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SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO E A FALHA NA RESSOCIALIZAÇÃO DO APENADO

O sistema criminal brasileiro sofreu sérias e importantes modificações ao longo dos anos. Uma delas foi aderir ao modelo de ressocializar o apenado em respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana esculpida na carta Magna de 1988.

SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO E A FALHA NA RESSOCIALIZAÇÃO DO APENADO


 

O sistema criminal brasileiro sofreu sérias e importantes modificações ao longo dos anos. Uma delas foi o sistema carcerário, que influenciado pelos movimentos europeus juntamente com os acordos e convenções internacionais que defendem os direitos humanos, aderiu ao modelo que visa ressocializar o preso.

Tal sistema, encontra muitas falhas, a principal delas é não cumprir com seu objetivo principal que é a ressocialização do apenado. Ao fazer a análise e o estudo de tal sistema observa-se que são empregados vários meios para atingir tal objetivo, como incentivar os estudos, o trabalho e a religião, porém ainda assim constata-se o fracasso.

Desde que o homem decidiu viver em sociedade e assim deixar seu estado natural, passou a se submeter a normas que lhe foram impostas com o objetivo de dirimir conflitos, tais normas são as leis.

As leis possuem um importante papel na sociedade, pois é através delas que temos atualmente um cenário de “paz”. Conforme preleciona Rudolph Von Ihering na obra, A luta pelo direito, A meta da lei é a paz (2012, p.53).

É através de lei que o Estado encontra seu fundamento para punir, o ius puniendi, é, portanto, atribuição do poder Estatal, e somente a ele. Todas as punições existentes no ordenamento jurídico brasileiro pressupõe a existência de uma lei. O ius puniendi, pode ser exercido pelo Estado através de penas restritivas de direito, multas e a penas privativas de liberdade.

Até meados do século XIX, as penas corporais eram os principais meios de punição utilizados pelo homem. Nesse período a pena de morte, que era muito utilizada, entrou em colapso abrindo margem para um novo meio de coerção, a pena privativa de liberdade.

Nesse sentido preleciona Bitencourt, (2011, p. 49): “A crise da pena de morte deu origem a uma nova modalidade de sanção penal: a pena privativa de liberdade, uma grande invenção que demonstrava ser meio mais eficaz de controle social”.

No fim do século XVIII e começo do XIX, a despeito de algumas grandes fogueiras, a melancólica festa de punição vai-se extinguindo. Nessa transformação, misturaram-se dois processos. Não tiveram nem a mesma cronologia nem as mesmas razões de ser. De um lado, a supressão do espetáculo punitivo. O cerimonial da pena vai sendo obliterado e passa a ser apenas um novo ato de procedimento ou de administração. (FOULCAULT, 1985, p. 12)

Tal medida coercitiva ainda subsiste, sendo uma das mais usadas quando da ocorrência de um crime, tendo como um de seus principais objetivos além da reprovação e prevenção de crimes, a ressocialização do infrator.

Assim, aduz Rogério Greco (2015, p. 537): “ a pena deve reprovar o mal produzido pela conduta praticada pelo agente, bem como prevenir futuras infrações penais”.

A ressocialização por sua vez, é medida que tem por escopo a reinserção do indivíduo que cometeu um ato delitivo, na sociedade. É, portanto, uma forma pedagógica adotada com a finalidade de se valer de um criminoso, educa-lo e reinseri-lo na sociedade, de forma que ele não se torne reincidente.

No entanto, o fracasso de tal objetivo, qual seja a ressocialização do apenado, é visível por todos na sociedade brasileira.

Assim preleciona Rogério Greco (2015, p. 540): “ Também não escapou à critica dos juristas o critério de prevenção especial positiva ou ressocialização. A finalidade, segundo essa concepção, é a de recuperar o condenado, fazendo sua reinserção na sociedade”.

Na obra do autor acima citado, há severas críticas quanto ao sistema carcerário falido, afirmando ainda que “ mais que um problema do Direito Penal, a ressocialização, antes de tudo, é um problema político-social do Estado. Enquanto não houver vontade política, o problema da ressocialização será insolúvel.” (2015, p. 541)

Nesse mesmo sentido, Cezar Roberto Bitencourt, (2011 p.145) assevera que: “ O ideal ressocializador tem sido objeto de várias criticas. Por ora, duas delas merecem ser destacadas: a primeira interroga sobre seu conteúdo ou finalidade; a segunda trata da finalidade de pô-lo em prática.”

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Conforme as lições de Bitencourt a grande dificuldade da ressocialização é colocá-la em prática. Temos atualmente um sistema criminal evoluído, porém fracassado, pois não consegue pôr em pratica seus principais objetivos.

Tal fracasso é tão evidente que assim afirma Manoel Pedro Pimentel (1983, p. 163):

O fracasso da prisão como agente terapêutica foi constatado, relativamente às penas de curta duração, logo depois de iniciada a pratica do encarceramento como pena. É antiga, portanto, a ideia de que o ambiente do cárcere deve ser evitado, sempre que possível, nos casos em que a breve passagem do condenado pela prisão não enseje qualquer trabalho de ressocialização. Por outro lado, essas pequenas condenações não se prestam a servir como prevenção geral, acrescentando-se o inconveniente de afastar o sentenciado do convívio familiar e do trabalho, desorganizado, sem nenhuma vantagem, a sua vida.

Ao se deparar com o ambiente carcerário, vários são os problemas encontrados pelos apenados, a falta de estrutura, a superlotação dos presídios, a falta de higiene, de segurança, alimentação, dentre outros, são motivos que possivelmente vão de encontro com a falha nos objetivos da condenação penal e seu sucessivo cumprimento de pena.

A lei de execuções penais é bem clara em seu art. 12 quando prevê o mínimo necessário para a garantia da dignidade da pessoa humana: “A assistência material ao preso e ao internado consistirá no fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas”.

Essa humanização existente no direito penal tem como um de seus principais percussores Cessare Beccaria em sua grande obra intitulada, Dos Delitos e Das Penas. Na citada obra o autor defende ideais de que as penas devem ser proporcionais aos delitos praticados. Além disso, o autor afirma que o melhor meio é a prevenção de crimes e não a punição, e um desses meios de prevenção seria o estímulo ao conhecimento.

Assim, aduz o escritor:

Não apenas é do interesse da humanidade que não se cometam crimes, mas que delitos de todos os tipos sejam menos frequentes, em função do mal que causam a sociedade. Portanto, tanto mais fortes devem ser os meios de prevenção utilizados, quanto maior for o estímulo para que o crime seja cometido, na medida em que ele é contrário ao bem público. Assim, deve existir uma proporção entre crimes e penas. (BECCARIA, p.22)

Tal linha de pensamento é aceita e utilizada no atual ordenamento jurídico, que serve de influência para nossa carta magna e legislação penal. Assim, seguindo os ensinamentos de Beccaria, Cezar Roberto Bitencourt (2011, p.57) aduz:

Os princípios reabilitadores ou ressocializadores da pena têm como antecedente importante esses delineados de Beccaria, já que a humanização do direito penal é requisito indispensável. É paradoxal falar da ressocialização como objetivo da pena privativa de liberdade se não houver o controle do poder punitivo e a constante tentativa de humanizar a pena”.

Assim, conforme explicitado temos em nosso sistema criminal um cárcere que funciona de forma inexitosa não gerando os resultados mínimos esperados. Onde um criminoso inicia sua privação de liberdade, como pena imposta pelo Estado, onde tem-se de um lado a seu favor leis e até mesmo programas e incentivos estatais para que se obtenha sucesso em sua readaptação, e de outro condições desumanas e cruéis nas cadeias públicas espalhadas pelo Brasil, gerando assim um verdadeiro paradoxo de difícil explicação.


 

REFERÊNCIAS

BECCARIA, Cessare. Dos delitos e das penas. 1ª Ed. São Paulo: Hunter Books Editora, 2012.

BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal Parte Geral. 23ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2017.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2009.

GRECO, Rogério. Curso de direito penal, Parte geral, Volume 1. 17ª Ed. Niterói, RJ: Editora Impetus, 2015.

PIMENTEL, Manoel Pedro. O crime e a pena na atualidade. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1983.

VON HERING, Rudolph. A luta pelo direito. São Paulo. 1ª Edição. Hunter Books Editora. 2012

 

 

 

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