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Indenização via a Teoria do Desvio Produtivo

Uma análise no âmbito das Agências Bancárias e Call Centers

A indenização é certa quando caracterizada a Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor . Para tanto, se faz necessário, compreender melhor a teoria e a sua aplicação em situações cabíveis.

1.            Da Responsabilidade Civil pela perda do tempo útil

 

A responsabilidade civil pelo desvio produtivo é caracterizado pelo desperdício de tempo do consumidor de forma injusta e ilegítima na relação consumerista, a saber a situação geradora desse tempo perdido foi provocado por ação exclusiva do prestador de serviço ou da comercialização de produto. Destaque-se que não se enquadra toda e qualquer perda do tempo e, sim, aquela que cause desperdício injusto e intolerável ensejando uma reparação extrapatrimonial.

 

O que ocorre nos dias atuais, é que com a modernidade e o avanço tecnológico a vida em sociedade se tornou mais agitada do que nas décadas passadas, fazendo com que o dia-a-dia seja mais corrido e com muitas de atividades úteis. É nesse contexto, que se nota a agressão ao bem, chamado tempo, e como isto tem causado tantos problemas.

 

A relevância deste tema pode ser demonstrada em que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro teve aumento de 1.400% de sentenças que concederam compensação financeira dos consumidores pelas horas gastas para resolver conflitos criados por fornecedores e prestadores de serviços. Tais dados foram extraídos do Anuário da Justiça Rio de Janeiro de 2019 (Consultor Jurídico. conjur.com.br).

 

Conforme o doutrinador Pablo Stolze Gagliano (2013, p. 47), o seu desperdício é uma agressão atual e que “(...) mata aos poucos, em lenta asfixia, valor dos mais caros para qualquer um de nós.”. Este novo tema jurídico tem sido acolhido pelo princípio da dignidade da pessoa humana e da função social.

 

O princípio da dignidade da pessoa humana é uma garantia constitucional, previsto no artigo 1°, inciso III, da Constituição Federal, e como esclarecido anteriormente, o tempo encontra-se resguardado por este princípio. O seu valor no ordenamento jurídico é imenso e não somente na seara civil, mas também como podemos é notável na seara processual, com a previsão no artigo 5°, inciso LXXVIII, da Constituição Federal ao qual assegura a razoável duração do processo.

 

No que toca à responsabilidade civil, sabe-se que há a indenização material e a moral, ou patrimonial e a extrapatrimonial.  Esta responsabilidade civil encontra-se resguardada no artigo 186 do Código Civil de 2002, no qual reporta ao dano em sua forma genérica:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. (Grifo Nosso).

 

Desta forma, o nomeado doutrinador Sílvio de Salvo Venosa (2011, p. 20) define que “A noção de responsabilidade, como gênero, implica sempre exame de conduta voluntária violadora de um dever jurídico”.  Após a previsão legal concedendo o direito a reparação por dano moral houve durante muito tempo discussão para entender no que caberia esse “exclusivamente moral”, uma vez que se é um dano sem repercussão patrimonial e passível de ser indenizado.

 

O dano moral é uma “(...) lesão ao patrimônio psíquico ou ideal da pessoa, à sua dignidade, enfim, que se traduz nos modernos direitos da personalidade.” (Ibidem, p. 333). Logo, o dano moral refere-se a um dano extrapatrimonial que pode afetar às áreas, como por exemplo, da dignidade humana e danos aos direitos da personalidade.

A Constituição Federal também estendeu para a área de Direito do Trabalho a possibilidade de uma responsabilidade civil por dano material ou moral, conforme previsão no artigo 114, inciso VI, da Constituição Federal, in verbis: “Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: VI as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho” (Constituição Federal de 1988).

 

A responsabilidade civil por dano material ou moral é, portanto, cabível na seara do direito civil, trabalhista e do consumidor, entre outros. No entanto, faz-se necessário compreender quanto a sua classificação, que se divide em duas modalidades: em dano moral subjetivo e dano moral objetivo, ou seja, quanto à necessidade ou não de prova. Nesse sentido o doutrinador Flávio Tartuce esclarece que (2017, p. 406):

 

a)            Dano moral provado ou dano moral subjetivo – constituindo regra geral, segundo o atual estágio da jurisprudência nacional, é aquele que necessita ser comprovado pelo autor da demanda, ônus que lhe cabe.

b)           Dano moral objetivo ou presumido (in re ipsa) – não necessita de prova, como nos casos de abalo de crédito ou abalo moral, protesto indevido de títulos, envio do nome de pessoa natural ou jurídica para o rol de inadimplentes (Serasa, SPC) uso indevido de imagem, morte de pessoa da família ou perda de órgão ou parte do corpo. Na última hipótese, há que se falar também em dano estético presumido (in re ipsa).

 

Resumidamente, entende-se que o dano que necessita de comprovação de prova do ato ilícito é chamado de dano moral subjetivo. Quando não é necessário que se comprove o dano sofrido é chamado de dano moral objetivo.

Ressalte-se que o dano cabível ao desvio produtivo do consumidor é classificado no dano moral ou extrapatrimonial. Como o caso em questão se refere às relações de consumo, a responsabilidade civil será àquela adotada pelo Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 14, in verbis:

 

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

        § 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

        I - o modo de seu fornecimento;

        II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

        III - a época em que foi fornecido.

        § 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.

        § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

        I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

        II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

        § 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. (Grifo Nosso)

 

Nesse contexto, o desvio produtivo do consumidor ocorrer na seara consumista será aplicada a teoria da responsabilidade civil objetiva do fornecedor. Desta forma, o jurista Vitor Vilela Guglinski (2012) esclarece que:

               

(...) os fornecedores atuam no mercado de consumo assumindo os riscos do empreendimento, tese inspiradora da teoria da responsabilidade civil objetiva do fornecedor. Sendo assim, se este decide explorar empresa, deve arcar com os danos eventualmente decorrentes de sua atuação, inclusive o dano extrapatrimonial causado ao consumidor por despojá-lo de seu tempo útil. (Grifo Nosso).

 

A teoria da responsabilidade civil objetiva do fornecedor é um conjunto de “juízo valorativo cristalizado na previsão legal” (SOUZA, 2017, p. 25) que define e sistematiza de forma categórica a responsabilidade civil, de forma a fornecer ao operador do direito uma base sólida no mister de subsumir o direito aos casos concretos.

 

A responsabilidade civil objetiva conforme Lemes está subsumida na teoria do risco na qual “todo dano é indenizável  por quem se liga a ele pelo nexo da causalidade, independente da culpa” (LEMES, 2016, p. 17). Em outras palavras, enquanto a responsabilidade civil subjetiva é obrigatória a comprovação de culpa do agente que comete ato ilícito, na objetiva, esse quesito não é obrigatório. No caso do desvio produtivo do consumidor, enquadra-se responsabilidade civil objetiva porquanto se refere à relação de consumo, ou seja, é na área dos direitos do consumidor e, conforme exposto acima pela previsão do artigo 14 do CDC, é essa responsabilidade adotada visto que o consumidor é a parte vulnerável desta relação.

 

Para que seja possível requisitar uma ação de indenização pelo desvio produtivo do consumidor é necessário observar alguns requisitos essenciais, sendo que os dois últimos requisitos são facultativos, (DESSAUNE, 2017, p. 250):

 

1°. O problema de consumo potencial ou efetivamente danoso ao consumidor (...);

2°. A prática abusiva do fornecedor de se esquivar da responsabilidade pelo problema de consumo (...);

3°. O fato ou evento danoso de desvio produtivo do consumidor (...);

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4°. a relação de causalidade existente entre a prática abusiva do fornecedor e o evento danoso dela resultante (...);

5°. o dano extrapatrimonial de natureza existencial sofrido pelo consumidor (...);

6º. o dano emergente e/ou o lucro cessante sofrido pelo consumidor (...);

7°. o dano coletivo (...).

 

Vale destacar que esta responsabilidade civil ocorre uma vez que há, por parte do fornecedor, uma conduta desleal e ilícita não cumprindo com o seu dever do bom atendimento, pelo contrário aproveita-se da vulnerabilidade do consumidor para adquirir um lucro extra ou apenas praticar conduta abusiva ao invés de solucionar de forma rápida e eficiente o problema do consumidor. Delimitando um pouco os casos cabíveis, observa-se que há um grande índice de reclamações no que toca às agências bancárias e os Call Centers.

 

2.            As Agências Bancárias

 

Segundo Kumar As agências bancárias são o canal mais tradicional e ainda mais importante para a prestação de serviços financeiros no Brasil (KUMAR, 2004, p.251), constituindo-se de locais físicos utilizados pelos bancos, para realizar transações econômicas e financeiras, contratar serviços e financiamentos entre outras atividades bancárias. Por outro lado, segundo a RESOLUÇÃO Nº 4.072/2012, a “agência é a dependência destinada ao atendimento aos clientes e ao público em geral no exercício de atividades da instituição, não podendo ser móvel ou transitória”.

 

Com o advento da automação, Vansconcelos diz que no Brasil os bancos foram os pioneiros no uso da internete e automação dos seus serviçoz atingindo grau de excelência reconhecido e nível internacional. Com isso isso o faturamento liquido subiu em relação a forma tradicional de atendimento (VASCONCELLOS, 2014, p,6.2). Com o advento dos app, os bancos buscaram agilizar com efetividade de algumas dessas atividades, com o intuito reduzir custos e facilitar o acesso à informação e gestão de alguns processos financeiros por conta e risco do próprio utente.

 

No que pese o aporte tecnológico para facilidade dos seus  clientes, não ocorre o mesmo em relação à resolução dos problemas que são gerados por má gestão do utilizador-cliente ou quando o próprio sistema gera bugs, pane no sistema eletrônico ou ainda o sistema de segurança é invadido por hackers que demandam a atenção e atendimento personalizado do banco para sua resolução. Associado a estes efeitos colaterais da tecnologia, os bancos utilizam-se de telemarketing para venda se serviços e produtos.

 

Segundo a PROTESTE, Associação de Consumidores, as empresas que mais incomodam os consumidores são as de telecomunicações das instituições financeiras, que gera contratos de serviços ou de empréstimos não solicitados ou não queridos pelo correntista (YOSHIDA, 2017).

 

O problema se encontra no momento em que o cliente adentra nessas agências e se depara com várias mesas enumeradas e equipadas para realizar o atendimento, porém, não há funcionário que o atenda restando somente um ou dois para atender a todos. Consequentemente, com um número superior de clientes e poucos para realizar o atendimento, a espera é inevitável. E esta espera, muitas das vezes, ultrapassa o limite tolerável se estendendo por horas.

 

Este ato é, claramente, caracterizado pelo mau atendimento ou conduta abusiva do fornecedor que é vedado pelo CDC. Em outras palavras, o fornecedor simplesmente negligencia o tempo do indivíduo não o considerando como um bem jurídico.

É quando há a disponibilidade de um atendimento mais eficiente e não o faz, que enseja a indenização. E nesta linha de pensamento que o Superior Tribunal de Justiça julgou recentemente concedendo a indenização por dano moral pela espera excessiva na fila de banco:

 

RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. TEMPO DE ATENDIMENTO PRESENCIAL EM AGÊNCIAS BANCÁRIAS. DEVER DE QUALIDADE, SEGURANÇA, DURABILIDADE E DESEMPENHO. ART. 4º, II, “D”, DO CDC. FUNÇÃO SOCIAL DA ATIVIDADE PRODUTIVA. MÁXIMO APROVEITAMENTO DOS RECURSOS PRODUTIVOS. TEORIA DO DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR. DANO MORAL COLETIVO. OFENSA INJUSTA E INTOLERÁVEL. VALORES ESSENCIAIS DA SOCIEDADE. FUNÇÕES. PUNITIVA, REPRESSIVA E REDISTRIBUTIVA. 1. Cuida-se de coletiva de consumo, por meio da qual a recorrente requereu a condenação do recorrido ao cumprimento das regras de atendimento presencial em suas agências bancárias relacionadas ao tempo máximo de espera em filas, à disponibilização de sanitários e ao oferecimento de assentos a pessoas com dificuldades de locomoção, além da compensação dos danos morais coletivos causados pelo não cumprimento de referidas obrigações. 2. Recurso especial interposto em: 23/03/2016; conclusos ao gabinete em: 11/04/2017; julgamento: CPC/73. 3. O propósito recursal é determinar se o descumprimento de normas municipais e federais que estabelecem parâmetros para a adequada prestação do serviço de atendimento presencial em agências bancárias é capaz de configurar dano moral de natureza coletiva. 4. O dano moral coletivo é espécie autônoma de dano que está relacionada à integridade psico-física da coletividade, bem de natureza estritamente transindividual e que, portanto, não se identifica com aqueles tradicionais atributos da pessoa humana (dor, sofrimento ou abalo psíquico), amparados pelos danos morais individuais. 5. O dano moral coletivo não se confunde com o somatório das lesões extrapatrimoniais singulares, por isso não se submete ao princípio da reparação integral (art. 944, caput, do CC/02), cumprindo, ademais, funções Documento: 1787616 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 08/02/2019 Página 1 de 5 Superior Tribunal de Justiça específicas. 6. No dano moral coletivo, a função punitiva – sancionamento exemplar ao ofensor – é, aliada ao caráter preventivo – de inibição da reiteração da prática ilícita – e ao princípio da vedação do enriquecimento ilícito do agente, a fim de que o eventual proveito patrimonial obtido com a prática do ato irregular seja revertido em favor da sociedade. 7. O dever de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho que é atribuído aos fornecedores de produtos e serviços pelo art. 4º, II, d, do CDC, tem um conteúdo coletivo implícito, uma função social, relacionada à otimização e ao máximo aproveitamento dos recursos produtivos disponíveis na sociedade, entre eles, o tempo. 8. O desrespeito voluntário das garantias legais, com o nítido intuito de otimizar o lucro em prejuízo da qualidade do serviço, revela ofensa aos deveres anexos ao princípio boa-fé objetiva e configura lesão injusta e intolerável à função social da atividade produtiva e à proteção do tempo útil do consumidor. 9. Na hipótese concreta, a instituição financeira recorrida optou por não adequar seu serviço aos padrões de qualidade previstos em lei municipal e federal, impondo à sociedade o desperdício de tempo útil e acarretando violação injusta e intolerável ao interesse social de máximo aproveitamento dos recursos produtivos, o que é suficiente para a configuração do dano moral coletivo. 10. Recurso especial provido. GRIFO NOSSO. (STJ, REsp 1.737.412/SE, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 05/02/2019, DJe 08/02/2019)

 

Outro julgado do STJ com o mesmo entendimento caracterizando o desvio produtivo do consumidor pela espera em fila de banco por mais de uma hora:

 

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ESPERA EM FILA DE BANCO POR MAIS DE UMA HORA. TEMPO SUPERIOR AO FIXADO POR LEGISLAÇÃO LOCAL. Insuficiência da só invocação legislativa aludida. Padecimento moral, contudo, expressamente assinalado pela sentença e pelo acórdão, constituindo fundamento fático inalterável por esta Corte (Súmula 7/STJ). Indenização de R$ 3.000,00, corrigida desde a data do ato danoso (Súmula 54/STJ). 1. A espera por atendimento em fila de banco quando excessiva ou associada a outros constrangimentos, e reconhecida faticamente com provocadora de sofrimento moral, enseja condenação por dano moral. 2. A só invocação de legislação municipal ou estadual que estabelece tempo máximo de espera em fila de banco não é suficiente para desejar o direito à indenização, pois dirige a sanções administrativas, que podem ser provocadas pelo usuário. 3. Reconhecidas, pela sentença e pelo Acórdão, as circunstâncias fáticas do padecimento moral, prevalece o julgamento de origem (Súmula 54/STJ). 4. Mantém-se, por razoável, o valor de 3.000,00, para desestímulo à conduta, corrigido monetariamente desde a data do evento danoso (Súmula 54/STJ), ante as forças econômicas do banco responsável e, inclusive, para desestímulo à recorribilidade, de menor monta, ante aludidas forças econômicas. 5. Recurso Especial improvido. GRIFO NOSSO. (STJ, REsp 1.218.497/MT, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. 11.09.2012, DJe 17.09.2012).

 

Pelo abalo extrapatrimonial e adotando a tese do Desvio produtivo do consumidor, o Tribunal de Justiça do estado de São Paulo julgou procedente o pedido de indenização por descaso ao consumidor, in verbis:

 

APELAÇÃO AÇÃO INDENIZATÓRIA DANOS MORAIS E MATERIAIS NULIDADE REPELIDA FASE DE CONSEQUÊNCIAS SANEAMENTO POSTERIOR IRRELEVANTE RESCISÃO DO CONTRATO RESTITUIÇÃO DO VALOR DO BEM SEGURO DESPESAS ÍNSITAS À PROPRIEDADE INDENIZAÇÃO MORAL MAJORAÇÃO 'QUANTUM' EXTENSÃO DO DANO CORREÇÃO MONETÁRIA JUROS DE MORA. - Decisão suficientemente fundamentada que abrange todos os argumentos da defesa “capazes de infirmar a conclusão adotada” inteligência do artigo 489, §1º, inciso V, do Novo Código de Processo Civil. Preliminar deduzida com único propósito de se opor à interpretação dada pelo MM. Magistrado (artigos 5º e 6º, do Novo Código de Processo Civil) notável higidez da análise e fundamentação quanto à prova; - Inequívoca aplicação da fase de consequências do artigo 18, §1º, do Código de Defesa do Consumidor. Saneamento ao longo da demanda, há muito superado o prazo de 30 dias, o qual não inviabiliza a opção pelo desfazimento do negócio nos exatos termos da tutela protetiva do consumidor. Quantia, porém, considerada pelo valor atualizado do bem (Tabela Fipe), sob pena de locupletamento em face do decurso do tempo (art. 884, do Código Civil); - Desfazimento do negócio jurídico que impõe a transferência do veículo em favor da requerida desnecessária, por ora, a fixação de astreintes, sem prejuízo de eventuais medidas de indução ou execução direta na R. Primeira Instância (art. 139, do NCPC); - Exclusão dos danos materiais inviável a restituição do valor do seguro, do financiamento ou do IPVA do veículo parcelas que não se qualificam como “perdas e danos” (artigo 389, do Código Civil) verbas decorrentes da propriedade do veículo automotor, inadmissível supor a responsabilidade da ré, independente da imobilização do veículo (posse e uso) precedentes; - Teoria do desvio produtivo danos morais em decorrência do descaso com o consumidor, demonstrado o abalo extrapatrimonial pela restrição ao direito de propriedade (artigos 186 e 927, ambos do Código Civil). 'Quantum' arbitrado que se mostra incompatível com o dano sofrido (art. 944, do CC) e com os paradigmas jurisprudenciais para casos análogos negativação por mais de ano quantia majorada para R$18.000,00, corrigida da data da fixação (Súmula 362, do STJ); - Juros de mora, sobre indenização por danos morais, que deve incidir da data do fato danoso (responsabilidade extracontratual) ou da citação (contratual artigo 405 do CC) hipótese de negócio jurídico, termo inicial da data do evento danoso (anotação irregular), súmula 54, do C. STJ; RECURSOS PRINCIPAL (FORD) e ADESIVO (AUTOR) PARCIALMENTE PROVIDOS (TJSP, 30° Câmara de Direito Privado, Apelação n° 1001912-28.2016.8.26.0269, Relatora Ministra MARIA LÚCIA PIZZOTTI, julgado em 4 de outubro de 2017). (Grifo Nosso).

 

               

Em um julgado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, o relator desembargador Fernando Antônio de Almeida julgou procedente o pedido de indenização por desvio produtivo do consumidor pela demora na fila do banco, veja a seguir:

 

APELAÇÃO CÍVEL DIREITO DO CONSUMIDOR AÇÃO SOB O RITO SUMÁRIO DEMORA NA FILA DO BANCO CONSUMIDOR QUE PERMANECEU ESPERANDO POR APROXIMADAMENTE UMA HORA E MEIA NA FILA DO BANCO - SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE O PLEITO AUTORAL PARA CONDENAR O RÉU AO PAGAMENTO DE R$3.110,00 DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - APELA A EMPRESA RÉ AFIRMANDO QUE SE O CONSUMIDOR FICOU NA FILA, FOI POR SUA ESCOLHA, JÁ QUE OFERECE TERMINAIS DE AUTO-ATENDIMENTO CONTINUA AFIRMANDO QUE NÃO HÁ PROVAS DE QUE O AUTOR FICOU REALMENTE NA FILA DO BANCO POR DUAS HORAS, POIS PODERIA TER PEGO A SENHA, SAÍDO DA FILA E RETORNADO MAIS TARDE POR FIM, ALEGA QUE A DEMORA NA FILA CONSTITUI MERO ABORRECIMENTO, O QUAL NÃO GERA DANO MORAL, NOS TERMOS DA SÚMULA 75 DO TJRJ NÃO ACOLHIMENTO O RÉU NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE DEMONSTRAR FATO IMPEDITIVO DO DIREITO DO AUTOR – RESTOU CARACTERIZADA A VIOLAÇÃO AO DEVER DE QUALIDADE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR - SÃO INACEITÁVEIS AS ALEGAÇÕES DO APELANTE DE QUE O AUTOR PODERIA TER REALIZADO O PAGAMENTO DAS CONTAS POR TERMINAIS DE AUTOATENDIMENTO, UMA VEZ QUE CABE A ESTE OPTAR PELO MEIO QUE AVALIE MAIS CONVENIENTE, CABENDO, POR CONSEGUINTE, AO BANCO DISPONIBILIZAR UM SERVIÇO DE QUALIDADE, O QUE NÃO SE VERIFICOU - DESSA FORMA, ENTENDE-SE QUE OS FATOS NARRADOS PELO CONSUMIDOR ULTRAPASSAM O

 

MERO ABORRECIMENTO COTIDIANO, EM RAZÃO DE TER ESPERADO NA FILA DO BANCO POR QUASE 02 HORAS, PERDENDO TEMPO PRODUTIVO, ENSEJANDO O DEVER DE INDENIZAR.  DESPROVIMENTO DO RECURSO.  (TJRJ, 27ª Câmara Cível, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0035092-08.2012.8.19.0004, Relator Desembargador FERNANDO ANTÔNIO DE ALMEIDA, julgamento no dia 12 de fevereiro de 2014).

 

A Comarca de Jales segue a mesma linha de pensamento, julgando procedentes os casos de Reparação por perda do tempo útil. O magistrado da Comarca de Jales - SP, traz em uma de suas sentenças que a espera da parte autora de 3 horas e 2 minutos nas dependências da instituição financeira se caracteriza perda do tempo útil:

 

Isso traduz hipótese de reparação, autônoma, se a parte-autora assim o desejasse, ou por danos morais, nos termos pleiteados na inicial – em razão da perda de tempo produtivo ou útil – direito, esse, de cunho fundamental, extraído do regime e princípios adotados pela Constituição Federal. (p. 2, TJSP Proc. 0005804-43.2014.8.26.0297 – 2014).

               

 

2 Os Call Centers

 

Conforme já dito anteriormente, o avanço tecnológico trouxe muitas mudanças na vida cotidiana do consumidor. Através desta modernidade se criou novas maneiras de facilitar o acesso, a aquisição, entre outros atos de relação de consumo. É nesse contexto que surge a chamada Call Center, que, de acordo com Cintia I. S. Guimarães (2012, p.18), “Possui como característica predominante, a utilização de tecnologias (telefone e computador), por meio das quais é possível assegurar uma distribuição, teoricamente eficiente, das chamadas, promovendo uma interação com o cliente em tempo real.”. Desde modo, entende-se que o Call Center é o meio de tecnologia utilizada com o intuito de facilitar de forma eficiente a solução de problema, informação, entre outras atividades relacionadas ao consumidor, mediante telefone e computador.

Ainda que haja punição para as instituições financeiras por parte dos órgãos reguladores, de forma difusa pelo consumidor mediante ajuizamento de ações indenizatórias, os bancos mantêm atendimento deficitário que continua a gerar demora ultrapassa o mero aborrecimento e causa real perda do tempo útil.

É comum encontrar pessoas com um histórico frustrante na tentativa de solucionar problemas mediante o SAC. O sistema de ligação gratuita para resolução dos problemas continuam ineficiente gerando ligações intermináveis fazendo com que o consumidor perca horas por dia.

No entanto o que realmente se consegue é um enorme desgaste físico, mental e de tempo, uma vez que um atendente transfere ao outro e nesse jogo de competências o consumidor fica horas no telefone na tentativa de resolver o problema. O doutrinador Marcus Dessaune explica:

 

(...) que o fornecedor, ao se encontrar em posição de vantagem para impor ao consumidor vulnerável o próprio modus solvendi do problema de consumo que criou, tem o poder de transformar em pena (“castigo”) o tempo que o consumidor precisa gastar tentando solucionar aquela situação nociva.

 

Há casos em que é necessário realizar novas ligações, e outras e outras mais, na busca de solucionar o problema. Inacreditavelmente, percebe-se um total desrespeito aos direitos do consumidor defendidos pela chamada “Lei do SAC”. São nestes casos em que se configura perda do tempo útil que enseja uma indenização. E é esse o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:

               

 

 

 

APELAÇÃO CÍVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. Contratação de combo (telefonia, televisão e internet). Demora na instalação. Cobranças de valores diversos ao contratado. Negativação do nome do autor. Sentença de improcedência. Irresignação da parte autora. 1. Ré que demorou quase um mês para instalar a internet e o serviço de tv HD na residência do autor. 2. Contrato firmado por telefone, através do call center. Parte ré que não junta aos autos a gravação da conversa. Inversão do ônus da prova decretada por decisão. Cabia à ré demonstrar os termos em que o contrato foi firmado. Risco do empreendimento. 3. Falha na prestação do serviço demonstrada. Cobrança e negativação indevidas. 4. Determinação de refaturamento das contas em observância ao valor de R$ 129,00, referente ao plano contratado. 5. O dano moral, no presente caso, advém da longa espera pela instalação do serviço, da cobrança indevida, da negativação do nome do autor, bem como da perda de tempo útil do demandante, já que todos os esforços realizados administrativamente não foram suficientes para a solução da controvérsia. Quantum indenizatório arbitrado de acordo com as peculiaridades do caso concreto. 6. Reforma da sentença. 7. DÁ-SE PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. (TJRJ, Vigésima Quinta Câmara Cível. Apelação Cível n. 0030017-42.2013.8.19.0007. Rel. Des. Sérgio Seabra Varella, julgado em 17 de Maio de 2017). (Grifo Nosso).

 

 

Nesta mesma decisão o nomeado desembargador Sergio Seabra Varella (2016, p.6) ainda esclarece que o consumidor buscou de todas as maneiras a solução do problema porém não obteve êxito, o que o obrigou a ingressar com uma demanda judicial e, automaticamente, trouxe transtornos e perda do tempo útil.

                Logo, conforme exposto acima, há o cabimento desta modalidade jurídica de responsabilidade civil, considerando o tempo como um bem jurídico passível de ser tutelado. Uma vez que se refere ao direito do consumidor, a pessoa que teve seu direito lesionado nas relações de consumo possui proteção jurídica por meio do Código de Defesa do Consumidor, pela Constituição Federal e pelo Código Civil.               

 

 

Conclusão

 

A Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor se consolida nos tribunais como reconhecimento dos direitos fundamentais da pessoa que repercute nas relações de consumo, convertendo-se em uma sinalização aos administradores de empresas para que reforcem os protocolos de atendimento e flow-up para que a vida seja mais agradável e descomplicada, Nas palavras do desembargador Alcides da Fonseca, do TJ-RJ,  a perda de tempo vital do cidadão poderia ser usado para atividades de trabalho ou de lazer, mas não com problemas criados pelas próprias empresas (NOBREGA, 2019). Assim, a teoria se mostra compensatória ao consumidor e punitiva aos fornecedores que não tem protocolo de ação consentâneo com à dignidade humana.

 

Bibliografia

 

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Sobre os autores
João Ernesto Paes de Barros

Professor Mestre, doutorando na Universidade de Lisboa, advogado em Portugal e no Brasil, porfessor de Direito das Obrigações, Contratos e Responsabilidade Civil.

Ana Cristina Tetzlaff Alves

Bacharel em Direito pela Faculdade Católica Rainha da Paz, FCARP, Araputanga, Mato Grosso, Brasil.

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