A formação do direito público no antigo regime se fundamentou amplamente nos conceitos jurídicos do direito romano. O conceito de “jurisdição” foi especialmente importante para a relação entre os poderes do Estado e da Igreja. Por outro lado, as funções não propriamente jurisdicionais, como a tributação, o disciplinamento e mesmo a “polícia” foram mais diretamente influenciadas pela doutrina do direito canônico.
O “direito da igreja” ofereceu um molde intelectual e conceitual para a prática administrativa estatal essencial no antigo regime. Esta influência não se deu sem conflitos e as relações entre o “direito comum”, o direito real legislado e o direito canônico compuseram um ordenamento jurídico complexo que exige do historiador uma grande sensibilidade. A relação entre o direito canônico e o desenvolvimento administrativo do Estado no antigo regime foi especialmente complexa no mundo colonial.
Nas Américas, a capacidade material e política de ordenar a sociedade e as relações locais de poder estava longe de ser consolidada pela administração real. Ao longo da expansão colonial e de diferentes formas, a estrutura eclesiástica forneceu uma moldura através da qual se pode assegurar e desenvolver um “mínimo de estatalidade” nas colônias, base para o desenvolvimento de outras instituições.
As pesquisas em História do Direito hoje devem ser capazes de analisar em que medida o “direito da igreja” influenciou o “direito da administração colonial” portuguesa no Brasil. A pesquisa de fontes doutrinárias junto a regimentos, legislação e estatutos dos tribunais coloniais e da administração fazendária oferece novas perspectivas para a compreensão da influência da doutrina e disciplina do direito canônico sobre a formação da administração colonial portuguesa no Brasil.