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O que as recentes tragédias em nosso cenário nacional podem nos ensinar sobre integridade nas empresas

Agenda 22/02/2019 às 18:27

Algumas reflexões sobre a prevenção e a atuação empresarial no que concerne ao cuidado de suas atividades baseadas em seus valores principais. Ter um plano de governança e uma gestão eficiente vai além do trabalho. Valores são essenciais.

O ano de 2019 mal começou e já vem marcado por enormes descasos tanto no setor público, quanto no setor privado, principalmente no que diz respeito a ocorrência das mais terríveis tragédias que temos visto nos últimos tempos, sendo Brumadinho a maior no segmento de rompimentos de barragens e de vítimas.

Inúmeros questionamentos surgem, quase que diariamente, sobre as causas de tamanho desastre. A maioria delas procura trazer à tona uma série de irregularidades que são ignoradas pelas empresas, por suas controladas e contratadas. Demais disso, são ignoradas as recomendações do Poder Público, quando a realização e a atividade do objeto empresarial dependem de sua aprovação, assim como seu descaso e a recorrente ausência de fiscalização contínuas.

No caso de Brumadinho, a total displicência restou clara: inúmeras recomendações foram feitas, assim como perícias técnicas ao local, e o que restou? O total descrédito dos Diretores, assim como do Conselho de Administração, que é pilar fundamental em um programa de compliance e cuja atenção que deveria ser redobrada e dedicada aos riscos iminentes.

O apoio da alta administração, a identificação de riscos, sua mitigação, e monitoramento e treinamento constantes, quando não realizados “para inglês ver” produzem, sensivelmente, mudanças na condução e na gestão empresarial.

O que mais se destacou em relação a tamanho desastre, foi a total inexistência de observância aos riscos. Pergunta-se, assim, se a Vale teria a exata dimensão do que a falta de segurança e de critérios elementares poderiam causar em sua empresa, aos seus funcionários, aos investidores e a sociedade em geral. Como os atos previstos não foram revistos e, se foram, não tiveram suas recomendações atendidas, o programa de compliance restou ineficiente e, por conseguinte, falho.

Descabido prejuízo financeiro foi enorme, e a empresa caiu em descrédito, onde inúmeras famílias foram dizimadas, moradias foram extintas em um mar de lama, e o meio ambiente perdeu aproximadamente 125 hectares de florestas, dentre outros prejuízos de enorme monta que serão sentidos ainda por anos.

Uma empresa referência em programas de integridade possui uma cultura de respeito, integração e interação entre seus funcionários. Ao revés, uma empresa que não transmite confiança, não consegue sequer recrutar bons profissionais, pois estes preferem trabalhar em um ambiente corporativo que lhes dê, no mínimo, segurança em seu labor diário.

Antes de aderir a conformidade, a atividade empresarial deve estar pautada em um programa de governança baseado em valores que abrangem diversidade, independência, coerência e, sobretudo, responsabilidade corporativa.

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Demais disso, as atividades empresariais devem ser norteadas por seus princípios institucionais, os quais se aliam diretamente a valores éticos, humanos e familiares. É o demonstrar fazer o que é certo, da forma correta. Portanto, uma empresa que possui em suas atividades o desenvolvimento de atuações sociais, por exemplo, demonstra sua preocupação com o indivíduo e com a melhoria de toda a sociedade.

Quando um programa de compliance é falho, é evidente a ausência de crescimento na empresa. Os canais de denúncia não funcionam, pois os funcionários são inseguros e têm medo de situações retaliadoras, as diligências entre os fornecedores e terceiros não são realizadas a contento, os treinamentos não abrangem os riscos e, sobre estes, sequer são levantados ou mitigados com a seriedade que deveriam ter.

Ademais, destaco que se os próprios funcionários não acreditam na empresa em que trabalham, a população acredita menos ainda. Indenizações que não cobrem vidas, números que não superam as perdas.

Por esse motivo, a mudança tem que vir de dentro para fora, e todos os gastos institucionais com o desenvolvimento em valores e em integridade, alocados como investimentos. Um sistema de políticas internas efetivas, com investigações eficazes, gera credibilidade e confiança desde o chão de fábrica até a alta administração.

Sobre a autora
Juliana Costa

Atuação como consultora jurídica e DPO em empresas localizadas em São Paulo, Teresina, Recife, Ceará, Bahia, Espírito Santo, Tocantins, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Distrito Federal. Experiência em atuação Cível, Digital, Administrativa, Tributária, Consumerista, Trabalhista e Societária. Minha experiência inclui a gestão empresarial com foco em resultados e a atuação em equipes de Governança de Dados e Segurança da Informação. Sou Advogada Sênior com uma trajetória consolidada em proteção de dados em escritórios de advocacia e consultorias em LGPD. Com mestrado em Direito, Justiça e Desenvolvimento, com foco em Proteção de Dados pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), sou especialista certificada em Privacidade e Proteção de Dados, com certificações CIPM pela IAPP, DPO e LGPD (PDPE) pela EXIN. Minha expertise abrange o desenvolvimento de políticas, contratos e procedimentos de adequação à LGPD e compliance, além de otimização de fluxos organizacionais e business intelligence. Certificada em ISO/IEC 27001, ISO/IEC 9001 e ISO/IEC 20000 (Skillfront e Certiproof), participei da Comissão que estabeleceu a profissão de Encarregado de Dados Pessoais na Classificação Brasileira de Ocupação (CBO) junto ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Também sou professora da área de LGPD na TV Pública e no MBA da Universidade de Vila Velha - ES. Sou autora e coautora de diversos artigos e livros na área de Proteção de Dados e Compliance, incluindo o livro "Direito Digital Aplicado 5.0 - Especial Administração Pública" e a Revista de Direito Digital n.02 2021 da Enlaw. Minha carreira inclui a realização de projetos de consultoria em Compliance e uma vasta experiência de 15 anos em órgãos públicos e empresas privadas, abrangendo áreas como contenciosa, consultiva, direito criminal, energia, trabalhista, tributária, societária e cível. Também atuei como parecerista na área de licitações e contratos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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