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A magistratura e a desigualdade de gênero

Reflexões sobre a questão da desigualdade de gênero no cargo da Magistratura e seus aspectos intrínsecos.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho é sobre a carreira de magistratura, conhecida amplamente como sendo a carreira dos juízes, mais precisamente sobre as desigualdades de gênero na carreira em questão. Para aprofundamento nos conhecimentos da magistratura de maneira embasada, foram usados textos de autores conhecidos por prover conhecimento no âmbito das carreiras públicas e também da questão da desigualdade de gênero, como Weber, Bourdieu, Firmino entre outros.

O objetivo maior pretendido ao final deste trabalho é o esclarecimento e a exposição detalhada das delimitações da carreira de magistratura e principalmente como a forma que se dá a estruturação da mesma, influência na questão da desigualdade de gênero dentro da carreira.

A metodologia aplicada foi a de pesquisa bibliográfica e de dados que puderam contribuir com a construção da perspectiva da carreira e da desigualdade de gênero dentro da mesma.


2. CARREIRA

Pode-se definir carreira como a aglomeração de cargos de uma mesma profissão, hierarquizados segundo as exigências funcionais e com acesso privativo dos titulares dos cargos inferiores àqueles imediatamente superiores. Trata-se do processo necessário para se atingir a “senioridade individual” (DIAS, 2010), que se refere, basicamente, ao período em que o servidor leva para atingir os requisitos e condições do cargo.

De modo ideal, o desenho das carreiras deveria prever uma descrição de cargos completa, com todos os detalhes e implicações, estabelecendo-se atividades básicas dos cargos, níveis de variação dentro da organização, escala de dificuldades encarada pelos ocupantes dos cargos, responsabilidade por valores e processos, conhecimentos exigidos a cada fase da vida profissional, além de atitudes e habilidades a serem desenvolvidas (DIAS, 2010).

A priori, importa discutir o Plano de Carreiras, Cargos e Salários (PCCS) para uma melhor compreensão da estruturação da Carreira da Magistratura. Domingues e Ladosky (2007) apresentam a importância do PCCS na medida em que atua com a finalidade de: garantir definições básicas que têm implicações na gestão geral da administração, ou seja, imprimir determinadas concepções e tendências nas políticas da gestão pública; alcançar um equilíbrio interno ao fornecer resposta aos empregados/servidores quanto à demanda por transparência e critérios de eqüidade na ascensão funcional e salarial; alcançar um equilíbrio externo ao permitir adequação ao mercado, balizando a remuneração pelos cargos, rigorosamente definidos, e viabilizando a comparação com outras instituições correlatas. (DOMINGUES; LADOSKY. 2007. p. 19-20).

Ainda, acrescentam que o escopo da criação de Planos de Carreiras, Cargos e Salários é:

[...] definição das atribuições, responsabilidades e especificações de cada cargo; a criação e/ou racionalização de estruturas hierárquicas entre os cargos; e a formalização de critérios e práticas para a gestão dos recursos humanos, ou seja, a gestão continuada de cargos, salários e carreiras na organização/instituição. (DOMINGUES; LADOSKY. 2007. p. 22).

Acerca da construção desse PCCS, Domingues e Ladosky (2007. p. 23) propõem a divisão em seis etapas: 1) Análise de função; 2) Descrição de cargos; 3) Avaliação de cargos; 4) Pesquisa de salários; 5) Política de remuneração; 6) Construção da estrutura salarial.

Na fase da análise de função, busca-se definir todos os detalhes inerentes à função. Nesse sentido, os autores distinguem tarefa, função e cargo, sendo a tarefa o produto de um esforço humano, a função um conjunto de tarefas, deveres e responsabilidades e o cargo um conjunto de funções similares. (DOMINGUES; LADOSKY. 2007. p. 24).

Na etapa da descrição de cargos, há uma renderização das informações obtidas na etapa anterior, devendo estar constar de Manual de Descrição de Cargos, compilando as definições dos cargos, bem como dividindo-os por área ou atividade. (DOMINGUES; LADOSKY. 2007. p. 24).

A fase da avaliação de cargos tem por fim gerar critérios de avaliação dos cargos, utilizando-se de tabelas de avaliação, de forma individualizada por cargo, gerando-se perfis dos cargos ora analisados. Ademais, possibilita-se a construção de Tabela de Lotação, sendo eficiente para se observar o número de cargos ocupados na estrutura hierárquica e nas carreiras (DOMINGUES; LADOSKY. 2007. p. 25-26).

Na fase da pesquisa de salários, a intenção é a comparação entre os valores obtidos normalmente no mercado e a ponderação acerca do cargo exercido no serviço público. (DOMINGUES; LADOSKY. 2007. p. 27).

A política salarial “é o instrumento pelo qual se determinam os parâmetros salariais que se deseja imprimir às carreiras, fixando normas e condições a serem seguidas ao longo da estrutura organizacional”. (DOMINGUES; LADOSKY. 2007. p. 28).

Por fim, a construção da estrutura salarial é tida como “o agrupamento dos cargos em diversas faixas salariais, reunindo cargos com resultados similares a partir dos critérios de avaliação. A estrutura contempla, no seu interior, valores salariais calculados matematicamente para atender a uma política desejada”. (DOMINGUES; LADOSKY. 2007. p. 29). Nessa etapa, os autores chamam atenção para a necessidade de acompanhamento por parte das entidades sindicais para garantir o equilíbrio das remunerações.

Outrossim, os autores (DOMINGUES; LADOSKY. 2007. p. 29-32) colacionam alguns aspectos de grande relevância na negociação do PCCS, não devendo estes pontos ser negligenciados pelas entidades sindicais, quais sejam:

2.1. Magistratura

A carreira da magistratura, regulada pela Lei Complementar Federal nº 35/79 (LOMAN), vislumbra muitos destes elementos, como se observará a seguir. A aferida carreira é composta por classes, em consonância com o escalonamento existente delineado nos estatutos responsáveis pela organização do Poder Judiciário da União ou pelos diplomas que disciplinam a organização judiciária de cada um dos estados-membros.

A porta de entrada se dá por meio da aprovação em concurso público, na modalidade provas e títulos, como Juiz de Direito Substituto. Esta é a fase que irá habilitar o profissional e apontar onde ele tem condições técnicas para atuar. O candidato deve possuir diploma de nível superior de bacharelado em Direito reconhecido pelo Ministério da Educação, além, ao menos, três anos de atividade jurídica, considerado o período de exercício de cargo privativo de bacharel em Direito, conforme instituído pela Emenda Constitucional n. 45/2004.

Outra forma de ingresso na carreira se dá pelo Quinto Constitucional, o qual se encontra previsto no art. 94. da Constituição Federal, vejamos:

Art. 94. Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros, do Ministério Público, com mais de dez anos de carreira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes.

Parágrafo único. Recebidas as indicações, o tribunal formará lista tríplice, enviando-a ao Poder Executivo, que, nos vinte dias subseqüentes, escolherá um de seus integrantes para nomeação.

O magistrado pode atuar na Justiça especializada (Eleitoral, Trabalhista ou Militar) ou na comum (Estadual ou Federal). À exceção da Justiça Eleitoral, cuja competência é exercida de forma cumulativa pelos magistrados da Justiça Estadual, cada um dos segmentos do Judiciário possui concurso próprio. O juiz estadual julga matérias que não sejam da competência dos demais segmentos do Judiciário (Federal, Trabalho, Eleitoral ou Militar), sendo, dessa forma, sua competência considerada residual.

O cargo de juiz só se torna vitalício após cerca de dois anos de atividade. A atuação, como Juiz de Direito Substituto, se dá em pequenas cidades, onde estão sediadas as chamadas Comarcas de primeira entrância, substituindo ou trabalhando em conjunto com o Juiz Titular. Com o passar do tempo, ele pode se candidatar à remoção ou à promoção para Comarcas de entrância superior, sediadas, em geral, em cidades maiores e capitais dos Estados.

De Juiz de Direito Substituto passa a Juiz Titular de entrância inicial, atuando em todas as áreas da magistratura. O próximo cargo é o de Juiz da entrância intermediária, o qual é alocado em uma comarca ou circunscrição maior e começa a se especializar. Em seguida há o cargo de Juiz da entrância final, o qual é alocado nas capitais, atuando igualmente em áreas específicas. O último cargo integrante da carreira é o de Desembargador dos Tribunais Estaduais.

Além das justiças estaduais, o profissional de Direito também tem a opção de prestar concursos para a área federal, para atuar nos Tribunais Regionais e, para o degrau final da carreira, nos Tribunais Superiores, como o Supremo Tribunal Federal (STF), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Tribunal Superior do Trabalho (TST), por exemplo.

Embora os juízes tenham a mesma função básica, sem distinção de categorias, e em todos os tempos e lugares, podem ser classificados de acordo com a extensão maior ou menor de sua jurisdição, se é especializada ou não, conforme a hierarquia na organização judiciária, etc (GUIMARÃES, 1958). Assim, as carreiras da magistratura satisfazem a diferentes padrões. A da Justiça Federal prevê apenas os degraus de Juiz Substituto e de Juiz Federal, da qual se passa diretamente ao Tribunal.

2.2. Promoção e Remoção

Há duas formas de movimentação na carreira: promoção e remoção (Título V, Capítulo II da LOMAN). O processo de remoção se refere à transferência do Juiz no plano horizontal, enquanto a promoção diz respeito ao deslocamento no plano vertical da carreira.

A LOMAN estabelece, em seu artigo 81, uma preferência em face da promoção por merecimento: “Na magistratura de carreira dos Estados, ao provimento inicial e à promoção por merecimento precederá a remoção”. Assim, somente a vaga a ser provida por antiguidade fica preservada, não podendo ser prejudicada por remoção ou transferência no plano horizontal da carreira.

Inicialmente, após ser a aprovação no concurso público, o profissional irá atuar em todas as áreas. Porém, no decorrer do tempo, vai sendo promovido e se especializando. Do artigo 80 da LOMAN se extrai os requisitos para a habilitação à promoção:

Art. 80. - A lei regulará o processo de promoção, prescrevendo a observância dos critérios ele antigüidade e de merecimento, alternadamente, e o da indicação dos candidatos à promoção por merecimento, em lista tríplice, sempre que possível.

§ 1º - Na Justiça dos Estados:

I - apurar-se-ão na entrância a antigüidade e o merecimento, este em lista tríplice, sendo obrigatória a promoção do Juiz que figurar pela quinta vez consecutiva em lista de merecimento; havendo empate na antigüidade, terá precedência o Juiz mais antigo na carreira;

II - para efeito da composição da lista tríplice, o merecimento será apurado na entrância e aferido com prevalência de critérios de ordem objetiva, na forma do Regulamento baixado pelo Tribunal de Justiça, tendo-se em conta a conduta do Juiz, sua operosidade no exercício do cargo, número de vezes que tenha figurado na lista, tanto para entrância a prover, como para as anteriores, bem como o aproveitamento em cursos de aperfeiçoamento;

III - no caso de antigüidade, o Tribunal de Justiça, ou seu órgão especial, somente poderá recusar o Juiz mais antigo pelo voto da maioria absoluta do seus membros, repetindo-se a votação até fixar-se a indicação;

IV - somente após dois anos de exercício na entrância, poderá o Juiz ser promovido, salvo se não houver, com tal requisito, quem aceite o lugar vago, ou se forem recusados, pela maioria absoluta dos membros do Tribunal de Justiça, ou de seu órgão especial, candidatos que hajam completado o período.

A questão das promoções é bem definida. Elas se dão de acordo com a disponibilidade das vagas e seguem os critérios de merecimento ou antiguidade. Em média, leva-se de vinte a vinte e cinco anos para que um juiz estadual ascenda ao posto de Desembargador de um Tribunal de Justiça, que é o ápice da carreira.

2.3. Juiz de Direito Substituto de Segundo Grau

Trata-se de cargo instituído pela Lei nº 12.782, de 2013, que transformou dez cargos de Juízes de Direito em Juízes de Direito Substitutos de Segundo Grau para atuar na substituição de Desembargadores e no auxílio ao segundo grau de jurisdição, cuja nomeação se deu por meio da Portaria GPR 613, de 10 de Maio de 2013, do TJDFT. É uma inovação na carreira da magistratura e vem recebendo enormes críticas quanto à sua constitucionalidade.

Os cargos de Juiz de Direito Substituto de Segundo Grau são providos por concurso de remoção, nos moldes do artigo 93 da Constituição Federal, observados os critérios de antiguidade e merecimento, alternadamente, vedada a permuta.

2.4. Remuneração

No que diz respeito à remuneração de um Juiz, define-se com base nos rendimentos de um Ministro do Tribunal Federal. Segundo a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), o piso salarial para o início de carreira varia de acordo com o Estado. Porém, o teto do Judiciário, correspondente à remuneração do ministro do Supremo Tribunal Federal, portanto, R$ 39.293,32 (trinta e nove mil, duzentos e noventa e três reais e trinta e dois centavos).

A última tabela de remuneração disponibilizada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) apresenta a seguinte disposição:

(Fonte: TJDFT – Transparência: https://www.tjdft.jus.br/transparencia/estruturas-remuneratorias/MagistraturaRes102CNJAnexoIIIEstruturaRemuneratria.pdf)

Conforme o profissional vai evoluindo na carreira, ele vai recebendo mais benefícios e o percentual do seu salário vai aumentando. Há uma pequena variação entre os Estados, visto que alguns deles possuem número maior de entrâncias.

2.5. Déficit de Magistrados

A despeito de atrativa, a carreira apresenta um déficit quantitativo de juízes, de acordo com os últimos dados disponibilizados pelo Justiça em Números.

Um dos motivos para esta ocorrência é a dificuldade de aprovação nos concursos. Um levantamento da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que contou com a participação de cinco mil associados, demonstra que um juiz participa, em média, de dois a três concursos, com tempo médio de estudo de três anos e meio, antes de ser aprovado.

A seleção é extremamente rígida e é exigida do candidato uma nota mínima. Atualmente, segundo a AMB, 50% (cinquenta por cento) das vagas nos concursos públicos são preenchidas por mulheres, número este que vem acendendo nos últimos cinco anos.

2.6. Questão de gênero

Apesar da participação das mulheres ter crescido consideravelmente nas últimas décadas, inclusive no que diz respeito ao mercado de trabalho. e as mesmas se encontrarem em áreas gerais deste mercado, seu acesso a cargos de níveis mais elevados, ainda é uma dificuldade (BOURDIEU, 2007).

É muito complexo pensar na forma como a estrutura da sociedade está posta, colocando as mulheres a margem desses cargos de maior escalão, mesmo sendo maioria da população e maioria votante. Essa desigualdade entre homens e mulheres no serviço público é um grande espelho da realidade do contexto social que vigora no Brasil como um todo, um país alicerçado em um forte patriarcado que desde os seus primórdios colocou a mulher em uma posição secundarista aos homens, que imbuiu os homens de voz e tomada de decisão e por ser assim, ceifou das mulheres o direito a expressar seus próprios pensamentos e ideais e, além disso, as deixou a margem dos processos de tomada de decisão.

Esse cenário tem mudado nas últimas décadas, mas ainda assim existem grandes acertos a serem feitos, essa mudança de cenário mostra-se muito da base para o topo, ou seja, as mulheres vêm conseguindo se inserir na sociedade e no mercado de trabalho de maneira concreta, mas isso se dá de forma mais abundantemente nos âmbitos mais baixos e de forma mais escassa nos âmbitos mais elevados. Mulheres são maioria em trabalhos ligados a serviços domésticos e lojas por exemplo, mas como diretoras, presidentes e em cargos de liderança como um todo são minoria (FIRMINO, 2015).

A disparidade entre o número de mulheres no mercado de trabalho e sua atuação em cargos de alto escalão também se mostra presente na carreira de magistratura. A carreira de magistratura é uma das mais pretendidas dentro da área jurídica. Para o alcance dessa carreira é necessário que seja aprovado em concurso público, com provas, títulos e exigência de no mínimo três anos de exercício no campo jurídico. O magistrado (juiz) pode trabalhar na Justiça especializada, ou seja, no âmbito Eleitoral, Trabalhista ou Militar ou na Justiça comum que seria nas esferas Estadual ou Federal. À exceção da Justiça Eleitoral, na qual a competência é exercida de forma cumulativa pelos juízes da Justiça Estadual, cada um dos segmentos do Judiciário possui concurso próprio. O magistrado estadual julga matérias que não sejam da competência dos demais segmentos do Judiciário – Federal, Trabalho, Eleitoral ou Militar –, sendo a sua competência, sendo assim, é considerada residual (CNJ Serviço: saiba como funciona a carreira de magistrado, p. 01, 2016).

No Brasil, a maneira adotada para ingresso na carreira é por meio de concurso. Sendo assim, aproxima-se então o modelo brasileiro dos sistemas chamados de “burocráticos”. A carreira se aproxima desse sistema por ter contratação com base em competência técnica e qualificações específicas, além das tarefas serem pensadas por meio de regras instaladas e escritas e os funcionários estarem sujeitos a estruturas hierárquicas e normas disciplinares de regimento (WEBER, 1999).

Apesar do ingresso na carreira ser por meio de concurso público e a princípio ser acessível tanto para homens quanto para mulheres, essa igualdade de oportunidade se dá apenas nas fases iniciais, pois para ascender em Tribunais Superiores são levados em conta critérios que não são tão facilmente compreendidos e binários, não são uma questão de prova com certo e errado, e sim critérios políticos e corporativos que podem se alterar em função de inúmeras variáveis que não podem ser isoladas para uma definição exata de critério utilizado. Existe ainda um agravo nessa questão de desigualdade entre homens e mulheres, que é a questão de existir um subnível de desigualdade dentro do próprio núcleo feminino, que é a desigualdade entre mulheres brancas e mulheres negras. Dentro da própria magistratura onde o número de mulheres é inferior ao de homens, o número de mulheres negras por sua vez é inferior a todos os outros, expondo assim o quão complexa e excludente é essa estrutura posta do judiciário (VENTURINI; FERES JÚNIOR, 2015).

A seguir, por meio de gráficos e dados sobre o judiciário brasileiro, é possível constatar a magnitude dessas desigualdades dentro do Poder Judiciário Brasileiro. Os motivos para tais desigualdades são diversos, não podendo responsabilizar diretamente apenas um fator específico.

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Como mostra o gráfico, o nível de participação das mulheres é até significativo nos primeiros níveis de hierarquia, mas conforme o grau de hierarquia vai aumentando essa participação vai decrescendo. Isso não pode ser atribuído tão e somente ao mérito intelectual e de capacidade de exercer a função, até mesmo porque estudos feitos pelo movimento feminista levantaram dados que mostram que as mulheres em toda a trajetória acadêmica tendem a possuir níveis superiores aos homens de escolaridade.

Além disso, para o alcance dos graus mais elevados de hierarquia, se leva em conta critérios subjetivos, que são muito relacionados a política e indicações, o que pode vir a ser um dos fatores que desfavorecem as mulheres no sentido da competição, uma vez que muito dessa influência política e social que pode acarretar nessas indicações, está diretamente ligado ao “habitus”, que consiste no relacionamento social extra trabalho. Mulheres tendem a participar menos destes ciclos sociais que são importantes para manutenção dessas estruturas e sistemas, fazendo, assim, com que sejam naturalmente prejudicadas.

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Como já dito anteriormente e evidenciado no infograma, a questão de desigualdade de gênero está constante e diretamente ligada à questão de desigualdade de raça, pois se as mulheres já são minoria nos cargos de tomada de decisão, as mulheres negras são ainda em menor número que as mulheres brancas. Um exemplo palpável dentro do próprio Judiciário, é que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) teve em toda a sua existência, apenas três ministras, e entre essas ministras, nenhuma negra. Mais agravante do que isso, é saber que nunca houve em toda a história do Brasil, uma ministra negra em qualquer dos Tribunais Superiores.

Apesar de os dados do CNJ já se mostrarem bastante expressivos diante da situação da mulher no alcance a cargos mais altos na carreira da magistratura, estes são parciais e inacabados, segundo Sousa (2011).

Atualmente, apenas 29% dos cargos de magistrados na Justiça Federal são ocupados por mulheres e 40% na Justiça Comum de 1ª instância. Esses percentuais vão diminuindo significativamente conforme se analisam os cargos das instâncias superiores e aqueles por indicação. Vejamos alguns dados apresentados por Sousa (2011):

TABELA 1 – Quadro de juízes(as) da Justiça Federal de primeiro grau. (Atualizado em 31/12/2008).

Na segunda instância, o percentual de mulheres providas nos cargos cai para 25,1% em relação ao total de cargos.

TABELA 2 – Quadro de Desembargadores da Justiça Federal de (Juiz de Segundo Grau) (Atualizado em 31/12/2008).

A situação é ainda mais séria quando observamos os Tribunais Superiores, já que, dos setenta e um cargos disponíveis, apenas oito são ocupados por mulheres, o que representa um percentual de 13,9% apenas.

TABELA 3 – Quadro de Ministras dos Tribunais Superiores (Atualizado em 1/07/2009).

*Ministras Ellen Gracie Northfleet e Cármen Lúcia Antunes Rocha.

** Ministras Kátia Magalhães Arruda, Ives Gandra da Silva Martins Filho, Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Rosa Maria Weber Candiota da Rosa, Dora Maria da Costa.

*** Ministras Eliana Calmon Alves, Fátima Nancy Andrighi, Laurita Hilário Vaz, Denise Martins Arruda e Maria Thereza Rocha de Assis Moura.

No Supremo Tribunal Federal (STF), a representação feminina está a cargo da ministra Cármen Lúcia, atual presidente, e pela ministra Rosa Weber. No caso do Superior Tribunal de Justiça (STJ), dos 33 ministros que integram o Plenário, apenas seis são mulheres, o mesmo ocorre no Tribunal Superior do Trabalho (TST). Já no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), dos sete ministros do colegiado, duas são mulheres.

Enaltece-se que a escolha para Presidência dos tribunais brasileiros se dá por eleição entre os membros do Pleno do órgão e a praxe é observar o critério de antiguidade.

Deste modo, percebe-se que a mulher tem buscado e conseguido o ingresso na magistratura, entretanto, o número de mulheres nas primeiras instâncias é bem mais expressivo que nos quadros superiores, o que demonstra um claro distanciamento delas da cúpula do Judiciário.

Outro aspecto a ser considerado é o da magistratura ser uma carreira lenta e possuir promoção por antiguidade, sendo importante frisar que a promoção na carreira somente fora permitida às mulheres nas décadas de 70 e 80, o que justifica o agravamento desse número tão baixo de mulheres nos Tribunais Superiores.


3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo maior deste trabalho foi expor a notória problemática a respeito das desigualdades de gênero no serviço público, principalmente no que se refere ao âmbito judiciário no Brasil, mostrando, por meio de dados, o quão necessário se faz o debate a respeito deste tema.

Colocando esse assunto em evidência e abrindo o debate sobre o mesmo, se busca provocar uma forma de pensar coletivamente em mudanças efetivas para reformulação do plano de carreira da magistratura, a fim de não mais deixar mulheres à margem das instâncias superiores e, ao contrário, fomentar a ampliação da participação das mulheres nessas instâncias.

Chama-se ainda atenção para a questão da desigualdade entre mulheres brancas e negras, onde dentro de um grupo que já é minoria, existe outra minoria sobreposta, e por isso é tão importante que seja feita uma reformulação na estrutura da carreira pensando no sentindo de ampliação participativa em massa de grupos minoritários nos graus elevados da carreira.


4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 07/06/2017.

BRASIL. Lei Complementar n. 35, de 14 de março de 1979. Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp35.htm. Acesso em 07/06/2017.

BRASIL. Lei n. 12.782, de 10 de janeiro de 2013. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12782.htm. Acesso em 07/06/2017.

CNJ JUS - https://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/82067-cnj-servico-saiba-como-funciona-a-carreira-de-magistrado. Acesso em: 08/06/2017.

FIRMINO, Camila; SILVA, Filipe. Desigualdades de Gênero no Serviço Público Federal. In: FREIRE, Alessandro; PALOTTI, Pedro (org). novos olhares e perspectivas. Brasília: Enap 2015

GUIMARÃES, Mário. O juiz e a atividade jurisdicional. Rio de Janeiro, Forense, 1958, p. 67.

SOUSA, Ana Júlia da Silva de. Participação da mulher nos espaços de poder no Brasil: atuação feminina no executivo, legislativo e judiciário. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 91, ago 2011. Disponível em: <https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista-91/participacao-da-mulher-nos-espacos-de-poder-no-brasil-atuacao-feminina-no-executivo-legislativo-e-judiciario/>. Acesso em 10 de junho de 2017.

TJDFT – Transparência - https://www.tjdft.jus.br/transparencia/estruturas-remuneratorias/MagistraturaRes102CNJAnexoIIIEstruturaRemuneratria.pdf. Acesso em: 08/06/2017.

VENTURINI, Anna Carolina; FERES JÚNIOR, João, A desigualdade de gênero na Justiça brasileira, Grupo de Estudo Multidiciplinares da Ação Afirmativa, 2015.

WEBER, Max. Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Brasília, DF: Editora Universidade de Brasília: São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, p. 198. – 230, 1999.

Sobre as autoras
Juliana Moreira Moraes

Formada pela instituição de ensino UniCEUB desde 2013, com ênfase em Direito Civil, mais precisamente em Direito do Consumidor.Conciliadora do TJDFT desde 2010, tendo atuado junto aos Juizados Especiais de Brasília.Estudante de Gestão de Políticas Públicas na UnB.Possui experiência em escritório de advocacia. Relatora suplente da Junta Administrativa de Recursos de Infrações de Trânsito (JARI) do DER/DF.

Fernanda Moreira Moraes

Advogada formada pelo UniCEUB, pós-graduada em Direito Público - Direito Processual Civil pelo IMP, graduanda em Gestão de Políticas Públicas pela UnB, colaboradora na Defensoria Pública do Distrito Federal e membro da Comissão de Esporte, Cultura e Lazer da OAB/DF.

Informações sobre o texto

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