Cumpre observar, inicialmente, que o ano de 2017 foi significativamente decisivo para Justiça do Trabalho, pois além da publicação da lei 13.467/17, popularmente chamada de "reforma trabalhista", outras atualizações legislativas que alteraram diretamente a relação de trabalho em vários setores da economia.
Dentre elas, se encontra a lei 13.429/17 que modificou a regra de contratação do trabalho temporário, bem como tratou, pela primeira vez, sobre a terceirização, trazendo requisitos e formalidades que posteriormente seriam aprimoradas pela "reforma trabalhista" e a lei 13.419/17, que disciplinou o rateio entre empregados na cobrança das gorjetas entre outras inovações.
Além da atualização legislativa acima, uma outra importante definição em um 1º tema de Recursos de Revista Repetitivos, o TST firmou três teses sobre as hipóteses de exigência de apresentação de certidão de antecedentes criminais pelos candidatos ao empregado e a possibilidade de indenização por danos morais.
Esta foi uma importante decisão para nosso ordenamento jurídico que passou despercebida, entenda:
A insegurança jurídica prevaleceu por muitos anos para o empregador que solicitasse certidão de antecedentes criminais aos candidatos ao emprego. Desse modo, decisões antagônicas sobre o mesmo assunto, ora condenando a empresa ao pagamento de uma indenização de dano moral ao solicitar a certidão e outras que não vislumbravam a existência de um dano extrapatrimonial.
Assim sendo, decorrente de inúmeros recursos serem levados ao TST, em março de 2015, o ministro César Leite de Carvalho acolheu a proposta de Incidente de Recurso de Revista Repetitivo, a fim de uniformizar a jurisprudência sobre o tema, levando a partir deste, o despacho de todos os Recursos de Revistas sobre o tema, sendo suspensos até que em 20/4/17, os ministros da SDI-1 do TST, por maioria, definiram as seguintes teses jurídicas:
1 – Não é legítima e caracteriza lesão moral a exigência de Certidão de Antecedentes Criminais de candidato a emprego quando traduzir tratamento discriminatório ou não se justificar em razão de previsão em lei, da natureza do ofício ou do grau especial de fidúcia exigido.
2 – A exigência de Certidão de Antecedentes Criminais de candidato a emprego é legítima e não caracteriza lesão moral quando amparada em expressa previsão legal ou justificar-se em razão da natureza do ofício ou do grau especial de fidúcia exigido, a exemplo de empregados domésticos, cuidadores de menores, idosos ou deficientes, seja em creches, asilos ou até mesmo instituições, motoristas rodoviários de carga, empregados que laboram no setor da agroindústria no manejo de ferramentas de trabalho perfuro cortantes, bancários e afins, trabalhadores que atuam com substâncias tóxicas, entorpecentes e armas, trabalhadores que atuam com informações sigilosas.
3 – A exigência de Certidão de Antecedentes Criminais, quando ausente alguma das justificativas supra, caracteriza dano moral in re ipsa, passível de indenização, independentemente de o candidato ao emprego ter ou não sido admitido.
Este acórdão foi publicado somente em 22/9/17 e ainda não transitou em julgado, pendente de análise de Recurso Extraordinário.
Assim sendo, sem prejuízo, o TST já firmou seu entendimento e vem aplicando esta tese aos casos em concreto.
Por conseguinte, dentre as teses firmadas, destaca-se o 2º item que pontuou ser legítima e não caracteriza lesão moral quando a exigência se justificar em razão do trabalho, como por exemplo, dos empregados domésticos, motoristas rodoviários de carga, bancários com especial fidúcia, etc...
A tese firmada supracitada apresenta um rol exemplificativo das atividades que justifiquem a exigência da certidão para admissão do candidato ao emprego, contudo, ainda se faz de suma importância para esta afirmação se analisar caso a caso.
Neste sentido, em recente decisão RR-1124-06.2017.5.07.0033, a colenda turma do tribunal entendeu que a exigência sem justificativa de certidão de antecedentes criminais na admissão gera direito a indenização. O entendimento foi aplicado pela 6ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho ao condenar uma fábrica de biscoitos. A empresa terá que pagar R$ 5 mil ao funcionário.
Na ação, o ajudante sustentou que a empresa, ao exigir a certidão de antecedentes criminais sem que haja pertinência com as condições objetivas do trabalho oferecido, põe em dúvida a honestidade do candidato ao emprego.
Na contestação, a empresa argumentou que a certidão era exigida apenas para alguns cargos, entre eles o de ajudante de produção. Segundo a fábrica de biscoitos, o alto índice de violência na cidade da contratação (Maracanaú-CE) autorizaria a exigência.
Condenada em primeiro grau, a fábrica recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região, que afastou a condenação. Segundo o TRT-7, a conduta da empresa não havia resultado em lesão aos direitos de personalidade do empregado. Ressaltou ainda que ele havia sido contratado e que a exigência era direcionada a todos os candidatos.
Ao julgar o recurso do trabalhador, a 6ª Turma do TST destacou que, no julgamento do Incidente de Recurso de Revista Repetitivo (IRR 243000-58.2013.5.13.0023), o TST firmou o entendimento de que a exigência da certidão de antecedentes criminais somente seria legítima e não caracterizaria lesão moral em caso de expressa previsão em lei ou em razão da natureza do ofício ou do grau especial de confiança exigido do candidato ao emprego. No caso, contudo, a 6ª Turma entendeu que o cargo de ajudante de produção não se enquadra nessas hipóteses, ensejando-se assim danos morais ao empregado.
Por fim, é importante frisar que o acesso à certidão de antecedentes criminais é assegurado a todos, como advogado atuante nas esferas do Direito do Trabalho, Direito Cível, Direito Empresarial, entre outros, compreendo que desde que sejam esclarecidos os fins e as razões do pedido, até porque, a ausência de antecedentes criminais é pressuposto para o exercício de determinadas profissões, como, por exemplo, informações sobre antecedentes criminais de candidatos à vaga em empresa de transporte de valores, ou a vaga de vigilantes.
No entanto, a eventual existência de registro em certidão de antecedentes criminais não pode, por si só, ser fator impeditivo para a recolocação do ex-condenado no mercado de trabalho, se esta condenação não guardar alguma relação com a atividade laboral.
Portanto, é valioso salientar que é inaceitável a recusa de um candidato apenas pela simples existência de antecedentes criminais, sob pena de se caracterizar, sim, a discriminação.