo anterior, se a obra teve um custo de R$ 50.000,00, o Estado não pode, somadas as contribuições individuais, arrecadar mais do que os R$ 50.000,00 que oneraram os cofres públicos.
Na combinação de situações possíveis entre o limite individual e o limite total, três hipóteses podem ocorrer:
a) o somatório das contribuições individuais é inferior ao custo da obra, neste caso, não haverá nenhum problema, pois o art. 81 do CTN veda apenas a situação inversa, ou seja, que o sujeito ativo, somadas as contribuições individuais, arrecade quantia superior ao custo da obra, nesta hipótese, o contribuinte será cobrado pelo limite individual que é a valorização de seu imóvel, veja-se o seguinte exemplo:
O poder público (União, Estados, Distrito Federal ou Municípios) opta por fazer uma obra orçada em 50,00 (custo da obra), todavia, a mencionada obra produziu a valorização de cinco imóveis, imagine que os cincos imóveis tinham o valor de 10,00 (antes da obra), passando a valer 11,00 depois da obra, desta forma, o somatório das contribuições individuais seria de 5,00, correspondentes a 11,00 - 10,00 que é = 1,00 x por 5, que é o número de imóveis beneficiados pela obra pública.
No exemplo acima, apesar do custo da obra ser superior ao somatório das contribuições individuais o Estado só poderá cobrar 1,00 de cada contribuinte e 5,00 no total.
b) o somatório das contribuições individuais é igual ao custo da obra, neste caso, não haverá nenhum problema, pois o art. 81 do CTN veda outra situação, qual seja, que o sujeito ativo arrecade quantia superior ao somatório das contribuições individuais, nesta hipótese, o contribuinte será cobrado pelo limite individual que é a valorização de seu imóvel, observe o seguinte exemplo:
O poder público (União, Estados, Distrito Federal ou Municípios) opta por fazer uma obra orçada em 50,00 (custo da obra), todavia, a mencionada obra produziu a valorização de cinco imóveis, imagine que os cincos imóveis tinham o valor de 100,00 (antes da obra), passando a valer 110,00 depois da obra, desta forma, o somatório das contribuições individuais seria de 50,00, correspondentes a 110,00 - 100,00 que é = 10,00 x por 5, que é o número de imóveis beneficiados pela obra pública.
c) o somatório das contribuições individuais é superior ao custo da obra, neste caso, deve ser respeitado o comando do art. 81 do CTN, que veda ao sujeito ativo arrecadar, somadas as contribuições individuais, quantia superior ao custo da obra, nesta hipótese, o contribuinte será cobrado pelo limite individual que é a valorização de seu imóvel, conforme o seguinte exemplo:
O poder público (União, Estados, Distrito Federal ou Municípios) opta por fazer uma obra orçada em 50,00 (custo da obra), todavia, a mencionada obra produziu a valorização de cinco imóveis, imagine que os cincos imóveis tinham o valor de 90,00 (antes da obra), passando a valer 130,00 depois da obra, desta forma, o somatório das contribuições individuais seria de 200,00, correspondentes a 130,00 - 90,00 que é = 40,00 x por 5, que é o número de imóveis beneficiados pela obra pública.
No exemplo acima, o somatório das contribuições individuais é superior ao custo da obra, assim sendo, o Estado não pode cobrar o valor de 40,00 da cada imóvel, pois se o fizer estará extrapolando o limite global, nesta hipótese, o sujeito ativo deverá promover uma redução proporcional no valor cobrado de cada contribuinte, até se chegar ao limite total que é o custo da obra, essa redução pode ser feita de duas maneiras:
1º) pela técnica da redução proporcional os valores devem ser reduzidos em proporção ao valor excedente, o valor total excedente é de 200,00 - 50,00, assim, constata-se um excedente global de 150,00, ao se dividir esse valor pelo número de imóveis é possível encontrar o excedente individual de cada imóvel, 150/5, onde 5 é o número de imóveis, assim, é possível constatar 30,00, como o excedente individual de cada imóvel, sendo que ao se subtrair o valor originalmente cobrado do excedente, obtêm-se o valor que realmente pode ser cobrado, ou seja, 40,00 - 30,00 = 10,00, (valor máximo a ser cobrado de cada imóvel).
2º) pela técnica da simplificação, ora, se 50,00 é o limite, basta dividir esse valor por 5 (número de imóveis), para se obter 10,00, todavia, deve ser feita a observação de que essa forma de cálculo existe apenas para simplificar as contas, isso não quer dizer que quando o somatório das contribuições individuais exceda o custo da obra, o contribuinte será cobrado pelo valor deste último, pois a obrigação tributária do sujeito passivo existe em virtude da valorização, entretanto, como lei prevê o custo da obra como limite global (total), na hipótese analisada, o contribuinte irá pagar uma parcela menor do que a efetiva valorização de seu imóvel.
Ao estabelecer como teto o custo da obra, a intenção do legislador foi fazer com que a contribuição de melhoria seja instrumento de ressarcimento dos cofres públicos, evitando que o Estado arrecada quantia superior ao dispêndio efetuado.
Pode-se concluir então que o limite global (custo da obra) é voltado tanto ao sujeito ativo, como limite de arrecadação, como ao sujeito passivo, sendo instrumento fiscalizador de que o Estado não excederá tal limite, da mesma forma, é o limite individual, pois voltado tanto ao Estado, como limite de cobrança do contribuinte, quanto ao próprio sujeito passivo, pois na hipótese do custo da obra ser menor que o somatório das contribuições de cada um, o limite individual deverá ser reduzido, ou seja, para Estado os limites significam restrições ao poder de cobrança, ao passo que para o contribuinte são instrumentos de fiscalização do valor cobrado.