4. O SUICÍDIO
Chamado de autoextermínio ou autocídio, o suicídio é o ato de colocar fim em sua própria vida, ou seja, matar-se. A palavra tem sua origem no latim, suicidium, em que sui significa “próprio” e o cidium “matar”. A ação de suicidar-se passou por diversas transformações no decorrer dos tempos. KOVÁCS (2016) relata que na antiguidade greco-romana, aqueles que ceifavam sua própria vida não teriam direito ao sepultamento, e suas mãos eram cortadas e enterradas separadas do corpo. No século XIX, na Europa, a prática era atribuída como crime, e os que sobreviviam eram aprisionados.
Para a religião, o suicídio possui diversos significados, e, em alguns destes, acredita-se que o cometimento desse ato é um crime espiritual, pois aquele que deu a vida é o único que poderá tirá-la. Em outras religiões, a condenação para a pessoa é o próprio motivo que o levou à pratica, pois caso tenha sido por razões ruins, a sua alma retornará triste, ou qualquer situação negativa. Ainda existem crenças, que não admite que o julgamento por esse mérito, pois somente cabe ao criador da vida.
Na busca de entender os motivos que levam uma pessoa ao autoextermínio, surgem diversos pontos de vista. A sociologia através de Émile Durkheim, atribui a ideia dessa prática ser fundamentada em questão social. DURKHEIM (1982, apud TORO et el, 2013), em seu livro “Le Suicide”, define que o suicídio é “todo caso de morte que resulte direta ou indiretamente de um ato positivo ou negativo, praticado pela própria vítima, sabedora de que devia produzir esse resultado”. Ademais, classifica o suicídio em três tipos: egoísta, altruísta e o anônimo.
O primeiro tipo, tem relação com a depressão ou sensação de abandono moral, causando desinteresse no convívio social. O segundo, é aquele em que se motiva sobre uma causa importante para sociedade ou comunidade, seu não cometimento é entendido como uma desonra e deverá ser punido. E o último, se caracteriza pelo reflexo de um estado desorganizado em que a ordem social se encontra em colapso.
A psicologia traz o entendimento fundamentado na individualização do ser, em que o ato é consequência de uma eliminação de dor psíquica. Ou seja, o indivíduo encontra no suicídio a única forma de eliminar a dor, seja ela não física, um sofrimento mental aparentemente sem solução, acreditando que a única forma para interromper tudo isso é a morte.
4.1. SUICÍDIO NO BRASIL
O sentimento suicida tem sua ligação em diversas causas que geralmente não são isoladas, o indivíduo procura solução para seus problemas e como lidar com o fracasso, remorso, rejeição, humilhação ou até mesmo a depressão, encontrando assim solução na sua própria morte. Transtornos mentais como a depressão, esquizofrenia, ansiedade ou até mesmo fantasias negativas, geram mudanças ou oscilações de humor, em que o possuidor do transtorno mental admite uma vulnerabilidade, pois existem outros fatores que auxiliam no gatilho para a prática do ato suicida. Em dados apresentados pela ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE (2017), dos 33.269 casos de tentativa de suicídio do sexo feminino, cerca de 25,5% possuíam algum transtorno/deficiência mental; e dos 14.931 casos do sexo masculino, cerca de 27,7%.
Segundo MANUAL PARA PREVENÇÃO AO SUICÍDIO (2017), elaborado pelo Ministério da Saúde, existem sinais emitidos pelo indivíduo que possui sentimento de acabar com a própria vida. Lembrando que não existe um cronograma ou manual para confirmar a crise suicida, contudo alerta que:
As pessoas sob risco de suicídio costumam falar sobre morte e suicídio mais do que o comum, confessam se sentir sem esperanças, culpadas, com falta de autoestima e têm visão negativa de sua vida e futuro. Essas ideias podem estar expressas de forma escrita, verbalmente ou por meio de desenhos. Alguns indivíduos começam a formular um testamento ou fazer seguro de vida. (BRASIL, Ministério da Saúde, 2017, p.3).
Ademais, expressões como “vou desaparecer”, “vou deixar vocês em paz”. “Eu queria poder dormir e nunca mais acordar”, não deverão ser tratadas como chantagem emocional. Como também o isolamento habitual, deixar de interagir, ficar em casa ou fechado em seu quarto, são comportamentos de evasão social. O manual explora outros fatores que podem auxiliar no comportamento suicida:
A exposição ao agrotóxico, perda de emprego, crises políticas e econômicas, discriminação por orientação sexual e identidade de gênero, agressões psicológicas e/ou físicas, sofrimento no trabalho, diminuição ou ausência de autocuidado, podem ser fatores que vulnerabilizam, ainda que não possam ser considerados como determinantes para o suicídio. Sendo assim, devem ser levados em consideração se o indivíduo apresenta outros sinais de alerta para o suicídio. (BRASIL, Ministério da Saúde, 2017, p.3).
O suicídio poderá afetar qualquer classe, idade ou gênero. Esse fenômeno de autodestruição é a 15ª causa de mortalidade do mundo, representando 1,4% de todas as mortes no mundo, dado apresentado através do BOLETIM EPIDEMIOLÓGICO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE (2017). O boletim traz o estudo do perfil epidemiológico dos indivíduos que cometeram suicídio, dividindo nas tentativas e os que chegaram ao óbito no Brasil. O período apresentado no periódico foi de 2011 a 2016.
O estudo analisou o perfil do autoextermínio no Brasil, trazendo o comparativo do gênero, raça/cor, escolaridade, idade, zona de residência, local de ocorrência, repetição, relação com o trabalho, o meio utilizado para autoprovocar a lesão (enforcamento; intoxicação exógena; arma de fogo; e outras formas). Em relação as tentativas, os dados definiram que as mulheres são:
53,2% eram brancas e 32,8% negras (pardas + pretas). Quanto à escolaridade, 28,5% delas apresentavam ensino fundamental incompleto ou completo e 25,5% ensino médio incompleto ou completo. A ocorrência de tentativa de suicídio se concentrou nas faixas etárias de 10 a 39 anos, representando 73,1% dos casos [...]; A grande maioria delas, 92,1%, residia na zona urbana, e os casos se concentraram nas regiões Sudeste (44,8%) e Sul (33,4%). Evidenciou-se que 88,9% dos casos ocorreram na residência, seguidos de 2,3% em via pública. Chamou a atenção o fato de 31,3% das lesões terem caráter repetitivo, embora fosse elevada a proporção de dados ignorados (27,9%). (BRASIL, Ministério da Saúde, 2017, p. 4).
Enquanto os homens foram:
52,2% eram brancos e 34,8% negros (pardos + pretos). Com relação à escolaridade, 30,1% deles apresentavam ensino fundamental incompleto ou completo e 22,6% ensino médio incompleto ou completo. Em 71,1%, os casos ocorreram nas faixas etárias de 10 a 39 anos. [...]; A grande maioria deles, 89,9%, residia na zona urbana, e os casos se concentraram nas regiões Sudeste (42,8%) e Sul (34,9%). A análise das características das ocorrências mostrou que 82,0% dos casos ocorreram na residência, seguidos de 5,4% em via pública. Apesar da elevada proporção de dados ignorados (29,6%), 26,4% das lesões tinham caráter repetitivo. (BRASIL, Ministério da Saúde, 2017, p. 4).
O Brasil registrou 55.649 óbitos por suicídio no período de 2011 a 2015. A taxa geral de 5,5/100mil habitantes, variando de 5,3 em 2011 a 5,7 em 2015. O boletim apresenta que:
O risco de suicídio no sexo masculino foi de 8,7/100 mil hab., sendo aproximadamente quatro vezes maior que o feminino (2,4/100 mil hab.). Em ambos os sexos, o risco aumentou, ao longo do período, passando de 8,4 para 9,1/100 mil hab. no sexo masculino e de 2,3 para 2,5/100 mil hab. no feminino. Assim, o crescimento da taxa foi de 0,7/100 mil hab. No sexo masculino e de 0,2/100 mil hab. no feminino. (BRASIL, Ministério da Saúde, 2017, p.6).
Os resultados expressos no boletim, traçam perfis de homens e mulheres que cometeram ou tentaram o suicídio no ano de 2017. Dados que são necessários para implementação de políticas que buscam impedir o aumento dos suicídios.
4.2. TIPO PENAL DE INDUZIMENTO, INCENTIVO E AUXILIO AO SUICÍDIO
A sociedade, com o passar do tempo, necessitou de uma regulamentação do comportamento, e nesse contexto, surgiu o Direito. A interferência do Estado, através de normas jurídicas traz a finalidade de controle e regimento da conduta do homem no meio social. Nesse diapasão surgiu o Direito Penal, ilustrando ação e consequência em que se o indivíduo praticar, será punido. ANÍBAL BRUNO (1967 apud MASSON, Cleber, 2017, p. 57).) conceitua o Direito Penal com:
O conjunto das normas jurídicas que regulam a atuação estatal nesse combate contra o crime, através de medidas aplicadas aos criminosos, é o Direito Penal. Nele se definem os fatos puníveis e se cominam as respectivas sanções – os dois grupos dos seus componentes essenciais, tipos penais e sanções. É um Direito que se distingue entre os outros pela gravidade das sanções que impõe e a severidade de sua estrutura, bem definida e rigorosamente delimitada.
O Código Criminal de 1830, já tipificava o crime de auxílio ao suicídio em seu artigo 196, nele que aduz que: “ajudar alguém a suicidar-se, ou fornecer-lhe meios para esse fim com conhecimento de causa. Penas - de prisão por dois a seis anos”. Como a revogação do Código Criminal de 1930, surgiu o Código Penal de 1940, que aumenta o tipo elencados no artigo do antigo código. O artigo 122, do CP, aduz que:
Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. (BRASIL, 1940)
As ações apresentadas no tipo penal poderão ocorrer isoladamente ou cumulativamente. Entender-se por induzimento o agente que incutir, inspirar ou apresentar ideia de suicídio àquele que não possua, poderá responder pelo presente tipo penal. O artigo também engloba ações como instigar ou prestar auxílio para que alguém retire sua própria vida.
Na doutrina existe controversa acerca do auxílio pela modalidade omissiva. Segundo NUCCI (2017) existem duas correntes: a) a que não admite o auxílio por omissão, pois a ação de “prestar auxílio” é do tipo comissivo; b) a que admite e afasta o entendimento da primeira corrente, pois, o tipo comissivo admite a omissão, ressaltando que o agente será punido quando teria o dever de impedir e não o fez. Para ilustrar, o autor exemplifica:
O pai que, sabendo da intenção suicida do filho menor, sob poder familiar, nada faz para impedir o resultado e a enfermeira que, tomando conhecimento da intenção suicida do paciente, ignora-a por completo, podem responder pela figura do auxílio, por omissão, ao suicídio (NUCCI, 2017, p.464).
Para tanto, todas estas teorias deverão ser respaldadas à luz do direito, em que omitir-se, será o agente responsável por sua omissão, podendo esse ter evitado a consumação do tipo, pela autor do ato.
5. NEXO DE CAUSALIDADE
A conduta praticada pelo agente e o resultado produzido, chama-se nexo causal ou relação de causalidade. GRECO (2017) esclarece que é o elo que une a ação praticada e a produção do resultado, gerando fatores necessários para a atribuição ao agente a responsabilidade pelo ato. Segundo Bitencourt (2014), o fato delituoso apresenta-se como tipo objetivo de forma externa, como por exemplo, os crimes que são de mera conduta, em que o ato se satisfaz pelo tipo legal, já os que possuem resultado, torna-se necessário a análise do nexo de causalidade. Diante disso, não havendo essa relação, não existira possibilidade do agente ser responsabilizado.
O art. 13, do Código Penal, traz o entendimento de que a causa é a ação ou omissão que possibilitou o resultado, e que sem ele, não poderia ocorrer. Já o resultado que determina o crime, só poderá ser atribuído a quem deu a causa.
A causa pode ser conceituada como qualquer ação ou até mesmo a omissão, sendo tais fatores substanciais para a existência do resultado. Guilherme Nucci (2017) explica que: “não há qualquer diferença entre causa, condição (aquilo que permite à causa produzir o seu efeito) e ocasião (circunstância acidental que favorece a produção da causa), para fins de aplicação da relação de causalidade” (p. 482). Nesse contexto, para investigar se o fato foi a causa de um determinado crime, retira-o do cenário, e se mesmo com sua ausência, produzir o resultado, esse fato não é considerado causa do crime.
O resultado poderá ser analisado em dois critérios, podendo ser expresso na sua forma naturalista ou jurídica. Consoante aos critérios apresentados, NUCCI (2017) explica que o resultado naturalístico:
O resultado naturalístico é a modificação sensível do mundo exterior. O evento está situado no mundo físico, de modo que somente se pode falar em resultado quando existe alguma modificação passível de captação pelos sentidos. Exemplo: a morte de uma pessoa é um resultado naturalissimamente comprovável. Já o resultado jurídico é a modificação gerada no mundo jurídico, seja na forma de dano efetivo ou no de dano potencial, ferindo interesse protegido pela norma penal. Sob esse ponto de vista, toda conduta que fere um interesse juridicamente protegido causa um resultado. Exemplo: a invasão de um domicílio, embora possa nada causar sob o ponto de vista naturalístico, certamente provoca um resultado jurídico, que é ferir o direito à inviolabilidade de domicílio do dono da casa. (p. 483).
O nexo de causalidade é uma discussão bastante antigo, e com o passar do tempo, surgiram várias teorias acerca do nexo de causalidade, trazendo soluções para o entendimento dessa ferramenta para o ordenamento jurídico, além de críticas em sua aplicação.
5.1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA
No passar do tempo sugiram várias teorias de causalidade, onde foram criados meios para a configuração da existência de crime, imputando-o ao agente causador. Nessa evolução, destacamos as três teorias mais importantes para a construção da ideia causal: Teoria da Condição ou Equivalência; Teoria da Adequação e a Teoria da relevância jurídica.
A teoria da condição ou equivalência, também é conhecida como a teoria da equivalência dos antecedentes causais. Tal teoria é conceituada como a causa, ou tudo aquilo que que tenha agregado, mesmo em menor potencial, a produção do resultado, eliminando, de uma forma mental, e mesmo que esse resultado tenha ocorrido, aquela causa não é constituída como fator de produzir o resultado. A presente teoria também é conhecida como teoria da conditio sine qua non (condição sem a qual não), Segundo CONSTANTINO (2017):
A causa é toda a condição sem a qual o evento não teria ocorrido, do modo como ocorreu. Para a constatação do nexo causal, a corrente doutrinária ora examinada utilizasse de uma fórmula ou procedimento, denominado procedimento de eliminação hipotética, através do qual uma suposta causa é mentalmente suprimida de uma cadeia causal, para se saber se tal fator é causa ou não-causa do evento. (p. 44).
A teoria das condições foi bastante criticada por diversos estudiosos, o critica pairava pelo chamado “regressus ad infinitum” (retorno ao infinito), em que determina como causa tudo aquilo que contribuiu para o resultado. A exemplo, CONSTANTINO (2017) cita:
Um atropelamento efetuado com veículo automotor, dirigido por um indivíduo ébrio, que cause a morte da vítima, deve-se concluir que a ação culposa (imprudente) do motorista é causa, mas também são causas da ocorrência: o automóvel, quem fabricou as autopeças e montou o veículo, quem vendeu o veículo ao perpetrador do atropelamento, quem extraiu os minérios da Natureza para a confecção das autopeças; a bebida alcoólica, bem como quem industrializou e vendeu a citada bebida ao motorista; os pais do motorista, que o geraram, etc. (p.48).
A teoria da adequação surge como uma análise pessoal do Juiz, pois o magistrado utiliza-se das suas experiências da vida ou do cotidiano como meio de enquadramento da causa ao resultado. Contudo, essa teoria foi bastante comentada, pois se utilizava de causas prováveis, sem nenhuma base sólida de enquadramento, razão essa, que não foi aceita pelo ordenamento jurídico.
A seguir, surge a terceira teoria, a teoria da relevância jurídica. Os doutrinadores dessa corrente estabelecem que a identificação do nexo de causalidade deverá ser realizada pela Teoria da Condição, porém a imputação do resultado ao agente deverá ser sustentada pela relevância à norma jurídica. CONSTANTINO (2017) traduz o entendimento através do seguinte exemplo:
O indivíduo F tem consciência de que seu conhecido J sofre de uma grave enfermidade cardíaca e, portanto, não pode experimentar emoções fortes; mas querendo matá-lo, F conta uma piada extremamente engraçada a J, sendo certo que este último é tomado de uma crise incontrolável de riso, devido à piada, e sofre um ataque cardíaco fulminante, que o leva a óbito; pois bem: no tocante à causalidade física (analisada segundo os postulados da teoria da condição), obviamente a piada contada por F foi causa da crise de riso irrefreável em J, decorrendo daí seu ataque cardíaco e morte; entretanto, analisando-se a conduta de “contar uma piada” e observando-se a finalidade da norma jurídica e os caracteres do tipo penal correspondente (homicídio – “matar alguém”), há que se negar a relevância jurídica da respectiva causa (piada). (p.51)
Entretanto, a teoria apresenta problema na sua análise, pois utilizando a teoria da condição, cria-se a dificuldade em interromper o regresso, por ser a causalidade medida pelas Leis da Física.
5.2. TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVO
A teoria da imputação objetiva foi desenvolvida por Claus Roxin na década de 1970, trazendo uma complementação das teorias causais anteriores, bem como uma solução para o regressus ad infinitum. A imputação objetiva visa limitar a responsabilidade do agente que pratica uma determinada ação, apresentando critérios, que serão analisados a fim de atribuir o resultado ao responsável pela conduta.
Destarte, para atribuir um resultado a um sujeito, não será necessário determinar seu nexo de causalidade, mas sim a existência de um nexo que seja possível analisar se houve a criação de um risco proibido, ou elevou aquele permitido.
A teoria determina que, para imputar um resultado na conduta de um agente, será imprescindível avaliar se esta conduta prosperou para a criação ou aumento de um risco. ROXIN (2002), simplifica dizendo que
Um resultado causado pelo agente só deve ser imputado como sua obra e preenche o tipo objetivo unicamente quando o comportamento do autor cria um risco não permitido para o objeto da ação, quando o risco se realiza no resultado concreto, e este resultado se encontra dentro do alcance do tipo. ( p.11).
A imputação objetiva de Claus Roxin utiliza critério para atribuição da responsabilidade ao agente, supostamente, responsável pelo resultado. GRECO (2014) resume que “a imputação objetiva enuncia o conjunto de pressupostos genéricos que fazem de causação, uma conduta objetivamente típica”.
Além disso, o autor destaca que a teoria traz uma posição secundária ao tipo subjetivo e a finalidade, trazendo prioritariamente o tipo objetivo para a imputação. GRECO (2014) salienta que “esse tipo objetivo não pode, porém, esgotar-se na mera causação de um resultado”, sendo necessário que preencha as ideias aduzidas na presente teoria, como a criação de um risco juridicamente desaprovado e a realização deste no resultado.
5.2.1. Criação do risco não permitido
A criação do risco não permitido tem por finalidade analisar o comportamento do autor, sendo influenciado por circunstâncias subjetivas. O risco não permitido é aquele no qual a ação é ilícita, e que sendo praticada, poderá ocasionar um risco de perigo ao objeto da ação, e nesse contexto, o dolo encontra-se de forma secundária para imputar o resultado ao agente. PRADO (2005) apresenta como exemplo:
"A", sobrinho e herdeiro de "B", o envia em uma viagem de avião com a esperança de que sofra um acidente e que, em consequência, morra. Também seria aplicável tal critério às hipóteses de desvio do curso causal (p. ex., "A", atropelado por "B", morre ao ser levado ao hospital em razão de um acidente com a ambulância que o transportava).
O autor enfatiza que nos exemplos citados não seria possível atribuir a imputação objetiva, pois em tais exemplos, a ação do agente não criou um risco juridicamente proibido, apenas utilizou-se da pretensão que o resultado ocorra, no caso a morte, não criando risco de morte juridicamente relevante. Logo, para que seja imputado o resultado ao autor da ação, é indispensável a existência de um risco desaprovado que se materialize em uma consequência provável.
5.2.2. Aumento do risco permitido
O risco permitido é aquele tolerável e comum na vida em sociedade, a exemplo o avião, onde existe uma possibilidade de acidente, mas esse meio de transporte é essencial para a locomoção, na mesma ideia, existe o trânsito, em que os deslocamentos de carros ou qualquer automóvel, possuem risco de acidente, mas por precisarmos destes meios para percorrer longos trajetos, tornam-se tais riscos toleráveis.
PRADO (2005), apresenta mais um exemplo, em que:
"A", industrial, infringindo o dever de cuidado, entrega a seus trabalhadores matéria-prima não desinfetada para manejo, o que provoca a morte de quatro deles. Ao depois, constata-se que tampouco a desinfecção aconselhada teria eliminado a possibilidade de as mortes virem a ocorrer.
Diante do exemplo, torna-se possível o reconhecimento do nexo de imputação, que no caso “A” encontra-se no dever de cuidar, sendo que sua negligência e falta de observação implica no aumento do risco, intensificando-o. Ações essas que são relacionadas aos delitos culposos, em que o autor da ação não deseja o resultado, mas assume o risco por negligência ou imperícia.
5.2.3. A diminuição do risco
Na teoria objetiva, existe possibilidade em que impossibilita responsabilizar, ou reconhecer, o agente como causador do injusto, podendo existir o nexo causal, mas não o da imputação. Tavares (2000 apud CONSTANTINO, 2017, p. 54) apresenta critérios que afastam o nexo de imputação, sendo que tais critérios são: “que o risco, no caso, era tolerável ou permitido; o agente diminuiu o risco para o bem jurídico; [...]”.
Quando o agente diminui o risco também não se enquadra a imputação objetiva, como no caso apresentado por ROXIN (2002) que:
Quem convence o ladrão a furtar não mil, mas somente cem marcos alemães, não é punível por participação no furto, pois sua conduta não elevou, mas diminuiu o risco de lesão. O mesmo vale para a redução de lesões corporais em rixas, bem como para vários casos análogos” (p.11).
O exemplo citado pelo autor admite a existência do nexo causal, mas afastar a Teoria da Imputação Objetivo, pois o agente não criou o risco, tampouco aumentou, mas diminuiu. Dessa forma, a redução da lesão possibilita o exaurimento da presente teoria.
5.2.4. A imputação objetiva de Günther Jakobs
Na visão de Gunther Jakobs, a imputação objetiva se estrutura pelo papel do indivíduo dentro da sociedade, ou seja, as relações desenvolvidas, bem como o convívio no meio social são necessárias para a análise da teoria. A vida torna-se complicada diante dos diferentes indivíduos que compõem o corpo social, as lesões surgem pelo convívio entres esses seres.
O papel que cada pessoa desempenha na sociedade torna-se essencial para análise da imputação. Logo, caso o agente viole seu papel, será atribuído o resultado gerado, diferente se a pessoa agiu dentro do limite, que desta maneira, será considerado um mero acidente. Entretanto, se o ato foi omisso em sua totalidade ou parcialidade, passar-se-á imputar o resultado.
JAKOBS (2000, apud PRADO, Luiz, 2005, p.6) ressalta a necessidade de analisar alguns requisitos para que se impute o resultado aquele que deu causa, tais como: o risco permitido; o princípio da confiança; a proibição de regresso; e a competência ou capacidade da vítima.
Considera-se risco permitido as ações aceitas e válidas no meio social, baseadas no contato entre os indivíduos que fazem parte da sociedade. As relações já geram um risco de lesão, contudo são aceitas pela necessidade de convívio. O princípio da confiança determina que o agente confiará que outro fará seu papel, ou cumprirá com sua obrigação perante a sociedade. Já a ideia da proibição de regresso tem relação com o princípio da confiança, envolvendo a figura de um terceiro indivíduo, no qual o agente não poderá ser responsabilizado pela conduta deste, como a exemplo: um vendedor de punhal, que vende para aquele que utiliza para assassinar uma pessoa, e, nesse contexto, o vendedor não poderá ser responsável pelo assassinato.
Quanto a competência ou capacidade da vítima, suas ações acarretará o afastamento da imputação objetiva ao agente causador, nas situações em que consente na prática do ato, ou assume o risco.
Das teorias desenvolvidas ao longo tempo, a imputação objetiva trouxe a solução acerca do regresso ao infinito, limitando a responsabilidade ao agente que cria um risco juridicamente proibido, ou aumento um risco permitido. Gunther Jakobs desenvolve uma visão divergente da teoria principal, em que, a solução para a limitação do regresso, é a identificação do risco determinante do resultado:
[...] dentre os antecedentes causais, deve-se selecionar aqueles determinantes, definidos pelo autor como risco determinante, que pode consistir em conduta de um ou de vários dos intervenientes, até mesmo da própria vítima, que neste caso deve suportar a título de fatalidade ou acidente. (GUNTHER, Jakobs. 2000, p.17 apud SOUZA, Valéria, 2006. p.68):
Desse modo, analisando o lapso temporal da relação causal, será necessário identificar a causa determinante para o resultado, que por consequência ocorre a vedação do regresso ao infinito. Ou seja, o agente que agiu fora de seu papel social ou omitiu-se em alguma parte integrada do ato, sendo essa ação determinante para o resultado, será imputado a este a responsabilidade.