1. O ESTATUTO
O estatuto do desarmamento entrou em vigor no dia 23 de dezembro de 2003 – um dia após a sua aprovação – com a difícil tarefa de conter o crescente número de armas de fogo e explosivos ilegais nas mãos de bandidos. Certamente um grande problema à segurança pública. Diversas medidas foram tomadas, milhares de armas foram apreendidas e destruídas nas campanhas nacionais de recolhimento de materiais bélicos
É preciso considerar que as armas voluntariamente entregues nas campanhas do desarmamento pertenciam (ilegalmente ou legalmente) a cidadãos comuns, ou seja, não foram entregues por criminosos atuantes. Então, provavelmente o principal efeito do ED foi evitar que muitos conflitos cotidianos envolvendo cidadãos comuns acabassem resultando em crimes letais. Nesse sentido, o ideal para a análise feita é que fosse possível separar os crimes letais cometidos por indivíduos que nunca haviam matado ninguém dos crimes letais cometidos por indivíduos já atuantes na atividade criminosa. Infelizmente, a distinção por tipo de criminoso não foi possível com os dados agregados utilizados neste estudo.¹
Graças a estas intervenções, o Brasil registrou a primeira queda nos índices de homicídios, parecia que realmente a lei nº 10.826/2003 tinha cumprido seu objetivo principal: salvar vidas. No entanto, 15 anos depois é necessário analisarmos a devida eficácia de tal norma.
2. O DESARMAMENTO
A legítima defesa é um direito natural do ser humano que não pode ser suprimido, nenhuma lei ou convenção está acima deste. Sob nenhuma hipótese, um Estado democrático pode impedir alguém de repelir uma injusta agressão ou de o mesmo fazer uso dos meios necessários para isso. A verdade é que o estatuto, apesar de bem intencionado, foi um terrível fracasso no que diz respeito a armas ilegais, uma vez que tornou o cidadão de bem muito mais vulnerável aos criminosos.
Estatísticas oficiais apontam que o número de vítimas fatais de armas de fogo tem crescido de forma exponencial: Nunca se matou tanto com arma de fogo como hoje. Estimativas apontam para a existência de 13 milhões de armas ilegais em nosso país, sendo que a grande maioria esta nas mãos de pessoas com intenções questionáveis. Estudos mostram que a taxa de criminalidade de um país em nada tem haver com a facilidade que o cidadão tem de adquirir uma arma legalmente. Muito pelo contrario. Os índices de violência estão principalmente ligados à má distribuição de renda e a falta de políticas publicas de integração social.
O ED evitou que muitos conflitos cotidianos envolvendo cidadãos comuns fossem “resolvidos” com armas de fogo e reduziu uma das fontes de abastecimento da atividade criminosa – roubo e furto de armas de residências e veículos.20 Ademais, a lei tornou mais difícil que cidadãos comuns cometessem crimes letais, sobretudo emocionalmente motivados. Por outro lado, porém, ela reduziu a capacidade de autoproteção dos cidadãos em relação à vitimizações criminais.¹
O fato é que é o Estado Brasileiro é incapaz de oferecer proteção a todos, 24 horas por dia e ao mesmo tempo impede, de formar repressiva, que se defendam, quando na verdade o cidadão de bem, preparado e apto a ter/portar uma arma, de forma alguma representa qualquer risco à segurança pública, o problema obviamente são aquelas obtidas ilegalmente.
3. DECRETO Nº 9.685 DE 2019
Crimes hediondos são aqueles que por sua crueldade causam repúdio em toda sociedade. Da mesma forma, leis hediondas são aquelas mal avaliadas, aprovadas frente a forte emoção do legislador e com consequências devastadoras. O recém editado decreto Nº 9.685 de 2019 que altera o Decreto 5.123 de 2004, este que por sua vez regulamenta o Estatuto, é recebido por boa parte dos brasileiros como um pequeno passo para uma grande jornada necessária para o amadurecimento da sociedade como um todo.
A violência é um fenômeno complexo, cuja causa não reside simplesmente na disponibilidade de armas de fogo, mas sim envolve outros fatores socioeconômicos, tais como a ausência de um sistema educacional eficiente, que diminui o campo de escolhas profissional dos jovens e aumenta a probabilidade de ingresso na criminalidade.²
A insegurança é extrema e uma legislação restritiva acaba por privar o cidadão de defender a sua vida e o seu patrimônio e o torna dependente unicamente de uma segurança pública deficitária.
4. CONCLUSÃO
É inquestionável que o estatuto do desarmamento tirou de circulação milhares de armas sem registro que estavam nas mãos de pessoas despreparadas, o que salvou muitas vidas. Todavia, impedir que o cidadão de bem, preparado, devidamente treinado e que cumpra todos os requisitos objetivos tenha direito de possui-la ou porta-la para, se necessário fazer o uso em defesa de sua vida ou de seu patrimônio é algo imoral, desumano, inexplicável e antidemocrático, pois vai contra o Referendo Nacional de 2005 onde 63,94% da população votaram contra o desarmamento. Certamente uma política armamentista permissiva não seria o ideal, neste momento, para uma sociedade como a nossa. O Decreto Nº 9.685/19 veio como uma inovação e servirá de base para novos estudos e estatísticas a cerca do tema.
5. REFERÊNCIAS
¹DOS SANTOS, MARCELO JUSTUS; Kassouf, Ana Lúcia. Avaliação de Impacto do Estatuto do Desarmamento na Criminalidade: Uma abordagem de séries temporais aplicada à cidade de São Paulo: Economic Analysis of Law Review; Brasilia Vol. 3, Ed. 2, (Jul-Dec 2012): 307-322.
MAGALHÃES, L. C. A prevenção, o controle, o combate e a erradicação do tráfico ilícito de armas pequenas e leves no Brasil e o programa de ação da ONU. Brasília: UPIS, 2006.
MARCÃO, Renato. Estatuto do Desarmamento: anotação e interpretação jurisprudencial da parte criminal da lei n. 10.826, de 22-12-2003. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
²SCORZAFAVE, SOARES, DORIGAN. Luiz Guilherme, Milena Karla, Tulio Anselmi. Vale a pena pagar para desarmar? Uma avaliação do impacto da campanha de entrega voluntária de armas sobre as mortes com armas de fogo. Estud. Econ. vol.45 no.3 São Paulo July/Sept. 2015