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A APLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO APÓS A REFORMA TRABALHISTA DE 2017

Agenda 08/08/2019 às 12:27

Os direito trabalhistas foram reduzidos com a Reforma Trabalhista de 2017, até que ponto a reforma limita a aplicabilidade dos princípios do Direito do Trabalho? Tais princípios ainda possuem o mesmo alcance de antes da reforma? E a força sindical?

A APLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO APÓS A REFORMA TRABALHISTA DE 2017

 

Danilo Rubens Martins da Silva[1]

 

RESUMO

 

Os princípios fundamentam o ordenamento jurídico brasileiro e estão consagrados pela Constituição Federal de 1988, não obstante, como parte do ordenamento jurídico brasileiro, o Direito do Trabalho é composto por regras e também por princípios, que são ordenados em uma sistemática que possibilitam a regulamentação da relação de trabalho subordinada. Em 2017, com a aprovação da Lei n. 13.467, denominada de reforma trabalhista, que trouxe significativas mudanças acerca da relação entre empregado e empregador, surgiram inquietações, principalmente pela classe trabalhadora que se sentiu prejudicada em diversos pontos alterados pela reforma. Diante dessas inquietações, foi feito pertinente analisar a aplicabilidade dos princípios do Direito do Trabalho após a referida reforma trabalhista, verificando o alcance destes princípios nas principais mudanças advindas da reforma. Tal verificação fez mediante análise doutrinária da definição dos princípios, da Consolidação da Leis Trabalhistas (CLT) e jurisprudências em que foram aplicados os princípios do Direito do Trabalho, tendo assim, a possibilidade de verificar a aplicabilidade ou não, dos princípios do Direito do Trabalho após as alterações na CLT. Necessário ainda, ressaltar se tais princípios ainda possuem o mesmo alcance interpretativo como antes, diante de situações concretas que surgiram após a reforma. Diante desta problemática o diálogo com a lei, a doutrina e a jurisprudência foi essencial para se concluir, no sentido de que a reforma violou princípios basilares do Direito do Trabalho e também princípios constitucionais, resultando em perdas significativas para os trabalhadores na relação de emprego e trabalho.

Palavras-chave: Direito do Trabalho; princípios; reforma trabalhista        

 

INTRODUÇÃO

 

O artigo que segue teve por finalidade abordar uma temática acerca do Direito do Trabalho muito comentada atualmente, a reforma trabalhista ocorrida no ano de 2017, com alterações significativas nas relações empregado/empregador com a aprovação da Leis n. 13.467/2017, alterando cerca de 200 pontos da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).

No desenvolvimento do estudo, fez-se necessária a leitura e compreensão acerca das mudanças ocorridas na CLT em conformidade com a reforma trabalhista estabelecida com a aprovação da Lei n.13.467/2017, fazendo um paralelo com a legislação anterior, pontuando as principais alterações, analisando cada uma delas a luz dos princípios constitucionais e do Direito de trabalho. Posteriormente, buscou-se na jurisprudência estabelecida após a referida reforma, julgados que possibilitassem averiguar a aplicação desses princípios e seu alcance dentro da nova legislação estabelecida pela lei retro citada. 

Para tanto, utilizou-se pesquisa bibliográfica com levantamento e análise das informações acerca dos problemas apresentados na elaboração do projeto antecedente a este artigo, partindo do método dedutivo para buscar as respostas de tais questionamentos.

A pesquisa bibliográfica contribuiu para definir os princípios norteadores do Direito do Trabalho, em seguida, o levantamento das principais alterações sofridas pela CLT em virtude da reforma trabalhista de 2017. Seguindo, foi feita uma análise acerca do alcance que tais alterações na CLT tiveram na relação empregado/empregador.

E por último, verificou-se a aplicabilidade dos princípios do Direito do Trabalho após as alterações advindas da reforma trabalhista, ressaltado se tais princípios ainda possuem o mesmo alcance interpretativo como antes, diante de situações concretas que surgiram após a reforma.

Buscou-se realizar tal abordagem à luz dos princípios constitucionais e do Direito do Trabalho, dando ênfase à aplicabilidade dos mesmos após a reforma trabalhista com a aprovação da lei supracitada. No entanto, o tema demonstrou-se complexo, fato este determinante para que houvesse uma melhor delimitação do alcance da pesquisa, uma vez que o Direito do Trabalho, em sua composição por regras e princípios ordenados em uma sistemática que possibilitam a regulamentação da relação de trabalhado subordinada, passou por uma alteração em suas regras, que, por conseguinte, modificaram significativamente a relação empregado/empregador e, mediante tais alterações, é possível que algum, ou alguns dos princípios que regulamentam o Direito do Trabalho tenha seu alcance reduzido ou até mesmo ignorado pelo legislador. 

                  Após a aprovação das leis que possibilitaram a reforma trabalhista, notou-se uma inquietação na população por eventuais perdas de direitos trabalhistas, uma vez que a referida reforma alterou diversos pontos importantes da CLT. Depois da reforma estabelecida e consequentemente a inquietação causada por ela, principalmente na classe trabalhadora por possíveis perdas de direitos antes protegidos pela legislação trabalhista e defendidos pelo Ministério do Trabalho, é que surge a necessidade de analisar a aplicabilidade dos princípios do Direito do Trabalho diante de tal reforma.

Restou-se necessário elencar quais princípios serão observados no estudo em questão, tarefa esta que não foi fácil, pois todos os princípios são importantes para que se possa ter uma interpretação e integração mais fiel da lei. Para tanto, foi feita uma análise dos princípios considerados mais relevantes no Direito do Trabalho, então elencados conforme a doutrina majoritária, sendo eles: o princípio da proteção (com a tríplice regra do in dubio pro misero, da norma mais favorável e da condição mais benéfica), o princípio da irrenunciabilidade, o princípio da continuidade, o princípio da primazia da realidade, o princípio da razoabilidade e o princípio da boa-fé.

Definidos os princípios, surgiu a necessidade de verificar as principais alterações ocorridas nas leis que originaram a reforma trabalhista e, com isso, analisar se tais alterações ferem alguns dos princípios que, segundo a doutrina, a própria CLT e a Constituição Federal (CF) de 1988 amparam em seus textos.

Ao dialogar com a lei e a doutrina, iniciamos desde já a termos algumas conclusões possíveis acerca do nosso objeto de estudo, conclusões essas que necessitaram ser comprovadas através das análises propostas. Diálogo esse que se sustentou pela lei e pela doutrina, especificamente na Constituição Federal de 1988, que em seu texto ampara os princípios do Direitos do Trabalho, bem como a CLT, que também em seu texto, ressalta a importância da aplicação dos princípios na interpretação e aplicação das normas do Direito do Trabalho.

É importante salientar que a doutrina, em sua maioria, traz os princípios do Direito do Trabalho como aportes fundamentais da legislação, e sabedores dessa realidade, ao iniciarmos o diálogo com tais institutos, com intuito de verificar a aplicabilidade dos princípios do Direito do Trabalho às alterações promovidas pela reforma trabalhista, partimos do pressuposto que a reforma trouxe significativas mudanças para a CLT, com a possibilidade de violar princípios do Direito do Trabalho e constitucionais, diminuindo assim o alcance de alguns princípios no que tange à proteção do hipossuficiente na relação de emprego ocasionando perdas significativas ao empregado, principalmente no que tange à sua representação sindical, que foi praticamente extinta com a reforma.

 

1 OS PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO

 

1.1 Breve histórico acerca dos princípios do Direito do Trabalho

 

É cediço que nosso ordenamento jurídico se baseia em princípios, esses com fundamentação na Constituição Federal (CF) de 1988, que regula/normatiza os direitos do trabalhador, estando explícitos em seu artigo 7. os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, e também dos que busquem à melhoria de sua condição social, direitos estes embasados, no âmbito das relações de trabalho, em direitos fundamentais advindos de valores como liberdade e igualdade, com objetivo de proteger a integridade física, moral e psicológica do trabalhador, buscando com isso garantir a esse trabalhador uma existência digna.

Analisando ainda o sobredito preceito constitucional, nota-se que o rol extenso expresso é exemplificativo, o que nos leva a buscar uma interpretação para aplicação de tal dispositivo, em outros dispositivos orientados por princípios, dentre os quais destacamos:  dignidade da pessoa humana (art. 1., III, CF); valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1., IV, CF); valorização do trabalho humano e justiça social (art. 170., CF); busca do pleno emprego (art. 170., VIII, CF); e, primado do trabalho como base da ordem social (art. 193, CF).

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social.

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

VIII - busca do pleno emprego;

Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.

 

É compreensível a conclusão de que tais princípios acima expostos denotam uma parte do que é, ou deveria ser, o conceito que estrutura o estado democrático de direito, uma vez que este tem como ponto central a pessoa humana com sua dignidade. Logo o princípio da dignidade da pessoa humana é basilar em toda constituição democrática, conforme Mauricio Godinho Delgado (2017, p. 28):

A eleição da pessoa humana como ponto central do novo constitucionalismo, que visa assegurar sua dignidade, supõe a necessária escolha constitucional da Democracia como o formato e a própria energia que tem de perpassar toda a sociedade política e a própria sociedade civil. Sem Democracia e sem instituições e práticas democráticas nas diversas dimensões do Estado e da sociedade, não há como se garantir a centralidade da pessoa humana e de sua dignidade em um Estado Democrático de Direito. Sem essa conformação e essa energia democráticas, o conceito inovador do Estado Democrático de Direito simplesmente perde consistência, convertendo-se em mero enunciado vazio e impotente.

 

Desta feita, sabido é que, os princípios são verdadeiras normas jurídicas que, juntamente com as regras jurídicas compõem o ordenamento do Direito, o que está evidente na Constituição Federal de 1988, onde um dos seus eixos principais é baseado por um núcleo principiológico humanístico e social.

No mesmo diapasão, temos o Direito do Trabalho, que também possui seus princípios norteadores da relação empregado/empregador, buscando informar, orientar e normatizar tanto os advogados, magistrados e outros aplicadores do Direito quanto ao Poder Legislativo ao elaborarem leis sobre o tema, Amauri Mascaro Nascimento (2001, p. 467) disciplina que:

Para o positivismo, os princípios estão situados no ordenamento jurídico, nas leis em que são plasmados, cumprindo uma função integrativa das lacunas, e são descobertos de modo indutivo, partindo das leis para atingir as regras mais gerais que delas derivam, restritos, portanto, aos parâmetros do conjunto de normas vigentes, modificáveis na medida em que seus fundamentos de direito positivo são alterados.

 

Portanto, no Direito do Trabalho fazem-se presentes os princípios tanto constitucionais quanto do próprio Direito do Trabalho, princípios esses que buscam sustentar e harmonizar o ordenamento jurídico, estabelecendo garantias e proteção aos mais vulneráveis em relações jurídicas das mais diversas naturezas.

 

 

 

 

 

1.2 Os princípios do Direito do Trabalho à luz da doutrina

 

                            A CLT, em seu artigo 8.,caput, possibilita a interpretação de que o princípio tem a função de integrar, de preencher lacunas da lei ao ser interpretada pelas autoridades, assim:

Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

 

Ao questionarmos qual a função dos princípios da nossa lei trabalhista, Amauri Mascaro Nascimento (2001, p. 466) diz que “é a integração das lacunas. Nos casos de ausência de leis, de jurisprudência, de regras contratuais os princípios devem servir de critério de solução das controvérsias. É um papel muito acanhado dado aos princípios pela CLT”.

Diante de tais argumentações, nota-se que os princípios são considerados normas universais, capazes de propiciar uma interpretação e integração das normas quando estas não forem suficientes para dirimir a lide, conforme nos esclarece Miguel Reale (2004, p. 304):

O legislador, por conseguinte, é o primeiro a reconhecer que o sistema das leis não é suscetível de cobrir todo o campo da experiência humana, restando sempre grande número de situações imprevistas, algo que era impossível ser vislumbrado se quer pelo legislador no momento da feitura da lei. Para essas lacunas há a possibilidade do recurso aos princípios gerais do direito, mas é necessário advertir que a estes não cabe apenas essa tarefa de preencher ou suprir as lacunas da legislação.

 

No entendimento de Maurício Godinho Delgado (2016 p. 191-192):

Em conclusão, para a Ciência do Direito os princípios conceituam-se como proposições fundamentais que informam a compreensão do fenômeno jurídico. São diretrizes centrais que se inferem de um sistema jurídico e que, após inferidas, a ele se reportam, informando-o.

 

Destarte, é perceptível a função e importância que os princípios desempenham na interpretação e aplicação das normas, uma vez que sua aplicação, segundo Ennio Marcos de Melo Lima (2018, p. 10),

...se dá de forma estrutural, assumindo uma função protetiva aos direitos do trabalhador que na relação empregatícia se encontra submisso ao empregador, assegurando o mínimo de direitos que sobretudo não podem fazer parte de livre disposição ou negociação, pois são direitos individuais indisponíveis.

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No tocante aos princípios, enumerá-los é uma questão que se depara com um grande número de opiniões, por se tratar de um tema complexo. Porém, Américo Plá Rodriguez (2000, p. 61) propõe os seguintes princípios:

1) princípio da proteção que se pode concretizar nestas 3 ideais: a) in dubio, pro operário; b) regra da aplicação da norma mais favorável; e c) regra da condição mais benéfica; 2) princípio da irrenunciabilidade dos direitos; 3) princípio da continuidade da relação de emprego; 4) princípio da primazia da realidade; 5) princípio da razoabilidade; 6) princípio da boa-fé; e 7) princípio de não discriminação.

 

                        Seguindo a classificação principiológica listada acima, apresentaremos a definição de cada um deles no item a seguir.

 

1.3 Os princípios do Direito do Trabalho, uma breve definição

 

                    O princípio é o início, o começo de algo. E como já foi dito anteriormente, as leis necessitam ser interpretadas e aplicadas em conformidade com os princípios do Direito na busca da harmonia necessária para uma melhor utilização de seu teor, seja pelo legislador ou pelo intérprete, como narra Arnaldo Sussekind (1999, p. 56):

Princípios são enunciados genéricos, explicitados ou deduzidos do ordenamento jurídico pertinente, destinados a iluminar tanto o legislador, ao elaborar as leis dos respectivos sistemas, como o intérprete, ao aplicar as normas ou sanar omissões.

 

                        Os princípios do Direito do Trabalho em destaque neste trabalho são os seguintes:

 

1.3.1 Princípio da proteção

 

                    O princípio da proteção está remetido totalmente ao empregado, considerado o lado mais vulnerável da relação de emprego, com objetivo de protegê-lo, buscando um equilíbrio jurídico nessa relação doravante desigual na relação de emprego.

Não existe na Constituição brasileira o termo exato para “princípio da proteção ao trabalho”, no entanto, ele se respalda nos direitos sociais, econômicos e na vertente de que a ordem social é fundada no trabalho, conduzindo a outro princípio basilar, que consiste na dignidade da pessoa humana (ARRUDA, 1998).

 

                    No entendimento de Américo Plá Rodrigues (2000, p. 83), tal princípio se refere ao critério fundamental que orienta o Direito do Trabalho, inspirando num propósito de igualdade com objetivo de amparar preferencialmente o trabalhador.

                    Desse princípio surgem, segundo Américo Plá Rodrigues (2000, p.83-84) os princípios: in dubio pró operário, regra da aplicação da norma mais favorável e a regra da condição mais benéfica.

 

a) In dubio, pró operário

 

                     O referido princípio estabelece que, em caso de dissídio, havendo divergências quanto à interpretação da norma, deverá o magistrado optar pela escolha de interpretação mais favorável ao empregado, ou seja, na dúvida, para o empregado.

José Cairo Junior (2018, p.105) ressalta que tal regra deve ser aplicada no âmbito do Direito Material do Trabalho e jamais no que se refere ao Direito Processual Laboral, no qual as partes devem merecer tratamento isonômico, segundo mandamento constitucional.

 

b) Regra da aplicação da norma mais favorável

 

Sabe-se que, no Direito, quando há a possibilidade de aplicação de duas normas no mesmo caso, existem regras acerca da escolha da norma a ser aplicada, e o referido princípio estabelece que, havendo duas ou mais normas regulando o mesmo assunto, deverá ser aplicada a que for mais favorável ao empregado. Logo, em consequência do princípio em tela, quando uma lei, de ordem pública, ou privada, for mais favorável ao empregado, dando garantias de melhores condições de trabalho, em detrimento das demais, ela deverá ser utilizada, uma vez que havendo esse confronto de duas ou mais normas, aplicar-se-á a que é mais vantajosa para o empregado, levando-se em consideração ser ele a parte hipossuficiente na relação de trabalho.

Nos escritos de Arnaldo Sussekind, Délio Maranhão e Segadas Viana (1999, p. 152-153), que se fazem atuais, o princípio da proteção do trabalhador resulta das normas imperativas, e, portanto, de ordem pública, que caracterizam a intervenção básica do Estado nas relações de trabalho, visando a opor obstáculos à autonomia da vontade.

 

 

c) Regra da condição mais benéfica

 

A regra da condição mais benéfica estipula que, uma vez fixadas no contrato de trabalho duas ou mais regras, prevalecerá a que estabelecer condições mais favoráveis ou vantajosas para o empregado, ou seja, havendo conflito de regras ou conflito na interpretação da norma jurídica explicitada no contrato de trabalho, deverá prevalecer a mais favorável ao empregado.

Entrementes, o princípio da proteção busca evitar a exploração do trabalhador, evitando abusos que possam violar sua integridade física e mental, possibilitando a aplicação da jurisdição pelo Estado, intervendo, caso ocorra violação a tal princípio.

 

1.3.2 Princípio da irrenunciabilidade dos direitos

 

            O princípio da irrenunciabilidade dos direitos possui a finalidade de proteger o empregado e seus direitos trabalhistas, não permitindo que o empregado hipossuficiente abra mão de seus direitos subjetivos que possam ser exercidos em face do empregador. O princípio da irrenunciabilidade dos direitos está positivado no artigo 9. da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), ao mencionar que serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente consolidação.

            Américo Plá Rodrigues (2010, p. 142) diz que a noção de irrenunciabilidade pode ser expressa em termos muito mais gerais, como sendo a impossibilidade jurídica de privar-se voluntariamente de uma ou mais vantagens concedidas pelo direito trabalhista em benefício próprio.

            Agora, faz-se necessário saber que o referido princípio não se aplica em audiências, uma vez que o empregado poderá, caso deseje, renunciar a algum direito a ele atribuído.  

 

1.3.3 Princípio da continuidade da relação de emprego

 

                    Em regra, os contratos de trabalho são estabelecidos por prazo indeterminado. No entanto, há a possibilidade de se estabelecer contratos de trabalho por prazo determinado, porém nosso ordenamento jurídico não permite que haja a sucessão de contratos por prazo determinado em uma mesma empresa, o que, caso ocorra, caracterizará um único vínculo.

                    De acordo com José Cairo Junior (2018, p.110), presume-se que a intenção dos contratantes e principalmente do empregado é de protrair indefinidamente, no tempo, e execução do pacto laboral.

           

1.3.4 Princípio da primazia da realidade

 

                    O princípio da primazia da realidade estabelece que os fatos reais, ou seja, o que realmente ocorreu no âmbito laboral tem maior força do que se encontra nos documentos, ou no próprio contrato de trabalho, sendo tal princípio utilizado de forma rotineira na prática trabalhista.

                    José Cairo Junior (2018, p. 111) observa que a prevalência da primazia da realidade sobre a formalidade depende de prova, ou seja, não basta apenas alegar uma situação, é necessário, sobretudo, prová-la.

                    Desta feita, nota-se que tal princípio possui a função de solucionar a lide que existe entre uma situação de fato no âmbito laboral e a documentação e/ou contrato de trabalho que regem o vínculo empregatício.

 

1.3.5 Princípio da razoabilidade

 

                    A razoabilidade é um princípio que nos remente à subjetividade e que é utilizado e adotado não apenas pelo Direito do Trabalho, mas por diversos outros ramos jurídicos, e seu teor nos remete a uma ação que é guiada pela razão, ou seja, deriva da racionalidade.

Na doutrina, José Cairo Junior (2018, p. 112) explica que o princípio da razoabilidade, contudo, serve para afastar o reconhecimento de situações fáticas extremas, absurdas e inaceitáveis pelo senso comum do homem médio.

                    O princípio da razoabilidade é colocado no intuito de não permitir pretensões que destoam da realidade fugindo dos parâmetros estabelecidos pela natureza humana, tanto por parte do empregado quanto do empregador.

 

1.3.6 Princípio da boa-fé

 

                    A boa-fé está presente em todos os ramos do Direito, não sendo exclusividade do Direito do Trabalho, uma vez que sempre se exige do sujeito, em qualquer relação jurídica, que ele aja dentro dos preceitos da boa-fé, resguardando seus direitos e deveres oriundos de obrigações contratuais no intuito de cumpri-las.

                    Américo Plá Rodrigues (2000, p. 425) enfatiza que a boa-fé se remete à:

Conduta da pessoa que considera cumprir realmente com o seu dever. Pressupõe uma posição de honestidade e honradez no comércio jurídico, porquanto contém implícita a plena consciência de não enganar, não prejudicar, nem causar danos. Mais ainda: implica a convicção de que as transações são cumpridas normalmente, sem trapaças, sem abusos nem desvirtuamentos.

 

                    Entrementes, é compreensível que o princípio em tela se configura na busca pela verdade, em que as partes, diante de um dissidio se respeitem, e acima de tudo, respeitem a justiça, não provocando lesão ao outro, primando pela lealdade e honestidade.

 

1.3.7 Princípio de não discriminação

 

                    Pelo princípio de não discriminação, tem-se estabelecida a proibição de qualquer tipo de discriminação subjetiva, oriundas da cor, raça, credo, idade, sexo ou opinião, em qualquer momento, desde a admissão e todo período em que viger o contrato de trabalho. Tal princípio não encontra fundamentação na CLT, porém, a Constituição Federal de 1988 em artigo 7., inciso XXX, resguarda tal princípio.

                    Temos também normas especificas de Direito de Trabalho, como os Decretos n. 4.316/2002 e n. 3.956/2001 que resguardam o mencionado princípio em seus textos.

 

2 PRINCIPAIS ALTERAÇÕES SOFRIDAS PELA CLT EM VIRTUDE DA REFORMA TRABALHISTA DE 2017

 

O Direito do Trabalho passa por um momento delicado após a reforma trabalhista ocorrida no ano de 2017 com a aprovação da Lei n. 13.467/2017 alterando cerca de 200 pontos da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), e que trouxe mudanças significativas para as relações trabalhistas tanto para o empregador quando para o empregado, deixando este segundo em situação de desvantagem em relação ao primeiro. Também no ano de 2017, foi aprovada a Lei n. 13.429, que regulamenta e amplia o trabalho terceirizado e o contrato temporário.

 

2.1 Principais alterações da reforma trabalhista e consequentes reflexos

 

Impende reconhecer que, o ponto central da reforma trabalhista foi a inserção do Artigo 611-A, onde está exposto uma tratativa acerca da prevalência dos acordos coletivos em relação à Lei, sou seja, prevalecimento do acordado sobre o legislado, como transcrito no mencionado artigo da CLT,

Art. 611-A: A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre: I - pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais; II - banco de horas anual; III - intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas;  IV - adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a Lei no 13.189, de 19 de novembro de 2015; V - plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do empregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança; VI - regulamento empresarial;  VII - representante dos trabalhadores no local de trabalho;  VIII - teletrabalho, regime de sobreaviso, e trabalho intermitente; IX - remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado, e remuneração por desempenho individual;  X - modalidade de registro de jornada de trabalho;  XI - troca do dia de feriado; XII - enquadramento do grau de insalubridade;  XIII - prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho; XIV - prêmios de incentivo em bens ou serviços, eventualmente concedidos em programas de incentivo;  XV - participação nos lucros ou resultados da empresa. 

 

Da leitura do supracitado dispositivo deflui a existência de uma tendência que propicia a flexibilização relativa à jornada de trabalho, partilhando também uma flexibilização quanto à remuneração, haja vista que, após a reforma trabalhista é possível pactuar quanto à jornada de trabalho, banco de horas e intervalos e, consequentemente estipular planos de cargos e salários de acordo com a condição pessoal do empregado, entre outros.

Importante ressaltar, segundo Sandro Sacchet de Carvalho (2017, p. 83), que alguns parágrafos do artigo 611-A buscam garantir a intenção da proposta do negociado sobre o legislado, o que tem por consequência uma limitação do papel da Justiça do Trabalho quando for necessária análise dos acordos e convenções.

Destarte, se faz necessário verificar que o § 1. do referido dispositivo disserta acerca do exame da convenção coletiva ou acordo coletivo, onde, deverá a Justiça do Trabalho observar o que diz o § 3. do artigo 8. da CLT,  ou seja, na falta de disposições legais ou contratuais deverá balizar sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva, analisando exclusivamente a conformidade  dos elementos essenciais do negócio jurídico estabelecidos no artigo 104 da Lei n. 10.406/2002 (Código Civil).

Contrapondo o artigo 611-A, o 611-B elenca as indisponibilidades relacionadas aos direitos que podem ser instrumentos de negociação, como a licença maternidade, número de dias de férias, dentre outros. Nota-se, portanto, uma preocupação do legislador quanto os direitos fundamentais presentes na Constituição Federal de 1988, classificando como ato ilícito a supressão ou a redução de uma série de direitos, em um rol exemplificativo, buscando assim, proteger o empregado de possíveis abusos por parte do empregador.

Outra importante modificação apresentada no artigo 394-A, §§ 2. e 3., foi a relativa ao trabalho da gestante em ambientes com condições insalubres classificados como médio e mínimo, desde que ela, voluntariamente apresente atestado de saúde, emitido por médico de sua confiança autorizando sua permanência no exercício de suas atividades, e no caso da lactante, apresentar atestado de saúde que recomende o afastamento durante a lactação. Tal modificação, obviamente, pode ser prejudicial a gestante, parte tida como vulnerável na relação de emprego, uma vez que a mesma poderá sentir-se coagida a perder o emprego e aceitar a possiblidade de desenvolver suas atividades em locais impróprios para a sua saúde e do feto.

Outra substancial alteração, refere-se a uma nova modalidade de contrato de trabalho, citado no § 3. do artigo 443 da CLT, o contrato de trabalho intermitente, que estipula características de subordinação na prestação de serviços, não sendo contínuo, se realizando com alternância entre períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, excluindo os aeronautas que são regidos legislação específica.

A revogação dos §§ 1., 3. e 7. do artigo 477 traz um retrocesso que implica na possibilidade de pagamento inadequado concernente às verbas rescisórias de trabalhadores com mais de um ano de serviços prestados, uma vez que, não é mais necessária a homologação da rescisão com assistência do sindicato da referida classe, bastando para tanto, a comunicação da rescisão para às autoridades competentes, podendo então, de acordo com André G. Campos (2017, p. 15), ser realizada na própria empresa.

Fato esse atrelado à perda da força sindical que, com a reforma trabalhista, passou a permitir, conforme estipula o artigo 510 da CLT, a criação de uma comissão para representar os empregados, caso a empresa tenha mais de 200, objetivando promover-lhes o entendimento com os empregadores, dispensando assim a atuação dos sindicatos. No entendimento de Sandro Sacchet de Carvalho (2017, p. 88), há a preocupação de que a comissão eleita possa sofrer pressão por parte do empregador de forma a influenciar sua representação, reduzindo assim o poder de barganha entre o obreiro e o empregador. É notável a redução da força dos sindicatos na representação dos empregados, principalmente após a extinção da contribuição sindical obrigatória, que em tese, mantinha financeiramente o funcionamento destas entidades, mas por outro lado, a extinção da contribuição sindical pode ser entendida como uma forma de obrigar os sindicatos a serem realmente efetivos nas lutas e interesses de seus respectivos membros.

Não se pode deixar de mencionar a redução significativa no número de reclamações trabalhistas que a reforma trouxe, algo que está sempre sendo exposto pelos tribunais. Mariana Machado Pedroso (2018, p. 2) menciona que tal fato se deve pela insegurança jurídica que se abate sobre os operadores do Direito, principalmente, advogados, e, outro fator, ainda pela mesma autora (2018, p. 2), é relativo à possibilidade de a parte vencida ter que arcar com os custos do processo, incluindo honorários de sucumbência. Desta feita, é evidente que há uma limitação por parte do empregado em pleitear uma a ação trabalhista por medo de ter que arcar com despesas, mesmo sendo beneficiário da justiça gratuita, perdendo ou tendo reduzido o seu poder de acesso à Justiça do Trabalho.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 5766 que recai sobre os artigos 790-B e 791-A, ambos da CLT, preconiza justamente a função de que créditos trabalhistas obtidos em demandas propostas por trabalhadores pobres assumem caráter de mínimo existencial, compatível com o princípio constitucional da dignidade humana, logo não deverá ser cerceado o direito do trabalhador em recebê-los. Ainda, em seu pedido, diz o então procurador Rodrigo Janot,

...que as normas violam as garantias constitucionais de amplo acesso à jurisdição e a assistência judiciária integral aos necessitados e, com propósito de desregulamentar as relações trabalhistas e o declarado objetivo de reduzir o número de demandas na justiça, a Lei 13.467/2017 inseriu 96 disposições na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com “intensa” desregulamentação da proteção social do trabalho e redução de direitos materiais dos trabalhadores. (STF, Notícias Reconhecidas, 28-8-2017).

 

Deflui a necessidade de expor a decisão da ADI supracitada em sua integralidade para que possamos identificar os efeitos da mesma acerca dos dispositivos que a originaram, sendo assim:   

ADI n. 5766: Decisão: Após o voto do Ministro Roberto Barroso (Relator), julgando parcialmente procedente a ação direta de inconstitucionalidade, para assentar interpretação conforme a Constituição, consubstanciada nas seguintes teses: “1. O direito à gratuidade de justiça pode ser regulado de forma a desincentivar a litigância abusiva, inclusive por meio da cobrança de custas e de honorários a seus beneficiários. 2. A cobrança de honorários sucumbenciais do hipossuficiente poderá incidir: (i) sobre verbas não alimentares, a exemplo de indenizações por danos morais, em sua integralidade; e (ii) sobre o percentual de até 30% do valor que exceder ao teto do Regime Geral de Previdência Social, mesmo quando pertinente a verbas remuneratórias. 3. É legítima a cobrança de custas judiciais, em razão da ausência do reclamante à audiência, mediante prévia intimação pessoal para que tenha a oportunidade de justificar o não comparecimento, e após o voto do Ministro Edson Fachin, julgando integralmente procedente a ação, pediu vista antecipada dos autos o Ministro Luiz Fux. Ausentes o Ministro Dias Toffoli, neste julgamento, e o Ministro Celso de Mello, justificadamente. Presidência da Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 10.5.2018. (STF, Plenário, ADI n. 5766/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe n. 97, de 17-5-2018).

Conforme a decisão ADI n. 5766, a ADI foi julgada parcialmente procedente, na busca de alicerçar sua interpretação conforme a Constituição.

Tais mudanças na legislação vêm de encontro com situações que deixam o empregado preocupado com seu futuro profissional, uma vez que se questiona muito sobre a estabilidade no emprego e o vínculo empregatício, porém, não são apenas essas as mudanças ocorridas na CLT.

 

3 A APLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO APÓS AS ALTERAÇÕES ADVINDAS DA REFORMA TRABALHISTA

 

                              Discorrer acerca da aplicabilidade dos princípios do Direito do Trabalho após a reforma trabalhista não será algo singelo, tendo em vista que pouco tempo decorreu após a entrada em vigor da referida reforma, o que dificulta analisar se tais alterações na CLT violam ou não princípios do Direito do Trabalho e/ou constitucionais, levando em consideração as principais alterações apontadas no item anterior deste trabalho.

                    Vale ressaltar que a aprovação um tanto quanto rápida da reforma possibilitará que alguns de seus dispositivos possam ser questionados e até mesmo considerados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por violarem preceitos constitucionais e até mesmo princípios do Direito do Trabalho que são respaldados pela Constituição Federal de 1988, uma vez que tal reforma trouxe grande instabilidade jurídica no Direito do Trabalho.

                    No que diz respeito aos objetivos da reforma, nota-se posições divergentes quanto aos doutrinadores, uns defendem que a reforma possui objetivos modernistas e progressistas, vislumbrando o desenvolvimento econômico por meio dos valores do trabalho e da livre iniciativa, já outros, são contra, dado que deixou o trabalhador em situação de desvantagem na relação com o empregador, acarretando perdas em direitos conquistados com muita luta pela classe trabalhadora.

Para Mauricio Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado (2017, p. 39-40):

A reforma trabalhista implementada no Brasil por meio da Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017, desponta por seu direcionamento claro em busca do retorno ao antigo papel do Direito na História como instrumento de exclusão, segregação e sedimentação da desigualdade entre as pessoas humanas e grupos sociais.

 

Ainda de acordo com Mauricio Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado (2017, p. 40) “a Lei n. 13.467/2017 tenta instituir múltiplos mecanismos em direção gravemente contrária e regressiva à concepção de Estado Democrático de Direito”, ou seja, está divergindo dos princípios humanísticos e sociais defendidos pela Constituição, bem como diverge também dos direitos fundamentais da pessoa humana, contribuindo de maneira contundente para uma regressão dos direitos trabalhistas até então conquistados.

Mauricio Godinho Delgado (2017, p. 41) diz que “o Direito do Trabalho realiza um importante papel de política pública de distribuição de renda no mundo da economia e da sociedade capitalista, no entanto, a Lei n. 13.467/2017 busca romper com essa lógica” através da desregulamentação ou flexibilização das normas indispensáveis sobre o contrato de trabalho, consequentemente violando princípios constitucionais e do Direito do Trabalho.

Nesse sentido, Mauricio Godinho Delgado (2017, p. 41) diz que:

Na verdade, os princípios constitucionais da centralidade da pessoa humana na vida real do Direito do Trabalho, da dignidade da pessoa humana, da valorização do trabalho e do emprego, do bem-estar individual e social, da igualdade em sentido material e da subordinação da propriedade privada à sua função socioambiental são repetidamente negligenciados ou diretamente afrontados por diversas regras jurídicas da na nova lei.

 

Percebe-se, portanto, que segundo doutrinadores a reforma trabalhista traz violações a princípios protetores dos trabalhadores na relação de emprego, violações essas que propiciam uma desconstrução da estrutura jurídica antes construída e que protegia a saúde e a segurança do trabalhador enquanto parte de uma relação de trabalhista.

O artigo 394-A da CLT trouxe à baila um dos pontos mais polêmicos da reforma por se tratar do trabalho da gestante e lactante em locais considerados insalubres, pois tal norma, ao possibilitar que mulheres gravidas ou lactantes laborem em locais inapropriados com sua condição violam o princípio da dignidade da pessoa humana e consequentemente expõe a trabalhadora a riscos inerentes a sua saúde e de seu filho.  A referida norma foi questionada pela ADI 5938/DF, onde foi requerida sua inconstitucionalidade justamente por violar diversos direitos e princípios protetores, como aponta a decisão favorável à ADI 5938/DF que julgou inconstitucional a norma.

A ação foi ajuizada no Supremo pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos. A norma questionada admitia que gestantes exercessem atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo e que lactantes desempenhassem atividades insalubres em qualquer grau, exceto quando apresentassem atestado de saúde que recomende o afastamento. Tal previsão legal, segundo a entidade autora, afronta a proteção que a Constituição Federal atribui à maternidade, à gestação, à saúde, à mulher, ao nascituro, aos recém-nascidos, ao trabalho e ao meio ambiente de trabalho equilibrado. (STF, Plenário, ADI n. 5938/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe n. 115 de 30-5-2019).

 

                        Desta feita, surge o primeiro ponto de impacto entre as novas normas e os princípios que regem as relações trabalhistas, comprovando que existem inconsistências na lei que merecem ser analisadas de forma mais complexa, buscando diversas formas para sua interpretação e sua aplicação em situações concretas.

Seguindo as análises dos principais pontos da reforma destacados neste trabalho, verificamos que o artigo 611-A da CLT busca a prevalência das normas coletivas sobre a lei, fato este que já era aplicado antes da reforma, onde o que era acordado em convenções ou acordos coletivos possuíam prevalência, observando os limites e o alcance de tal prevalência, ou seja, na maioria dos casos, prevalece o negociado sobre o legislado, o que para alguns doutrinadores dificulta o acesso à Justiça do Trabalho por parte do trabalhador, uma vez que a Justiça do Trabalho não poderá, conforme o § 2. do mencionado artigo, dispor sobre a nulidade dos acordos por não caracterizarem um vício do negócio jurídico.

No que tange ao acesso à Justiça do Trabalho, o que se percebe é que houve uma tentativa de dificultar o acesso por parte do trabalhador, restringindo à atuação da Justiça do Trabalho e de seus Magistrados.

Mauricio Godinho Delgado (2017, p.47) conclui que:

A tentativa de emasculação do Poder Judiciário Trabalhista por intermédio de preceitos da Lei n. 13.467/2017, como por exemplo o art. 8., §§ 2. e 3., e o art. 702, I, “f” e §§ 3. e 4., ambos da CLT. Os novos dispositivos legais, se não bastassem outras afrontas, agridem, manifestamente, somo se vê, o princípio constitucional da separação dos poderes (art. 2., CF), e o princípio e garantia de independência do judiciário  (art. 2., CF), além das próprias estrutura e logica de atuação do Poder Judiciário (art. 92, caput e incisos II-A e IV, CF).

 

                        Nesse ínterim, percebe-se a tentativa de limitar e enfraquecer a Justiça do Trabalho, o que configura grande entrave na busca e efetivação dos direitos individuais e sociais de natureza trabalhista, violando, portanto, princípios constitucionais e do Direito do Trabalho.

                    Além da dificuldade do acesso à Justiça do Trabalho nota-se que a nova lei não trouxe uma reforma sindical e que seu conteúdo afeta consideravelmente o sistema de organização sindical e a representação coletiva da classe trabalhadora, tendo em conta que as alterações promovidas pela reforma buscam enfraquecer os sindicatos estimulando um modo de decrescimento e distanciamento na definição de normas que regulamentam a relação de emprego. Segundo José Dari Krein (2017, p. 92), as principais novidades diretas são:

(1) a prevalência do negociado sobre o legislado; (2) o estrangulamento financeiro dos sindicatos; (3) a normatização da representação dos trabalhadores no local de trabalho com base no Estado; (4) a possibilidade da negociação individual, excluindo os sindicatos na definição das cláusulas do contrato de trabalho; (5) a retirada da função do sindicato de supervisionar as homologações dos trabalhadores com mais de um ano no emprego; e (6) a eliminação da ultratividade.

 

                    Diante de tantas perdas por parte dos sindicatos, nota-se que houve um enfraquecimento dessas entidades no sentido de elas serem instrumentos para a busca de mais direitos e melhores condições de trabalho, contribuindo assim para uma maior proteção social.

                    Nesse seguimento, Mauricio Godinho Delgado (2017, p. 46) ressalta que:

O novo diploma jurídico instiga o sindicalismo a se tornar potencial adversário dos trabalhadores, podendo suprimir ou atenuar, por meio da negociação coletiva trabalhista, largo número de direitos imperativamente fixados na ordem jurídica heterônoma estatal.

 

                    Outro ponto que enfraquece ainda mais a atuação dos sindicatos e que merece destaque está relacionado à atividade fiscalizatória que essas instituições possuíam na homologação rescisão dos contratos individuais do trabalho com mais de um ano que foi extinto com a revogação do § 1. do artigo 477 da CLT, o que possibilita que esta homologação seja realizada na própria empresa, podendo ocorrer pagamento inadequado das verbas rescisórias ao empregado, entre outras situações possam o prejudicar.

                    Como se vê, as entidades sindicais buscam regular o direito coletivo do trabalho visando um equilíbrio de forças entre empregado e empregador por meio de diálogos, negociações e fiscalização. No entanto, para que essas atividades sindicais sejam desenvolvidas de maneira eficiente é necessário que o empregado contribua financeiramente para a manutenção dos sindicatos, o que, com a reforma foi praticamente extinto, pois com o fim da contribuição sindical que foi declarada constitucional pelo Superior Tribunal Federal (STF), através da Ação Direta de Constitucionalidade 55 (ADI – 55), as entidades passaram a ter dificuldades para se manter e consequentemente representar os sindicalizados.

Nesta oportunidade, José Dari Krein (2017, p. 93), esclarece que:

O financiamento sindical foi afetado pelo fim da contribuição sindical obrigatória, que era uma demanda de parte importante do movimento sindical, mas a sua introdução na contrarreforma tinha como função ajudar a ganhar parte da sociedade e do movimento sindical para reduzir as resistências às propostas do governo. Por um lado, o fim da contribuição sindical é defendido por parte do movimento sindical e da sociedade. Por outro, o governo utilizou a inclusão da medida para dividir o movimento sindical, sinalizando que poderia negociar a sua retirada e apresentar uma alternativa ao financiamento.

 

Observa-se, portanto, que os sindicatos perderam forças na representação da classe trabalhadora quebrando assim a possiblidade de equilíbrio esperado nas relações entre empregado e empregador uma vez que, segundo José Dari Krein (2017, p. 93), a fragilização do movimento sindical não advém somente da reforma, mas há um contexto econômico, político e ideológico desfavorável à ação coletiva no capitalismo contemporâneo que colocou os sindicatos na defensiva e estes perderam força na sociedade. Logo, caíram em descredito e, consequentemente os trabalhadores não reconhecem a importância de representação das classes por entidades sindicais.

No tocante à representação dos trabalhadores na empresa, o artigo 510 da CLT estabelece que em empresas com mais de 200 empregados, é assegurada a eleição de uma comissão para representa-los, com a finalidade de promover-lhes o entendimento direto com os empregados, ou seja, não há a necessidade da intervenção sindical, logo, surgem percepções acerca da idoneidade dessa comissão que pode sofrer pressão que influencie em sua representação, o que pode ocasionar em um ataque ao princípio da norma mais favorável, pois conforme o artigo 620 da CLT as condições estabelecidas em acordo coletivo de trabalho sempre prevalecerão sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho, uma vez que o termo “sempre” induz que mesmo, que outras condições, mesmo que mais favoráveis ao trabalhador, não serão considerados em face o acordo coletivo de trabalho, ficando claro seu confronto com o princípio do Direito do Trabalho da norma mais favorável.

Enfim, dentre todos os pontos destacados nesse trabalho, que não representam todas as mudanças trazidas pela reforma, notamos que são mudanças radicais que prejudicam a parte mais fraca na relação de emprego, logo podemos dizer que está havendo uma precarização do trabalho que se dissocia do papel civilizatório que incumbido ao Direito em um estado democrático de direito.

Substancial parte dos doutrinadores demonstra grande insatisfação com a reforma, como Mauricio Godinho Delgado (2017, p. 45) expressa:

A Lei da Reforma Trabalhista, entretanto, apresenta regramento distinto, vislumbrando no Direito Coletivo um instrumento adicional de regressão no patamar civilizatório mínimo assegurado pelo Direito Individual do Trabalho na ordem jurídica do país. Ao invés de ser instrumento de harmonização, agregação e, em certas situações, de adequação em face do patamar civilizatório mínimo fixado no Direito Individual do Trabalho, o Direito Coletivo do Trabalho passaria a se direcionar, nos termos da nova lei, para o caminho de se tornar mais um meio de redução do patamar civilizatório mínimo trabalhista garantido pela ordem jurídica especializada da Republica brasileira.

 

                    Destarte, a reforma trabalhista, considerada por alguns como contrarreforma, está ainda produzindo seus efeitos iniciais, e já se percebe que causou grande inquietação tanto no empregado quando no empregador, devido à instabilidade jurídica até então imposta pela nova lei, que está sendo até o momento muito questionada em diversos aspectos por colidir com princípios do Direito de Trabalho e constitucionais, já tendo como resultado a revogação de alguns dispositivos pelo Supremo Tribunal Federal.

 
CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

                Procurou-se, neste artigo, estabelecer um olhar acerca das implicações da Lei n.13.467/2017, denominada de reforma trabalhista, no contexto da aplicabilidade dos princípios do Direitos do Trabalho e constitucionais, pautando pela possibilidade de que tais princípios estão sendo violados ou ignorados pela reforma.

                Notou-se que a vigência da lei da reforma deu origem a uma instabilidade jurídica na seara trabalhista, uma vez que, a reforma trouxe à baila grande inquietação, principalmente pelos trabalhadores que consideraram estar perdendo direitos antes adquiridos, e que essas perdas, se confirmaram após a lei passar a vigorar.

                Após análise das pesquisas realizadas confirmamos que a lei, em alguns pontos desrespeitou princípios do Direito do Trabalho e constitucionais, no entanto, a maior parte das mais de 200 alterações advindas da reforma não violam tais princípios. No entanto, alguns pontos já foram considerados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal justamente por irem de encontro com preceitos constitucionais, violando o princípio da dignidade da pessoa humana, no caso, quando a CLT passou a permitir o trabalho de gravidas e lactantes em locais insalubres.

Muito se fala na hipótese da prevalência do negociado sobre o legislado, ou seja, com a reforma, pode o empregado ter grandes prejuízos uma vez que, segundo a nova legislação, é livre a negociação entre empregadores e empregados, tendo validade o que foi acordado, como estipula o artigo 620 da CLT, surgindo daí outro grande problema que acomete o trabalhador, que é a dificuldade do acesso à Justiça do Trabalho, pois ela não poderá, dispor sobre a nulidade dos acordos por não caracterizarem um vício do negócio jurídico, ou seja, houve uma tentativa de dificultar o acesso por parte do trabalhador, restringindo à atuação da Justiça do Trabalho e de seus Magistrados.

Vale notar que outro ponto muito debatido, e que segundo doutrinadores, visa privilegiar os empregadores está relacionado à perda da força dos sindicatos na representação dos empregados, uma vez que a CLT trouxe alterações que afastaram dos sindicatos algumas funções de fiscalização, além de acabar com a contribuição sindical, contribuição esta que era vital à manutenção destas entidades na luta pela igualdade entre empregado e empregadores.

Neste sentido, a pesquisa realizada mostrou que grande parte da doutrina se demonstra manifestamente contra a reforma trabalhista da forma com que foi coloca, suscitando a hipótese de que a reforma provocou um desmonte nos direitos trabalhistas, determinando o fim dos sindicatos e da Justiça do Trabalho, deixando o trabalhador em situação arriscada perante e empregador.

 

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[1] Advogado, Mestrando em Direito das Relações Internacionais (UDE-UY), Especialista em Prática Trabalhista e Previdenciária (Faculdade Cambury-GO); Direito Civil e Processo Civil (Faculdade Cambury-GO) e Direito de Família e Sucessões (Damásio – SP), cursando Pós Graduação em Direito Previdenciário (ESA Nacional), membro das Comissões de Direito do Trabalho, Direito Previdenciário e Direito de Família e Sucessões da OAB-GO.

Sobre o autor
DANILO RUBENS MARTINS DA SILVA

Advogado, Mestrando em Direito das Relações Internacionais (UDE-UY), Especialista em Prática Trabalhista e Previdenciária (Faculdade Cambury-GO); Direito Civil e Processo Civil (Faculdade Cambury-GO) e Direito de Família e Sucessões (Damásio – SP), cursando Pós Graduação em Direito Previdenciário (ESA Nacional), membro das Comissões de Direito do Trabalho, Direito Previdenciário e Direito de Família e Sucessões da OAB-GO.

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