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Arbitragem no Direito Empresarial: uma alternativa eficiente para a resolução de conflitos

Agenda 21/08/2019 às 11:48

O presente artigo tem por objetivo analisar o uso da arbitragem no Direito Empresarial, considerando-se aspectos conceituais e teóricos e as vantagens que tornam tal instituto uma alternativa mais eficiente, quando comparado ao processo judicial.

Introdução

Quando se pensa no exercício de uma atividade empresarial lucrativa e estável, uma das características mais imprescindíveis, seja nos aspectos produtivos, administrativos ou comportamentais, é a eficiência que, neste contexto, representa a produção da maior quantidade de bens ou serviços com a maior economicidade de recursos, e no menor tempo possível (Costa, 2019). Em suma, todos os procedimentos que envolvem a atividade empresarial exigem uma simbiose de qualidade e celeridade, orientada pela máxima imortalizada por Benjamin Franklin: time is money.

Em sentido contrário, uma das principais críticas feitas no Brasil referente à atividade jurisdicional exercida pelo Estado é a morosidade na tramitação de seus processos. Assim, quando uma ação associada ao Direito Empresarial, seja para a proteção de direitos ou para resolução de conflitos, carece do respaldo de uma decisão judicial, a necessidade de eficiência, própria das atividades mercantis, se choca lentidão processual da jurisdição, podendo implicar em prejuízos às partes e risco à atividade econômica.

Outra consideração que se faz importante é a aplicação do princípio da publicidade dos atos processuais que vigoram como regra no ordenamento jurídico brasileiro, limitado apenas quando pela defesa da intimidade ou do interesse social, nos termos do art. 5º, inciso LX, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988). Esta publicidade processual, quando relacionada ao Direito Empresarial, representa, em muitos casos, grandes prejuízos ao exercício de uma atividade produtiva, produzindo como possíveis consequências a insegurança do mercado quanto à organização, a divulgação de métodos produtivos exclusivos, entre tantas outros.

Diante destes fatos, constata-se que a opção para o atendimento de demandas do direito empresarial via jurisdicional se torna inconveniente em grande parte dos casos, necessitando-se, assim, de outro meio de resolução de conflitos, mais célere, menos formal, mas cuja decisão emane a mesma segurança jurídica de uma sentença. Tal meio é, sem dúvida, a arbitragem.

A arbitragem, foi reintroduzida no direito brasileiro em estatuto próprio em 1996 com o advento da Lei n. 9.307, e tem sido cada vez mais utilizada como forma alternativa e efetiva para a solução de conflitos relacionados a direitos patrimoniais disponíveis, tornando-se uma opção viável ao Judiciário, em razão, justamente, de sua rapidez, confidencialidade, economicidade processual, busca pelo embasamento técnico em suas decisões e pela segurança jurídica emanada da sentença arbitral, referendada no Código de Processo Civil (CPC/2015).

Arbitragem e jurisdição: aspectos conceituais

Conforme ensina Cintra et al. (2014), os primeiros meios de solução de conflitos utilizados pelas sociedades humanas consistiam na autotutela, onde a própria parte resolvia seus litígios através da violência, ou na autocomposição, onde os conflitos também eram solucionados pelas próprias partes, mediante renúncia, submissão, desistência ou transação. Posteriormente, o surgimento das primeiras civilizações e o consequente estabelecimento de leis, sejam elas de cunho civil ou religioso, trouxeram consigo o advento da heterocomposição, com o Estado, na figura dos seus governantes ou sacerdotes, outorgando a si o papel de mediador das lides.

Neste sentido, conforme apregoa Frederico Starling (2015), a arbitragem, ou juízo arbitral, foi um dos primeiros meios de solução de conflitos conhecidos pela história, consistindo no método pelo qual as partes buscavam pacificar as relações conflituosas de forma privada, mediante a intervenção de um terceiro, seguindo fórmula outorgada pelo estado.

No Direito Romano, uma das bases do ordenamento jurídico brasileiro e do ocidente em geral, a arbitragem voluntária e facultativa era admitida e estimulada, chegando a se tornar arbitragem obrigatória entre as fases das ações da lei (“legis actiones”, séculos VIII ao V a.C.) e do processo formulário (“per formulas”, séculos V ao II a.C.). (Scavone Júnior, 2018).

Com o desenvolvimento da noção de Estado e o fortalecimento deste, já na 3ª fase do Direito Romano, denominada cognitio extra ordinem, a arbitragem se transforma em jurisdição, que de forma geral, é compreendida como a superação de todos os meios previamente utilizados para a solução de conflitos. Na jurisdição o Estado deixou de ser aquele que meramente estabelecia a fórmula do julgamento e a concedia a um terceiro escolhido pelas partes. Aqui, o Estado é o próprio julgador.

Etimologicamente, a palavra jurisdição origina-se do latim juris dictio, que significa “dizer o direito”, se traduzindo na qualidade do judiciário em interpretar as leis para solucionar os casos concretos. De acordo com Cintra et al. (2014), a jurisdição é monopólio e uma das funções do Estado, na qual este substitui os titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente, resolver o conflito que os envolve, com o intuito de buscar a pacificação do conflito com justiça. A pacificação é feita em razão da atuação da vontade do direito objetivo que rege o caso apresentado em concreto, tudo isso por intermédio do processo.

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Ora, se como foi dito a jurisdição é a superação de todas as formas de solução de conflito, a arbitragem seria, portanto, um método ultrapassado e anacrônico? Não necessariamente, visto que, nem sempre o Estado foi capaz de alcançar a todos os seus cidadãos e, em muitos casos, as exigências para o acesso à justiça via jurisdicional é complexo ou não adequado a várias situações, abrindo espaço para a arbitragem.

Fato é que a arbitragem nunca deixou de existir, assim como os outros meios de resolução de conflitos, até mesmo a autotutela, que é proibida pelo ordenamento jurídico. Na evolução do Direito no curso da história, a arbitragem sempre foi contemplada nos procedimentos e processos legais, ora imbuída de maior, ora de menor importância. No Brasil, o instituto é reconhecido desde as Ordenações Filipinas de 1603, expressamente adotado pela Constituição brasileira de 1824, efetivamente consagrado como forma de prevenir litígios nas Constituições de 1891 e 1969, e estatuído em legislação própria através da Lei nº 9.307/1996. (Starling, 2015).

Assim, considerado o entendimento da doutrina e da legislação atual, Luiz Antônio Scavone Júnior (2018), define o instituto da arbitragem da seguinte forma: “A arbitragem pode ser definida, assim, como o meio privado, jurisdicional e alternativo de solução de conflitos decorrentes de direitos patrimoniais e disponíveis por sentença arbitral, definida como título executivo judicial e prolatada pelo árbitro, juiz de fato e de direito, normalmente especialista na matéria controvertida”. (Scavone Júnior, 2018, p. 19).

A arbitragem no Direito Empresarial

Com base no conceito descrito anteriormente, a resolução de conflitos no âmbito do Direito Empresarial, além de enquadrar-se conceitualmente na arbitragem, tendo em vista seu caráter basicamente patrimonial, apresenta diversas vantagens importantes quando opta-se por este instituto, fazendo com que alguns autores não entendam a arbitragem simplesmente como um meio alternativo, mas, na verdade, como o meio adequado para resolução de controvérsias dessa natureza. (Bacellar, 2016).

Neste sentido, Scavone Júnior (2018) apresenta algumas destas vantagens, como sendo:

a) especialização, tendo em vista que, na arbitragem, possibilita-se a nomeação de um árbitro especialista na matéria do conflito ou no objeto do contrato entre as partes, reduzindo-se gastos e tempo com perícias que, muitas vezes, não conta com especialista de confiança das partes do ponto de vista técnico;

b) rapidez, na arbitragem, o procedimento é, nas palavras do autor, “abissalmente mais célere que o procedimento judicial” (Scavone Júnior, 2018, p. 20);

c) irrecorribilidade, a sentença arbitral equivale a uma sentença judicial transitada em julgado, conforme o art. 515, inciso VII do CPC/2015, não sendo passível de recurso;

d) informalidade, não se exige na arbitragem a formalidade do procedimento judicial, podendo ser feita pelas partes a escolha dos árbitros e do direito material e processual utilizados para a resolução do conflito, nos limites da Lei 9.307/1996; e, por fim,

e) confidencialidade, a arbitragem pode ser sigilosa, o que contrapõe a publicidade, entendida como regra em processos judiciais, conforme o art. 189 do CPC.

Ao discorrer sobre tais vantagens da arbitragem para o direito empresarial, Garcia (2014) dá especial atenção à rapidez deste procedimento, considerando que o processo judicial costuma demorar muito mais do que os seis meses que o árbitro possui para prolatar a sentença arbitral, prazo este previsto no art. 23 da Lei de Arbitragem.

Já Barcellar (2016), chama a atenção para a importância da confidencialidade, vez que, segundo ele, em alguns litígios empresariais, independentemente da proteção à intimidade ou do interesse social, o sigilo nos atos processuais são fundamentais para a continuidade da atividade econômica, que poderia ser prejudicada pela publicidade das adversidades enfrentadas pela empresa e debates envolvendo seus relacionamentos comerciais.

Garcia (2014), acrescenta ainda à essas vantagens a autonomia negocial, que se relaciona à liberdade de se negociar, seja na contratação ou na eventual resolução de litígio, de forma a satisfazer a pretensão das partes pacificamente e com o menor desgaste possível.

Um artifício fundamental para a aplicação da jurisdição arbitral no direito empresarial é a introdução da chamada cláusula compromissória no documento social da empresa para a resolução de conflitos de natureza societária. O texto constante no art. 4º da Lei nº 9.307/96, define a cláusula compromissória como sendo “a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato”. Starling (2015) afirma ser importante salientar que a introdução de tal cláusula deve ser feita in abstracto, ou seja, anterior à ocorrência de qualquer conflito. Assim, a cláusula compromissória funcionará como predeterminação da via arbitral como a única apta a solucionar quaisquer controvérsias oriundas da interpretação daquele contrato.

A importância da arbitragem na solução de conflitos do Direito Empresarial é reconhecida nas legislações específicas da matéria, conforme se verifica na redação do parágrafo 3º do art. 109, na Lei de Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/1976), introduzido pela Lei nº 10.303/2001, que afirma que “o estatuto da sociedade pode estabelecer que as divergências entre os acionistas e a companhia, ou entre os acionistas controladores e os acionistas minoritários, poderão ser solucionadas mediante arbitragem, nos termos em que especificar”. Tal parágrafo pode ser aplicado subsidiariamente às sociedades de responsabilidade limitada, nos moldes do parágrafo único do art. 1.053 do Código Civil de 2002.

Por fim, Garcia (2014) destaca que, atualmente, a arbitragem tem gradualmente ganhando força na resolução de conflitos empresariais, valorizada por possuir legislação própria, por resolver conflitos de forma ágil e pela grande força normativa que existe em sua sentença, que a caracterizam como uma forma mais eficiente de resolução de conflitos e acesso à justiça.

Referência

BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 16 de dezembro de 1976. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6404compilada.htm>.

________. Lei nº 9.037, de 23 de setembro de 1996. Dispõe sobre a arbitragem. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 de setembro de 1996. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9307.htm>.

________. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Institui o Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 de março 2015. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>.

CARMONA, Carlos Alberto; apud DIAS, Jader Augusto Ferreira. A Arbitragem como meio alternativo na solução de conflitos societários. In: BERALDO, Leonardo de Faria (Org. e Coord.). Direito societário na atualidade: aspectos polêmicos. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p.403 - 426.

CINTRA, Antônio Carlos de Araújo. GRINOVER, Ada Pellegrini. DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2014.

COSTA, Alessandro. Os 3 'E' que movimentam uma empresa: eficiência, eficácia e efetividade. Portal Administradores, 2019.

GARCIA, André Corral. Arbitragem no direito empresarial. 2014. 57 f. Monografia (Especialização) - Curso de Direito, Faculdade de Direito de Presidente Prudente, Presidente Prudente/SP, 2014.

LIMA, Bruna Nogueira Tosta Machado de. Arbitragem e o Direito Empresarial: alterações da Lei de Arbitragem pela Lei nº 13.129/2015. Jus Navigandi, 2015. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/41169/arbitragem-e-o-direito-empresarial-alteracoes-da-lei-de-arbitragem-pela-lei-n-13-129-2015>.

SCAVONE JUNIOR, Luiz Antônio. Manual de arbitragem: mediação e conciliação. 8. ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2018.

STARLING, Frederico. Arbitragem no Direito Empresarial contemporâneo. Jus Navigandi, 2015. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/41655/arbitragem-no-direito-empresarial-contemporaneo>.

Sobre o autor
Paulo Ramon Santos

Bacharelando do Curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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O artigo se justifica no sentido de apresentar alternativas eficientes de acesso à justiça que podem contribuir para o descongestionamento das vias jurisdicionais, além de permitir procedimentos mais céleres e menos formais.

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