RUBENS REQUIÃO(33) aponta como motivos de dissolução total da sociedade o distrato, a expiração do prazo pactuado para duração da sociedade e a impossibilidade da sociedade preencher o intuito e o fim social.
FÁBIO ULHOA COELHO(34), por sua vez, acrescenta como fatos propiciadores desse estado a falência, a unipessoalidade e causas contratuais. Analisaremos cada uma das causas enumeradas por esses doutrinadores, começando pela expiração do prazo determinado de existência da sociedade.
V.1 - Sociedade com Prazo Certo:
Dissolve-se a sociedade pela expiração do prazo ajustado ou implemento da finalidade para qual ela foi constituída, nos termos do artigo 335, nº 1 do Código Comercial, uma vez que sua criação pode ter se dado para a conclusão de certa obra, por exemplo, a construção de uma ponte.
O fato da sociedade subordinar-se a um objeto temporário não a coloca ou a identifica como de prazo indeterminado ocorrendo simplesmente que esse tempo de duração será incerto, ou seja, até finalização de seu objetivo.
No caso da empresa ter um único objetivo e seus estatutos marcarem um prazo certo de existência, realizado o objeto social antes do transcurso do tempo designado, operar-se-á sua dissolução. Continuará operando regularmente, entretanto, a sociedade que, antes de emergir o lapso temporal assinado, tiver seu prazo prorrogado mediante a concordância unânime de todos os sócios.
Referida prorrogação deverá ser levada a arquivamento na Junta Comercial e esse ato registrário não poderá ser almejado após a expiração do prazo de duração da sociedade, conforme artigo 35 da Lei 8.934/94. Assim, ultrapassado o prazo contratual de sua duração sem que tenha se dado a prorrogação, a sociedade será considerada irregular, desde que continue operando, e "perderá a proteção de seu nome empresarial", conforme artigo 59 da Lei 8.934/94. Uma vez vencido o tempo, os sócios poderão elaborar distrato (dissolução extrajudicial).
Não dissolvida a sociedade por força de sua prorrogação, não se dará a formação de uma nova entidade mas, tão-somente, teremos sua continuação a teor do artigo 307 do Código Comercial, conforme interpretação de WALDÍRIO BULGARELLI(35).
O artigo 60 da Lei de Registros Públicos, no que se refere às Empresas Mercantis, estabelece que "a sociedade que não proceder a qualquer arquivamento no período de dez anos consecutivos deverá comunicar à Junta Comercial que deseja manter-se em funcionamento", sob pena de não o fazendo, após notificação (pessoal ou fícta) da Junta Comercial, ser considerada inativa, ter seu registro cancelado e perder a proteção de seu nome empresarial, ou seja, subordinando-se, ao que parece, a uma situação dissolutória já que sua reativação só poderá se dar por meio do mesmo procedimento destinado para sua constituição.
O grande problema é saber se o referido artigo se aplica ou não às sociedades de prazo certo. Na hipótese de uma sociedade estar sendo criada para durar quinze anos e após dez anos nenhum ato tenha sido levado a registro, bem como nenhuma comunicação tenha se dado pela empresa notificada regularmente, será que a Junta Comercial poderá cancelar seus registros e submetê-la às sanções já apontadas?
Segundo MARCO ANTONIO MARCONDES PEREIRA(36), a resposta só pode ser negativa, pois a sociedade já fora constituída com a manifestação dos sócios acerca de sua duração, configurando-se a exigência por parte do artigo 60 da Lei 8.934/94 cabível apenas às sociedades por tempo indeterminado, sendo que submeter a sociedade por prazo certo àquelas sanções importarão em ofensa a seu direito líquido e certo de existência pactuada no contrato social, subordinando-se o órgão competente ao remédio constitucional do mandado de segurança.
V.2 - A Morte de um dos Sócios:
A morte de um dos sócios sempre configurou-se em motivo para a dissolução total da sociedade, salvo disposição em contrário dos que sobreviverem, nos termos exatos do artigo 335, nº 4 do Código Comercial. Assim pactuado entre os sócios que sobrevindo a morte de algum deles a sociedade permaneça, evita-se que ela se dissolva e então seus sucessores acabam por receber o quinhão do falecido, que será levado a inventário.
FRAN MARTINS e RUBENS REQUIÃO(37) divergem a respeito de dever ser a cláusula de continuação da sociedade pactuada antes ou depois do evento morte: o primeiro acredita ser imprescindível que a estipulação seja anterior ao falecimento do sócio, enquanto o último - se valendo do direito francês - vê a continuação da sociedade como uma "condição implícita, mesmo na ocorrência do falecimento do sócio, sem que haja necessidade contratual expressa", embora reconheça o peso majoritário da posição agasalhada pelo primeiro.
Atualmente, segundo MARCO ANTONIO MARCONDES PEREIRA(38), manifesta a tendência de se preservar a sociedade, parece que mais sensato é o ensinamento de REQUIÃO, que desemboca na dissolução parcial e evita a deletéria extinção da empresa.
Nada impede também que a sociedade continue com os herdeiros do falecido desde que estes queiram e inexistam motivos justos para a recusa por parte dos demais sócios. Na realidade, entendem alguns autores, que todo e qualquer herdeiro do falecido poderá participar da sociedade. HERNANI ESTRELLA(39), vê necessária a limitação aos herdeiros necessários e cônjuge supérstite tendo em vista que no momento da celebração da cláusula de prosseguimento da sociedade só estes eram conhecidos de antemão, enquanto os instituídos fogem à vocação hereditária legal. Referida limitação, segundo MARCO ANTONIO MARCONDES PEREIRA, não tem razão de ser, pois os demais sócios só poderão se opor ao ingresso dos sucessores diante de motivo justo, inexistindo limitação legal àqueles herdeiros instituídos, possa prevalecer tal restrição, salvo se contratualmente os sócios limitarem o ingresso de herdeiros testamentários, no caso de morte de um deles.
O artigo 308 do Código Comercial veda o ingresso de herdeiros menores na sociedade mercantil, ainda que autorizados pelo juiz. Essa restrição só tem razão de ser se considerarmos que se aplicam às sociedades cuja responsabilidade seja ilimitada, não se aplicando o artigo 1.403 do Código Civil, dispositivo que autorizado pelo juízo(40), já que o artigo 291 do Código Comercial só permite a aplicação subsidiária das normas do Código Civil. Se a sociedade for por quotas de responsabilidade limitada, poderá o menor participar dela como cotista, segundo doutrina JOÃO EUNÁPIO BORGES DA SILVA e outros que são citados em jurisprudência colecionada por DARCY DE ARRUDA MIRANDA JUNIOR(41).
Diante do exposto, tudo leva a crer que a sociedade comercial nunca se dissolverá em caso de morte de um dos sócios e acabará quando muito em rescisão parcial do vínculo contratual, com a conseqüente apuração de haveres do sócio falecido. Poderá ainda o herdeiro menor participar da sociedade se esta for limitada, mas apenas como cotista.
V.3 - Distrato:
Outra causa de dissolução total da sociedade é o distrato, conforme artigo 335, nº 3 do Código Comercial, que nada mais é do que uma convenção entre todos os participantes do quadro societário destinada a extinguir o ente anteriormente criado. Essa forma de dissolução, também designada de convencional, opera-se extrajudicialmente, não havendo necessidade de que se dê pela mesma forma de instrumento por que foi celebrada. Essa exigência do artigo 337 do Código Comercial encontra-se revogada pelo artigo 53 da Lei 8.934/94, que dispõe: "as alterações contratuais ou estatutárias poderão ser efetivadas por escritura pública ou particular, independentemente da forma adotada no ato constitutivo".
Aliás, regra repetida do artigo 11 da Lei 6.939/81 que já houvera revogado aquele dispositivo do Código e artigo 62, parágrafo 3º, do Decreto 57.651/66.
V.4 - Impossibilidade de Execução do Fim e Intuito Social:
A impossibilidade de atender o fim e o intuito social é causa de dissolução prevista no artigo 336, nº 1 do Código Comercial que, exemplificativamente, a aponta em decorrência da perda ou insuficiência do capital social, que "representa a totalidade, expressa em dinheiro, dos contingentes realizados ou prometidos pelos sócios com aquela destinação"(42).
Não é a diminuição do capital social que autoriza se falar em dissolução, mas apenas a redução que inviabilize a empresa de atingir seu fim social. As situações previstas no artigo do Código que podem dar causa à dissolução são enumerativas, pois outras causas podem fazer com que a sociedade não desenvolva seu objeto social: a doutrina aponta a incidência de impostos proibitivos sobre o objeto industrial da sociedade, a concorrência aberta por outros à sociedade(43) e também, em face da legislação superveniente que torne o objeto social da sociedade ilícito civil ou penal. Assim, muitas podem ser as causas que abale o objeto social.
É também comum na doutrina enumerar-se a grave divergência entre os sócios - não mera desinteligência - entre as causas que atingem o intuito e o fim social(44), contudo, essa divergência acaba, via de regra, gerando dissolução parcial, salvo quando se tratar de sociedade composta por dois sócios, para aqueles que entendem pela impossibilidade da sociedade unipessoal no nosso direito(45).
Como pondera FÁBIO ULHOA COELHO(46), essa modalidade de dissolução pode ser extrajudicial ou judicial na medida em que os sócios discordem ou não da ocorrência das causas dissolutórias.
V.5 - Causas Contratuais:
Causas contratuais previamente estabelecidas entre os sócios poderão acarretar a dissolução total da sociedade, configurando-se tal hipótese no cumprimento de seu próprio contrato de constituição. É a instituição de cláusula resolutiva ou condição resolutiva (artigo 119 do Código Civil), sujeita à apreciação do Judiciário se um dos sócios entender por sua ocorrência. Do contrário, superveniente a condição, sem dúvidas acerca de sua incidência, alguns autores são da opinião que os sócios deverão lavrar instrumento de distrato.
Diante de uma cláusula resolutiva inserta nos estatutos da sociedade constituída por prazo certo, realizada a condição dever-se-á desconsiderar o tempo ajustado, pois a indicação destas duas causas de dissolução mostra a vontade dos sócios como alternativa, prevalecendo a causa resolutiva pela possibilidade de ocorrer antes do termo.
Vencido o prazo de duração da sociedade, continuando estas suas atividades será tida como irregular, de forma que se operada a condição resolutiva previamente pactuada e sem que tenham os sócios levado a efeito distrato, também será taxada de irregular.
V.6 - Sociedade Unipessoal:
A grande maioria dos autores atesta que a sociedade se dissolve totalmente diante a unipessoalidade, ou seja, resumindo-se a um único sócio a sociedade perderia sua condição conceitual: a pluralidade de pessoas.
A despeito dessa posição majoritária, existe corrente baseada na conservação da empresa que vê na sociedade unipessoal, em situação temporária, a solução para se evitar o perdimento de sua atividade produtiva(47), levando-se a decretar a dissolução parcial, saindo o sócio dissidente ou herdeiros deste, sua parte do patrimônio. Nesse sentido vem se colhendo inúmeros julgados nos tribunais(48).
No direito alienígena encontramos substrato legal para indigitada postura(49), pois conferem às sociedades caráter institucional, contudo, no direito pátrio os defensores de sua existência baseiam-se, fundamentalmente, no fato, já mencionado, de que "não se deve esquecer de que a sociedade por quotas de responsabilidade limitada, embora constituída segundo as regras das sociedades de pessoas, isto é, pelas disposições dos artigos 300 a 302 do Código Comercial, rege-se pelas normas contidas no Decreto 3.708, de 10 de janeiro de 1.919. Em seu artigo 18 estabelece que: ´Serão observadas quanto às sociedades por quotas, responsabilidade limitada, no que não for regulado estatuto social, e na parte aplicável, as disposições da Lei das Sociedades Anônimas´. Ora, conforme dispõe o artigo 206 da Lei de Sociedades Anônimas, verificada em assembléia geral ordinária a existência de apenas um único acionista, pode a companhia prosseguir operando pelo prazo de um ano, dissolvendo-se depois se o mínimo de dois acionistas não for reconstituído, ressalvada a hipótese da subsidiária integral"(50).
O referido posicionamento, por outro lado, encontra resistência no argumento de que o disposto no artigo 206 da Lei 6.404/76 é regra excepcional das sociedades por ações, logo inextensível às sociedades de pessoas.
Apesar de FÁBIO ULHOA COELHO se situar pela dissolução total da sociedade em face da unipessoalidade, aponta como salutar o entendimento jurisprudencial de permitir a continuação da sociedade nas mãos do único sócio, que a exploraria individualmente até que nova fosse constituída.
MARCO ANTONIO MARCONDES PEREIRA, analisa a questão de forma particular, senão vejamos: "Acreditamos, todavia, em que pese o luminar doutrinador, que a continuação da sociedade por quotas de responsabilidade na modalidade unipessoal não significa que o sócio deva ser tratado como comerciante com firma individual, senão após decorrido um ano. E dentro desse prazo teríamos, de acordo com a jurisprudência favorável à sociedade unipessoal - uma contradictio in terminis - uma sociedade de cunho "institucional" como acolhida no direito estrangeiro. Após um ano da singularidade então teríamos que considera-la dissolvida, respondendo o sócio remanescente por firma individual. Nem o ingresso do novo sócio nessa sociedade implica na formação de outra, diversa daquela sujeita anteriormente à unipessoalidade. Aqui temos apenas a continuação da sociedade unipessoal que, agora, retorna à pluralidade de elementos. Do contrário, fosse o ingresso de novo sócio considerado como criação de nova sociedade, esse fato estaria dissolvendo a sociedade que antes não foi extinta por circunstância de maior relevo, qual seja, a própria unipessoalidade".
Assim, a sociedade, que antes tinha composição plural, tornou-se unipessoal e que retorna ao estado inicial, é a mesma, logo existente como dantes e consideradas as saídas e entradas de sócios como singelas alterações societárias. Com efeito, ainda que seja um contra-senso falar-se em sociedade unipessoal, o seguimento jurisprudencial acabará, num futuro próximo, por influir legislação do teor da francesa e alemã, entretanto, até que tal sobrevenha, a unipessoalidade pode importar em dissolução total da sociedade senão após decorrido o prazo de artigo 206 da Lei 6.404/76, aplicável subsidiariamente às sociedades por cotas de responsabilidade limitada face as exigências sociais colocadas na questão(51).
Com maior razão deverá adotar-se a dissolução parcial se houver cláusula de renúncia ao pedido de dissolução total em casos de morte, incapacidade e denúncia de um dos sócios.
V.7 - A Falência da Sociedade:
A declaração da falência da sociedade prevista como causa dissolutória no artigo 335, primeira parte do nº 2, do Código Comercial, encontra divergência na doutrina, defendendo alguns autores que a falência da sociedade, modalidade sempre judicial (Decreto-Lei 7.661 de 21 de junho de 1.945), representa a sua dissolução total, pois os sócios são afastados do controle e administração e essa situação confunde-se com a liquidação, não se podendo falar que a sociedade revive com a concordata suspensiva, que deve ser proposta pelos sócios e não pela falida(52).
Parte da doutrina que é discordante de tal posicionamento, entende que a sentença declaratória da falência não extingue a personalidade jurídica da sociedade, uma vez que esta (a sociedade) poderá inclusive prosseguir no comércio a requerimento do "falido" e deferimento do juízo (artigo 74 da Lei de Falências) e diante a possibilidade de processamento da concordata suspensiva (artigo 177 da Lei de Falências).
É da jurisprudência: "A falência, como causa legal de dissolução das sociedades mercantis, não extingue sua personalidade jurídica, que se mantém até completa liquidação do seu patrimônio e encerramento do processo (artigo 179 do Decreto-Lei 7.661/45) (53)".
Vale assinalar que a dissolução também não é causa extintiva da pessoa jurídica, mas sim a partilha, de forma que tanto a falência como a dissolução não a atingem, pelo menos num primeiro momento, pois, só ao final do procedimento dissolutório ou falimentar que poderemos falar em extinção da pessoa jurídica. De forma que, classificar a falência como não causa dissolutória pelo fato de não extinguir a personalidade jurídica não parece ser o melhor caminho.
O traço relevante na dissolução total é sobrevivência da empresa, ou a viabilidade de continuação de suas atividades, independentemente do sócio que se retira com seus haveres. Ora, a circunstância de a empresa falida poder continuar no comércio (artigo 74 da Lei de Falências) e até reviver com a concordata suspensiva (artigo 177 da Lei Falências) é que se faria relevante para identificar a falência como causa de dissolução parcial.
Parece ser mais razoável o entendimento de que a declaração da falência como causa potencial de dissolução total posto que as probabilidades de se fugir da liquidação são remotas no campo prático (artigo 74 e 177 da Lei de Falências), raramente se encontrando na jurisprudência casos de continuação do negócio pelos sócios da falida ou de concordatas suspensivas.