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O crime de lavagem de dinheiro no Brasil e em diversos países

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Agenda 15/10/2005 às 00:00

6 Alemanha e Espanha

Na Alemanha, o crime de lavagem de dinheiro é colocado no Código Penal [14], Título III, referente aos crimes contra o Estado Democrático de Direito, na Seção XXI, que trata da receptação e do favorecimento real. Como legislação de segunda geração, o código penal alemão aponta expressamente quais são os delitos antecedentes.

Apesar de não ser muito abrangente, na previsão legal alemã vê-se referência expressa aos crimes cometidos contra a ordem tributária, a organização dos mercados, assim como os crimes cometidos por intermédio de organização criminosa.

Em comparação à lei brasileira, também é possível a delação premiada e a punição por tentativa. A lei alemã prevê, ainda, o confisco dos bens envolvidos enquanto a lei brasileira faz referência à apreensão e seqüestro por ordem judicial (art. 4º).

Outro ponto a ser destacado na previsão legal alemã diz respeito à cominação da pena privativa de liberdade que é, a princípio, até cinco anos, podendo chegar a até dez anos em casos extremamente graves, enquanto a pena brasileira, antes de qualquer agravamento, pode chegar a dez anos (art. 1º).

Na Espanha, o Código Penal [15] traz referência expressa ao crime de ´lavagem´, no Título XIII, que trata dos delitos contra o patrimônio e contra a ordem socioeconômica, Capítulo XIV, da receptação e outras condutas afins.

As condutas incriminadas pela legislação espanhola são semelhantes às enumeradas pela lei brasileira: adquirir, converter, transmitir, ocultar, encobrir bens de origem ilícita.

Por outro lado, os dispositivos revelam aspectos diferenciados em relação ao que dispõe à lei brasileira, destacam-se: a possibilidade de agravamento da pena se os bens têm origem a partir do tráfico de drogas; suspensão de atividades ou dissolução de empresas envolvidas; inabilitação temporária para exercício profissional de empresário, trabalhador do setor financeiro, professor, educador, trabalhador social e funcionário público, em caso de envolvimento com os crimes de ´lavagem de dinheiro´.

Na previsão legal espanhola, destaca-se, ainda, a fixação da pena em até seis anos, sendo possível o agravamento se houver participação do agente em organização criminosa.


7 França, Itália e Suíça

Exemplo de legislação de terceira geração, a repressão à ´lavagem de dinheiro´ na França, Itália e Suíça tem como crime antecedente a prática de qualquer delito.

O Código Penal [16] francês dispõe um capítulo ao tratamento do crime de ´lavagem de dinheiro´, é o Capítulo IV, do Título II, sobre os crimes contra a propriedade.

O Código Penal francês resume-se a apontar condutas incriminadoras e fixar a pena em até nove anos, podendo chegar até dez anos se o crime for cometido com habitualidade facilitado pelo exercício profissional ou quando competido por organização criminosa.

Na previsão francesa, diferentemente do que diz a legislação brasileira, há a previsão de penas adicionais para as pessoas naturais. São exemplos: a proibição de ter escritório aberto ao público, proibição esta que poderá ser temporária, até cinco anos, ou até mesmo permanente; suspensão de atividades profissionais; cancelamento da licença para dirigir veículos; proibição de sair do País por até cinco anos.

Na Itália, o crime de ´lavagem´ foi incluído no Código Penal [17] desde 1990, no Título XIII, que traz os delitos contra o patrimônio, Capítulo II, dos delitos contra o patrimônio mediante fraude, ao lado da receptação.

Na Itália, as condutas também envolvem adquirir, receber e ocultar dinheiro e bens provenientes de atividade ilícita, abrangendo os crimes de extorsão, seqüestro, tráfico de entorpecentes e afins.

Merece destaque na legislação italiana a fixação de pena que pode variar de dois a doze anos, acrescida de multa que pode ser fixada de um a trinta milhões de libras. Há também a previsão de agravamento da pena em caso de a ´lavagem de dinheiro´ ter sido realizada a partir de uma atividade profissional.

Na Suíça, o delito de ´lavagem´ alicerça-se no crime de favorecimento real, como crime contra a administração da justiça no Código Penal [18].

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O Código Penal suíço traz apenas aspectos gerais sobre o crime porquanto uma lei especial federal traz, com detalhes, o sistema suíço de combate à ´lavagem de dinheiro´ [19]. Merece destaque observar que a referida lei suíça alcança e traz amplas obrigações para todas as instituições que exerçam intermediação financeira, prevendo, inclusive, o funcionamento do sistema de colaboração entre as autoridades suíças e estrangeiras.

De qualquer forma, convém ressaltar que o Código Penal suíço não diz o prazo da pena, refere-se apenas à possibilidade de detenção ou reclusão e multa, destacando-se o agravamento da pena para o autor que realizar ´lavagem de dinheiro´ como membro de uma organização criminosa ou grupo constituído para exercitar sistematicamente a ´lavagem´e, ainda, se o montante lavado envolver uma alta quantia.


8 México e Colômbia

No México, incluída em 1996 no Código Penal [20] a capitulação do crime de ´lavagem´, no Título XXIII, que trata do encobrimento e operações com recursos de procedência ilícita. No Capítulo II, o Código Penal [21] mexicano traz a tipificação das operações com recursos de procedência ilícita:

Em um formato bastante individualizado e abrangente, a legislação mexicana pune com pena de cinco a quinze anos qualquer agente que, por si mesmo ou por interposta pessoa, adquira, administre, custodie, intermedie, deposite, dê em garantia, transporte, transfira, dentro do território mexicano ou no estrangeiro, recursos, direitos ou bens de qualquer natureza, com conhecimento de que procedem ou representam o produto de uma atividade ilícita, com o propósito de ocultar ou pretender ocultar, encobrir ou impedir o conhecimento da origem, localização, destino e propriedade destes recursos, direitos ou bens provenientes de alguma atividade ilícita, ou seja, a previsão legal mexicana, de terceira geração, pune a ´lavagem de dinheiro´ proveniente de qualquer atividade ilícita.

Outro ponto de relevo, já que ausente na legislação brasileira, consiste na previsão de responsabilidade penal dos empregados e funcionários das instituições que integram o sistema financeiro que dolosamente prestem ajuda ou auxílio para o cometimento das condutas delineadas acima, sem prejuízo dos procedimentos e sanções previstas na legislação financeira vigente. Há, inclusive, a possibilidade de aumento da pena de ½(um meio) se o crime for praticado por servidor público encarregado de prevenir, denunciar, investigar ou julgar os delitos, com a inabilitação para desempenhar o emprego ou função pública. Estes dispositivo, sem dúvida, refletem um grande avanço no combate à ´lavagem de dinheiro´.

Na Colômbia, a Lei nº 491 de 1999 incluiu no Código Penal [22] o Capítulo Terceiro relativo aos crimes de ´lavagem de dinheiro´. Neste país, comete o crime de ´lavagem de dinheiro´ quem adquire, guarda, transporta, custodie, administre, bens que tenham sua origem em atividades de extorsão, enriquecimento ilícito, seqüestro, rebelião relacionada com o tráfico de drogas, entorpecentes ou substâncias psicotrópicas, e, ainda, quem dê aparência de legalidade ou legalize, oculte, esconda a verdadeira natureza, origem, destino, ou realize qualquer outro ato para ocultar e esconder sua origem, mesmo se cometidos total ou parcialmente no estrangeiro, estando sujeito a pena de prisão de seis a quinze anos e multa.

O Código Penal colombiano, assim como o mexicano, também incrimina o empregado ou diretor de instituição financeira que descumpra os mecanismos de controle contra o crime de ´lavagem de dinheiro´. Além disso, prevê como causa de agravamento de pena quando a conduta é realizada por pessoa que pertença a pessoa jurídica, a uma sociedade ou organização dedicada à ´lavagem de dinheiro´. Há, ainda, a previsão de pena acessória correspondente à proibição do exercício da profissão ou oficio por três a cinco anos no caso de o crime ser praticado por empresário de qualquer indústria, administrador, empregado, operador financeiro, de bolsa de valores ou seguradora, e à perda do cargo público em caso de servidor público.


9 União Européia

Em Estrasburgo, 1990, a Comunidade Européia expediu a Convenção Européia sobre ´Lavagem´, Busca, Apreensão e Confisco de Produtos do Crime [23], com 44(quarenta e quatro) artigos, destacando-se por ampliar o rol dos crimes considerados antecedentes à ´lavagem de dinheiro´.

Inspirada no texto da Convenção de Viena de 1988 a Convenção do Conselho da Europa alargou para fins de ´lavagem´, a noção dos capitais ilícitos, estendidos não só àqueles provenientes do tráfico de drogas mas aos de outras atividades delituosas. Previu, ainda, a possibilidade de um tipo culposo de ´lavagem´, a impossibilidade de invocar o sigilo bancário para o cumprimento das disposições, além do emprego de técnicas especiais de investigação (SOUZA NETTO, 2004, p. 52).

Cervini, Oliveira e Gomes (1998, p. 115) apontam a seguintes diferenças entre a Convenção Européia e a Convenção de Viena de 1988:

(i) la Convención Del Consejo de Europa no se acota exclusivamente a aquellos bienes que proceden de la comisión de delitos vinculados al tráfico de drogas sino a los dineros originados en cualquier tipo de delitos; (ii) la Convención del Consejo de Europa a diferencia de lo que sucede con la Convención de Viena preve expresamente la posibilidad de tipificar la comisión imprudente de estos delitos.

No Direito Comunitário, destacam-se dois documentos editados nos anos de 1991 e 2001, respectivamente:

1) Council Diretive on prevention of the use of the financial system for the purpose of money laundering (91/308/EEC) (Brussels, 10 June 1991);

2) Diretive 2001/97/EC of the European Parliament and of the Council of 4 December 2001 amending Council Diretivew 91/308/EEC on the prevention of the financial system for the purpose of money laundering (Brussels, 28 December 2001).

A chamada Diretiva 91/308/CEE relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de ´lavagem de dinheiro´ constitui um dos principais instrumentos internacionais de combate à ´lavagem de dinheiro´, no entanto, mereceu ser atualizada pela Diretiva 2001/97/CE que em seu preâmbulo traz a seguinte justificativa:

[...] a diretiva deve não só refletir as melhores práticas à escala internacional neste domínio, mas também deve igualmente continuar a pautar-se por elevados níveis de proteção do setor financeiro e de outras atividades vulneráveis face aos efeitos perniciosos associados ao produto de atividades criminosas.

Segundo a Diretiva 91/308/CEE, são enumerados como ´lavagem de dinheiro´ os seguintes atos cometidos intencionalmente:

— conversão ou transferência de bens, com conhecimento, por parte de quem as efetua, de que esses bens provêm de uma atividade criminosa ou da participação numa atividade dessa natureza, com o fim de encobrir ou dissimular a origem ilícita dos mesmos ou de auxiliar quaisquer pessoas implicadas nessa atividade a furtar-se às conseqüências jurídicas dos seus atos,

— dissimulação ou encobrimento da verdadeira natureza, origem, localização, utilização, circulação ou propriedade de determinados bens ou de direitos relativos a esses bens, com conhecimento pelo autor de que tais bens provêm de uma atividade criminosa ou da participação numa atividade dessa natureza,

— aquisição, detenção ou utilização de bens, com conhecimento, aquando da sua recepção, de que provêm de uma atividade criminosa ou da participação numa atividade dessa natureza,

— a participação num dos atos referidos nos travessões anteriores, a associação para praticar o referido ato, as tentativas de o perpetrar, o fato de ajudar, incitar ou aconselhar alguém a praticá-lo ou o fato de facilitar a sua execução.

Para assegurar a estabilidade e a integridade dos sistemas financeiros dos Estados-membros, a Diretiva 2001/97/CE tem como pontos principais:

a) o alargamento do rol de atividades a serem monitoradas para alcançar não só a lavagem de dinheiro do produto do crime associado ao tráfico de drogas;

b) inclusão das agências de câmbio, das instituições de transferências de fundos, seguradoras, cassinos e das empresas de investimento mobiliário no rol de atividades abrangidas pela Diretiva por serem vulneráveis à ´lavagem de capitais´;

c) apontada a necessidade de ação comum na definição das infrações para incriminação da ´lavagem de dinheiro´com a criação de sistemas de notificação de transações suspeitas; de cooperação internacional; identificação de clientes e manutenção de registros; de identificação, detecção, congelamento, apreensão e perda de instrumentos e produtos do crime;

d) a necessidade de repressão à criminalidade organizada (Plano de Ação do Grupo de Alto Nível);

e) inclusão de agentes imobiliários, negociantes de pedras preciosas, obras de arte, leiloeiros, dos notários e outros profissionais forenses independentes, inclusive advogados, como sujeitos ao disposto na diretiva quando participem de transações financeiras, empresariais, principalmente quando prestem consultoria fiscal pelo risco acentuado desses serviços profissionais serem utilizados de forma abusiva para o branqueaento de produto de atividades criminosas;

f) identificação de transações com clientes cujo montante seja igual ou superior a 15000 euros;

g) envio de informações de quaisquer fatos que possam constituir indícios de operações de ´lavagem de dinheiro´ às autoridades responsáveis pela repressão à ´lavagem de dinheiro´.

O controle do sistema financeiro incentivou a utilização de outras atividades e profissionais na ´lavagem de dinheiro´. Sem dúvida, a União Européia, sensível aos avanços da tecnologia do crime, conseguiu delinear e avançar na criação de um sistema abrangente de prevenção e repressão à ´lavagem de dinheiro´, ao envolver atividades profissionais e empresariais utilizadas para dissimular a origem do produto de atividades criminosas.

Sobre a autora
Neydja Maria Dias de Morais

procuradora da Fazenda Nacional, mestranda em Direito pela UFPB

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORAIS, Neydja Maria Dias. O crime de lavagem de dinheiro no Brasil e em diversos países. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 834, 15 out. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7424. Acesso em: 23 dez. 2024.

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