2. DOS CRIMES FALIMENTARES
2.1 Conceito
Trata-se de crimes falimentares são condutas incrimináveis pelo risco de, vindo a ocorrer a falência, causarem dano aos credores. A Lei 11.101/2005 – LFR manteve o sistema de condição objetiva de punibilidade a partir de decisão nos autos cíveis, mas ampliando o campo, para incluir as condutas praticadas não apenas a partir da decretação da falência, mas também a partir do despacho concessivo da recuperação judicial (art. 58) ou da sentença homologatória da recuperação extrajudicial (art. 164, § 5º). Pela LFR mesmo sem o decreto de falência, pode existir crime e, portanto, a rigor, não se justificaria manter a expressão crimes falimentares. (CREPALDI; 2008).
No entanto, uma vez que está consagrada pelo uso, a expressão pode ser mantida, devendo-se sempre ter em mente que não mais se limitam os crimes a condutas exclusivamente praticadas a partir da decretação da falência. (COELHO; 2005).
É apurada a existência de possíveis “crimes falimentares”, na maioria das vezes cometida pelo falido, apesar da ressalva do § 2º do art. 187, que permite a impetração da ação penal em qualquer fase processual. Tais crimes estão tipificados nos artigos. 168 a 178 da Lei de Falências e são classificadas como de ação pública incondicionada, embora se permita entre as ações penais privadas a subsidiária da pública (art. 184). (BRASIL; 2008).
A competência para o conhecimento da ação penal pertence ao juiz criminal da jurisdição onde tenha sido declarada a falência (art. 183). Não será, portanto, o próprio juízo da falência, a não ser que acumule compet6encia falimentar e criminal, nas comarcas menores. (CREPALDI; 2008).
Nenhuma das condutas descritas pela Lei 11.101/2005 é punível, ao menos como crime falimentar, sem que tenha sido decretada a falência, concedida a recuperação judicial ou homologada a recuperação extrajudicial. Esta sentença constitui elemento normativo do tipo quando a conduta só pode ser cometida após sua prolação (habilitação ilegal de crédito, exercício ilegal de atividade ou violação de impedimento), ou condição objetiva de punibilidade quando a conduta pode ser praticada antes da sentença, mas só é punível como crime falimentar se ela for prolatada (fraude a credores, violação de sigilo empresarial e favorecimento a credores).
Assim, é da sentença do juízo de recuperações e falências (Súmula 147 – STF) que começa a correr a prescrição (se o crime foi anterior, obviamente), regendo-se pelas regras normais do Código Penal. Além das causas previstas no Código Penal, a prescrição iniciada com a recuperação judicial ou extrajudicial é interrompida pela sentença que a transformar em falência. (ANDREUCCI; 2005).
2.2 Dos efeitos da condenação
São efeitos da condenação por crime previsto nesta lei (art. 181, I, II e III):
Art. 181. São efeitos da condenação por crime previsto nesta Lei: I - a inabilitação para o exercício de atividade empresarial; II - o impedimento para o exercício de cargo ou função em conselho de administração, diretoria ou gerência das sociedades sujeitas a esta Lei; III - a impossibilidade de gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio.§ 1o Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença, e perdurarão até 5 (cinco) anos após a extinção da punibilidade, podendo, contudo, cessar antes pela reabilitação penal; § 2o Transitada em julgado a sentença penal condenatória, será notificado o Registro Público de Empresas para que tome as medidas necessárias para impedir novo registro em nome dos inabilitados. (BRASIL; 2005).
Entretanto, Esses efeitos, contudo, não são automáticos; necessitam ser motivadamente declarados na sentença, pois perdurarão por cinco anos após a extinção da punibilidade, salvo se anteriormente foi o condenado beneficiado por reabilitação criminal, art. 181, § 1º. Só a partir daí terão eficácia. Ademais, prevê o art. 188 a aplicação subsidiária do Código de Processo Penal, quando não incompatível com a lei falimentar. Os efeitos da condenação penal se tornam efetivos após o trânsito em julgado da sentença penal. A reabilitação no direito empresarial é híbrida. (CREPALDI; 2008).
2.3 Crimes.
2.3.1 Fraude a Credores.
Fraude a credores consiste em praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar a recuperação extrajudicial, ato fraudulento de que resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, com o fim de obter ou assegurar vantagem indevida para si ou para outrem (art. 168, caput). É um crime próprio (cujo sujeito ativo é o devedor ou seu representante), formal (não admite tentativa), de perigo, doloso e comissivo. O sujeito passivo imediato é a Administração da Justiça; os sujeitos passivos mediatos são os credores aos qual a conduta causa prejuízo. (CREPALDI; 2008).
2.3.2 Violação de Sigilo Empresarial.
Consiste em violar, explorar ou divulgar, sem justa causa, sigilo empresarial ou dados confidenciais sobre operações ou serviços, contribuindo para a condução do devedor a estado de inviabilidade econômica ou financeira (art. 169). (BRASIL; 2008).
O sujeito passivo é o detentor do sigilo empresarial ou dos dados confidenciais sobre operações ou serviços, desde que esteja submetido à falência, à recuperação judicial ou à recuperação extrajudicial. (CREPALDI; 2008).
2.3.3 Divulgação de Informações Falsas.
Consiste em divulgar ou propalar, por qualquer meio, informação falsa sobre devedor em recuperação judicial, com o fim de levá-lo à falência ou de obter vantagem (art. 170). É, portanto, crime comum quanto ao sujeito ativo, pois qualquer pessoa pode praticar a conduta ilícita. (BRASIL; 2008).
O sujeito passivo é o devedor em recuperação judicial. Portanto, não existe a figura típica na falência nem na recuperação extrajudicial. (CREPALDI; 2008).
2.3.4 Indução a Erro.
Indução a erro é conduta que consiste em sonegar ou omitir informações ou prestar informações falsas no processo de falência, de recuperação judicial ou de recuperação extrajudicial, com o fim de induzir a erro o juiz, o MP, os credores, a assembleia geral de credores, o Comitê ou o administrador judicial (art. 171, caput). (BRASIL; 2008).
2.3.5 Favorecimento de Credores.
Favorecimento de Credores consiste em praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar o plano de recuperação extrajudicial, ato de disposição ou oneração patrimonial ou gerador de obrigação, destinado a favorecer um ou mais credores em prejuízo dos demais (art. 173, caput). Nas mesmas penas incorre o credor que, em conluio, possa beneficiar-se de ato previsto no caput doa art. 172 (art. 172, parágrafo único). (BRASIL; 2008). O sujeito passivo é todo e qualquer credor prejudicado pela conduta ilícita.
2.3.6 Desvio, Ocultação ou Apropriação de Bens.
Desvio, ocultação ou apropriação de bens é conduta que consiste, respectivamente, em desviar, esconder ou exercer a posse direta indevida sobre bens pertencentes ao devedor sob-recuperação judicial ou à massa falida, inclusive por meio da aquisição por interposta pessoa (art. 173, caput). (BRASIL; 2008).
2.3.7 Aquisição, Recebimento ou Uso Ilegal de Bens.
Aquisição, recebimento ou uso ilegal de bens é conduta que consiste em adquirir, receber ou usar, ilicitamente, bem que sabe pertencer à massa falida ou influir para que terceiro, de boa-fé, o adquira, receba ou use (art. 174, caput). (BRASIL; 2008).
2.3.8 Habilitação Ilegal de Crédito
Habilitação ilegal de crédito consiste em apresentar, em falência, recuperação judicial ou recuperação extrajudicial, relação de créditos, habilitação de créditos ou reclamação falsa, ou juntar a elas título falso ou simulado. (CREPALDI; 2008).
2.3.9 Exercício Ilegal da Atividade
Exercício ilegal de atividade consiste em realizar tarefas ou desempenhar funções para as quais tiver sido inabilitado ou incapacitado por decisão judicial, nos termos da lei falimentar. Trata-se, portanto, de crime próprio, de merca conduta, de perigo, doloso e comissivo. (CREPALDI; 2008).
3. DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
3.1 Lei nº 11.101/2005
O art. 196 prevê a exigência aos Registros Públicos de Empresas que deverão manter um banco de dados integrados em âmbito nacional, público e gratuito, disponibilizando na Internet a relação de todos os devedores falidos ou em recuperação judicial. (BRASIL; 2008).
Os devedores proibidos de requerer concordata nos termos da legislação específica em vigor na data da publicação da Lei 11.101/2005 ficam proibidos de requerer recuperação judicial ou extrajudicial, art. 198. (CREPALDI; 2008).
Segundo o art. 199, não se aplica o disposto no art. 198 desta Lei às sociedades a que se refere o art. 187, Lei 7.565/1986: não podem impetrar concordata as empresas que, por seus atos constitutivos, tenham por objeto a exploração de serviços aéreos de qualquer natureza ou de infra-estrutura aeronáutica. Assim sendo, poderão negociar diretamente com os credores, em caso de dificuldades financeiras, as dívidas de natureza trabalhista e tributárias, devendo, para esse fim, apresentar um plano de recuperação no prazo estabelecido legalmente, ou seja, 180 dias. (CREPALDI; 2008). (BRASIL; 2008).
A Lei 11.196/2005 acrescentou o § 1o ao art. 199 estabelecendo que tanto na recuperação judicial como na falência não ficará suspenso o exercício de direitos derivados de contratos de locação, arrendamento mercantil ou de qualquer outra modalidade de arrendamento de aeronaves. (BRASIL; 2008).
Estabelece o § 2o que os créditos decorrentes dos contratos mencionados no § 1o do art. 199 não se submeterão aos efeitos da recuperação judicial ou extrajudicial, prevalecendo os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, não se lhes aplicando a ressalva contida na parte final do § 3o do art. 49, LFR. (BRASIL; 2008).
REFERÊNCIAS
Doutrina:
MARINONI, Luiz Guilherme. Novo Curso de Processo Civil: Tutela dos direitos mediante procedimento comum, v. II/Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart, Daniel Mitidiero, - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. – (Curso de Processo Civil: v.2).
ANDREUCCI, Ricardo. A eficácia da lei penal no tempo e os crimes falimentares tipificados pela Lei n. 11.101/2005. São Paulo: Complexo Jurídico Damásio de Jesus, maio 2005. Disponível em:<www.damasio.com.br>.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Presidência da República, Casa Civil, 2006. Disponível em <www.presidencia.gov.br>. Acesso em 11 maio 2008.
BRASIL. Lei n. 11.101, 2005. Brasília: Presidência da República, Casa Civil, 2006. Disponível em <www.presidencia.gov.br>. Acesso em 11 maio 2008.
COELHO, Fábio Ulhôa. Comentários à nova lei de falências e de recuperação de empresas: (Lei n. 11.101, de 9-2-2005). 2. ed. rev. – São Paulo: Saraiva, 2005.
CREPALDI, Silvio Aparecido. Crimes falimentares: uma abordagem analítica. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XI, n. 53, maio 2008. Disponível em: http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2773>. Acesso em nov 2018