1. O FATO
Representantes do opositor Juan Guaidó , reconhecido como presidente da Venezuela pelo Brasil, conseguiram pela primeira vez acesso à embaixada do país em Brasília, na madrugada desta quarta-feira, 13, horas antes do início das atividades da 11.ª Cúpula do Brics , que reúne os líderes de Rússia, Índia, China e África do Sul, países que apoiam a permanência de Nicolás Maduro no poder.
Para o caso houve uma verdadeira invasão de uma sede diplomática algo censurável nas relações internacionais.
Do que se lê no site do jornal O Estado de São Paulo, 13 de novembro do corrente ano, "segundo a equipe de Guaidó, funcionários da embaixada permitiram o acesso de Tomas Silva, ministro-conselheiro acreditado pelo Brasil, ao local - a embaixadora María Teresa Belandria não está no País. O governo Maduro, no entanto, descreveu o ato como “invasão”, mesmo termo usado pelo governo brasileiro ao tratar do caso .
De acordo com comunicado divulgado pela embaixadora, um grupo de funcionários da representação diplomática decidiu abrir as portas e entregar as chaves da embaixada voluntariamente, bem como reconhecer Guaidó como legítimo presidente. "
2. AS SEDES DIPLOMÁTICAS
As sedes diplomáticas(embaixadas, sedes de governos internacionais, etc.) são invioláveis como garantia às representações estrangeiras. As convenções internacionais assinalam que os locais das missões diplomáticas são invioláveis, não podendo ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida de execução, ficando assegurada a proteção a seus arquivos, documentos, correspondência, incluídos os dos funcionários consulares, por não pertencerem a estes, mas ao Estado a que eles servem. O Estado acreditante pode ainda renunciar a tais imunidades, mas o deve fazer de forma expressa.
As missões diplomáticas destinam-se a assegurar a manutenção de boas relações entre o Brasil e os Estados em que se acham sediados, bem como a proteger os direitos e os interesses do Brasil e dos brasileiros, como se lê da Lei 3.917, de 14 de julho de 1961.
A missão diplomática é integrada pelo Chefe da Missão (embaixador ou ministro), além de pessoal diplomático, administrativo e técnico e o pessoal de serviço.
E m 1961, foi assinada a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, que veio a codificar toa a matéria. A ênfase da Convenção é sobre a missão diplomática, relegando o chefe da missão a segundo plano.
Segundo a terminologia adotada a expressão agente diplomático abrange o chefe da missão ou um membro do pessoal diplomático da missão. No passado, sob o manto do Regulamento de Viena de 1815 tal expressão era reservada apenas ao chefe da missão.
3. A INVIOLABILIDADE DA MISSÃO DIPLOMÁTICA
Dentre todas as imunidades, talvez a mais importante delas seja a da inviolabilidade da missão diplomática que está prevista no artigo 22 da Convenção de Viena Sobre as Relações Diplomáticas que dispõe da seguinte maneira:
Artigo 22:
1. Os locais da Missão são invioláveis. Os Agentes do Estado acreditado não poderão nêles penetrar sem o consentimento do Chefe da Missão.
2. O Estado acreditado tem a obrigação especial de adotar tôdas as medidas apropriadas para proteger os locais da Missão contra qualquer intrusão ou dano e evitar perturbações à tranqüilidade da Missão ou ofensas à sua dignidade.
3. Os locais da Missão, em mobiliário e demais bens nêles situados, assim como os meios de transporte da Missão, não poderão ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida de execução.
A maioria dos doutrinadores concorda que a inviolabilidade da missão é uma das prerrogativas de importância mais relevante para o desempenho das Missões diplomáticas, sobre isso LIMA fala que a inviolabilidade da Missão, que em tempos remotos era considerada uma extensão da própria inviolabilidade do agente diplomático, teve seu status mudado com a Convenção de Viena Sobre as Relações diplomáticas (CVRD) e passou a ser um atributo do estado acreditante concedido aos locais utilizados para sediar a Missão.
Enquanto a obrigação de abstenção consagrada no § 1º do art. 22. da CRVD impede as autoridades locais de qualquer intervenção na sede da Missão sem a autorização do Chefe da Missão, a obrigação de proteção fruto do § 2º deste mesmo artigo é mais ampla, obrigando o Estado local a fornecedor proteção e segurança à sede da Missão não poupando esforços para que para garantir que todas as atividades que devam ser desempenhadas na sede da Missão não sofram nenhuma interrupção motivada mor ameaça à segurança de sua sede. Ressalta também que a esta imunidade é imperativa não somente ao Estado acreditado no qual se localiza a sede da Missão diplomática de governo estrangeiro, mas sim a todo e qualquer estado, sendo que nenhuma nação deverá agredir a soberania de outra através de violação das sedes de suas Missões diplomáticas.
A inviolabilidade da Missão é atributo que impede até mesmo determinados entes do Estado onde se localiza a sede de exercerem sua autoridade em alguns casos, como explica Mazzuoli:
Nesse sentido, não podem, policiais do estado acreditado, sem o consentimento do Chefe da Missão, invadir, a embaixada de país estrangeiro a fim de capturar certo individuo procurado, e lá asilado. Além de respeitar a inviolabilidade dos locais da missão, o Estado acreditante tem a obrigação especial de adotar todas as medidas necessárias para proteger tais locais contra qualquer intrusão ou dano e evitar as perturbações à tranquilidade da missão ou ofensas à sua dignidade.(obra citada).
A inviolabilidade da Missão é atributo que impede até mesmo determinados entes do Estado onde se localiza a sede de exercerem sua autoridade em alguns casos, como explica Mazzuoli:
Nesse sentido, não podem, policiais do estado acreditado, sem o consentimento do Chefe da Missão, invadir, a embaixada de país estrangeiro a fim de capturar certo individuo procurado, e lá asilado. Além de respeitar a inviolabilidade dos locais da missão, o Estado acreditante tem a obrigação especial de adotar todas as medidas necessárias para proteger tais locais contra qualquer intrusão ou dano e evitar as perturbações à tranquilidade da missão ou ofensas à sua dignidade.(Curso de Direito Internacional Público, 2012. p.571).
Como disse ainda Mazzuoli(Obra citada, terceira edição, pág. 477), “os locais da missão são invioláveis, não podendo os agentes do Estado acreditado(por Estado acreditado se entende aquele que recebe em seu território uma missão diplomática; e por Estado acreditante se entende aquele Estado que envia uma missão diplomática para território de outro Estado) neles penetrar sem o consentimento do Chefe da Missão(artigo 22, § 1º). O Estado acreditado tem ainda a obrigação especial de adotar todas as medidas apropriadas para proteger os locais da missão contra qualquer instrução ou dano e evitar perturbações à tranquilidade da missão ou ofensas à sua dignidade(artigo 22, parágrafo segundo). Os locais da missão, seu mobiliário e demais bens nele situados, assim como os meios de transporte da missão, não poderão ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida de execução(artigo 22, parágrafo terceiro). São também invioláveis os arquivos e documentos da missão, em qualquer momento e aonde quer que se encontrem(artigo 24), bem como a sua correspondência oficial(artigo 27, parágrafo segundo). Ademais, os direitos e emolumentos que a missão perceba em razão de prática de atos oficiais também são isentos de todos os impostos ou taxas(artigo 28)”.
O que se tem em relação às prerrogativas e imunidades da missão diplomática também se aplica às atividades das demais repartições que o Estado mantém no exterior, na medida em que o Direito Internacional pode imputar ao próprio Estado a regência das atividades de tais repartições. Assim tanto no caso das missões diplomáticas quanto no caso relativo às demais repartições que o Estado mantém no exterior, tem-se como certo que a responsabilidade pelos atos por estes órgãos causados deve recair sobre o Estado acreditante, sem que este possa alegar que a missão ou a repartição sua, situada no estrangeiro, ultrapassou os comandos atribuídos, uma vez que, em se tratando de órgãos seus, sobre ele deve recair eventual responsabilidade, como disse Guido Fernando Silva Soares(Das imunidades de jurisdição e de execução, páginas 104 e 105).
Somem-se ainda o privilégio envolvendo a inviolabilidade pessoal e domiciliar conferido aos agentes diplomáticos desde os tempos mais remotos. A inviolabilidade atribui ao agente a chamada intangibilidade, garantindo-lhe a segurança absoluta para o desempenho de seus misteres e colocando-lhe acima de qualquer ofensa ou perseguição.
4. O AGENTE DIPLOMÁTICO
Na escolha e nomeação dos agentes diplomáticos, cada Estado determina as qualidades e condições de idoneidade que devem possuir os seus agentes no exterior, bem como o modo de sua designação. É certo que, em muitos países, o pessoal diplomático constitui um corpo de funcionários de carreira.
Em geral, os agentes diplomáticos são nacionais do país que os nomeia, mas nada impede que pertençam a outra nacionalidade. Entretanto, a prática internacional desaconselha a escolha de um nacional do Estado junto a cujo governo o nomeado deve servir. Isso porque haveria uma dificuldade de conciliar os deveres do agente em relação aos dois Estados(o que escolhe e aquele da qual é nacional e onde vai servir).
Recomenda a prática do Direito Internacional Público que antes de efetuada a nomeação, o governo que resolve acreditar um agente diplomático junto a outro governo deve solicitar deste a aceitação a esse outro governo, ou, antes, deve informar-se confidencialmente junto a esse outro governo, sobre se tal pessoa será bem recebida como representante diplomático. Assim é bom saber se a mesma será persona non grata. A essa consulta, designa-se o nome de pedido de agrément ou de agréation.
Partido para o posto deverá o agente diplomático, além de outros documentos, um que o identifica e outro que o acredita. O primeiro é o passaporte diplomático e o segundo é a credencial.
O agente diplomático tem deveres que podem ser assim resumidos: de representação, de observação e de proteção.
5. O RECONHECIMENTO DE GOVERNO DENTRO DE UMA SUBLEVAÇÃO
Fala-se que há uma sublevação na Venezuela e existe um governo que se opõe ao que estaria no poder de forma ilegítima.
Ensinaram Hildebrando Aciolly e Geraldo Eulálio do Nascimento Silva (Manual de direito internacional público, 15.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 99.) que “se se tratar de um Estado surgido de um movimento de sublevação, o reconhecimento será prematuro enquanto não cessar a luta entre a coletividade sublevada e a mãe-pátria, a menos que esta, após luta prolongada, se mostre impotente para dominar a revolta e aquela se apresente perfeitamente organizada como Estado; 2º) desde que a mãe-pátria tenha reconhecido o novo Estado, este poderá ser reconhecido logo que apresente todas as características de um Estado perfeitamente organizado e demonstre, por atos, sua vontade e sua capacidade de observar os preceitos do direito internacional. 3°) se se tratar de um Estado surgido de outra forma, ele poderá ser reconhecido logo que apresente todas as características de um Estado perfeitamente organizado e demonstre, por atos, sua vontade e sua capacidade de observar os preceitos do direito internacional.”
Contudo, não se pode descartar a hipótese do reconhecimento prematuro de um Estado, o que pode ser perigoso, devendo ser realizado com extrema cautela, uma vez que sua prática poderá ser interpretada como ingerência indevida em assuntos internos do Estado. Segundo alguns autores o reconhecimento da Croácia por parte de certos membros da Comunidade Europeia, e Suíça (ocorrido em 15 de janeiro de 1992), foi prematuro, eis que a Croácia, a época, controlava apenas um terço de seu próprio território, como ensinou Valério de Oliveira Mazzuolli(Curso de direito internacional público, 2009, pág. 400).
A doutrina majoritária faz referência a duas teorias relativas ao reconhecimento de governo:
1) Doutrina Tobar. Instituída pelo Ministro das Relações Exteriores do Equador, Carlos Tobar (1853-1920), em 1907, pregava que a única forma de evitar golpes de Estado no continente americano seria a comunidade internacional se recusar a reconhecer os governos golpistas como legítimos, rompendo relações diplomáticas e apresentando a eles uma declaração de não-reconhecimento, até que aquele governo fosse confirmado de forma democrática. Esta tese esteve presente na América Latina, inclusive na Venezuela, que aplicou-a rompendo relações com Estados cujos governos não concordava, inclusive o Brasil.
2) Doutrina Estrada. Em 1930, o Ministro das Relações Exteriores do México, Genaro Estrada (1887-1937), proferiu uma declaração sustentando que o reconhecimento de uma nova soberania é uma prática afrontosa, e de desrespeito à soberania da nação preexistente, pois o reconhecimento é um elemento dispensável para que o Estado inicie suas atividades. Em outras palavras, quer dizer que se um Estado não concorda com determinado governo, basta simplesmente não manter relações diplomáticas com ele. Mas emitir um juízo de valor seria considerado uma ofensa.
Na prática, percebe-se que esta teoria obteve maior aceitação na América Latina. Pode haver, para o caso, um reconhecimento especial que são alternativas que podem ser estudadas pela Organização dos Estados Americanos e, se for o caso, apesar da posição do Uruguai, pelo Mercosul, em grau de economia local:
a) Reconhecimento de beligerância. Ocorre quando parte da população de um Estado desencadeia uma revolução contra o governo, com a finalidade de criar um novo Estado ou modificar a forma de governo existente. A beligerância é um estado jurídico “precário”, dada a existência de duas situações distintas, onde ou o governo preexistente retomará ao poder, ou os rebeldes tomarão o poder definitivamente e instituirão um novel governo, baseado em seus ideais revolucionários. Como exemplo, cabe mencionar o caso da Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela que reconheceram a Frente Nacional de Libertação Sandinista como beligerante na guerra civil da Nicarágua, em junho de 1979.
b) Reconhecimento de insurgência. A insurgência (insurgency, em inglês, ou insurgence em francês), é deflagrada no momento em que uma revolta de proporções consideráveis, mas sem a qualidade de guerra civil, com fins políticos, comandada por um movimento armado com o fim de impedir a soberania e as relações exteriores de um Estado. Esta espécie de reconhecimento faz com que os atos praticados pelos “insurretos” deixem de serem de serem qualificados como atos criminosos, de banditismo, terroristas ou de pura violência. A base de uma insurgência pode ser política, econômica, religiosa, étnica, ou uma combinação de fatores. Podem ser citadas insurgências históricas, como a Guerra Civil Russa (1918-1921), e a Guerra Civil Angolana (1975-2002).
c) Reconhecimento como Nação. Ocorre quando um ou mais Estados admitem que determinado grupo reúne todos elementos necessários para ser considerado como verdadeira Nação. O termo “Nação” refere-se a um conjunto de pessoas que possuem a mesma origem, as mesmas tradições, os mesmos costumes e aspirações comuns. Comumente os membros de uma nação falam a mesma língua e habitam o mesmo território, podendo, entretanto, haver exemplos em sentido contrário. O que liga o povo de uma nação é um laço puramente moral, ao passo que no Estado, existe uma relação política. O reconhecimento como Nação teve origem na primeira Guerra Mundial, de 1914 a 1918, gerando efeitos mais políticos do que jurídicos, por tratar-se de uma espécie de “promessa” de reconhecimento, quando a respectiva Nação tornar-se formalmente um Estado soberano, após reunidos os requisitos que lhe são inerentes.
CONCLUSÕES
Para o caso, de toda sorte, fica a responsabilidade do governo brasileiro por qualquer dano que venha a ser causado a missão diplomática Venezuela no país. Aplica-se o que já foi dito:
“Os locais da missão são invioláveis, não podendo os agentes do Estado acreditado(por Estado acreditado se entende aquele que recebe em seu território uma missão diplomática; e por Estado acreditante se entende aquele Estado que envia uma missão diplomática para território de outro Estado) neles penetrar sem o consentimento do Chefe da Missão(artigo 22, § 1º). O Estado acreditado tem ainda a obrigação especial de adotar todas as medidas apropriadas para proteger os locais da missão contra qualquer instrução ou dano e evitar perturbações à tranquilidade da missão ou ofensas à sua dignidade(artigo 22, parágrafo segundo). Os locais da missão, seu mobiliário e demais bens nele situados, assim como os meios de transporte da missão, não poderão ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida de execução(artigo 22, parágrafo terceiro). São também invioláveis os arquivos e documentos da missão, em qualquer momento e aonde quer que se encontrem(artigo 24), bem como a sua correspondência oficial(artigo 27, parágrafo segundo). Ademais, os direitos e emolumentos que a missão perceba em razão de prática de atos oficiais também são isentos de todos os impostos ou taxas(artigo 28)”.
O Estado acreditado tem a obrigação especial de adotar todas as medidas apropriadas para proteger os locais da missão contra qualquer dano e evitar perturbações à tranquilidade da missão ou ofensas à sua dignidade.