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O plano diretor como instrumento de política urbana

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Agenda 08/04/2019 às 16:30

4 INSTRUMENTOS DE INTERVENÇÃO URBANÍSTICA VIABILIZADOS PELO PLANO DIRETOR

O plano diretor municipal é o instrumento principal da execução da política de desenvolvimento e ocupação do Município, sendo esse o espaço ideal para o debate sobre as necessidades locais, devendo-se observar que qualquer deliberação deve estar em sintonia com os princípios regionais e nacionais, conforme anteriormente abordado.

Uma característica importante do plano diretor e fundamental para a pesquisa que se materializa no presente trabalho, é que sua instituição é obrigatória para a efetiva implementação de diversos institutos jurídicos que o Poder Público pode efetivar, no sentido de impor sanções ao proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado.

Uma dessas hipóteses está prevista no artigo 182, § 4º da Constituição da República, que condiciona à prévia inclusão de determinada área no plano diretor para que o Poder Público possa compelir ao adequado aproveitamento do solo urbano, sob pena de haver, sucessivamente: I – parcelamento ou edificação compulsória; II – IPTU progressivo no tempo; III – desapropriação para fins urbanísticos.

Também o Estatuto da Cidade condiciona a aprovação do plano diretor para a implementação de diversos institutos como: I – outorga onerosa do direito de construir; II – direito de preempção; III – operações urbanas consorciadas; IV – transferência do direito de construir.

A partir disso é possível afirmar que o plano diretor é, portanto, uma diretriz do Poder Público e da própria sociedade.

Para o presente trabalho interessa analisar o plano diretor a partir de sua característica viabilizadora de políticas urbanas que, por sua vez, se manifestam de duas formas principais: as limitações urbanísticas à propriedade e o aproveitamento adequado compulsório. São os temas que serão abordados a seguir, sempre considerando o enfoque do plano diretor adotado no presente trabalho, qual seja a de instrumentalizar a aplicação de políticas urbanas.

4.1 LIMITAÇÕES URBANÍSTICAS À PROPRIEDADE

Por muito tempo o direito de propriedade fora tido como absoluto, exclusivo e perpétuo. Absoluto, pois o proprietário poderia usar e dispor das coisas como melhor lhe aprouvesse. Exclusivo, pois o exercício da propriedade pelo seu titular excluía todos os demais não proprietários. E, finalmente, perpétuo, pois o direito não desaparecia com a morte de seu titular, tampouco se perdia pelo não uso.

Porém, conforme visto anteriormente, o direito de propriedade não é mais considerado pelo ordenamento jurídico como um direito absoluto e ilimitado de seu titular. Ao contrário, a sua existência condiciona-se à efetivação de uma função social.

A funcionalização do direito de propriedade impõe ao seu titular uma série de restrições que flexibilizam seus caracteres clássicos.

A partir disso se pode definir que limitações ao direito de propriedade são todas as interferências que, de qualquer modo, afetem os caracteres desse direito.

Dentre as várias classificações que a doutrina apresenta, verifica-se a existência de limitações de direito constitucional, de direito administrativo e de direito urbanístico.

O fato, contudo, é que a limitação à propriedade privada, conforme lição de José Afonso da SILVA constitui um gênero, das quais são espécies as restrições, as servidões e a desapropriação.[54]

Interessante verificar o paralelo feito pelo autor entre essas restrições, o direito urbanístico e os caracteres do direito de propriedade ao afirmar que “porque aqui interessa apenas considerar sua interferência com a atividade urbanística, diremos que as limitações urbanísticas à propriedade compreendem: as restrições urbanísticas, a servidão urbanística e a desapropriação urbanística [...] As restrições limitam o caráter absoluto da propriedade; as servidões, o exclusivo; e a desapropriação, o caráter perpétuo”.[55]

É, pois, essa classificação que será adotada para estudar as limitações à propriedade no presente trabalho e que será abordada a seguir.

4.1.1 Restrições Urbanísticas à Propriedade

Por limitar o caráter absoluto da propriedade, as restrições urbanísticas limitam as faculdades de fruição, modificação e de alienação que o proprietário tem ao seu dispor.

Sobre a restrição da faculdade de fruição da propriedade, cabe ressaltar a lição de José Afonso da SILVA:

A faculdade de fruição – que é manifestação do caráter absoluto do direito de propriedade – consiste no poder, que o proprietário tem, de tirar de sua propriedade todas as vantagens que ela possa proporcionar. O proprietário exerce essa faculdade por meio do uso e da ocupação da coisa que lhe pertence, de sorte que as restrições a essa faculdade efetivam-se mediante restrições ao uso e à ocupação.[56]

Logo, porque o proprietário exerce a faculdade de fruição da propriedade através da ocupação e do uso que faz da coisa, as restrições urbanísticas devem atingir exatamente essa duas ações.

Neste ponto, cabe ao plano diretor estabelecer as restrições ao uso da propriedade, com caráter de generalidade, executoriedade, razoabilidade e não-confiscatoriedade, que, em razão de tais características devem ser suportadas.

As restrições ao uso da propriedade são normas trazidas no plano diretor que disciplinam o zoneamento, de forma que o proprietário não pode dar ao seu imóvel o uso que melhor lhe aprouver. Fica ele limitado aos usos definidos no plano diretor.

De igual forma, o plano diretor age em relação à ocupação, quando limita o seu coeficiente, estabelece recuo e alinhamento, ou quando impede a edificação.

As restrições não se limitam à faculdade de fruição, como visto. Atinge também à modificabilidade da propriedade. Isso ocorre quando o plano diretor vincula à prévia aprovação e autorização da municipalidade o loteamento, fracionamento e o desmembramento de lotes.

Acresça-se a isso as restrições de imodificabilidade advindas do tombamento, que proíbe qualquer alteração das características no imóvel sem a autorização da autoridade competente.

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Por fim, existem as restrições quanto à alienabilidade da propriedade, manifestado principalmente no direito de preempção em favor do Município como instrumento de política urbana, previsto nos arts. 25 a 27 do Estatuto da Cidade.

Com base nesse instituto fica estabelecido um direito de preferência ao Poder Público Municipal para a aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares, o que limita a faculdade do proprietário de disposição do bem da forma que melhor lhe aprouver, em prol do interesse coletivo.

Feita essa análise, passa-se ao estudo das limitações ao caráter exclusivo da propriedade, consubstanciado nas servidões urbanísticas.  

4.1.2 Servidão Urbanística

Como dito, a servidão urbanística mitiga a faculdade de exclusividade que o proprietário detém sobre determinado objeto. Ao contrário das restrições urbanísticas, cuja natureza é generalista, a servidão possui natureza pontual e específica. José Afonso da SILVA assim a define:

Trata-se de uma forma de limitação ao direito de propriedade que atinge seu caratê exclusivo, o que lhe dá sentido singular, e não geral. Constitui ônus real imposto a um imóvel, particular ou público, no interesse da atividade urbanística do Poder Público.

Vincula duas coisas: uma serviente (imóvel particular, geralmente; mas também público) e um bem de domínio público, como coisa dominante. Por ser limitação singular, é indenizável.[57]

Trata-se de uma limitação á exclusividade do domínio sobre um imóvel em benefício de um bem de domínio público, no interesse da ordenação dos espaços habitáveis.

A servidão urbanística é utilizada sempre que o ente estatal dela necessitar se servir para, na execução do plano urbanístico, necessitar, por exemplo, construir vias de circulação subterrâneas ou elevadas as quais passarão por cima ou por baixo de determinada propriedade privada sem, no entanto, absorvê-la.

Constitui também servidão urbanística, o ônus suportado pelo proprietário de imóvel de ter sua propriedade atravessada por fios e cabos elétricos ou telefônicos.

Ressalte-se que, por se tratar de uma limitação imposta caso a caso, de maneira singular, o proprietário deve ser indenizado pelos prejuízos efetivamente suportados.

Existem outras formas de limitação da exclusividade que o proprietário detém além da servidão urbanística e que com esta não se confundem.

Uma delas é o direito de superfície urbanístico, previsto nos art. 21 a 24 do Estatuto da Cidade, através do qual se atribui a pessoa diversa do proprietário direito real de utilização do solo.

José dos Santos CARVALHO FILHO conceitua direito de superfície como sendo ”aquele pelo qual o proprietário concede a outrem, por tempo determinado ou indeterminado, o direito de utilizar a superfície de seu imóvel na forma do pactuado no respectivo contrato”.[58]

Mediante escritura pública é possível, por exemplo, a um proprietário que não possua as condições materiais necessárias à edificação de um prédio, institua direito de superfície em favor de um superficiário, que nele poderá edificar e utilizar-se da construção sem através disso adquirir a propriedade do solo. Objetiva a regularização fundiária e o ordenamento e direcionamento da expansão urbana de modo adequado

Resta ainda abordar os institutos que flexibilizam a perpetuidade do direito de propriedade, o que será visto a seguir quando da abordagem da desapropriação urbanística.

4.1.3 Desapropriação Urbanística

A desapropriação urbanística encerra a série de limitações urbanísticas da propriedade.

Celso Antônio BANDEIRA DE MELLO assim define a desapropriação: “do ponto de vista teórico, pode-se dizer que desapropriação é o procedimento através do qual o Poder Público compulsoriamente despoja alguém de uma propriedade e a adquire, mediante indenização, fundado em um interesse público. Trata-se, portanto, de um sacrifício de direito imposto ao desapropriado”.[59]

A desapropriação urbanística, entretanto, distancia-se do conceito clássico para caracterizar-se como um instrumento de realização da política do solo urbano, conforme aponta o próprio autor mais adiante ao lecionar:

Incide apenas sobre imóveis sitos em áreas – inclusa no plano diretor de desenvolvimento urbano do Município – para a qual haja lei municipal específica autorizando exigir dos proprietários, nos termos da Lei federal 10.257, de 10.7.2001, autodenominada “Estatuto da Cidade”, que lhes promovam adequada utilização. Se persistirem em não fazê-lo, é possível a desapropriação por títulos. Entretanto só terá lugar depois de adotadas, infrutiferamente e nesta ordem, as seguintes medidas: (I) imposição de parcelamento do solo ou edificação compulsória e (II) tributação do imposto territorial ou predial progressivo no tempo.[60]

A partir da noção trazida por Celso Antônio BANDEIRA DE MELLO, inicialmente é possível extrair que a desapropriação urbanística só é viável para as áreas previstas no plano diretor, o que novamente traz a lume sua importância enquanto instrumento viabilizador da política urbana.

A esse respeito importante é a lição de Jose Afonso da SILVA ao afirmar que a desapropriação urbanística tem como pressuposto “a aprovação de um plano urbanístico geral, particularizado, parcial, especial ou setorial, ou projeto de urbanificação quer para transformar áreas urbanizadas e já edificadas, renovando-as, dando-lhes nova destinação; quer preparando terrenos rústicos para convertê-los em solo urbano destinado à edificação para diversos usos previstos na lei de zoneamento”.[61]

Em um segundo momento também é possível estabelecer que a desapropriação somente ocorrerá quando inexitosos os esforços consubstanciados nas ações de aproveitamento adequado compulsório do solo urbano, que serão tratadas no próximo item deste trabalho.

O fato é que a desapropriação urbanística não consiste propriamente em um instrumento de transferência de imóveis do particular ao Poder Público, mas, conforme apregoa José Afonso da SILVA, é um instrumento destinado a conferir uma utilização positiva desses bens, em conformidade com o que dispõe o plano diretor.[62]

Para completar o entendimento da desapropriação urbanística e os pressupostos que a enseja, mister analisar os instrumentos de aproveitamento compulsório viabilizados pelo plano diretor.

4.2 APROVEITAMENTO ADEQUADO COMPULSÓRIO

O objeto do estudo a ser desenvolvido no presente item encontra fundamento no parágrafo 4º do art. 182 da Constituição da República, que assim dispõe:

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.

[...]

§ 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:

I - parcelamento ou edificação compulsórios;

II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;

III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

Antes de tudo é preciso relembrar que o próprio art. 182, em seu parágrafo 2º, menciona expressamente a propriedade urbana, inserida no contexto de normas e planos urbanísticos, vinculando sua função social à ordenação da cidade manifestada no plano diretor.

Vez mais se desvela a importância que o plano diretor assume na viabilização das políticas relacionadas à ordem urbanística, principalmente no que toca ao disciplinamento da função social que a propriedade urbana deve exercer. Sobre essa função social reitera José Afonso da SILVA que “com as normas dos arts. 182 e 183 a CF fundamenta a doutrina segundo a qual a propriedade urbana é formada e condicionada pelo direito urbanístico a fim de cumprir sua função social específica: realizar as chamadas funções urbanísticas de propiciar habitação (moradia), condições adequadas de trabalho, recreação e de circulação humana”. [63]

Segue adiante a análise individualizada dos instrumentos de aproveitamento adequado compulsório colocado à disposição do Poder Público.

4.2.1 Parcelamento, Edificação e Utilização Compulsórios

A realização do aproveitamento adequado do solo urbano se realiza primeiramente a partir da aplicação dos institutos do parcelamento, da edificação e da utilização compulsórios que, a rigor, tem por objetivo garantir o cumprimento da função social da cidade e da propriedade, por meio da indução da ocupação de áreas vazias ou subutilizadas, onde for considerado prioritário pelo Município.

Dentre os pressupostos necessários a compelir o proprietário a conferir uso, edificar ou parcelar seu lote encontra-se a necessidade de que a área onde se encontra o imóvel esteja prevista no plano diretor. Tal conclusão é possível extrair da lição de José Afonso da SILVA, a seguir transcrita:

Observe-se que o parcelamento, a edificação e a utilização compulsórios, nos termos do art. 182, § 4º, I, da CF, só se legitimam se forem atendidos os pressupostos e fins ali configurados, quais sejam: (a) existência de um plano diretor que inclua áreas cujo aproveitamento específico se colima; (b) existência de lei municipal específica conferindo ao Poder Público Municipal a faculdade de exigir o dito aproveitamento; (c) existência de lei federal regulando o assunto; (d) que o solo seja urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado.[64]

José dos Santos CARVALHO FILHO manifesta posição em igual sentido:

A outra condição reside na menção da área no contexto do plano diretor. Esta condição, aliás, deve preceder a anterior: só depois de fixadas as áreas no plano diretor é que poderá ser editada lei municipal específica para a área em que estarão os imóveis sujeitos ao parcelamento, edificação ou utilização compulsórios. Sendo assim, é curial a conclusão de que a ausência de indicação das áreas no plano diretor inviabiliza a promulgação da lei específica a que se referem os dispositivos constitucional e legal.[65]

Visto isso, cumpre analisar mais detidamente cada um dos institutos.

O parcelamento compulsório é a providência pela qual o Poder Público procede impositivamente à subdivisão do solo urbano em frações iguais ou não, de molde a que resultem em uma pluralidade de lotes autônomos em substituição à área parcelada.

Já a edificação compulsória se origina de ato do Poder Público que obriga o proprietário de solo não edificado a edificar obra que atenda aos índices mínimos de aproveitamento previstos no plano diretor. Nada impede, todavia, a aplicação do instituto nas hipóteses de subutilização, ou seja, para aqueles casos onde exista uma construção, porém que não atenda ao mínimo de aproveitamento definido no plano diretor.

Esse mesmo fundamento aplica-se para a utilização compulsória, através da qual o proprietário de imóvel não utilizado ou subutilizado promova o uso próprio de acordo com os padrões definidos no plano diretor.

Na hipótese do proprietário não acudir às determinações do Poder Público, o Estatuto da Cidade coloca a disposição da municipalidade uma ferramenta de coerção eficiente, qual seja, a possibilidade de progressividade do IPTU no tempo. É o que será abordado a seguir.

4.2.2 IPTU Progressivo no Tempo

Tal qual o parcelamento, uso e edificação compulsórios, o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano)  também busca seu fundamento de validade na Constituição, sendo expressamente previsto em seu art. 182, § 4º, inc. II.

Também é previsto no art. 5º do Estatuto da Cidade, que assim disciplina o instituto:

Art. 7º Em caso de descumprimento das condições e dos prazos previstos na forma do caput do art. 5o desta Lei, ou não sendo cumpridas as etapas previstas no § 5o do art. 5º desta Lei, o Município procederá à aplicação do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo, mediante a majoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos.

§ 1º O valor da alíquota a ser aplicado a cada ano será fixado na lei específica a que se refere o caput do art. 5º desta Lei e não excederá a duas vezes o valor referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de quinze por cento.

§ 2º Caso a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar não esteja atendida em cinco anos, o Município manterá a cobrança pela alíquota máxima, até que se cumpra a referida obrigação, garantida a prerrogativa prevista no art. 8º.

§ 3º É vedada a concessão de isenções ou de anistia relativas à tributação progressiva de que trata este artigo.

Trata-se, em verdade, de instrumento de política urbana através do qual o Poder Público municipal emprega seu poder de coerção a fim de obrigar o proprietário a adequar seu imóvel ao plano diretor da cidade.

Novamente revela-se a importância que o plano diretor ostenta na organização urbanística do Município. A despeito de não disciplinar diretamente o instituto, é decorrência lógica que só poderá ele ser aplicado nas áreas já delimitadas no plano diretor cujos proprietários compelidos a parcelar, conferir uso ou edificar, permanecem inertes.

Decorre disso o próprio sentido do instituto que, na lição de José dos Santos CARVALHO FILHO pode ser definido “como instrumento de política urbana, implica a possibilidade de cobrar esse imposto do proprietário de bem imóvel, majorando-se a alíquota  respectiva em cada período anual, de forma a compeli-lo ao cumprimento da obrigação de parcelamento ou edificação, adequando-se então o imóvel à ordem urbanística prevista no plano diretor”.[66]

Nota-se, pois, que a tributação progressiva possui o objetivo específico de compelir o proprietário a dar destinação conforme ao imóvel em conformidade com o plano diretor. Logo, não espelha tributo de natureza fiscal, por não se destinar a meramente propiciar arrecadação de recursos ao erário municipal.

Como pressupostos de sua aplicação, o IPTU progressivo encontra em primeiro lugar a promulgação de lei federal que o discipline, requisito já suprido pela edição do Estatuto da cidade.

Porém, tal pressuposto deve ser complementado com a publicação de lei municipal específica para a área incluída no plano diretor, conforme prevê o art. 182, § 4º, inc. II, da Constituição.

Outro pressuposto é encontrar-se o imóvel urbano em situação de desconformidade com o previsto no plano diretor, ou, ainda, o descumprimento pelo proprietário da obrigação de parcelamento ou de edificação, da qual tenha sido devidamente notificado.

A implementação do IPTU progressivo se dá através da majoração de sua alíquota pelo prazo progressivo de cinco anos. O valor da alíquota será estabelecido na lei específica, mas não poderá exceder a duas vezes o valor referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de 15%.

4.2.3 Desapropriação com Pagamento em Títulos

A desapropriação com pagamento em títulos é uma forma drástica de intervenção na propriedade, tanto que é considerada pela doutrina como desapropriação-sanção.

O fato da desapropriação em comento estar ligada a fins urbanísticos não lhe retira os contornos básicos que a caracterizam. Como espécie de desapropriação não enseja outro efeito senão a transferência coercitiva da propriedade do particular para o Poder Público.

Tem como pressuposto inafastável para sua efetivação a resistência do proprietário ao cumprimento das obrigações urbanísticas que lhe foram impostas.

Caso o proprietário, mesmo sancionado pelo IPTU progressivo durante cinco anos insista em desatender as determinações urbanísticas determinadas pelo Poder Público, fica este autorizado a promover a desapropriação.

A finalidade do instituto não é outra senão promover a adequação do solo urbano aos termos estabelecidos pelo plano diretor, instrumento que mais uma vez demonstra sua importância no contexto do planejamento municipal.

Decorre do fato de que a desapropriação ostenta um caráter sancionatório o fato de que a indenização dela decorrente é feita mediante títulos da dívida pública, com prazo de resgate de até dez anos. Sobre o assunto, interessante a doutrina de José dos Santos CARVALHO FILHO:

Os títulos da dívida pública constituem documentos emitidos pelo Poder Público como meio de obtenção de recursos, os quais permitem ao seu detentor o resgate futuro com o pagamento, pela entidade pública emitente, de acréscimos relativos a juros e correção monetária. Como forma de investimento, servem os títulos às vezes como meio de pagamento, já que sempre retratam a existência de determinado valor em seu conteúdo. No caso da desapropriação urbanística sancionatória, os títulos só podem ser emitidos depois de aprovação pelo Senado Federal, órgão do legislativo incumbido do controle da dívida dos entes federativos.[67]

Importante ressaltar que, uma vez processada a desapropriação, o Município não pode se afastar do objetivo que a ensejou, qual seja, a adequação da condição do imóvel às diretrizes do plano diretor da cidade de modo a implementar a ordem urbanística local. Isso porque quando o Estatuto da Cidade se refere ao aproveitamento adequado do imóvel, pretende mostrar a necessidade de compatibilizar as condições do imóvel com o plano diretor.

Sobre o autor
Rodrigo Binotto Grevetti

Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba (2004). Especialista em Direito Civil e Empresarial pela PUC-PR (2005). Especialista em Direito Administrativo pelo Instituto de Direito Romeu Felipe Bacellar (2009). Licenciado em Geografia pela Universidade Federal do Paraná - UFPR (2010)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GREVETTI, Rodrigo Binotto. O plano diretor como instrumento de política urbana. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5759, 8 abr. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/72199. Acesso em: 25 dez. 2024.

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