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A intervenção judicial no processo de nomeação dos chefes de missão diplomática de caráter permanente.

Pode o Judiciário, caso provocado, intervir na escolha presidencial de um Embaixador que é parente do Presidente da República?

Agenda 18/09/2019 às 14:52

Breve Análise Constitucional acerca da recente notícia que tange à pretensão de indicação, a ser feita pelo presidente Jair Bolsonaro, de um parente de primeiro grau à Embaixada Brasileira em Washington.

Embora o artigo 2º da Constituição Federal (CF) preze pela independência dos poderes, parte do conceito melhor dedutível da Teoria da Tripartição de Montesquieu, há muito o que ser comentado acerca da harmonia – entre as funções – que é por vezes mal compreendida, e objeto de questionamento, como no caso ora abordado. Antes de tudo, cabe situar os Poderes envolvidos, a previsão legal, e o trâmite requisitado para a efetivação dessa pretensão judicial, a partir da vontade advinda do chefe do Poder Executivo.

Haja vista a lei que institui o regime jurídico dos servidores do Serviço Exterior Brasileiro (Lei 11.440/2006), o seu artigo 41 determina que os Chefes de Missão Diplomática Permanente, cuja nomenclatura enquadra os representantes responsáveis pelas Embaixadas, sejam indicados pela Presidência da República. Essa escolha é realizada unicamente dentre os diplomatas de Primeira Classe, salvo numa disposição trazida em Parágrafo Único do mesmo artigo, a qual determina que:

“Parágrafo único. Excepcionalmente, poderá ser designado para exercer a função de Chefe de Missão Diplomática Permanente brasileiro nato, não pertencente aos quadros do Ministério das Relações Exteriores, maior de 35 (trinta e cinco) anos, de reconhecido mérito e com relevantes serviços prestados ao País. (...)”

Com essa inserção, percebemos haver uma previsão legal para o exercício do cargo por um cidadão que se enquadre nessas categorias e não faça parte do corpo diplomático brasileiro. A partir dessa possível indicação, realizada pelo chefe do Poder Executivo, o mérito do processo é encaminhado para análise do Senado Federal, o qual é dotado de atribuições privativas pelo artigo 52 da CF. Destaco o inciso IV, que define a sua competência exclusiva para:“aprovar previamente, por voto secreto, após arguição em sessão secreta, a escolha dos chefes de missão diplomática de caráter permanente;”

Até o momento em que foi aqui abordado o tema, tal situação deveria transcorrer sem os maiores problemas se o caso não se tratasse de um indicado que é parente em primeiro grau do Presidente da República. A situação é enquadrada como Nepotismo, que se refere às competências elencadas no artigo 84, inciso VI, alínea a da Constituição Federal, uma vez que o cargo diz respeito à Administração Pública Federal. Tal interpretação deriva da aplicação conjunta dos artigos 1°, 2° e 3°, que são componentes do Decreto (7203/2010) que define aquilo que seria a prática nepotista.

Contudo, cabe aqui a lembrança da Súmula 13 (publicada em agosto de 2008), do Supremo Tribunal Federal, a qual identifica como Nepotismo a nomeação para os cargos que sejam de natureza exclusivamente administrativa, descartando os provenientes de indicação evidentemente política. Destaco o trecho de voto do Ministro Luís Roberto Barroso quando da Reclamação tangente ao Agravo Regimental n° 28.024, no qual afirma que:

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O Supremo Tribunal Federal tem afastado a aplicação da Súmula Vinculante 13 a cargos públicos de natureza política, ressalvados os casos de inequívoca falta de razoabilidade, por manifesta ausência de qualificação técnica ou inidoneidade moral. (...)”

Dessa forma, partindo do pressuposto que a acusação de falta de razoabilidade não venha a comprometer a nomeação, conclui-se que o Poder Judiciário não pode impedir a mera pretensão presidencial baseada na indicação. Note-se que deve ser aquela (a nomeação) sucedida por esta (a indicação), isto é, faz-se premente que se dirija a vontade política emanada pelo Poder Executivo primeiramente ao Legislativo, nos moldes do artigo 39 da supracitada Lei do Serviço Exterior Brasileiro:

“Art. 39. Mediante aprovação prévia do Senado Federal, os Chefes de Missão Diplomática Permanente e de Missão ou Delegação Permanente junto a organismo internacional serão nomeados pelo Presidente da República com o título de Embaixador. (...)”

 Assim, interpreta-se que o Senado Federal é o responsável pela decisão de escolher previamente os embaixadores, a partir da indicação presidencial, sendo etapas imunes da intervenção do Poder Judiciário, no escopo de garantia da Independência e da Harmonia entre os Poderes Constituintes, tal qual determina o artigo 2° da Magna Carta. A provocação no Judiciário poderá sim ocorrer apenas a partir do momento em que se der a nomeação, sendo discutidas as características intrínsecas deste caso e a aplicabilidade da vigorante Súmula.

O ato também pode ser passível de nulidade com base na interpretação do caput do artigo 37 no que diz respeito aos princípios constitucionais que vinculam a Administração Pública, a saber, “legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”, independentemente da incidência de nepotismo. Para isto, basta uma realização de Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) acerca da nomeação perante a Corte Suprema, uma vez tendo sido devidamente respeitadas as etapas anteriores.

Sobre o autor
Isaac Baptista da Conceição Nascimento

Estudante de Direito da Fundação Getúlio Vargas.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Reedição de trabalho realizado no dia 27 de agosto de 2019, para a disciplina Organização do Estado e Direitos Fundamentais, obrigatória para o 2° período do curso de Direito da Fundação Getúlio Vargas - Rio de Janeiro.

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